Capítulo 4
Já haviam se passado algumas horas desde que os dois começaram a caminhar mata adentro, após saírem daquela clareira onde haviam acordado. Cada vez mais o ambiente ao redor deles parecia sinistro, principalmente com a névoa que os rondava constantemente. O silêncio tornava tudo ainda mais desconfortável para os dois, afinal, já estavam andando há horas e nenhum deles havia tomado a iniciativa de falar um com o outro.
Após mais meia hora andando, o clima naquela densa floresta parecia ficar cada vez pior. O frio e o desconforto aumentavam, e a neblina ficava ainda mais densa a cada passo que davam, o que impossibilitava encontrar uma saída daquela floresta. Isso era um grande problema. Leonardo podia jurar que o caminho começava a ficar cada vez mais íngreme e, se eles se afastassem, poderiam acabar se perdendo um do outro. Certamente seria difícil para eles se localizarem novamente.
Pensando nisso, Leonardo se virou para trás, estendeu sua mão para Ryo e sugeriu calmamente: — Ei, é melhor segurar minha mão por enquanto. Está difícil de ver por causa da neblina e, talvez, se ficarmos de mãos dadas, a gente não se separe tão facilmente… — Leonardo tentou não olhar diretamente nos olhos de Ryo enquanto falava. Ele se sentia envergonhado ao sugerir que andassem de mãos dadas, mas, surpreendentemente, Ryo apenas suspirou e assentiu com a cabeça antes de entrelaçar sua mão com a de Leonardo.
E então seguiram de mãos dadas em meio à neblina que se estendia pela floresta. Ryo tropeçava diversas vezes, mas sempre que estava prestes a cair, Leonardo o segurava firmemente, puxando-o para cima e ajeitando algumas mechas de cabelo que haviam ficado soltas em sua testa. Ele lembrava Ryo para ter cuidado ao andar, ou poderia acabar se machucando. Assim, continuaram a andar por mais um longo tempo, falando pouco, com um ar inquietante que se espalhava pelo ambiente. Para tentar amenizar essa sensação, Ryo tomou a iniciativa de falar:
— Então, você realmente não se lembra de nada da hora em que morreu? — Ele disse, tentando manter a calma na voz em relação à pergunta que acabara de fazer.
— Não, eu não lembro. Só tenho algumas sensações sobre… eu realmente não me lembro de nada.— Ele não demonstrou muito desconforto sobre o assunto, mas também não parecia disposto a conversar muito.
— Sensações? Que estranho. Sabe, eu me lembro perfeitamente de tudo, então por que somente você não se lembra? Você não estaria mentindo para mim, estaria, Leonardo? — Ryo disse com certa dúvida se Leonardo estava realmente sendo sincero sobre o ocorrido.
— Ryo, por acaso eu já menti para você alguma vez? Acho que ambos sabemos a resposta para essa pergunta. — O jeito que Leonardo falava era claramente uma alfinetada, não com a intenção de ser maldoso, mas para lembrar Ryo de algo do qual já tinha certeza há muito tempo.
— Você tem razão… Eu só estou sendo desconfiado por coisas bobas. Vamos deixar isso de lado, tá bom? Mas eu não posso evitar de ficar curioso sobre o que você quis dizer com ‘sensações’. Será que poderia me falar? — Ele estava obviamente intrigado sobre o que Leonardo estava falando quando citou ter algumas sensações sobre o momento de sua morte, mas não havia perguntado somente por isso. O que Ryo realmente desejava era evitar aquele silêncio que só deixava o clima mais tenso.
— Hm… bem, eu não sei. Eu só sinto que, durante alguns momentos, tive uma necessidade inexplicável de me agarrar a algo… Como se viver ou não dependesse disso.— Ele não sabia muito bem como pôr em palavras o que queria explicar, mas achou que, para o momento em que se encontravam, essa foi a melhor explicação que conseguiu pensar.
Leonardo não pôde ver devido à névoa, mas o que ele havia dito fez o rosto de Ryo ficar extremamente vermelho. Ele parecia estar prestes a falar algo quando, em meio ao silêncio da floresta, finalmente escutou algo: um farfalhar de folhas ao longe. Por algum motivo, aquilo fez um arrepio correr pela sua espinha, e Ryo apertou mais forte a mão de Leonardo. — Leo, eu escutei alguma coisa.
— Tem certeza? Pode ter sido só impressão… sabe, pelo silêncio e essa névoa; você nunca foi muito fã desses ambientes mais sombrios mesmo. — Ele dizia para tentar manter o outro calmo. Afinal, ele também havia ouvido o som alguns segundos atrás e, de algum modo, sua visão estava se adaptando àquela neblina, e ele começava a enxergar a estrada à frente.
Agora Leonardo tinha acabado de entender por que aquela floresta era tão silenciosa. Com sua visão finalmente adaptada ao ambiente e olhando o chão à frente deles, o garoto tremeu e parou apressadamente. Mais adiante, tudo o que via eram ossos de diferentes animais, espalhados por toda parte. Aquilo causou uma sensação de estranhamento no garoto. Por sorte, eles não haviam pisado em nenhum desses ossos antes, o que evitou que fizessem barulho. Mas estavam conversando normalmente, e se isso tivesse alertado seja lá o que matou esses animais? Claro, sempre havia a chance de não ter mais nada ali, mas ele duvidava que tivesse tamanha sorte. As diferentes possibilidades naquele momento passavam por sua mente. Afinal, o que deveriam fazer? E se continuassem e dessem de cara com o que teria comido os animais dali? Mas também havia a possibilidade de não ter mais nada ali. E se tivesse? E se Ryo se machucasse? Claro que eles não se davam muito bem, mas ele não queria que ele se machucasse.
— Leo, por que você parou do nada? Tem algo de errado? — Ryo indagou, sem entender por que Leonardo havia parado de andar. Isso só deixou Leonardo mais pensativo. Será que havia algo barrando a passagem? Ou ele poderia estar apenas cansado de andar também.
— Escuta, Ryo, eu estou enxergando melhor a estrada. Acho que minha visão se adaptou melhor a essa floresta, benefícios do meu novo corpo, eu acho. Bem, a estrada fica muito íngreme adiante. Talvez seja melhor voltarmos para a clareira e procurarmos outro caminho. — Tentando parecer o menos preocupado possível, ele se virou para voltarem por onde tinham vindo, ainda puxando Ryo junto a ele enquanto acelerava o passo.
— Ei! Cuidado, você começou a andar com pressa do nada. O que foi que você viu?— O garoto dizia enquanto tentava acompanhar Leonardo à frente, mas esse novo corpo aparentemente não era tão rápido quanto o antigo, e ele estava com dificuldade para acompanhar o ritmo. — Vai mais devagar! Eu não consigo te acompanh—
O garoto parou de falar assim que sentiu seus pés fora do chão e as mãos de Leonardo em sua cintura. Ele não pôde deixar de ficar sem jeito com aquela ação do outro ao colocá-lo em seu ombro, mas não perderia a compostura. — MAS O QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO, LEONARDO? — O garoto não pôde evitar gritar com o outro, parecendo irritado, embora na verdade estivesse apenas sem jeito.
— Para de ser escandaloso, Ryo. Eu consigo correr mais rápido se você não me atrasar, é só isso. Agora para de gritar, senão eu te jogo no chão. — Ele disse, mantendo a compostura na voz enquanto continuava a correr por algum tempo. Por incrível que pareça, o outro realmente permaneceu quieto, mas ele sabia que, por dentro, Ryo deveria estar morrendo de raiva.
Ele continuou correndo por algum tempo e nada de chegar à clareira onde estavam. Então, mudou um pouco a direção, afinal, talvez tivesse voltado para o rumo errado. Ele continuou correndo enquanto segurava Ryo em seu ombro por alguns minutos e, mesmo assim, nada da clareira. Leonardo correu repetidamente por pelo menos uma hora e meia, sempre tentando mudar de direção para achar um caminho para a clareira. Ele já estava cansado de correr e carregar o outro em seu ombro o que deixava tudo mais cansativo. Ele já estava irritado com isso. Tinha certeza de que, pelo tempo em que correu com Ryo, já deveriam pelo menos ter saído daquela neblina, mas ela só parecia segui-los, independente da direção que seguiam. Irritado, olhou para trás enquanto pensava por onde ir agora, mas assim que se virou, congelou e segurou mais firmemente o garoto que estava em seu ombro pela cintura. — Mas que porra… — Eles não haviam saído do lugar. O que Leonardo viu foi aquele mesmo caminho de ossos que havia visto antes de pegar Ryo e correr. Era como se não tivessem outra opção a não ser ir direto para aquela direção que estava sendo indicada. Era como se estivessem brincando com eles. Ele não pôde deixar de se sentir como um animal indefeso sendo caçado por um predador entediado que brinca com sua comida antes de matá-la.
Leonardo então suspirou e deu um passo em direção àquele caminho repleto de ossos. Enquanto adentrava o caminho, o garoto não pôde deixar de notar que o peso em seus ombros havia desaparecido. Talvez por estar mais calmo e cauteloso agora, ele não sentia que o outro fosse tão pesado. Mas ele não pôde deixar de apertar a cintura de Ryo para garantir que ele estava ali. Então, assim ele fez… então parou e sua mão que tremia com um pensamento em sua cabeça: “P-por que… por que eu não senti nada?”
Comentários no capítulo "Capítulo 4"
COMENTÁRIOS
Capítulo 4
Fonts
Text size
Background
Entre Espadas
Um relacionamento que acabou de maneira conturbada e um acidente que causa a morte de ambos, foi assim assim que Ryo e Leonardo se viram em um mundo feudal durante um xogunato, onde aparentemente...