capa_ee_c_logo

Entre Espadas

Capítulo 40

  1. Home
  2. All Mangas
  3. Entre Espadas
  4. Capítulo 40 - Treze Soldados, Quatorze Corações que Batem em um Único Som.
Anterior
🟡 Em breve

“Mais do que guerreiros, somos uma família. Se um de nós cair, nós o levantaremos. Se nos atacarem, revidaremos ainda mais forte. No pior dos casos, morreremos lutando lado a lado. Mostraremos aos demônios que tentarem nos destruir o que acontece com aqueles que atacam nossa família. Jamais nos renderemos. O mal não passará enquanto nossa chama continuar a brilhar.’’ — Furukawa Masaru, O lírio sangrento.

[…]

            Já havia se passado quase duas semanas desde que Gonkuro, juntamente com Masaru, o primeiro e o segundo general, chegaram. Durante toda as últimas semanas, tudo o que estiveram fazendo foi para preparar as pessoas que vinham do Templo Huo para mais uma longa viajem, preparando mantimentos e materiais de construção para iniciar a reconstrução da vila, que há muito tempo estava em plenas ruinas. Atualmente, Masaru encontrava-se em seu quarto, sentada no chão, com seu irmão posicionado um pouco à sua frente. Entre os dois, havia um grande mapa do terceiro distrito, repleto de marcações detalhadas sobre a reconstrução da vila.

— Certo, concentrando as casas mais perto da entrada e ao longo dos muros da vila, podemos melhorar a cidade com um bom centro comercial. Dessa forma, o som dos festivais não vai incomodar tanto os idosos… O que acha, Gon? — Perguntou a Xogum, enquanto ajeitava os cabelos em um coque alto improvisado com um pequeno palito de metal.

Gonkuro, por sua vez, parecia extremamente calmo, com um sorriso folgado, após finalmente compensar, em duas semanas, as noites de sono e comida perdidas para manter seu discípulo vivo. Ter o discípulo de volta aparentemente reacendeu seu ânimo.

— Hmmm, não sei. Por um lado, você está certa, irmã, mas os idosos também gostam de desfrutar dos festivais. Colocar as casas muito distantes pode gerar um problema caso precisem carregar peso. Além disso, há poucos jovens nessa vila; os que permanecem, só o fazem por causa de suas mães e pais… Acho que podemos colocar as casas a duas ruas de distância dos comércios e restaurantes. Ah, se não me engano, eles também plantavam arroz… Mande carroças, alguns cavalos, leve dez soldados mais robustos e fortes e sete novatos, para mostrar que no exército também deve-se fazer trabalho pelo povo. Não quero desmoralizar homens que se acham superiores só por entrarem no exército. Essa tarefa é sua. Além disso, lembre-se de levar suprimentos suficientes para durar até a próxima colheita e envie alguém de confiança para permanecer lá até a cidade se estabilizar…

Enquanto Gonkuro falava de maneira constante, explicando tudo para sua irmã, ela anotava tudo em um pergaminho ao seu lado com um pincel, sem ao menos direcionar seu olhar para ele. Ambos pareciam extremamente habituados ao ritmo incessante de trabalho a que se submetiam, mas ainda assim era exaustivo. Quando finalmente terminaram, deitaram-se lado a lado na cama de Masaru, olhando para o teto e suspirando de cansaço.

— Sabe, se o Ryo tivesse vindo, nós três teríamos terminado pelo menos meia hora mais cedo. Ele faz parecer tão fácil… — Masaru disse entre risadas, enquanto estalava o pescoço.

— Haha, está mal-acostumada com seu discípulo auxiliando nos afazeres governamentais, minha irmã. Ele facilita demais o seu trabalho, na verdade, o nosso trabalho. Argh. Não sei quantas vezes, nesses últimos anos, eu o peguei adiantando documentos escondidos para que você pudesse dormir um pouco… Isso quando ele não me ajudava a comer bem — À medida em que falava, o loiro suspirava e bocejava, parecendo ainda ter sono acumulado ao longo dos anos.

— Nós não o merecemos, não é? Ele é bom demais. — Masaru perguntou com um tom triste em sua voz, enquanto se aconchegava nos braços de seu irmão mais velho, assim como fazia quando era apenas uma menininha sem juízo.

O rapaz riu, fazendo carinho na cabeça de sua irmãzinha. — Nem um pouquinho… Mas sabe, no final das contas, o que realmente importa é que nos importamos uns com os outros, Masaru. Se o que você acredita saber sobre vocês fosse falso, ainda o veria da mesma forma? — O baku perguntou, sinceramente.

— Como assim ? — A Xogum perguntou com uma confusão sincera.

— Sabe, eu sei que o vê como um filho. Mas, irmã, se todos os anos que acredita ter cuidado dele fossem falsos e poucos deles realmente tivessem acontecido, você ainda o amaria e o chamaria de filho? — Enquanto falava, a voz de Gonkuro continha uma real curiosidade.

Antes de respondê-lo, ela se sentou, e olhou seriamente para seu irmão. — Que tipo de pergunta é essa?! É obvio que sim! Independentemente do que acontecesse, uma parte do que vivemos seria real. O Ryo trouxe uma luz diferente para a minha vida, me ensinou o que é ser uma mestra, o que é ser uma mãe, o que é o desejo de proteger meu filho acima da minha própria vida. Mesmo que algumas memórias não fossem reais, mesmo se ele me odiasse, tudo bem. Toda mãe tem que estar preparada pela raiva de seus filhos. Mesmo assim, eu morreria e mataria por ele, do mesmo jeito que eu faria por qualquer um dos treze… vocês são minha família…

— Eu sei, perdão a indelicadeza. Você ainda deve estar abalada com a morte da Hana, da Himari e da Saki, não é? — Gonkuro perguntou enquanto se levantava da cama e caminhava até a varanda exterior.

Masaru, por sua vez, logo se levantou para caminhar junto de seu irmão. — Claro que estou. Ainda não entendo como a Hana pode ter matado suas próprias irmãs. Ela não era assim. Lembra quando a conhecemos? Ela dizia que seu sonho era poder proteger aqueles que eram importantes para ela e poder fazer as mais lindas roupas que uma artesã poderia fazer… Então não consigo me conformar com o fato que ela matou suas irmãs e machucou seu próprio povo… Isso não faz sentido, irmão.

— Hm, não pense demais sobre isso; apenas a fará sofrer mais. Deve começar a arrumar suas roupas. Vocês partirão esta tarde, lembra? Sobre a Hana, deixe que eu investigue  para descobrir o que aconteceu. Prometo que reportarei o mais rápido que puder tudo o que descobrir. — Quando terminou de falar, o homem abraçou sua irmã mais nova, beijou sua testa e, por fim, saiu do quarto, deixando-a sozinha para se arrumar e organizar seus pensamentos confusos.

No fim daquela tarde, as carroças com diversos suprimentos começaram a sair do Castelo Imperial, juntamente diversos soldados de diferentes escalões do Exército Imperial. A última a sair foi Masaru, levando Seiryuu em suas costas. A mulher se despediu de seu irmão com um abraço forte e amoroso.

— Não se estresse demais. Enquanto você estiver fora, eu cuidarei de tudo. Então perdoe seu irmão mais velho se agir de maneira errada. Não se irrite, Masaru.

Após isso, os dois apenas se olharam e riram enquanto a jovem xogum partia em cavalo, montada em um alazão alto de cor preta.

[…]

            Mais tarde naquele dia…

Em um espaço repleto de escuridão, uma única mesa de madeira estava posicionada no centro de tudo. Não seria outro lugar, se não uma paisagem onírica criada por Gonkuro, que estava sentado calmamente à mesa, aparentemente esperando por alguém. Aos poucos, o som de passos soou atrás do homem até pararem logo atrás dele.

— Gonkuro-sama, por que me trouxe até aqui? — Uma voz grave e calma soou perto a sua orelha.

O homem então virou-se para o lado, se deparando  com um rosto masculino bonito e bem constituído, com pinturas vermelhas nos olhos de cor azul envoltos em um lilás suave. Ele exibia um sorriso gentil e curto, e seus cabelos negros, bagunçados, tinham mechas azuladas. Dois grandes chifres curvados para trás completavam sua aparência. Vestido como um artista marcial pronto para uma apresentação, ele se sentou ao lado do segundo general e deitou sua cabeça no colo de Gonkuro.

Gonkuro, por sua vez, permitiu que o homem repousasse a cabeça em suas pernas como se não fosse nada demais. — Liu Guang, há quanto tempo, nono general… Vejo que continua com seu comportamento sonolento. Mas essas tintas vermelhas. — Gonkuro observou, passando o dedo abaixo dos olhos do nono, que parecia não se importar com o toque. — Está querendo irritar os anciões que o baniam antigamente? Você não voltou ao seu comportamento destrutivo, não é? Eu não quero ter que te punir de novo.

Liu Guang apenas riu com a pergunta feita pelo Baku. — Não seja bobo, Gonkuro-sama. Eu, o grande Nian, estou bem-comportado e racional como sempre. Meu shizun me ensinou bem, sabe? —  respondeu o homem, com uma certa provocação em sua voz.

— Hah, não seja bobo. Não adianta tentar me enganar com seu charme. Nós dois sabemos que, se isso funcionasse comigo, você seria mais difícil de lidar. Enfim, chamei você aqui por que tenho uma tarefa a você. Está disposto a aceitar? — Gonkuro perguntou, falando de maneira que parecia apenas uma tarefa fácil.

— Como eu poderia negar um pedido do meu querido shizun? Me diga do que precisa,  e farei. — respondeu o homem, bem-humorado e até mesmo parecendo se divertir.

— Preciso que vá até o terceiro distrito, com a desculpa que o enviei para ajudar minha irmã na reconstrução da vila. Quero que fique de olho nela e a contenha se ela perder o controle. Pode fazer isso por mim?

Liu ficou confuso e até se sentou de maneira correta ao lado de seu mestre. — Conter a Masaru? Por quê? É difícil algo a fazer com que ela perca o controle. Nem mesmo a morte de Hana e das outras a abalou. Então por que… — O general interrompeu sua fala e lançou um olhar ainda mais confuso para o outro.

— Shizun, o que está pensando em fazer?

Gonkuro, apenas sorriu para seu discípulo e se levantou, se preparando para sair. — Que graça teria se eu lhe contasse agora? Achei que gostasse de uma apresentação com um fator surpresa. Seu mestre o dará isso de presente.

— Shizun! Antes de sair, por favor, peça para algum dos outros ir comigo. A Masaru é praticamente impossível de conter sozinho… — disse o Nian, se levantando de um pulo e segurando a barra da manga de seu mestre.

— Tsk, é claro que o Gon não o mandaria sozinho, seu cachorro idiota. — Uma voz ríspida com um claro deboche soou atrás dos dois homens.

Virando-se para trás, Liu Guang já sabia quem encontraria, mas precisava ver por si mesmo. Com cabelos castanhos, orelhas felinas e dois rabos castanhos como de um gato de rua, vestindo um quimono largo e pouco detalhado, estava o único dos treze com quem Liu certamente não gostaria de trabalhar em uma missão que exige calma. — Zhao Minyue, gostaria de poder dizer que é um prazer revê-lo, mas na atual situação, estaria mentindo.

— Não discutam tanto. Vocês têm dois dias para chegar até a cidade em reconstrução. Já enviei a localização para a mente individual de cada um. Se demorarem mais que isso, tudo o que acontecer depois será culpa de vocês, entenderam?

— Sim. — responderam os dois generais ao mesmo tempo.

Com isso feito, quando Gonkuro abriu seus olhos novamente, ele estava sozinho em seu quarto, deitado em sua cama. Aparentemente cansado, deu um longo suspiro e enfim se levantou. A primeira parte de seu plano estava concluída. O momento de agir estava chegando.

[…]

Nos próximos dois dias, Gonkuro trabalhou incessantemente. Ele deu folgas a todos os trabalhadores do castelo interno, retirando-os lentamente do palácio sem que ninguém desconfiasse de nada. O homem conhecia o castelo de cabo a rabo, sabia como era sustentado e como alguém poderia facilmente destruí-lo se soubesse o que estivesse fazendo.

Desde que Ryo chegou, o terceiro general parecia perceber algo que estava escondido em sua própria mente. Alguém havia implantado duas sugestões em sua mente, não apenas na sua, mas também na de sua própria irmã e de todos os outros generais, sem que ninguém notasse. Essas sugestões faziam-os pensar que todas as ideias e planos profanos que pudessem ferir o povo da nação fossem exclusivamente culpa daqueles que foram infectados com a sugestão.

A primeira sugestão os fazia pensar que o garoto que havia surgido no terceiro distrito era perigoso, que seria naturalmente seu inimigo e que deveriam dominá-lo, trazê-lo para o império e mantê-lo sob uma prisão mental, para então entregá-lo a alguém. Obviamente, a primeira sugestão era sobre Ryo. Ela os fez ver o rapaz como alguém a ser detido e controlado, nos levando a usar todos os meios para trazê-lo para nós. Isso explica não só o comportamento cruel adotado por minha irmã na época, mas também o fato de que eu e a Kaoru concordamos com isso, sem tentar impedi-la.

Essa sugestão foi a mais fácil de identificar pelo terceiro general, logo após ele reescrever as lembranças do rapaz, o que o permitiu destruí-las da mente de seus companheiros sem que a figura oculta que havia feito isso percebesse. E mesmo que percebesse, era impossível desconfiar de um general enfraquecido por cuidar de seu amado.

A segunda semente era algo plantado na mente de todos os doze generais anteriores, exceto o primeiro: “Confie no primeiro general, ele está diferente, mas ainda é o verdadeiro Yanagi. Confie nele, entregue-se a ele, ele é seu melhor amigo, seu confidente.’’ Essa segunda semente foi a mais difícil de identificar. Até o momento, ele só havia conseguido retirar a que estava em sua mente e na mente do segundo general, Huo Liming.

Quando a retirou, sua mente pareceu clarear. Esse youkai, que afirmava ser o primeiro general, o corvo Yanagi, nem ao menos se parecia com o verdadeiro. O verdadeiro Yanagi Toshikazu possuía cabelos longos, ondulados e tingidos de vermelho. O verdadeiro primeiro general tingia seus cabelos de vermelho com a ajuda do próprio Gonkuro! De algum modo, um impostor havia enganado todos os generais e até mesmo a própria Xogum durante mais de trinta e dois anos. Agora, até Huo Liming havia sido substituída por uma cópia mais refinada dela mesma.

Esse último detalhe sobre a segunda general foi o mais fácil para Gonkuro identificar. No dia em que o Templo Huo foi destruído, ele, a ‘Huo’ e Ryo estavam no mesmo lugar. Enquanto a falsa general fazia a massagem cardíaca no rapaz, Gonkuro conseguia ouvir os sussurros dissonantes voando para mente do jovem: “Você pertence a mim, se submeta, desista.’’ Essas palavras se repetiam constantemente, tentando se infiltrar na mente do jovem. Mas o que esse impostor misterioso não contava era que Gonkuro não permitiria que ele enganasse o rapaz a quem Gonkuro tanto devia.

Agora, após dois longos dias de planejamento e garantindo que apenas ele e os impostores estariam dentro do castelo, Gonkuro caminhou lentamente pelos corredores que tanto conhecia, pelos quartos que tantas vezes entrou, com lembranças carinhosas daqueles que amava. Após um longo passeio pelo castelo, o loiro adentrou a uma sala de reuniões onde ‘Yanagi’ e ‘Huo’ estavam sentados em silêncio, encarando a porta aberta como se já estivessem esperando por ele.

— Oh, vejo que pularemos o fingimento… Desistiram de tentar me driblar tão facilmente? — Gonkuro perguntou, ainda parado no mesmo lugar, sem mostrar a intenção de mover nem ao menos um músculo.

As duas pessoas sentadas mais à frente riram em uníssono, de maneira bizarra, e suas vozes se sobrepuseram quando começaram a falar:

— Trinta e dois anos, entrando pouco a pouco na mente de cada um de vocês, dominando a aranha e a prendendo em uma ilusão para mantê-la obediente, e agora… tudo corre risco de ser arruinado por sua causa, Gonkuro. E mesmo assim você ainda vem até mim como se tivesse alguma chance. Você é realmente louco, não é?

— Louco? Não, sou apenas alguém disposto a tudo para proteger minha família. Admito, seu plano foi quase perfeito e sem erros. Eu teria caído nele se não fosse o momento em que entrei na mente do Ryo, quatro anos atrás… Só esse pequeno deslize, o qual você não esperava, me revelou tudo o que você fez e cá estamos: eu, o único general que você precisa se livrar para que seu plano dê certo, para que ele não se lembre… Devo admitir que estou curioso sobre por que deseja tanto o rapaz… Mas isso não importa. Então, como vai ser…? Vai me matar? Acha que consegue me matar? — O baku perguntou com um sorriso presunçoso no rosto.

— Se consigo te matar? Bem… — Em piscar de olhos, as duas pessoas sentadas desapareceram e reapareceram, uma atrás e uma bem na frente do general. No instante seguinte, duas lâmina se cruzaram, adentrando ao corpo do homem e cortando-o de cima a baixo.

Mas, diferente do esperado, o homem não sangrou. Apenas desapareceu em um estouro de uma nuvem dourada e reapareceu atrás do falso primeiro general. Pegando-o pelos cabelos, arremessou-o para o andar inferior. — Só isso que você tem? Patético.

O impostor, por sua vez, riu enquanto se levantava do chão. — Pode acalmar, meu bem, a brincadeira está apenas começando. Não é legal chamar de patético alguém que já quase te fodeu, não acha? — Assim que terminou de falar, a falsa Huo, que estava bem na frente de Gonkuro, desferiu mais um golpe com a lâmina, direcionado diretamente ao peito do terceiro general. Contudo, apenas o feriu na cintura enquanto ele desviava e revidava com um chute.

— Cale a boca! Você se aproveitou de um momento de fragilidade. Nada ali foi consensual, sua criatura suja. — Gonkuro revidou, enquanto diversas nuvens douradas saíam de suas mangas, preenchendo totalmente o ambiente e criando uma nova imagem onírica.

No instante seguinte, os três estavam em um campo sem flores, com Gonkuro no centro de tudo. As duas falsas figuras agora perdiam seus rostos, transformando-se em corpos sombrios. — Imagino que saiba o que segredo da minha família, sobre o porquê da divisão do sobrenome no nosso clã… É por isso que decidiu me atacar? Por que acha que sou fácil de matar?

As sombras nem ao menos se davam mais ao trabalho de fingir ser os dois generais que haviam roubado os postos, e apenas começaram a caminhar lentamente, de forma padronizada, em direção ao loiro. — Talvez tenha sido por isso… mas entenda, Katsura Gonkuro, eu vou mata-lo pois não posso permitir que saibam sobre mim, ainda não. Então apenas morra em silêncio, pequeno youkai.

Ouvindo a justificativa dada pelas sombras, Gonkuro suspirou lentamente. Ele levou as mãos ao alto da testa e lentamente começou a passá-las pelos cabelos. — Imaginei que diria isso, mas sinto em frustrá-lo. Se eu morrer hoje, pode ter certeza de que os levarei comigo. — Quando terminou de falar, suas mãos deslizaram por entre o longo cabelo loiro, que aos poucos se transformava em um mar de vermelhidão tão profunda quanto os cabelos de Masaru. À medida que a verdadeira cor se evidenciava, a paisagem ao redor também se alterava. A grama do campo murchou, revelando ossadas de humanos e youkais espalhadas por todos os lados. Os olhos, outrora verdes como jades, tornaram-se amarelos vibrantes, repletos de crueldade.

— Paisagem onírica, o ninho da besta devoradora de almas adormecida. Este é o meu segredinho, que apenas os que morreram em meus sonhos conhecem. Eu sou Furukawa Gonkuro. Gostaria de poder dizer que é um prazer conhecê-lo, mas estaria mentindo.

No instante seguinte, as três pessoas estavam coladas uma à outra trocando golpes. Gonkuro, por sua vez, parecia ter uma resistência muito maior do que antes. Ele conseguia segurar os golpes das katanas e redirecioná-las para longe, enquanto desferia golpes certeiros no estômago de ambas as sombras, até mesmo as arremessando para longe.

Por mais que manipulasse o ambiente à sua volta para desferir golpes a longas distâncias, as sombras eram tão rápidas quanto os verdadeiros generais e agiam de maneira coordenada. Era apenas uma questão de tempo até que elas conseguissem acertá-lo. Mas estava tudo bem; tudo o que ele precisava era conseguir estabelecer uma ligação mental entre os que estavam vivos dos treze generais, sua irmã e Kishin.

Sem que as sombras percebessem, sempre que ele era atingido e sua pele se pintava com o vermelho de seu sangue, Gonkuro estava se conectando, um a um, com todos os generais, exceto Huo e Yanagi, que não conseguia encontrar em lugar algum. Quando enfim conseguiu estabelecer a conexão, o homem já estava coberto de feridas, enquanto as sombras machucadas e até mesmo um pouco mais incorpóreas, com partes significantes de seus corpos desaparecidas.

Ao mesmo tempo em que continuava a lutar, uma parte de sua consciência estava em outro lugar, no vazio, com Kishin. Ao ver seu general e amante tão machucado, Kishin correu para segurá-lo em seus braços.

— GONKURO, O QUE ESTÁ ACONTECENDO?! POR QUE VOCÊ ESTÁ ASSIM?! — O oni gritava desesperado, enquanto lágrimas brotavam em seus olhos.

— Shhh, se acalme, Kishin. Está tudo bem… Eu estou aqui… para… me despedir. — Gonkuro disse carinhosamente, colocando a mão no rosto do outro.

— O que… NÃO FALE ASSIM, COMO SE FOSSE ME DEIXAR! ONDE VOCÊ ESTÁ ?!? EU VOU ATÉ VOCÊ, EU VOU TE AJUDAR!! — A voz de Kishin continha um desespero e o medo óbvio da perda de quem ama. Gonkuro, por sua vez, apenas sorria e permitiu que Kishin expressasse todas as suas indignações em meio às lágrimas.

— Kishin, não há tempo agora, mas por favor, se puder deixar que seu mestre seja egoísta mais uma vez… me espere… mesmo que eu nunca mais volte, me espere… eu te amo! — No segundo seguinte, Gonkuro o beijou e então desapareceu da mente do rapaz, voltando o foco para a batalha.

Ele estava no limite. A paisagem onírica em que se encontrava começava a se deteriorar, e as sombras feridas estavam estranhamente se curando. Por mais que continuasse atacando, todo o dano que causava se curava instantaneamente, enquanto o dano deixado em seu corpo só aumentava. Por um instante, ele sentiu como se sua paisagem estivesse prestes a desaparecer quando, de repente, uma gota de água caiu dos céus e uma voz jovial veio de cima:

— Fique de pé, Gonkuro! — Era a voz do quinto general, Jo Shihei, vinda de um mar cheio de peixes.

No instante seguinte, Gonkuro sentiu seu corpo se estabilizar mais uma vez e até ficar mais forte, com uma névoa vermelha surgindo entre seus pés junto a uma voz feminina doce.

— Gonkuro-kun, não desista, deixe esta raposa trapaceira ajudá-lo. — A voz de Sakuma surgiu em meio à névoa, acompanhada da figura onírica de uma raposa de pelo negro, consertando o estrago feito na paisagem.

— Ganharemos tempo para você, Gon! Então lute lindamente! — As vozes do sexto general, Ito, e da sétima general, Koharu, surgiram do chão abaixo de seus pés, prendendo temporariamente as sombras ao chão.

— Gonkuro-sama, obrigado… por devolver minhas memórias ao lugar… Sinto que logo me lembrarei de tudo. Eu os perdoo, então não morra, meu amigo! — A voz de Ryo soou atrás dele, junto a duas palmas totalmente abertas em suas costas, fortalecendo-o momentaneamente. Não era apenas Ryo ali, mas também a antiga quarta general.

Mais à frente, surpreendendo até mesmo o próprio Gonkuro, fogos de artifícios e a risada de um nekomata surgiram, fazendo-o sorrir. Eram o oitavo e o nono general, demonstrando seu apoio às ações do general.

Ali, fortalecido por seus amigos, por todos eles, até mesmo os que mal conseguiu contatar, Gonkuro sabia que sua família o apoiava mais uma vez. Naquele instante, a voz de sua irmã mais nova soou em meio a um choro contido:

— Está tudo bem, meu irmão. Eu entendo. Boa sorte.

Com a aprovação de sua irmã e as bênçãos de seus amigos e discípulos, Gonkuro sorriu mais uma vez. A paisagem onírica se refletia na realidade do Castelo Imperial, quase como se nem ao menos tivessem saído do lugar.

Ali, com um sorriso no rosto, Gonkuro estava pronto para dizer suas últimas palavras para sua família. Com sua voz rouca e direcionando toda a energia que ainda tinha ao próprio peito, ele sabia que o que faria seria um ato suicida, mas que só assim poderia dar a eles a chance de lutar.

— Meus amigos, minha família… essa será a última dança que terei ao lado de vocês, mas com o meu fim, acendo em seus corações a chama a qual tentaram apagar. Lembrem-se pelo que lutamos, lembrem-se por quem lutamos. Esqueçam a mentira que contaram a vocês e lembrem-se que eu amei cada… um… de… vocês…

Com a última fala de Gonkuro, a energia que se condensava em seu peito emitiu um brilho quase tão forte quanto a luz do sol, junto a um forte estrondo, que foi ouvido até o último dos distritos. Era um som que emitia três certezas: a primeira delas de que o Castelo Imperial já não existia mais; a segunda, que todas as mentiras plantadas pela sombra foram enfim desfeitas na mente de cada um dos treze; e a última…

Que o sol mais brilhante de toda a nação havia se apagado. O segundo general Katsura Gonkuro, estava morto.

[…]

Em algum lugar no distrito Sakuma.

Huo, recém-despertada depois de tudo, acordou no exato momento em que sentiu a chama da vida de Gonkuro se apagar. Ao mesmo tempo, ela e outra pessoa ali presa emitiram um grito de desespero, de dor e principalmente de perda…

— Adeus… meu amigo…

 

———————————-

Nota do autor: Bem-vindos, ao arco principal do primeiro volume e adeus, Gonkuro-sama.

 

Nota da editora: Eu não esperava por isso!

Comentários no capítulo "Capítulo 40"

COMENTÁRIOS

Deixe um comentário Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*

*

Capítulo 40
Fonts
Text size
AA
Background

Entre Espadas

3.4K Views 3 Subscribers

Um relacionamento que acabou de maneira conturbada e um acidente que causa a morte de ambos, foi assim assim que Ryo e Leonardo se viram em um mundo feudal durante um xogunato, onde aparentemente...

Chapters

  • Volume 1
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 45 Um Conto de Dois Irmãos (4): Sobre suas asas.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 44 Um Conto de Dois Irmãos (3): Nasce o Lírio.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 43 Um Conto de Dois Irmãos (2)
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 42 Um Conto de Dois Irmãos (1)
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 41 Você e Eu, Até o Fim.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 40 Treze Soldados, Quatorze Corações que Batem em um Único Som.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 39 O Doce Som da Biwa
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 38 Histórias de um Velho Tanuki.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 37 Camélias Vermelhas
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 36 O imperador selado
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 35 A Samurai de Cabelos Vermelhos
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 34 Bons sonhos, Tsukuyomi.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 33 A teia da aranha
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 32 O quarto general.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 31 Antidoto & Veneno
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 30 A prova de seu amor.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 29 A queda de Kumo-rui Parte 2
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 28 A queda de Kumo-rui Parte 1
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 27 Lembre-se do meu nome
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 26 Um lótus banhado a sangue
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 25 Kumo no Su, uma vila de tecelãs
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 24 O príncipe youkai e o santo de outra terra.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 23 Em direção a Kumo-rui.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 22 Um noivado inusitado.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 21 Quem devo ser nesta história?
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 20 As noites em Iwasakiyama
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 19 O príncipe de lugar nenhum
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 18 A flor de lotus que desabrocha entre os treze
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 17 O treinamento se inicia, dias chuvosos chegam à capital.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 16 Toyosaki Kaede
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 15 A lua e seu pecador
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 14 Lírios Aranha
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 13 Esquecer
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 12 Deixe os queimar.
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 11 Enunciação de morte
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 10 Entardecer
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 9 Toyosaki Ryo
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 8 Sacerdotisa...
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 7 Xogum
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 6 A cobra, a espada e o salgueiro
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 5 O habitante desta floresta
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 4 Um caminho de ossos a nossa frente
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 3 gosto amargo para Ryo
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 2 O vazio perante um novo começo
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 1 Um novo mundo, com você?!
      • capa_ee_c_logo
        Capítulo 0 Notas iniciais

Login

Perdeu sua senha?

← Voltar BL Novels

Assinar

Registre-Se Para Este Site.

De registo em | Perdeu sua senha?

← Voltar BL Novels

Perdeu sua senha?

Por favor, digite seu nome de usuário ou endereço de e-mail. Você receberá um link para criar uma nova senha via e-mail.

← VoltarBL Novels

Atenção! Indicado para Maiores

Entre Espadas

contém temas ou cenas que podem não ser adequadas para muito jovens leitores, portanto, é bloqueado para a sua protecção.

Você é maior de 18?