Laços

Laços em Carmesim

Capítulo 4

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  4. Capítulo 4 - Proposta Intrigante e Tentadora
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🟡 Em breve

O quarto estava envolto por uma penumbra serena. A luz da manhã filtrava-se por entre as cortinas semiabertas, espalhando reflexos dourados pelo ambiente. O ar ainda carregava o calor da noite anterior, denso, íntimo, quase cúmplice. Akihiro permanecia deitado, imerso numa lassidão incomum, como se o próprio corpo resistisse à ideia de despertar.

Mas ele sabia que não era apenas o cansaço habitual. Era Jun.

A fragrância dele impregnava o ambiente — cítrica e floral, algo fresco e ao mesmo tempo absurdamente viciante. Akihiro inspirou, deixando o aroma preencher-lhe os pulmões, e com ele, uma estranha sensação de paz. Pela primeira vez em muito tempo, não havia inquietação em seu peito ao acordar. Nenhum peso, nenhuma urgência.

Virou-se devagar, como se temesse romper o encanto daquele momento. Seus olhos pousaram sobre a figura parcialmente descoberta ao seu lado. Sem pensar, sua mão encontrou a cintura de Jun e apertou-a levemente, apenas para certificar-se de que ele ainda estava ali. Estava. A constatação fez Akihiro soltar um suspiro lento.

Jun dormia de bruços, o corpo levemente enroscado nos lençóis desfeitos, a respiração tranquila. Seus cabelos dourados, ainda mais bagunçados que de costume, espalhavam-se sobre o travesseiro como fios de seda reluzentes. A pele morena, sob o brilho suave da manhã, parecia ainda mais quente, convidativa. Akihiro estendeu a mão, hesitante, como se quisesse apenas confirmar com os dedos o que os olhos já percebiam — que aquele instante era real.

Ele não costumava dormir bem. Seu corpo estava acostumado a repousos curtos, sempre em prontidão, mas com Jun… tudo parecia diferente. Pela segunda vez, ele havia dormido profundamente, sem sequer perceber o tempo passar.

Um gemido baixo, arrastado, quebrou o silêncio. Jun se remexeu, ainda sob o torpor do sono. Seus olhos âmbar se abriram devagar, enevoados, perdidos entre o sonho e a vigília. Uma mecha de cabelo caiu sobre o peito de Akihiro, e o toque leve pareceu eletrizá-lo.

— O que…? — murmurou Jun, a voz rouca, embargada de sono.

Akihiro sorriu, a voz baixa e carregada de ironia afetuosa.

— Bom dia, dorminhoco.

Jun piscou lentamente, como se lutasse para reconhecer onde estava.

— Bom dia…? Que horas são?

O alfa virou o rosto em direção ao relógio, sem se mover muito.

— Tarde demais para fugir agora — murmurou, sorrindo de lado. Com um gesto suave, afastou uma mecha de cabelo que insistia em cobrir os olhos do outro.

Jun o observou, o olhar ainda enevoado, e por um momento apenas permaneceu em silêncio, como se tentasse entender onde, como — e por quê — havia amanhecido daquele jeito.

— Minha cabeça está… estranha — murmurou, erguendo-se um pouco, os músculos ainda pesados. — Nós… bebemos ontem?

— Um pouco — admitiu Akihiro, rindo suavemente, ainda apoiado em um cotovelo. — Você não se lembra? — perguntou, fingindo um tom dramático. — Nossa noite mágica, nosso casamento sob as estrelas… E agora, aqui estamos, prontos para começar nossa vida juntos. E você, para variar, fica ainda mais bonito com essa expressão de ressaca.

Jun corou, balançou a cabeça, uma sombra de riso ainda nos lábios. Por um instante, ele apenas o observou, os olhos âmbar mais suaves do que o normal.

Sua mão tateou o espaço ao redor até encontrar o celular, e bastou um olhar para que a expressão em seu rosto mudasse. A leveza deu lugar a urgência.

— Droga… — exclamou, levantando-se de súbito. Quase tropeçou ao tentar vestir-se às pressas.

Akihiro riu com gosto, a voz grave reverberando pelo quarto.

— Aonde está indo com tanta pressa? — perguntou, recostando-se despreocupadamente enquanto observava a correria com olhos divertidos.

— Tenho que trabalhar — respondeu Jun, tentando abotoar a camisa ao mesmo tempo em que procurava as meias.

— Relaxe. O mundo não vai acabar se você se atrasar um pouco.

Jun ignorou a resposta, determinado a se vestir o mais rápido possível. Akihiro, agora sentado, passou a observá-lo com outro tipo de olhar. Algo mais pensativo, mais… brando.

— Antes de fugir — começou, com aquele tom debochado que só ele sabia usar —, que tal tomarmos café da manhã?

Jun parou no meio do movimento, os dedos parados sobre o cós da calça.

— Café da manhã?

— Sim. O mínimo que posso fazer é não deixar você ir trabalhar de estomago vazio — insistiu, apoiando os antebraços nos joelhos.

Jun o encarou, franzindo o cenho, como se tentasse compreender se aquilo era uma piada ou uma provocação. Talvez os dois.

— Eu… não sei. Estou realmente atrasado.

— Vamos — disse Akihiro, com a voz mais suave do que o esperado. Havia algo em seu olhar que impedia Jun de negar imediatamente. — Só alguns minutos. Prometo não transformar isso num encontro romântico se isso te assusta tanto.

— Eu não estou assustado — rebateu Jun, cruzando os braços.

— Ótimo. Então vem?

Jun lançou-lhe um olhar semicerrado, medindo as intenções por trás do sorriso provocador. Mas, no fim, suspirou e assentiu, derrotado pela insistência — e talvez, secretamente, pela própria vontade de ficar.

— Só um café.

Akihiro sorriu, vitorioso, levantando-se com calma. Nenhum gesto foi apressado. Ele também não entendia com clareza por que desejava tanto estender aquele momento, por que queria que Jun permanecesse por mais alguns instantes. Mas decidiu que não era hora de questionar isso. Ainda não.

Por ora, tudo o que desejava era aproveitar aquele raro fragmento de tempo roubado da realidade.

—–

A cafeteria exalava um perfume reconfortante de grãos recém-moídos, misturado ao leve burburinho de conversas dispersas e ao tilintar de porcelanas sendo manuseadas com delicadeza. Àquela hora da manhã, o movimento era brando — um intervalo tranquilo entre a pressa dos trabalhadores e a chegada dos habituais frequentadores da cidade.

Akihiro e Jun escolheram uma mesa próxima à janela, onde a luz do sol, filtrada pelo vidro empoado, criava feixes dourados que aqueciam o tampo de madeira clara. O cenário parecia quase calmo demais para o estado interno de ambos.

Jun mantinha o olhar perdido além do vidro, embora nada de específico parecesse captar sua atenção. Segurava a caneca fumegante entre as mãos e a levava aos lábios em goles curtos e ansiosos, como se o doce amargo do café pudesse dissolver a inquietação.

Akihiro, com uma postura visivelmente mais relaxada, recostou-se na cadeira, o braço jogado de modo casual sobre o encosto.

— Está tudo bem com você? — perguntou, num tom cuidadoso, mas não inquisitivo.

Jun piscou algumas vezes, como se fosse puxado de volta à superfície após um mergulho profundo em pensamentos que preferia manter submersos.

— Estou… só um pouco tonto ainda — respondeu, a voz embargada de cansaço.

Akihiro assentiu devagar, sem tirar os olhos do ômega. Havia algo na forma como Jun mantinha os ombros tensos, a mandíbula discretamente cerrada, que sugeria mais do que uma simples ressaca. Não era dor — era pressa. Uma pressa nascida de ansiedade.

— Relaxe — disse com firmeza tranquila. — Você está seguro aqui.

— Não é sobre segurança — rebateu Jun com uma rapidez que traía sua irritação contida. — Só estou atrasado, só isso.

— E, no entanto, aqui está você — retrucou Akihiro, a voz marcada por um tom de ironia suave. Com um gesto calmo, estendeu a mão sobre a mesa e, sem impor força, tocou a mão de Jun.

O toque foi leve, mas preciso. Jun baixou os olhos, observando os dedos que agora repousavam sobre os seus. Sua respiração vacilou, como se de repente a atmosfera da cafeteria se tornasse rarefeita.

— Você é sempre assim tão agitado pela manhã? — questionou Akihiro, ainda com o tom de voz entre o provocador e o interessado.

Jun hesitou antes de responder, os olhos vagando até o rosto do alfa.

— Eu… não sei. Tenho muitas coisas na cabeça.

O polegar de Akihiro começou a traçar círculos vagos no pulso de Jun. O gesto era contraditório: ao mesmo tempo tranquilizante e carregado de tensão sutil.

— Como o quê?

Houve um breve silêncio. Jun desviou o olhar, relutante.

— Trabalho, principalmente. E outras coisas… mais complicadas.

Akihiro inclinou-se ligeiramente à frente, sua voz perdendo o tom brincalhão.

— Você não precisa se sobrecarregar tanto — murmurou, as palavras carregadas de uma intenção velada. — Não se quiser.

Jun ergueu os olhos com uma expressão de surpresa. Ele não esperava aquilo.

— O que exatamente você está dizendo?

Akihiro manteve o olhar fixo no dele, sem desviar.

— Quero dizer que talvez existam alternativas. O clube onde você trabalha é um ambiente exclusivo, seguro e com regras claras. Ainda assim, percebo que acaba se expondo mais do que gostaria. Querendo ou não há clientes que testam limites… propostas que, mesmo diante das normas, ultrapassam a linha entre o profissional e o pessoal.

Jun o observava com olhos arregalados, mas ainda não compreendia completamente a direção da conversa.

— Eu… não estou entendendo.

— O que estou propondo é simples — continuou Akihiro, o tom firme, sem vestígios de hesitação. — Você pode continuar no clube se quiser, mas não precisaria aceitar clientes para serviços íntimos. Em vez disso, ficaria apenas comigo. Eu pagaria por esse acordo, é claro. Melhor do que você ganha atualmente. E, além disso, não se sentiria pressionado a aceitar serviços íntimo só pelo pagamento.

O silêncio que se instalou foi denso.

Jun permaneceu imóvel, os lábios entreabertos, o rosto tomado por um misto de surpresa, confusão e… uma pontada de desconfiança.

— Está falando sério?

— Muito — respondeu Akihiro sem alterar o tom. — Mas não precisa responder agora. Apenas pense.

Com calma, ele retirou do bolso um cartão com seu número de telefone e o deslizou pela mesa até que encostasse na mão de Jun.

— Aqui. Ligue quando tiver decidido. Ou quando se sentir entediado.

Jun pegou o cartão com dedos que tremiam quase imperceptivelmente. Suas mãos estavam geladas.

— Eu… não sei o que dizer.

— Não diga nada. Não ainda — respondeu Akihiro, voltando a se recostar, como se o assunto estivesse, por ora, encerrado.

A comida chegou pouco depois. E, apesar da tensão que permanecia flutuando entre eles, partilharam o café da manhã em um silêncio que não era desconfortável, mas sim suspenso — como se as palavras não ditas ainda ecoassem entre uma mordida e outra.

Quando terminaram, Akihiro se levantou, pagou a conta com gestos lentos e seguros, e voltou-se para Jun com um aceno discreto.

— Vá. Não quero que fique se sentindo preso, especialmente estando tão tenso.

Jun se levantou também, segurando o cartão com força. Seus olhos, por um breve momento, encontraram os de Akihiro.

— Obrigado — disse, a voz baixa, quase um sussurro. — Pelo café… e pela proposta.

Akihiro apenas sorriu. Um sorriso contido, mais sombra de expressão do que gesto pleno.

— Cuide-se.

Jun hesitou na saída, como se quisesse dizer algo mais. Mas se conteve. Acenou brevemente com a cabeça e virou-se, saindo com passos apressados pela porta de vidro.

Akihiro permaneceu de pé, observando-o desaparecer pela calçada ensolarada. Sabia o que aquela oferta significava. Não era algo que costumava fazer — e não por falta de meios. Simplesmente nunca achou que valesse o esforço.

Mas havia algo em Jun.

Nas duas únicas vezes em que estiveram juntos, Akihiro dormira como não dormia há anos. Um sono pesado, sem os fantasmas que costumavam assombrá-lo. Sem interrupções, sem sobressaltos. Era como se a presença de Jun impusesse uma calma que ele desconhecia, um silêncio reconfortante, quase curativo.

Se algumas noites a mais ao lado daquele ômega garantissem esse tipo de repouso, então sim — valia o investimento.

Contudo, não era apenas o descanso que o motivava.

Havia em Jun uma resistência sutil. Ele hesitava, desviava, evitava se revelar. E, ao mencionar aquele homem que ameaçava sua família, sua expressão se fechara de forma instintiva, defensiva. Como se estivesse habituado a esconder feridas profundas.

Akihiro não era um homem paciente. Mas, com Jun… talvez houvesse algo que merecesse a espera.

Se aceitasse a proposta, ganharia tempo — e silêncio — para observar. Para compreender os limites da influência silenciosa que Jun exercia sobre ele.

E se, no processo, descobrisse os segredos que ele insistia em esconder… melhor ainda.

—–

O cheiro quente de sopa de missô e peixe grelhado envolveu Jun assim que ele atravessou a porta do pequeno restaurante, apertado entre dois prédios antigos, quase esquecido pelo tempo. A luz era fraca, amarelada, projetando sombras suaves sobre as paredes de madeira envernizada, e o zumbido abafado de vozes misturava-se ao tilintar intermitente de pratos e talheres. Tudo era familiar, e ainda assim distante.

Jun amarrou o avental com gestos automáticos, os dedos tensos no tecido já desgastado. A mente, no entanto, vagava longe — ainda presa à conversa daquela manhã. A oferta de Akihiro voltava a ele em ondas: a chance de trabalhar menos no clube, de escapar dos olhares que o despiam sem permissão, das palavras entredentes, das mãos que sempre queriam mais.

Era uma promessa perigosa e, ao mesmo tempo, uma armadilha tentadora demais para ignorar.

No bolso da calça, ele mantinha o cartão que Akihiro lhe dera. Sentia o relevo do papel entre os dedos quando, sem pensar, deslizou a mão para tocá-lo. Às vezes o tirava apenas para olhar, como quem procura num nome escrito a certeza de um caminho possível.

Desviou o olhar para o salão, onde clientes conversavam entre goles de chá. Caminhou com passos silenciosos até o balcão de pedidos, pegando uma bandeja com destreza, os dedos roçando sua borda metálica. Forçou um sorriso — daqueles que já aprendera a usar como escudo — e o ofereceu a um casal sentado perto da janela.

Mas sua atenção não estava ali.

Ainda ouvia a voz de Akihiro, calma e firme como uma corrente subterrânea, e o modo como seus olhos haviam se fixado nele, sem pressa, sem desviar. Um olhar que parecia ver através da pele. Jun engoliu em seco, desviando-se de uma cadeira no caminho com a leveza de quem conhece cada centímetro daquele lugar, mas sentindo-se, de repente, fora de lugar.

“O que ele realmente quer de mim?” — a pergunta voltou como um sussurro que não o deixava em paz. E o mais perturbador era: parte dele temia saber a resposta.

Jun notou quando um cliente entrou e se sentou perto do canto, mas não lhe deu muita atenção. Apenas quando se aproximou para anotar o pedido, seus olhos reconheceram o homem diante dele. O coração falhou por um instante, antes de disparar descontrolado. Era Choi, o homem que o tinha em mãos.

Os dedos de Jun se cerraram em torno da bandeja, os nós ficando brancos com a pressão. Por um breve momento, cogitou se virar e fingir que não o tinha visto. Mas era tarde demais — os olhos de Choi já estavam sobre ele, e um sorriso malicioso, quase complacente, se desenhava em seus lábios.

— Jun — disse Choi, sua voz suave e casual, como se fossem velhos amigos. — Já faz algum tempo. Venha, junte-se a mim por um momento.

O estômago de Jun se revirou, mas ele se forçou a manter a calma.

— Choi-san — ele cumprimentou, com a voz firme apesar do tumulto dentro dele. — O que o traz aqui?

Choi se recostou na cadeira e seus olhos examinaram Jun com um brilho predatório.

— Pensei em dar uma olhada em você. Você tem estado ocupado ultimamente, não é?

A garganta de Jun ficou apertada.

— Tenho trabalhado muito — respondeu ele, com a voz cuidadosamente neutra.

— Sim, eu ouvi falar — disse Choi, seu tom pingando uma falsa doçura. — O clube particular dos Hanamura. É um grande avanço em relação a este lugar.

O coração de Jun bateu forte em seu peito. Como ele sabe disso? Ele engoliu com força, forçando-se a encarar o olhar de Choi.

— Venha comigo — disse ele, levantando-se abruptamente. — Precisamos conversar.

Jun hesitou, mas o olhar de Choi não deixou espaço para discussão. Ele o seguiu até os fundos do restaurante, seus passos ecoando no corredor estreito. O ar ficou mais frio, a porta da sala de armazenamento se abriu rangendo quando Choi o conduziu para dentro.

No momento em que a porta se fechou, a mão de Choi saiu em disparada, atingindo Jun na bochecha com um tapa forte e dolorido. Jun cambaleou, com as costas batendo na parede enquanto segurava o rosto, com a respiração curta e em pânico.

— O que diabos você estava pensando?! — Choi sibilou, sua voz baixa e perigosa. — Trabalhar para os Hanamuras? Você tem alguma ideia de quem eles são?

A cabeça de Jun girou, a dor irradiando por sua bochecha. Os olhos de Choi se estreitaram, seu peito subindo e descendo com uma raiva mal contida.

— Eles são uma família rival. Você entende o que isso significa?

O coração de Jun bateu forte, sua mente acelerou.

— Eu… eu não sabia — ele repetiu, sua voz mal era um sussurro.

Choi se aproximou um pouco mais, sua presença pairando sobre Jun como uma nuvem de tempestade.

— Você precisa sair de lá. Agora.

A respiração de Jun ficou presa, seu corpo tremendo sob o olhar de Choi.

— Mas… o salário. É melhor do que em qualquer outro lugar. Eu não posso…

— Vou encontrar um emprego para você — interrompeu Choi, com um tom incisivo. — Em um de meus estabelecimentos.

O estômago de Jun se revirou ao pensar nisso. A última coisa que ele queria era ficar preso a Choi mais do que já estava.

— Eu… prefiro ficar lá — disse ele em voz baixa, com a voz quase inaudível. — Por favor, eu não vou causar problemas.

Os olhos de Choi brilharam de raiva, mas ele rapidamente se recompôs, sua expressão se transformando em uma máscara fria.

— Tudo bem — disse ele, com a voz baixando para um sussurro. — Então talvez possamos chegar a um acordo… — Ele inclinou a cabeça, observando Jun com um olhar calculista. — Pode continuar trabalhando lá, se conseguir me fornecer informações relevantes. Quero saber quem frequenta o lugar, quem são os clientes de maior prestígio… talvez até alguns detalhes sobre os Hanamura.

Jun sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Seu estômago revirou. Ele encarou Choi, sua expressão ficando mais séria. A respiração de Jun ficou presa, sua mente cambaleando. Espionagem? Sobre Akihiro?

— Você quer que eu espione uma Yakuza? — Choi deu de ombros, como se fosse a coisa mais natural do mundo. — Eu… eu não posso fazer isso — ele sussurrou, com a voz trêmula.

— Mas você fará, você sabe as consequências.

Jun sentiu seus ombros enrijecerem. Seu coração martelava em seu peito. Ele sabia que não tinha escolha. Negar significaria trazer problemas para sua família, e isso era algo que ele não podia permitir. Ele se forçou a respirar fundo, para manter a máscara impassível.

— …Entendido.

Choi sorriu, satisfeito.

— Bom garoto.

—–

Naquela noite…

O quarto exalava uma sufocante intimidade, envolto em sombras quentes que se derramavam das luminárias embutidas, como se a luz hesitasse em expor por completo o que ali se passava. Tudo era contido — o aroma persistente de colônia cara misturado ao suor recente, a quietude espessa do ar, o rangido abafado dos lençóis impecáveis. Diante da penteadeira, Jun ajustava com precisão as alças da lingerie de cetim negro, o tecido escorrendo sobre sua pele como um toque líquido, insinuando-se com suavidade indecente sobre os quadris. Miyagawa havia sido claro em seu pedido: sensualidade com classe. Nada de vulgaridade barata.

Sentado à borda da cama, Takahide Miyagawa o observava em silêncio. O terno já abandonado sobre a poltrona, as pernas afastadas, as mãos repousando sobre as coxas — dedos entrelaçados com a compostura de quem espera um prato caro ser servido. Os olhos, no entanto, traíam a fome meticulosa de um homem habituado a consumir beleza como um hábito luxuoso.

— Pensei que fosse ficar grande em você — comentou, com um leve sorriso, os olhos correndo pelo corpo de Jun. — Mas ficou perfeito.

O tom era admirativo, sim, mas tão limado de emoção quanto uma taça de cristal. Jun retribuiu com um sorriso treinado, sereno e vago, que jamais tocava os olhos. Sua mente, no entanto, já estava longe daquele quarto abafado, longe da noite previsível.

— Venha até aqui — pediu o homem, dando leves tapinhas no próprio colo, como quem convida um animal de estimação bem-educado.

Jun obedeceu com passadas medidas, aproximando-se até estar entre as pernas do cliente. As mãos grandes o envolveram pelos quadris; firmes, mas controladas. Ele não recuou. Conhecia aquele tipo de gesto — a exigência velada de domínio sob a aparência de cortesia.

Miyagawa começou a tocá-lo com uma lentidão estudada, percorrendo a curva de sua cintura, as coxas torneadas, o vinco sutil abaixo do ventre. Seu corpo reagiu apesar da apatia emocional, um reflexo condicionado a esse tipo de contato. Quando os lábios do alfa se inclinaram em direção ao seu pescoço, deixando lambidas mornas e mordidas calculadas, Jun girou ligeiramente o rosto.

— Sem marcas — murmurou, baixo, quase sem emoção. — Por favor.

— Tão cuidadoso… — disse Miyagawa, a voz escorregando num tom meio zombeteiro, meio lisonjeiro. — Tudo bem, vou me conter.

Sorriu e, antes de prosseguir, colou os lábios aos de Jun. O beijo foi leve, exploratório. Esperava resistência — como das outras vezes. Mas, para sua surpresa, Jun não apenas permitiu como respondeu. Seus lábios se moveram com destreza recém-adquirida, deslizando e capturando os de Miyagawa com uma intensidade inesperada. Era raro que fosse beijado assim, e mais raro ainda que retribuísse. Mas agora sabia como. Colocava em prática o que aprendera com Akihiro — e havia algo de instintivamente correto naquele gesto.

Ao se afastarem, os olhos do homem brilhavam com uma curiosidade satisfeita. Ele tocou o rosto de Jun com os dedos, examinando-o como se visse algo novo.

— Isso foi… diferente. Das outras vezes, você parecia querer fugir quando eu te beijava.

Jun apenas abaixou os olhos e murmurou, quase sem querer:

— Eu… aprendi. Seria vergonhoso não o fizesse em algum momento.

Miyagawa se inclinou então para a mesa de cabeceira, rasgando com um estalido seco o invólucro da camisinha. Os movimentos eram meticulosos, seguros. Jun observava, não com desejo, mas com uma aceitação resignada. Havia beleza ali, sim — o tipo de atratividade madura e controlada que convencia facilmente —, mas nenhuma centelha. Nada além da dança conhecida.

Quando Miyagawa se posicionou, a ereção roçando sua entrada, Jun ajustou-se com um gesto fluido. Baixou-se lentamente, sentindo cada centímetro invadir seu corpo com a familiaridade do hábito. A pressão inicial se dissolveu em uma sensação morna, uma mistura de prazer amortecido e desconforto bem mapeado.

As mãos do alfa apertaram seus quadris, guiando o ritmo. Jun retribuiu com movimentos calculados, mantendo a cadência. Por dentro, no entanto, sua mente se esgueirava para outro lugar — onde o toque era diferente, onde o beijo era ardente e genuíno. Onde Akihiro o olhava como se visse algo precioso.

— Você está apertado, Jun. Relaxe um pouco — sussurrou Miyagawa, com a respiração quente e entrecortada. As mãos escorregaram pelas laterais do corpo de Jun, até os mamilos, que massageou com gestos calmos. A resposta do corpo foi imediata, quase irritante.

Jun arqueou-se sob o estímulo, mordendo o lábio, lutando contra o prazer que não lhe pertencia. Quando a boca do homem prendeu um dos mamilos, sugando com intensidade, sua espinha se retesou em espasmos involuntários.

Ao mesmo tempo, Miyagawa deslizou a mão até o membro de Jun, acariciando-o em movimentos calculados, como se quisesse arrancar-lhe a rendição pela força do prazer.

— Você é tão responsivo… — murmurava ele entre beijos úmidos, passando de um lado ao outro com avidez metódica.

Jun devolvia com precisão — os quadris marcando o ritmo, os gemidos baixos, o olhar suavemente entorpecido. Nada era falso, mas tampouco era dele.

As estocadas se tornaram mais rápidas, mais profundas. Miyagawa se entregava com mais urgência. As mãos agarraram suas nádegas, puxando-o com força enquanto o clímax se aproximava.

— Estou perto…

O calor espesso do gozo se derramou dentro dele. Jun permaneceu onde estava, imóvel até sentir o corpo do outro relaxar. O corpo inteiro vibrou em resposta aos estímulos firmes de Miyagawa em seu pênis, até que a tensão o consumiu por completo.

Imóvel por alguns instantes, deixou-se mergulhar na exaustão que o dominava, apenas quando sentiu o outro relaxar. Então ergueu-se devagar, retirou a camisinha e descartou-a com cuidado.

Miyagawa o observava com ar satisfeito, o peito subindo e descendo em silêncio.

— Escute… — começou Miyagawa, o tom agora mais direto, menos mascarado. — Meu Rut está próximo. Pensei em… talvez você pudesse passá-lo comigo. O que me diz?

A garganta de Jun secou. Não era a primeira vez que recebia esse tipo de proposta — um convite perigoso, quase ritualístico. Havia pagamento, sim. Mas o custo real nem sempre era físico.

— Eu… preciso pensar. Não posso te dar uma resposta agora.

A voz saíra neutra, bem medida. Mas por dentro, sua mente era um fio de aço. Havia riscos que ele já não sabia se estava disposto a correr. E, ultimamente, tinha começado a questionar se ainda estava à venda — ao menos nesses termos.

Miyagawa se esticou, desta vez para pegar o celular. Digitou algo rápido e Jun viu a notificação da transferência aparecer no visor.

— Posso recompensá-lo bem se ficar comigo até o amanhecer — disse Miyagawa, os olhos demorando-se na forma como a lingerie moldava o corpo dele. — Gostei de ver você assim… e quero aproveitar mais tempo ao seu lado.

Era uma proposta tentadora. Ele sempre cumpria a palavra — e Jun sabia disso. A promessa pesou no ar como uma isca reluzente. Por fim, deixou-se ceder.

—–

Na tarde do dia seguinte.

Jun ajustou a gola da camisa, o tecido justo delineando seus ombros com precisão. Havia algo sutilmente provocador na maneira como se vestira — proposital, meticulosamente calculado. As calças negras moldavam-se ao contorno de seu corpo com elegância contida; a blusa, translúcida, deixava entrever o relevo suave de seu peitoral. Os sapatos polidos emitiam um som discreto, mas firme, a cada passo que ele dava sobre o pavimento liso da calçada em frente ao clube.

Parou por um instante diante da vitrine de uma loja fechada, observando seu reflexo com olhos críticos. As bochechas estavam levemente coradas, os lábios tingidos de um rosa pálido e os olhos delineados em um traço que acentuava sua expressão felina. Estava belo, sem dúvida. Mais que isso — irresistível. O tipo de beleza feita para ser comprada, admirada, tocada por mãos que sabiam o preço, mas não o valor.

Encostou-se à parede lateral, onde a sombra oferecia um respiro temporário do calor abafado. Seus dedos tamborilaram contra o braço com leveza, enquanto aguardava o cliente com quem havia acertado os termos por meio do aplicativo de encontros — uma plataforma exclusiva, feita para homens ricos que buscavam mais do que apenas beleza: presença, charme, e uma companhia que soubesse exatamente o que dizer e o que fazer.

Jun já fazia parte desse mundo há tempo suficiente para conhecer suas nuances, seus rituais. Mas naquela noite, algo estava deslocado. A lembrança da proposta de Akihiro ecoava em sua mente como uma nota dissonante.

“Ele quer me manter só para ele?” — O pensamento atravessou seu peito como um fio de eletricidade. Havia algo perturbador e atraente naquela ideia. Uma parte de si — a mais prática — via nisso uma oportunidade: estabilidade, uma renda segura, o fim da constante busca por clientes. A outra parte… resistia. Ser exclusivo. Pertença. Algo que, até então, ele jamais cogitara aceitar como real.

Um som de passos firmes o arrancou de sua contemplação. Virou-se, os olhos encontrando o jovem que se aproximava. Havia nele um frescor elegante, como uma brisa perfumada de primavera que não sabia ainda o peso do verão. Vestia uma camisa branca impecavelmente passada e calças sob medida. O cabelo escuro estava bem penteado para trás, e os olhos — de um castanho quente e luminoso — acenderam quando pousaram sobre Jun.

— Você deve ser KwonJun — disse o rapaz. Sua voz era suave, educada, e carregava aquele entusiasmo levemente performático que vinha com o dinheiro e a juventude.

— Sou eu. E você deve ser Aoyagi — respondeu Jun, apertando sua mão.

— Que bom finalmente conhecê-lo pessoalmente. Você é ainda mais deslumbrante do que imaginei. — Os olhos de Aoyagi passearam sem pressa por seu corpo, antes de voltarem para seu rosto com sincero agrado.

— Fico feliz que tenha gostado — respondeu Jun, mantendo o sorriso ensaiado e elegante. — Estou ansioso pelo nosso passeio.

— Tenho algo especial preparado. Vamos?

O início da noite transcorreu com leveza. Aoyagi o conduziu até uma das butiques mais exclusivas da cidade. Os corredores perfumados e o som ambiente cuidadosamente escolhido criavam a ilusão de um mundo à parte, onde o tempo se dobrava ao luxo. Aoyagi selecionava peças com atenção, como quem escolhe uma moldura para um quadro já perfeito.

— Experimente este — disse ele, aproximando um blazer sob medida.

Jun deixou que o tecido tocasse seu braço, forçando um sorriso suave.

— É uma peça maravilhosa. Obrigado.

Aoyagi pagou sem pestanejar. Quando saíram da loja, Jun carregava algumas sacolas discretas, enquanto a mão do rapaz se acomodava sobre sua cintura, guiando-o como seu par em uma dança.

Entre elogios sussurrados e provocações leves ao pé do ouvido, Jun respondia com risos medidos, palavras suaves e movimentos elegantes. Mas, por dentro, a distância entre ele e aquela noite só aumentava.

O convite para o hotel surgiu com naturalidade.

— Gostaria de prolongar nosso passeio — disse Aoyagi, seus olhos carregando um brilho mais denso agora. — Claro, só se você quiser. Garanto que farei valer a pena.

Jun hesitou. Seus dedos se apertaram em torno da alça de uma sacola. Ele sabia o que vinha a seguir. Estava acostumado com aquele tipo de proposta e, até certo ponto, com o que se esperava dele. Ainda assim, havia algo desconfortável naquela perspectiva. Talvez fosse a lembrança de Akihiro, ainda tão presente, tão viva.

— Tudo bem — respondeu por fim.

O hotel era de luxo, com mármore nas paredes e silêncio perfumado nos corredores. Aoyagi o conduziu até uma suíte com vista panorâmica da cidade. Assim que a porta se fechou, o clima entre eles mudou — a confiança juvenil de Aoyagi tornou-se mais assertiva.

— Você é lindo demais — disse ele, aproximando-se. Os dedos deslizaram pela face de Jun com um toque reverente, contornando a linha do maxilar. — Eu queria estar a sós com você a noite inteira.

Jun sentiu o coração disparar, não de desejo, mas de inquietação. Deveria estar focado em Aoyagi. Mas era Akihiro quem sua mente evocava. Akihiro, com seus olhos escuros, sua voz rouca, seu toque que marcava.

Os lábios de Aoyagi encontraram os seus. O beijo era suave, bem-intencionado, mas Jun hesitou. Seu corpo permaneceu imóvel por um segundo demasiado longo, antes que ele, com esforço, correspondesse. Seus lábios se moveram em resposta, mas sem convicção.

Aoyagi afastou-se um pouco, observando-o com a testa levemente franzida.

— Está tudo bem?

— Está… sim — murmurou Jun, rápido demais.

O olhar de Aoyagi buscou o seu por um momento mais, antes de suavizar, como se optasse por acreditar.

—–

No fim do dia.

Assim que Jun cruzou a soleira de casa, os ombros enfim cederam à exaustão. O ar no pequeno apartamento era quente e familiar, impregnado pelo aroma suave do jantar caseiro que pairava no ambiente, misturado ao perfume discreto das ervas secas que sua mãe mantinha em pequenos potes espalhados pelos cômodos.

— Estou em casa — anunciou Jun.

Antes mesmo que pudesse dar um passo adiante, ouviu passos apressados ecoando pelo corredor.

— Hyung! — A voz do irmão mais novo soou antes que ele chegasse à sala, os olhos iluminados por uma alegria espontânea ao vê-lo.

Jun sorriu, como se o cansaço do dia se dissipasse, ainda que por um instante. Logo em seguida, sua mãe apareceu, enxugando as mãos no avental. Havia ternura e preocupação em seu semblante.

— Bem-vindo de volta, querido. — Disse ela.

Jun se aproximou e afagando os cabelos de os cabelos do caçula com um gesto carinhoso antes de perguntar:

— E como está o Jin?

Mãe e filho trocaram um olhar breve, e ela respondeu com um sorriso contido:

— Está melhor hoje.

Jin ainda estava no hospital. Embora trocasse mensagens com Jun de vez em quando, costumava esconder os momentos de maior fraqueza para não preocupá-lo. Por isso, sempre que podia, Jun recorria à mãe em busca de notícias mais confiáveis. Ela, que o visitava quase todos os dias, conhecia as nuances que Jin jamais revelava nas entrelinhas das conversas.

Jun suspirou, como quem só agora se permitia respirar plenamente.

Na cozinha, sua mãe já servia o jantar. Sentou-se à mesa, o irmão mais novo ao seu lado, falando animadamente sobre algo curioso que havia visto na rua. Jun o escutava, mas parte de sua mente permanecia em outra direção.

Enquanto comia, deslizou a mão até o bolso e retirou o cartão que Akihiro lhe entregara pela manhã. Fitou o número impresso por alguns segundos antes de desbloquear o celular.

Jun: “Eu aceito sua proposta.”

A resposta não tardou.

Akihiro: “Ótimo. Vou mandar mensagens quando precisar de você.”

Jun manteve os olhos na tela por mais alguns instantes, depois digitou sua última mensagem:

Jun: “Entendido.”

Bloqueou o celular e retomou a refeição. Uma parte dele compreendia o risco envolvido naquele acordo. Mas, se isso significava garantir estabilidade para sua família, então era um preço que ele estava disposto a pagar.

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Capítulo 4
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Laços em Carmesim

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Akihiro Hanamura sempre acreditou que laços afetivos não passavam de ilusões passageiras – convenções sociais frágeis que encobriam a inevitável falência das relações humanas. Como...

Chapters

  • Capítulo 7 O coração exausto de Jun
  • Capítulo 6 O Gosto da Ternura
  • Capítulo 5 Junhos Possíveis
  • Capítulo 4 Proposta Intrigante e Tentadora
  • Capítulo 3 Sedução no Palco, Verdades no Encontro
  • Capítulo 2 - A primeira intersecção
  • Capítulo 1 - Uma Noite ao Acaso

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