Laços

Laços em Carmesim

Capítulo 6

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🟡 Em breve

O cheiro foi a primeira coisa que Akihiro notou ao despertar. Não era o aroma persistente do álcool que, por vezes, ainda o acompanhava após noites longas demais. Era algo mais quente, mais sutil. Familiar.

O travesseiro ao lado ainda guardava vestígios dele — flor de laranjeira e néctar de damasco, suaves, quase irreais, mas com uma densidade que se agarrava ao ar, como um sussurro de saudade. Misturava-se a esse rastro doce uma centelha cítrica, fresca, como a casca de bergamota se partindo sob a pressão dos dedos — breve, luminosa, impossível de ignorar.

A mão de Akihiro deslizou pelo espaço vazio ao lado. Ao perceber-se sozinho, suspirou, sem surpresa.

Esperava encontrar apenas ausência — como da última vez, quando Jun desaparecera antes da manhã, com alguma desculpa sussurrada como: “trabalho cedo”, “tenho uma entrega”, “não quero incomodar”.

Sempre havia algo, como se ele insistisse em não pertencer a lugar algum.

Mas algo estava diferente.

O aroma não vinha apenas dos lençóis. Espalhava-se pelo ar como uma brisa morna que escapava da porta entreaberta. Um segundo depois, um som abafado de panela encontrou seus ouvidos, misturado ao estalar sutil de alguma fritura. Akihiro se sentou, as sobrancelhas franzidas em confusão.

Vestindo apenas a cueca, com os cabelos desgrenhados e ainda marcados pelo travesseiro, seguiu o rastro aromático até a cozinha — um cômodo que, embora elegante, raramente conhecia uso. Suas refeições costumavam vir de restaurantes ou de entregas discretas que não exigiam esforço algum além de abrir a porta.

Mas ali estava ele.

Jun, de costas, movimentava-se diante do fogão com uma leveza cuidadosa, como se estivesse em território alheio e sagrado. O avental claro cobria-lhe o corpo esguio de modo quase provocador, ainda que sem qualquer intenção evidente.

Os cabelos loiros estavam presos em um coque frouxo, mas algumas mechas teimosas escapavam, emoldurando sua nuca e rosto com descuido encantador. Ele se virou ao ouvir os passos, os olhos se arregalando brevemente antes de suavizar-se num sorriso contido.

— Bom dia — disse, quase num sussurro, como se a manhã exigisse respeito.

Akihiro cruzou os braços, encostando-se à porta, o olhar percorrendo o corpo à frente sem cerimônia.

— Esse é um jeito interessante de se apresentar na minha cozinha — comentou, arqueando uma sobrancelha. — Só de avental?

Jun desviou os olhos, um rubor discreto subindo pelas maçãs do rosto.

— Minhas roupas sujaram ontem à noite… — respondeu, com uma honestidade quase cômica. — Estavam bem impróprias. Então coloquei para lavar. Achei melhor isso do que andar pelado por aí.

A resposta o fez rir, um som baixo e genuíno, que raramente escapava de seus lábios pela manhã. Ele se aproximou mais, observando o balcão organizado, os pratos em processo de finalização e o brilho tímido da luz entrando pela janela.

— E você cozinhando… Achei que ninguém nunca teria coragem de usar essa cozinha — disse, sem ironia, apenas surpreso.

Jun mordeu o lábio inferior, concentrando-se em mexer uma panela. Havia algo de absurdamente bonito nele naquele instante — não só pela imagem estética, mas pela naturalidade com que habitava o espaço, como se aquele gesto trivial carregasse camadas de intimidade que não haviam sido oferecidas, mas que, mesmo assim, estavam ali.

— Eu usei o que tinha. Espero que não se importe. Pedi a entrega de alguns ingredientes, já que não havia muito nos armários… — disse, cauteloso. — E, claro, vou lavar tudo depois.

Akihiro balançou a cabeça, um sorriso de canto surgindo em seus lábios.

— Você é a primeira pessoa a usar essa cozinha em… séculos.

— Notei — respondeu Jun, com uma risada breve. — A única coisa comestível que encontrei foi macarrão instantâneo.

— Eu quase não como em casa. Só deixo isso ali pro caso de uma emergência — murmurou Akihiro, coçando o queixo. — Tipo quando esqueço que o estômago precisa funcionar.

Jun serviu os pratos com uma educação quase formal, como se fosse um hábito enraizado. Colocou os hashis ao lado e esperou que Akihiro se sentasse. Ele não tocou no seu prato até ver que o outro provava a comida.

O alfa provou com expectativa contida, mas o sabor o pegou de surpresa. Não era apenas bom — era reconfortante, um calor caseiro, mas sem perder refinamento. Ergueu o olhar, encontrando Jun à sua frente.

— Você cozinha bem.

Jun soltou um sorriso pequeno, quase infantil.

— Obrigado, fico feliz que tenha gostado.

Terminaram a refeição em silêncio confortável, com pequenos comentários ocasionais. Jun recolheu os pratos e levou tudo à pia. A forma como limpava — cuidadosa, silenciosa — era quase hipnótica. Quase não havia sujeira, mas ele se dedicava como se fosse importante.

Akihiro, ainda sentado à mesa, o observava em silêncio. Uma parte dele tentava afastar a ideia que começava a tomar forma.

“Que clichê” — pensou. Um estereótipo do ômega bonito, educado, que sabe cozinhar, gentil até no modo de recolher os hashis — claro que despertaria aquela impressão.

Mas havia algo mais ali. Algo que não combinava com o que sabia sobre Jun.

Por que alguém como ele, que se encaixava com perfeição naquela imagem de domesticidade — um ômega feito para ser amado, cuidado e acolhido — estava agora em um clube luxuoso, vendendo seu corpo e seu tempo? Quantas máscaras ele teve que vestir até fazer disso sua vida?

Akihiro não sabia. Mas, enquanto o observava enxugar a última tigela, soube de uma coisa: queria descobrir.
Talvez não agora. Talvez nem soubesse o que faria com essa descoberta. Mas queria.

—–

Dias depois.

O cheiro envolvente de gordura quente, caldo fervente e molho de soja pairava no ar do restaurante, misturado ao burburinho abafado das conversas e ao tilintar dos talheres contra a louça. Era início de tarde, e o movimento ainda mantinha um ritmo agitado.

Jun deslizava entre as mesas com a destreza de quem parecia nascer para aquele espaço. A luz que atravessava as janelas altas dourava-lhe a pele morena, ressaltando o traço discreto das sardas que se espalhavam pelo nariz e pelas maçãs do rosto. Ele sorria polido, recolhia pratos com leve inclinação, inclinava-se para ouvir pedidos, como se a rotina fosse uma coreografia ensaiada.

Acabara de servir uma dupla de idosos quando a porta do restaurante se abriu. Não foi o gesto em si que lhe chamou atenção, mas a figura que surgiu no batente.

Akihiro.

Impossível ignorá-lo, mesmo em meio à multidão. A altura imponente, os ombros largos sob a camisa branca de tecido fino que se moldava ao corpo, os cabelos desalinhados com as mechas loiras atrás das orelhas, como se rejeitassem qualquer tentativa de ordem. Ele se deteve um instante na entrada, os olhos percorrendo o ambiente até encontrarem Jun. O ar entre eles pareceu se contrair, como se a intensidade do olhar fosse capaz de redesenhar o espaço.

Jun hesitou, não por timidez, mas por aquele tipo de pausa em que o tempo parece reorganizar prioridades. Depositou a bandeja sobre o balcão e caminhou até ele com calma, como quem atravessa uma ponte fina demais para correr.

— Akihiro — disse, com surpresa contida no sorriso que mantinha educado. — Não esperava vê-lo por aqui.

— Talvez eu só tenha vindo porque senti falta de ser bem servido por você. — A resposta veio com um curvar de lábios que não chegava a ser um sorriso, mas carregava o peso de algo entre o flerte e o desafio.

Jun, mesmo que acostumado a clientes atrevidos, percebeu que aquele tipo de audácia vinha de um lugar diferente. Vinha de alguém que o conhecia além da superfície. E que, por isso mesmo, ousava atravessá-la com palavras veladas.

— Estou de serviço, infelizmente — respondeu, os olhos se desviando para a cozinha por um instante, onde uma nova leva de pedidos estava sendo preparada. — Mas minha pausa é em pouco tempo, caso queira esperar.

Akihiro inclinou-se ligeiramente, os braços cruzados, como se já tivesse decidido o curso do encontro.

— Eu espero. Podemos almoçar em outro lugar, se preferir. Mas se quiser me convencer a comer aqui, aceito sugestões.

Jun conteve o impulso de rir, mais pela ousadia do que pelas palavras. A atmosfera entre eles era como um fio tensionado que jamais romperia, mas vibrava a cada nova aproximação.

— O katsudon daqui é muito bom. Se não se incomodar com o ambiente mais… modesto.

— Já comi em lugares muito piores — disse ele, já se dirigindo a uma das mesas vazias. — Não vejo por que reclamar.

Jun o observou afastar-se antes de retomar a rotina. Não disse mais nada, mas o sangue corria mais vivo sob sua pele.

Os minutos seguintes foram preenchidos pela correria familiar do horário de almoço, mas havia algo distinto em sua postura, cada movimento agora carregava uma consciência diferente — uma presença que o assistia do canto, olhos fixos como uma promessa não dita. Quando o pedido foi chamado no balcão, Jun o reconheceu sem sequer precisar confirmar: katsudon com arroz, sopa de missô e um acompanhamento simples de picles artesanais.

Para si, escolhera um prato mais leve — um donburi de frango grelhado com vegetais e molho cítrico.

Equilibrou a bandeja com os dois pedidos e serviu-os sobre a mesa. O prato diante de Akihiro foi colocado com uma mesura contida, mas Jun não sustentou o olhar; ainda assim, podia sentir o peso da atenção do outro subindo-lhe pelo rosto, como um toque não solicitado.

— Obrigado por esperar — disse, retirando o avental e dobrando-o com cuidado antes de se sentar do outro lado da mesa.

Akihiro já tinha pegado os hashi, mas ainda não começara a comer. Ele parecia mais interessado em observar Jun.

Debaixo do avental que deixara de lado, ele vestia roupas simples — calça escura de tecido leve e uma camiseta clara com a gola solta, revelando parte da clavícula. O cabelo, preso num coque alto e frouxo, era atravessado por uma bandana azul-marinho, parcialmente escondida sob mechas rebeldes que moldavam-lhe o rosto com descuido encantador.

Akihiro separou os hashi com um estalo, partindo um pedaço da carne empanada sobre o arroz, e levou o primeiro pedaço à boca. Mastigava devagar, como se saboreasse mais do que apenas a comida — como se cada detalhe daquele momento estivesse sendo cuidadosamente arquivado na memória. O vapor subia preguiçoso da tigela, e Jun também começara a comer seu donburi, os gestos tranquilos, a atenção dividida entre o prato e a presença firme diante de si.

O silêncio era denso, mas não desconfortável — a densidade de um lago profundo, que esconde mais do que revela.

Akihiro puxou o celular do bolso interno da jaqueta. A tela se iluminou com a familiaridade de um gesto repetido, sem pressa.

— Isso está mesmo bom. — Disse, depois de alguns segundos, a voz mais baixa.

Jun sorriu, quase imperceptível, mas com os olhos mais brilhantes.

— Fico feliz que tenha gostado. — A voz saiu mais suave do que pretendia.

O alfa não respondeu de imediato. Apenas pousou os hashis sobre a borda da tigela, como se esse gesto fosse suficiente para indicar que não estava ali por acaso.

Então, inclinou o celular sobre a mesa, sua voz carregava outra tonalidade. Um timbre mais leve, quase divertido.

— Hm… Esta foto sua… está bem produzida. Esse filtro é real ou é só edição?

Jun o fitou, confuso por um segundo.

— O quê? — inclinou-se ligeiramente para frente, franzindo o cenho. — Do que você está falando?

Akihiro girou o celular, revelando a tela. Era uma das fotos do perfil de Jun no aplicativo de encontros — também uma vitrine trabalho como acompanhante. Na imagem, ele usava uma camisa meio aberta e um sorriso ensaiado, o tipo de pose treinada para atrair atenção sem vulgaridade.

Jun arregalou os olhos.

— Você… — ele esticou o braço, tentando alcançar o celular — como você achou isso?

— Eu sempre soube — Akihiro afastou o celular com facilidade desdenhosa, como quem segura algo fora do alcance de uma criança. — Só nunca tinha me dado ao trabalho de procurar.

Jun, ainda tentando pegar o telefone, terminou com os antebraços espalmados sobre a mesa. O rosto corado, enterrado entre os braços, era o retrato da vergonha e da incredulidade.

— Você não devia estar vendo isso — a voz saiu abafada, quase um resmungo desesperado. — Que tipo de psicopata fica bisbilhotando o perfil alheio enquanto almoça?

Akihiro riu. Riu de verdade — um som raro, rouco, espontâneo. Ele pousou o celular ao lado do prato, ainda com a tela acesa, e observou Jun como quem observa algo frágil tentando manter a compostura.

— Você colocou isso na internet. Não é exatamente um segredo de estado. Tem até avaliações. — Ele deslizou o polegar pela tela. — “Atencioso, bonito e bom de conversa.” Cinco estrelas. E olha só, um tal de “Shun88” disse que você faz massagem melhor que terapeuta certificado.  Além de “mãos incríveis”, “sabe ouvir como ninguém”. “Passei a noite e acordei querendo mais.” — leu outra, em tom quase distraído. — “Não só o toque, mas o jeito que ele olha… como se te conhecesse de verdade.” É quase poético.

Jun emitiu um som entre um gemido e uma risada desesperada, afundando mais o rosto nos braços. Por um instante pareceu querer desaparecer no próprio corpo.

— As pessoas mentem na internet — protestou contra a manga da camiseta, voz abafada. — Nem metade dessas histórias aconteceu de verdade.

Akihiro arqueou uma sobrancelha, sem tirar os olhos da tela.

— Mesmo assim, você deixa lá? — perguntou, mais curioso que julgador.

Jun suspirou, erguendo o rosto apenas o suficiente para encará-lo de lado.

— Alguns são apagados automaticamente por serem explícitos demais. Outros eu tiro quando acho que passaram do limite. Mas não apago tudo. Engajamento chamam atenção… mesmo quando mentem.

Houve uma pausa breve, preenchida apenas pelo som abafado do ventilador girando no teto.

— De qualquer forma você tem mais avaliações que o meu restaurante favorito. É impressionante. — Akihiro falou com a naturalidade de quem lê um cardápio, mas o tom carregava uma ironia morna, sem crueldade.

Jun finalmente se recompôs o suficiente para retomar os hashis, embora ainda escondesse metade dele por trás das mãos. Seus olhos, ligeiramente marejados de riso e constrangimento, o fitavam com uma expressão mista de indignação e rendição.

— Relaxa. Se eu tivesse algo contra isso, não estaria aqui almoçando com você. Eu até considerei te contratar. Só não quis parecer desesperado. — Ele levou outro pedaço à boca, mastigando com falsa inocência.

— Só agora você se preocupa com parecer desesperado? — Jun murmurou, fingindo ofensa, mas o riso escapava entre as palavras. — E se eu deletar o perfil agora?

— Então terei que improvisar — disse Akihiro, erguendo o olhar e fixando-o no rosto dele com seriedade repentina. — Talvez prefira assim mesmo. Menos concorrência.

Jun desviou o olhar primeiro, mexendo nos hashis sem propósito, tentando encontrar um comentário leve que encerrasse aquilo. Mas o coração batia um pouco mais rápido do que antes.

Akihiro limpou a borda da boca com o guardanapo, colocou os hashi sobre a tigela vazia, um gesto quase ritualístico, e inclinou-se levemente para trás na cadeira, o braço estendido ao longo do encosto, como se quisesse ocupar mais espaço no ambiente — ou como se o espaço entre ele e Jun já estivesse se tornando pequeno demais.

— Quanto tempo você ainda tem de intervalo?

Jun ergueu os olhos, a expressão vacilando entre cautela e desconfiança.

— Uns quarenta minutos. — Respondeu, casualmente.

Akihiro assentiu, os olhos semicerrados, quase sorrindo.

— É tempo suficiente — disse, baixando a voz até torná-la um sussurro que parecia deslizar pela madeira da mesa como um segredo quente. — Não para almoçar de novo… Mas o suficiente.

Jun franziu o cenho, como se não houvesse entendido de imediato — embora tivesse entendido.

Seus olhos o traíram antes de qualquer reação verbal: arregalaram-se por um instante, antes de buscar alguma coisa para fixar no ambiente — uma tigela mal empilhada no balcão, a sombra do ventilador girando no teto, qualquer coisa que não fosse aquele sorriso de canto que Akihiro agora exibia com gosto perverso.

— Você ficou maluco?

— Só estou dizendo que podemos aproveitar o intervalo de forma… criativa — Akihiro se inclinou para a frente, diminuindo ainda mais a distância entre eles. Seu rosto agora projetava-se sobre a mesa com uma confiança provocadora, quase indolente. — Meu carro está estacionado ali na rua lateral… ninguém veria nada. Só você e eu. Em silêncio. Como dois adultos resolvendo um contratempo logístico.

Jun levou a mão ao rosto de novo, mas dessa vez não apenas para esconder a vergonha. Era também uma tentativa inútil de conter o sorriso que lhe escapava traiçoeiro pelas laterais dos lábios. Um sorriso que dizia “isso é absurdo”, mas também “isso é exatamente o tipo de coisa que você diria”.

— Você não tem vergonha na cara. — Murmurou, enfim, e os olhos encontraram os dele, firmes agora, embora ainda brilhando de incredulidade.

— Nenhuma — Akihiro respondeu com a precisão de quem nunca pretendeu tê-la —, mas, se você preferir algo mais convencional, posso passar aqui quando acabar seu turno. Te buscar. Irmos a algum lugar com uma cama de verdade e um espelho no teto, talvez.

— Um quarto com espelho no teto? Que romântico.

— Eu tenho meus momentos — disse Akihiro, inclinando-se ainda mais, até que o cotovelo repousasse na borda da mesa e seu queixo quase encostasse na mão. — E você, tem os seus quarenta e cinco minutos… Como vai usar?

Havia algo curioso naquela proposta — não só pelo absurdo contido nela, mas pelo fato de que, vindo de Akihiro, ela soava menos como provocação e mais como um convite genuíno. Como se o sexo fosse apenas uma camada — um meio, e não o fim.

Um modo de estar junto, de se fazer presente em um mundo onde as palavras às vezes falham.

Mas, naquele momento, Jun sorriu. Um sorriso inteiro, sem defesas, e apoiou as mãos na mesa como quem se prepara para levantar. Quando o celular de Akihiro vibrou sobre a mesa, rompendo o momento como um fio puxado de súbito. O aparelho tremia, encostado na tigela vazia, e a tela piscava com um nome que Akihiro não podia ignorar.

Ele olhou, franziu a testa, e soltou um suspiro pesado.

— Merda. — Resmungou, pegando o telefone. Atendeu, o rosto mudando de expressão como uma cortina puxada com força.

Jun observou em silêncio enquanto Akihiro falava baixo, com uma seriedade que não combinava com o tom anterior da conversa. A postura mudou, rígida de novo, e os olhos estavam em outro lugar — em outro assunto, outra responsabilidade. O mundo do lado de fora da bolha que haviam criado naquela mesa.

A ligação não durou mais que dois minutos, mas foi o suficiente para desmanchar qualquer traço de descontração.

Akihiro desligou e passou a mão pelo rosto, como se quisesse apagar as rugas recém-esculpidas na testa.

— Eu tenho que ir. Agora. — disse, tentando disfarçar a frustração com um tom prático. Mas não conseguiu.

Jun apenas assentiu, compreensivo, afastando a cadeira para o lado. Ambos se levantaram quase ao mesmo tempo, e ambos se levantaram quase ao mesmo tempo. Ele o acompanhou até o balcão, onde Akihiro pagou a conta sem discussão, antes de seguirem juntos até a porta.

Na calçada, o sol estava mais quente do que antes, e o barulho da cidade parecia longe, filtrado pelo silêncio que agora os envolvia. Akihiro parou diante do carro, prestes a abrir a porta, quando Jun, com um gesto contido e tímido, o chamou:

— Akihiro… — sua voz soou mais baixa, quase hesitante. — Se você… quiser passar aqui depois do trabalho, como disse antes… eu vou estar aqui.

O olhar de Akihiro se iluminou de imediato. O sorriso surgiu sem aviso, lento e curvado, como se saboreasse o momento mais do que qualquer. Deu um passo à frente, encurtando a distância entre eles.

— Tem certeza? — a voz grave, envolta de malícia, parecia vibrar no ar entre eles. — Se você alimentar o monstro, ele vai vir te pegar.

Jun desviou os olhos apenas por um instante, o rosto corado.

— Tenho certeza — respondeu, sem elevar a voz, mas com firmeza discreta. — Essa é a sua chance de ser romântico.

Akihiro piscou e, em seguida, riu baixo — um som rouco, que carregava incredulidade e divertimento na mesma medida.

— Romântico… — repetiu, como se testasse a palavra na boca. — Você realmente acha que pode me desafiar assim e sair ileso?

— Não é um desafio… Você mesmo disse que tem seus momentos.

Os olhos de Akihiro se estreitaram, o sorriso se curvando mais, e ele mordeu os lábios de leve. Havia uma excitação crua em sua expressão, uma determinação súbita que o deixava ainda mais imponente.

— Então é melhor estar preparado para mim… — deslizou o dedo indicador pela barriga de Jun, subindo lentamente. — Pode gemer, pode tremer, pode implorar… mas quando chegar aqui… — seu dedo parou, provocando um estremecimento imediato. — Ainda assim, eu não vou largar você.

Foi nesse instante que Jun percebeu o que havia provocado. O calor subiu-lhe às faces, a vergonha se confundindo com o desejo. Corado, desviou o olhar, tentando se esconder dentro do próprio silêncio.

— Estarei esperando… — murmurou, quase sem fôlego.

Por um momento, Akihiro apenas o encarou. O olhar era intenso, mais longo do que a situação permitiria, carregado de uma densidade que não exigia resposta. Então, como se a cena obedecesse a uma lógica própria, ele simplesmente não estava mais ali.

Jun piscou, procurando-o instintivamente, mas o espaço diante da calçada já estava vazio — nenhuma sombra, apenas a rua ensolarada e o murmúrio distante da cidade. Jun ficou imóvel, o coração acelerado, tentando decidir se aquilo havia sido real ou apenas mais um truque de Akihiro.

Por fim, voltou para dentro ainda com o sorriso preso ao rosto — e a estranha sensação de que, a partir dali, a espera se tornaria um hábito inevitável.

—–

O turno de Jun terminara entre o aroma persistente de comida e o som abafado de pratos sendo guardados. Vestia um sobretudo leve sobre a roupa de trabalho, a gola levantada para se proteger do vento frio que corria pelas ruas silenciosas, e o cabelo preso de modo despretensioso deixava à mostra a nuca levemente úmida.

Antes de sair, pegou o celular e enviou uma mensagem:

Jun: Acabei de sair do trabalho.

Pouco depois, a resposta chegou:

Akihiro: Estou na rua ao lado, esperando por você.

Ao dobrar a esquina, Jun desacelerou. O carro preto estava ali, estacionado, e Akihiro encostado nele, a presença familiar suficiente para fazer o mundo diminuir de ritmo por um instante.

A mão dele segurava um cigarro pela metade, mas a brasa já morria entre os dedos. O cigarro que segurava já se consumia, a brasa morrendo entre os dedos; ele o pisou sem pressa ao ver Jun e, com passos firmes e lentos, aproximou-se, os olhos percorrendo o corpo magro sob o casaco.

O alfa apenas abriu a porta do carro e esperou que Jun entrasse. O silêncio entre eles carregava uma estranha paz. Nenhum dos dois parecia desconfortável com a ausência de palavras.

Somente quando o carro avançou, a cidade fluindo ao redor como uma paisagem sonolenta, Akihiro quebrou o silêncio.

— Foi cansativo hoje? — perguntou, os olhos fixos na rua à frente.

— Não muito — respondeu Jun, a voz baixa, quase soturna pelo cansaço. — Só… longo.

A viagem seguiu tranquila. Só na garagem do prédio Akihiro se inclinanou para o banco de trás e, com um gesto aparentemente descuidado, puxou um pequeno buquê envolto em papel craft. As flores, em tons quentes de amarelo, laranja e vermelho queimado, exalavam um perfume suave, quase como uma boa colônia — discreto, mas persistente. Havia ali gérberas, lavandas tingidas e pequenas hastes douradas de sempre-vivas, todas unidas por um laço de cetim cor vermelho.

— Aqui — disse, estendendo o buquê em direção a Jun, que piscou devagar, como se não tivesse entendido.

— O quê…?

— Eu disse que iria compensar. — A voz dele soava rouca, mas não havia escárnio nos olhos.

Jun segurou as flores com delicadeza, apenas para perceber que não eram naturais. Ao toque, havia uma leve rigidez — não de algo morto, mas de algo feito para durar. Talvez papel, talvez tecido, talvez ambos.

— Elas não são de verdade…? — perguntou, mais surpreso do que decepcionado.

— Não — Akihiro balançou a cabeça. — Quando fui comprar, pensei que iria gostar de algo brega como flores. Mas também imaginei que, no dia seguinte, quando já estariam murchas. Então encontrei esse lugar… Fazem arranjos artesanais que duram — continuou, com um leve encolher de ombros. — Assim você pode ficar com elas o tempo que quiser.

Jun encarou o buquê por alguns segundos. Aquilo poderia ter sido impessoal — ou mesmo calculado —, mas não soava assim. Havia uma intenção ali, um cuidado silencioso que o surpreendia.

— São lindas, muito obrigado — disse por fim, num tom suave, quase distraído.

Akihiro ergueu o celular e tirou a foto. O flash capturou a expressão doce do ômega, com as flores meio abraçadas contra o peito e um brilho nos olhos que ele provavelmente não perceberia até ver a imagem.

— Além disso, caso alguém me acuse de não saber ser romântico… agora tenho provas.

— Ei — Jun esticou a mão como quem tenta impedir algo que já aconteceu. — Você devia me avisar…

— Se avisasse, você ia se esconder atrás das flores — respondeu ele, deslizando o celular de volta no bolso com um pequeno sorriso no canto da boca.

O elevador os levou em silêncio até o andar superior.

Dentro do apartamento, Akihiro abriu a porta e deixou que Jun passasse primeiro. Não havia pressa, nem desejo imediato nos gestos — só uma espécie de cuidado silencioso. O ômega caminhou até a sala e parou diante do sofá, olhando as flores por mais um instante antes de levá-las até o balcão da cozinha. Akihiro observava à distância, sem pressa de se aproximar, como se estivesse tentando entender o quanto ainda era permitido atravessar naquela noite.

— Quer tomar banho? — perguntou, enfim, encostado na parede do corredor.

— Sim, eu estou sujo do trabalho… — Jun virou-se de leve, os dedos ainda tocando a fita do buquê.

— Se dormir de conchinha com elas, vou ficar puto. — Akihiro cruzou os braços, o tom levemente provocador de antes já esmorecido.

Jun abafou uma risada com a ponta dos dedos e lançou-lhe um olhar de canto.

— Nem você sabe mais o que tá fazendo, não é?

— Não — admitiu ele, sem ironia. — Mas, por enquanto, estou me saindo melhor do que eu esperava.

Jun desviou o olhar, mas o sorriso ainda tocava a curva dos lábios.

——

A água quente escorria pelos ombros de Jun, deslizando pela pele como um fio contínuo que o envolvia em um calor quase entorpecente. O vapor começava a embaçar o espelho do banheiro, criando uma atmosfera difusa, íntima, onde os ruídos da casa se dissolviam em segundo plano.

As mãos de Akihiro deslizavam suavemente pelo corpo de Jun, lavando-o com cuidado, quase como se cada toque fosse um afeto silencioso que permanecesse na memória. Pouco depois, o alfa saiu do chuveiro, enrolado num roupão ainda úmido em alguns pontos. O cheiro fresco de sabonete ainda pairava no ar, misturado ao aroma quente do vapor.

Jun permaneceu sob o jato por mais alguns instantes, talvez para reorganizar os pensamentos, talvez porque sabia que, ao sair, encontraria Akihiro esperando-o com aquele olhar sempre insinuante, sempre pronto para desconcertá-lo. Suspirou, desligando a água e passando a toalha nos cabelos ainda úmidos, antes de se arrastar, relutante, até o quarto.

Como previra, Akihiro estava ali, deitado na cama com a desenvoltura de quem se sentia dono do espaço. O lençol amassado estava puxado até a altura da cintura, enquanto o roupão caía aberto ao redor do corpo, deixando o torso exposto, ainda marcado pela umidade recente. Seus olhos, semicerrados em preguiça calculada, iluminaram-se quando Jun atravessou a soleira.

— Até que enfim — murmurou, a voz carregada de uma satisfação preguiçosa. — Achei que fosse adormecer debaixo da água.

Jun franziu o cenho, evitando encontrá-lo diretamente com os olhos.

— Você saiu primeiro. Achei que não fosse me esperar.

— Claro que esperei. Tinha algo em mente. — Akihiro arqueou uma sobrancelha, divertido.

Jun hesitou, já desconfiado.

— Algo em mente?

O sorriso de Akihiro se abriu, lento, carregado de malícia. Ele se apoiou nos cotovelos, o corpo projetando-se ligeiramente à frente.

— Aquele comentário no seu perfil disse que você faz massagem melhor que terapeuta certificado — começou, quase casual, mas com a intenção evidente de provocar. — Estou curioso.

Jun parou no meio do movimento de secar os cabelos. A toalha deslizou para seus ombros, e ele o encarou em absoluto embaraço.

— Você de novo com isso… — murmurou, a voz carregada de desconforto. — Já não basta ter invadido meu perfil uma vez? Precisa ficar repetindo essas coisas?

Akihiro riu baixo, o som vibrando no quarto com uma insolência quase inocente.

— Não é minha culpa se você não sabe esconder seus talentos.

Jun desviou o olhar, os dedos apertando o tecido da toalha. O coração lhe batia mais rápido — não tanto pelo conteúdo da provocação, mas pelo modo como Akihiro sempre sabia encontrar a fresta exata para expô-lo.

Suspirou, resignado.

— Tudo bem, deita na cama… e tira o roupão.

Akihiro sorriu, satisfeito com a pequena vitória, e em seguida, soltou o cinto do roupão, deixando-o escorregar pela cama antes de deitar-se de bruços. A posição exibia o contorno firme de suas costas, largas e definidas, iluminadas pela luz amena que atravessava a cortina entreaberta.

Jun subiu sobre ele, sentando-se, sentindo o calor que emanava dele, os dedos pairando hesitantes sobre as costas antes de, finalmente, tocar sua pele. O contato o fez prender a respiração por um instante; havia algo de íntimo demais naquela aproximação, como se estivesse atravessando um limite invisível.

Começou devagar, pressionando com as palmas das mãos na altura dos ombros, deslizando em movimentos firmes e lentos. Akihiro soltou um suspiro satisfeito, os músculos relaxando sob o toque.

Jun engoliu em seco, lutando contra o turbilhão que crescia em seu peito. O contato físico sempre o deixava alerta, mas naquele momento havia algo diferente — a consciência de que Akihiro não estava apenas recebendo a massagem; estava observando-o, mesmo de olhos fechados, absorvendo cada reação dele como se fosse parte do jogo.

— Hm… então não era exagero — murmurou, a voz grave abafada contra o travesseiro.

Jun apertou os lábios, tentando ignorar a pontada de calor que lhe subia pelo rosto.

— Pare de falar. Você só pediu isso para me constranger.

— Não — replicou Akihiro, um sorriso audível na voz. — Pedi porque gosto da ideia de você me tocando assim, e se isso resultasse em uma boa massagem, por que não?

As palavras pesaram no ar, ressoando em Jun de maneira desconfortável. Seus dedos continuaram trabalhando, descendo pelas costas, explorando a tensão acumulada ao longo da espinha. Quanto mais pressionava, mais percebia a entrega absoluta de Akihiro, como se seu corpo inteiro se moldasse às mãos dele.

A pressão de seus dedos aumentou, talvez para se distrair, talvez para silenciar a própria mente.

O tempo se estendeu entre eles, marcado apenas pelo som da respiração de ambos e pelo deslizar das mãos de Jun. Aos poucos, ele se deixou levar pelo gesto, encontrando um ritmo natural.

Ele observou o corpo de Akihiro relaxado sobre o colchão, o rosto virado de lado, os cabelos escuros espalhados em desalinho contra o lençol claro. A pele aquecia sob seu toque, o corpo reagia, ora enrijecendo, ora relaxando por completo, como se cada pressão libertasse algo mais profundo.

Por mais que tentasse, Jun não conseguiu impedir que uma estranha sensação de intimidade o invadisse. Era como se, naquele ato aparentemente banal, houvesse algo de confissão, de entrega silenciosa.

Com voz baixa, quase um sussurro que não precisava se impor, Jun pediu:

— Vire-se.

Akihiro ergueu as pálpebras por um instante, os olhos semicerrados pela sonolência induzida pelo toque. Sem contestar, obedeceu. Deitou-se de costas, o peito largo exposto, subindo e descendo em movimentos lentos. O olhar que lançou a Jun foi de confiança absoluta, como se o ômega fosse a única pessoa no mundo capaz de desarmá-lo daquele modo.

Jun acomodou-se sobre o corpo dele, de frente, apoiando as mãos no esterno antes de deslizar devagar, sentindo a vibração sutil do coração sob sua pele. Seus dedos percorreram o abdômen, as costelas, os ombros, alternando pressão e suavidade, explorando cada detalhe com atenção quase reverente.

Akihiro fechou os olhos outra vez, suspirando. O som escapou-lhe entre os lábios como uma rendição, e Jun sentiu um calor discreto subir pelo próprio corpo. Gostava de vê-lo assim: vulnerável, solto, entregue. Era raro, e justamente por isso precioso.

Akihiro ergueu as mãos e pousou-as sobre as coxas dele, os dedos escorregaram por baixo do tecido da toalha presa à cintura do ômega, explorando a pele oculta, acariciando-a em círculos lentos, como se quisesse marcar sua presença mesmo na passividade.

Jun deixou que os dedos percorressem a clavícula do outro, descendo pela curva suave do peito até repousar sobre o abdômen firme. Um gesto que mais sugeria do que afirmava. Quando se moveu um pouco para trás, a pressão repentina o fez sentir a ereção crescente do alfa sob si. O calor subiu-lhe ao rosto de imediato, e ele recuou instintivamente como se tivesse tocado fogo.

— É sério?… — Murmurou, sem coragem de terminar a frase.

Os olhos do alfa se abriram devagar, pesados pelo torpor, mas carregados de malícia. O canto da boca se curvou em um sorriso lento, predador na sua calma.

— O que foi? — provocou, a voz grave arranhando o silêncio. — Descobriu alguma coisa?

Jun desviou o olhar, mordendo a própria língua para não tropeçar nas palavras.

— Seu pervertido… — tentou retrucar, mas a forma como se remexeu sobre o corpo dele o traía por completo.

Akihiro riu baixo, o som grave vibrando no peito sob as mãos de Jun.

— Você fica me massageando, tão dedicado, e agora finge surpresa? — Akihiro murmurou, a voz carregada de provocação. — Tira essa toalha e vamos ver quem é o verdadeiro pervertido.

Jun arregalou os olhos, escandalizado.

— É você! Eu não tenho nada a esconder.

Akihiro arqueou a sobrancelha, divertido.

— Claro… porque você é um santo. — Provocou, mordendo de leve o próprio lábio só para vê-lo enrubescer ainda mais.

Jun tentou se recompor, mas a gargalhada abafada de Akihiro apenas aumentou sua vergonha. Ainda assim, havia calor naquela provocação, algo que o fazia sentir-se visto e desejado, não ridicularizado.

A mão de Akihiro deslizou até a cintura dele, guiando-o para a frente, enquanto oferecia sua outra mão, deixando os dedos de Jun deslizarem sobre a sua palma. Logo seus lábios se encontraram em um beijo confuso, desesperado. Jun gemeu baixinho contra a boca dele, o som abafado, mas inconfundivelmente necessitado.

As mãos do alfa vagaram, traçando a curva delicada de sua cintura até alcançar a firmeza das nádegas. Apertou-as sem pudor, fazendo a toalha escorregar e revelar a ereção crescente de Jun.

— Olha só… e ainda finge que não está excitado. — A voz de Akihiro soava rouca, quase um rosnado.

— Foi porque você ficou me tocando no banho…

— Ah, claro… a culpa é sempre minha. — Akihiro sorriu contra os lábios dele, duvidando sem esforço.

Jun moveu-se sobre ele, pressionando sua bunda contra a ereção rígida do alfa. O atrito fez seus corpos pulsarem juntos, o pré-gozo úmido misturando-se à medida que se esfregavam, até que seus corpos se chocassem num ritmo descompassado.

— Quem diria que sua massagem ia acabar em um… final tão feliz. — Murmurou Akihiro, os olhos semicerrados de prazer.

A respiração de Jun saía curta, trêmula, enquanto ele rebolava contra o comprimento do outro. Suas mãos deslizaram pelo peito de Akihiro, sentindo a dureza dos músculos sob seus dedos, as linhas das tatuagens gravadas na pele quente.

Num movimento ágil, Akihiro o virou, prendendo-o debaixo de si. Jun afundou nos travesseiros, o corpo arqueado em conforto tenso, não totalmente deitado.

— Sabe… — disse Akihiro, a voz baixa, sincera —, essa massagem me renovou de verdade. Espero que não se importe se eu pedir mais vezes no futuro.

Jun corou levemente, desviando o olhar, a timidez traindo seu sorriso contido.

— Não… — murmurou ele, quase inaudível —, não me importaria… mas eu pensei que você ia me compensar… — disse Jun, hesitante, os lábios formando um biquinho envergonhado.

Akihiro inclinou a cabeça, rindo de novo, mas agora o brilho em seus olhos era malicioso e ao mesmo tempo carregado de ternura inesperada. Seus dedos traçaram a linha do maxilar de Jun, um toque íntimo que queimava mais que qualquer carícia explícita.

— Então é isso… quer que eu seja romântico. Quer que eu compense do jeito certo?

Jun estremeceu, não pelo gesto, mas pelo eco que aquilo provocava em sua memória. Já ouvira frases parecidas, sussurradas por clientes que pediam experiências diferentes — às vezes ternura, às vezes submissão, às vezes até o simulacro de um amor verdadeiro.

Antes que Jun respondesse, ele o puxou pela nuca, roubando-lhe um beijo firme, exigente — que logo se desfez em algo mais lento, reverente. Havia uma contradição arrebatadora naquele gesto: paixão e cuidado, desejo e devoção, tudo condensado no entrelaçar de bocas que se buscavam com urgência e, ao mesmo tempo, com calma.

Ele sabia interpretar cada papel, sabia se moldar às expectativas, mas ali… ali não era um cliente qualquer. Akihiro parecia excessivamente empenhado em lhe provar algo. Seria atuação? Ou ele realmente queria ser romântico? A linha era tênue demais, e Jun não sabia em qual lado caía.

Ele suspirou contra os lábios do alfa, entregando-se ao momento. O corpo reagia por instinto, mas sua mente permanecia lúcida, captando o peso simbólico daquele encontro. Já não era apenas o cumprimento de uma promessa adiada pelo desejo interrompido; cada provocação agora trazia em si a semente de algo mais profundo, difícil de nomear.

Talvez fosse isso que o deixava tão vulnerável: não distinguir mais se Akihiro estava apenas encenando ou se havia verdade no brilho de seus olhos.

O romance, em sua vida, sempre fora um contrato implícito, um papel ensaiado para satisfazer fantasias alheias. Mas com ele, a intensidade beirava o inverossímil. Era como se Akihiro quisesse convencê-lo — ou convencer a si mesmo — de que poderiam existir assim, como amantes. Jun apenas cedia, aceitando o jogo, sem saber se ao final restaria prazer ou apenas mais uma camada de confusão.

As mãos de Akihiro entrelaçaram-se às de Jun, puxando-o para mais perto até que não houvesse espaço entre seus corpos. O calor se fundia, as respirações se misturavam, e a cama parecia pequena demais para conter a tensão crescente.

— Romântico o bastante para você? — sussurrou Akihiro entre um beijo e outro, os lábios ainda roçando os de Jun, o sorriso malicioso marcando sua voz.

Jun conteve o riso que ameaçou escapar. Não havia desconforto em suas palavras; ao contrário, sentia-se à vontade naquela dança de provocações.

— Talvez. — respondeu, enigmático, deixando a interpretação ao alfa.

Akihiro inclinou-se mais, cada toque lento e calculado. Não havia pressa; apenas a construção paciente de uma tensão que parecia destinada a se eternizar.

O alfa suspirou contra a pele dele, as palavras soando abafadas, quase um murmúrio:

— Se for para compensar, vou fazer direito.

Um arrepio percorreu Jun, e ele não tentou esconder. Permitiu-se sentir vulnerável, aceitando que naquela provocação havia mais promessa de cuidado do que disputa.

A outra mão de Akihiro desceu pela sua cintura até apertar-lhe a bunda, afastando suavemente suas pernas.

— Vou fazer você se sentir tão bem. Como prometi. — Murmurou.

Os olhos de Jun se fecharam quando a mão dele deslizou entre suas coxas, os dedos roçando a entrada sensível. Ele ofegou, os quadris arqueando-se em busca de mais contato. Akihiro não o fez esperar: empurrou dois dedos para dentro, sentindo o calor apertado se contrair em torno deles. Jun gemeu alto, as costas arqueando contra o colchão, os lençóis amassados em suas mãos trêmulas.

Akihiro inclinou-se contra o peito dele, respirando fundo sobre os mamilos antes de lamber e morder de leve.

— Gosta disso? — provocou, sabendo a resposta ao sentir o corpo de Jun tremer sob sua boca.

Seus dedos se curvaram em busca daquele ponto secreto, e quando o encontraram, Jun gritou, seu corpo inteiro estremecendo. Akihiro riu baixinho, malicioso, pressionando ali repetidas vezes até vê-lo se desfazer.

— Promete que vai reagir tão bem assim quando eu estiver dentro de você… — sussurrou, antes de capturar os lábios de Jun em um beijo violento.

Jun o beijou desesperado, puxando-o pelo cabelo. Quando Akihiro retirou os dedos lentamente, arrancou-lhe um gemido arrastado.

Separaram-se do beijo apenas quando Akihiro abriu a gaveta ao lado, pegando a camisinha e a deslizando sobre si. Posicionou-se entre as pernas de Jun, a ponta já pressionando sua entrada sensível.

— Pronto? — perguntou, a voz rouca de desejo.

Jun assentiu com veemência, os olhos presos nos dele.

Com uma estocada lenta e firme, Akihiro o penetrou até o fundo. Os olhos de Jun reviraram, e um gemido longo escapou de seus lábios entreabertos. Akihiro parou, permitindo que ele se ajustasse, antes de recuar quase por completo e empurrar de volta, deliberado.

Jun gritou, as unhas cravando nas costas dele, enquanto os movimentos se tornavam profundos, certeiros, atingindo sempre o ponto que o fazia perder o fôlego. Palavras incoerentes escapavam de sua boca, a cabeça batendo contra os travesseiros.

— Está gostando assim? — perguntou Akihiro, num sussurro arrastado, mantendo o ritmo lento, romântico, exatamente como ele havia pedido.

Jun gemeu alto, a voz embargada, sem o menor resquício de contenção.

— S-sim… dentro de mim… tão fundo… — as palavras escaparam antes que pudesse censurá-las, e o rubor que tomou seu rosto só fez o alfa sorrir contra sua boca.

Akihiro aprofundou mais a estocada, girando os quadris de forma calculada até atingi-lo no ponto exato que o fazia tremer.

— Já devo estar na entrada do seu útero… — sussurrou, a voz baixa, quase um rosnado contra o ouvido dele. — Você está me apertando como se quisesse me prender aí dentro, com certeza deve estar sentindo.

O gemido de Jun se transformou em um grito contido, o corpo arqueando de prazer incontrolável.

— N-não fala assim… — tentou protestar, mas os quadris se moveram sozinhos, buscando mais, implorando sem palavras. — A-Akihiro… pare… pare de beijar meu útero assim…

A risada abafada do alfa vibrou contra a pele de sua garganta. Ele segurou a mão de Jun, beijando os dedos antes de entrelaçá-los aos seus.

— Olha você… Você teve sua chance de correr. — Ele mordeu-lhe o lóbulo da orelha com firmeza. — Eu disse que não vou te largar.

Jun enterrou as unhas nas costas dele, os olhos turvos de prazer, finalmente cedendo ao que nunca tinha permitido a nenhum outro: responder sem filtros, vulnerável e entregue.

— Eu… não quero que você pare… por favor.

Os quadris de Akihiro aceleraram, aumentando a força e a cadência. O som de pele contra pele misturava-se aos gemidos, preenchendo o quarto em uma sinfonia carnal.

Akihiro rosnou baixinho, estreitando o abraço contra o corpo de Jun, os dois tão próximos que pareciam fundidos.

— Você sente isso, querido? — murmurou rente à orelha dele. — Sou eu fodendo você bem onde mais precisa…

Jun o agarrou com as pernas, puxando-o para mais fundo, como se não suportasse nenhuma distância.

— M-me beija… por favor…

Akihiro poderia tê-lo feito sem esperar, mas a súplica o excitava ainda mais. Então o beijou, com uma força possessiva, engolindo-lhe os gemidos enquanto a língua o dominava tanto quanto o corpo. Sua mão desceu até o quadril de Jun, segurando-o firme, inclinando-se para acertar cada investida com precisão.

Um grunhido gutural escapou quando empurrou pela última vez, enterrando-se por completo. O corpo de Akihiro estremeceu ao gozar fundo, o calor latejando dentro da camisinha. A sensação arrastou Jun junto, seu próprio clímax se espalhando entre os dois, o corpo inteiro tremendo enquanto se agarrava ao alfa, dedos entrelaçados apertando com intensidade.

Por um momento permaneceram assim, respirações entrecortadas, fundidos em um mesmo calor. Quando Akihiro se retirou, o choramingo de Jun soou quase infantil, como se fosse injusto estar vazio de repente.

A camisinha ficou dentro dele. O alfa a puxou para fora com um estalo úmido. Seu olhar, no entanto, permaneceu fixo na entrada ainda pulsante, marcada por ele.

— Não me parece satisfeito… — murmurou, sem esperar resposta, deslizando dois dedos de volta para dentro, esticando-o outra vez.

Jun arfou alto, o corpo reagindo antes que pudesse pensar.

— Isso… — Akihiro sorriu, os dedos se curvando no ponto exato que o fez perder o ar. — Temos a noite inteira afinal… Está bem com isso, Jun?

Jun ergueu os olhos, ainda ofegante, os lábios entreabertos.

— Sim… eu estou bem — respondeu, sem hesitar, embora a voz saísse trêmula.

Um sorriso lento desenhou-se nos lábios de Akihiro, satisfeito tanto com a resposta quanto com a entrega que ela carregava.

——

A madrugada repousava pesada do lado de fora, silenciosa como se o mundo tivesse adormecido inteiro. Dentro do quarto, no entanto, Jun permanecia desperto, sentado na beira da cama com os pés quase tocando o chão frio. O lençol escorregava por sua cintura, revelando marcas sutis na pele — rastros de uma noite em que se entregara como nunca antes.

Ele tremia, mas não de frio. O coração batia acelerado, como se ainda estivesse preso à cadência dos movimentos que haviam se repetido horas antes, ora lentos, ora urgentes. As mãos descansavam sobre os joelhos dobrados, os dedos apertando-se entre si em busca de algum ponto de ancoragem.

Atrás dele, Akihiro dormia profundamente. O corpo do alfa estava parcialmente exposto, o peito largo subindo e descendo em intervalos compassados, a respiração pesada como quem carregava o mundo inteiro nos ombros, mas, por algum capricho, naquela noite tinha conseguido repousá-lo. Havia uma serenidade incomum em seu rosto — a expressão de alguém que raramente concedia a si mesmo o direito de descansar.

Jun desviou o olhar, incapaz de sustentar por muito tempo a visão. O cheiro estava em toda parte.

Não apenas o odor natural do quarto, nem apenas o suor da noite: eram os feromônios de Akihiro impregnados em sua pele, no lençol, no ar rarefeito que parecia mais denso a cada respiração. Profundo, amadeirado e mineral, com notas que lembravam cardamomo e mirra, cedro e ferro quente. Havia uma força primitiva naquela fragrância, como se cada partícula quisesse reivindicá-lo, marcá-lo de forma invisível. Jun sabia que, dali a dias, talvez ainda carregasse esse rastro, mesmo depois dos banhos, mesmo depois de voltar ao trabalho.

O problema não era o cheiro em si — era o que ele evocava.

Cada detalhe daquela noite havia sido tecido com uma ternura inesperada, como se cada gesto fosse feito não para possuir, mas para convencer.

E Jun, contra todo o instinto de autopreservação, acreditara.

Encostara a cabeça no peito de Akihiro horas antes, ouvira o compasso do coração dele até o sono chegar — mas não para si. Para ele, dormir era impossível. Não depois daquilo.

As lágrimas começaram a descer sem aviso, quentes contra a pele fria de seu rosto. Jun inclinou-se para a frente, pressionando a boca contra os dedos fechados, sufocando o som. O corpo não doía, o contrário: sentia-se leve, percorrido por uma estranha vitalidade, como se cada nervo tivesse sido desperto de uma vez só. E era justamente isso que o atormentava.

“Não vai acontecer de novo” — pensou, como se fosse um mantra necessário. — “Não era real.”

As palavras ecoavam em sua mente, cada vez mais duras. Tudo tinha nascido de uma provocação infantil, que aquela seria a chance de Akihiro ser romântico. E o alfa, movido por aquele espírito competitivo, simplesmente se lançara ao desafio. Cumprira o que prometera. Cumprira tão bem que Jun agora não sabia mais distinguir onde terminava a atuação e onde começava a verdade.

Talvez fosse só isso: uma performance, como tantas outras que Jun conhecia de perto. Era parte de seu trabalho interpretar os desejos alheios, vestir-se de papéis, entregar ao cliente a fantasia que ele pagara para ter. Talvez Akihiro não fosse diferente.

Mas se fosse?

O pensamento veio como um estilhaço, doloroso e breve, mas suficiente para abrir fendas em sua certeza. Akihiro, aquele mesmo homem que dizia não acreditar em vínculos, que zombava do conceito de romance, conseguira naquela noite recriar algo tão convincente que Jun quase se convenceu de que não estava sozinho no sentimento.

As lágrimas voltaram mais fortes. Ele passou a mão pelo rosto às pressas, como se pudesse esconder até de si mesmo a fraqueza, mas o coração ainda corria, ansioso, apaixonado demais para aceitar a lógica fria que tentava impor.

Jun respirou fundo, fechou os olhos e permitiu-se mais alguns segundos de desordem antes de recompor a postura. Não queria acordá-lo. Não queria que Akihiro visse o quanto aquilo o desestabilizava. Afinal, o alfa dormia tranquilo, e a tranquilidade dele, pelo menos, Jun não queria roubar.

Ainda assim, quando olhou para trás mais uma vez, o peito pesado se expandindo sob o lençol e a expressão serena que raramente aparecia, uma dúvida inevitável atravessou sua mente, cruel e doce ao mesmo tempo:

E se não tivesse sido atuação?

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Capítulo 6
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Laços em Carmesim

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Akihiro Hanamura sempre acreditou que laços afetivos não passavam de ilusões passageiras – convenções sociais frágeis que encobriam a inevitável falência das relações humanas. Como...

Chapters

  • Capítulo 7 O coração exausto de Jun
  • Capítulo 6 O Gosto da Ternura
  • Capítulo 5 Junhos Possíveis
  • Capítulo 4 Proposta Intrigante e Tentadora
  • Capítulo 3 Sedução no Palco, Verdades no Encontro
  • Capítulo 2 - A primeira intersecção
  • Capítulo 1 - Uma Noite ao Acaso

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