Capítulo 70: O Caminho de Volta

Por causa do ocorrido na noite anterior, Yan Qiu não dormiu bem. No dia seguinte, começou a considerar a possibilidade de se mudar.

Embora ele achasse que tinha deixado claro na noite anterior que ninguém deveria incomodá-lo novamente, ficou evidente que não havia pessoas normais na família Fu.

Mesmo que Lu Ruan sempre se mostrasse arrependida na frente dele, Yan Qiu sabia que “o lobo perde o pelo, mas não perde o vício”. Se pudesse voltar no tempo, ela faria as mesmas escolhas. Se a família Fu não tivesse caído, Fu Chenze não tivesse morrido e Fu Shuangchi não tivesse partido seu coração, ela ainda não teria olhos para ele.

Agora, toda essa atuação não passava de um consolo para ela mesma.

Cansado por não ter dormido bem, Yan Qiu estava exausto. Assim que chegou ao escritório de Li Zhi, cobriu-se com aquele cobertor rosa e adormeceu no sofá.

Quando Li Zhi voltou de uma reunião, encontrou essa cena.

Yan Qiu, coberto pelo cobertor, estava encolhido, com a cabeça enterrada nos braços, parecendo um coelhinho desamparado. O cobertor rosa contrastava com ele de uma maneira curiosa.

Com receio de que ele sentisse frio, Li Zhi ligou o aquecedor.

No entanto, Yan Qiu tinha um sono leve e acordou assim que ouviu o barulho. Meio confuso, sentou-se no sofá, esfregando os olhos e perguntando: “Você terminou a reunião?”

“Terminei.” Li Zhi se aproximou e sentou-se ao seu lado, levantando a mão para massagear suas têmporas.

Embora o ato mais íntimo entre os dois fosse apenas um beijo rápido, havia uma sensação de velhos casados, e Li Zhi gostava disso.

“Não dormiu bem ontem à noite?” perguntou Li Zhi.

“Não.” Yan Qiu se encostou nele, suspirando: “Tenho que ir ver alguns apartamentos mais tarde.”

“Por quê?”

Yan Qiu suspirou e contou a ele tudo o que aconteceu na noite anterior.

Enquanto falava, por algum motivo, Yan Qiu lembrou-se de um aniversário passado na família Fu.

Por muitos dias, ele esperou ansiosamente, estudando como brindar, praticando como se apresentar aos convidados, mas…

Depois, percebeu que não passava de uma piada.

“Mas, depois de tantas decepções, a gente para de esperar.” Yan Qiu sorriu amargamente. “Não é estranho? Quando você quer algo, nunca te dão; mas quando você não quer mais, insistem em te oferecer.”

Li Zhi sabia como tinha sido a vida de Yan Qiu e conhecia a parcialidade dos Fu. Então, acariciou seu cabelo com ternura e disse: “Vamos nos mudar para a casa. Ela foi feita para você.”

Depois de uma pausa, Li Zhi acrescentou: “E para nós também.”

Yan Qiu já tinha entendido as intenções de Li Zhi, mas ouvi-las dele causava uma sensação diferente.

Yan Qiu olhou para ele e, envergonhado, baixou a cabeça, encostando-se silenciosamente em seu ombro.

Li Zhi não o apressou, esperando pacientemente que ele decidisse.

Depois de pensar por um longo tempo, Yan Qiu finalmente se decidiu: “Li Zhi, vamos para Qian’an juntos.”

A nogueira ainda não tinha florescido, mas ele não podia mais esperar.

Li Zhi compreendeu seu desejo e respondeu: “Certo.”

Dezembro.

No dia em que voltaram para Qian’an, nevou o dia todo.

Qian’an era pequena e não tinha aeroporto, então tiveram que pegar um carro por meia hora após o voo.

Yan Qiu saiu do aeroporto e, ao ver a neve, lembrou-se de quando voltou sozinho de A City.

Na mesma tempestade de neve, ele, para evitar os Fu, arrastou seu corpo cansado, caminhando e parando.

Naquela época, ele não via um caminho de volta, mas depois encontrou uma nova vida.

Lembrou-se de um gato branco que encontrou no caminho e ficou triste.

Será que o encontraria de novo?

“Li Zhi.” Pensando nisso, Yan Qiu sugeriu: “Vamos caminhar até lá.”

Ele esperava que Li Zhi perguntasse por quê, mas não o fez.

Li Zhi apenas segurou sua mão com gentileza e respondeu: “Claro.”

Yan Qiu apertou a mão dele, caminhando juntos pela neve.

O chão estava coberto de neve, e cada passo fazia um som de “crec-crec”.

Nenhum dos dois usava guarda-chuva, e logo estavam cobertos de neve, mas Yan Qiu não sentia frio, pelo contrário, sentia-se aquecido.

Talvez fosse porque seu coração estava quente.

“Uma vez, eu também voltei a pé.” Yan Qiu disse, olhando para a estrada familiar.

“Sério?”

“Sim, numa tempestade de neve, caminhei por muito tempo. Quando estava com fome, comprava algo para comer. Quando estava cansado, dormia em pequenos hotéis. Andei por muito tempo até finalmente chegar.” Yan Qiu omitiu os detalhes dolorosos, tentando simplificar a história.

“Ali adiante, comprei um inhame assado muito bom. Será que ainda está lá?” Yan Qiu disse com esperança na voz.

“Encontrei um gatinho branco no mato. Ele era muito manso e me acompanhou por um bom tempo.”

“Mas, depois…” A voz de Yan Qiu ficou triste. “Ele desapareceu.”

Li Zhi apertou sua mão e disse suavemente: “Cada gato tem sua missão. A missão dele era te levar para casa. Se ele desapareceu, é porque cumpriu sua missão.”

Com essa explicação, a tristeza de Yan Qiu começou a desaparecer.

Quando estava prestes a responder, Yan Qiu avistou a barraca de inhames assados e correu para comprar dois.

Um para ele e outro para Li Zhi.

“Este é muito doce.” Yan Qiu disse, com um pensamento passando por sua mente.

Na vida passada, foi nessa época que encontrou “Diudiu”. Será que o encontraria novamente?

Sem conseguir se conter, Yan Qiu correu para o pequeno parque onde encontrou Diudiu da última vez.

Mas, por mais que procurasse, não encontrou o gato.

Cansado, ele limpou a neve de um banco e sentou-se.

Li Zhi sentou-se ao seu lado, limpando a neve do cabelo dele, e perguntou: “O que estava procurando?”

“Diudiu, o gato que mencionei. Encontrei-o aqui e queria ver se o encontrava novamente.”

Yan Qiu, frustrado, deu uma mordida no inhame assado já frio. “Acho que não vou encontrá-lo.”

Li Zhi pegou o inhame da mão dele e deu-lhe outro, ainda quente.

“Talvez ele já tenha um novo dono. Um gato tão manso deve ter muitas pessoas que o amem.”

“É verdade.” Yan Qiu segurou o inhame quente, sentindo a tristeza desaparecer. “Alguém deve estar cuidando dele.”

Quando chegaram a Qian’an, a neve tinha parado e já era tarde. Com fome, entraram em um restaurante simples. Yan Qiu temia que Li Zhi não gostasse da comida, mas ele se adaptou bem.

Li Zhi pegou os hashis e, ao ver o olhar curioso de Yan Qiu, perguntou com um sorriso: “Por que está me olhando assim?”

“Pensei que você não se adaptaria.”

Li Zhi riu e respondeu: “Não sou tão mimado. Quando comecei a trabalhar na empresa, comia macarrão instantâneo e marmita por falta de tempo.”

Yan Qiu lembrou-se de ler sobre Li Zhi em um jornal e pensou em como mesmo alguém tão bem-sucedido como ele passou por momentos difíceis.

Mas por quê? Por que os pais de Li Zhi morreram em um acidente? Por que o mestre dele não o ajudou? O que aconteceu entre eles para que Li Zhi, recém-formado, tivesse que assumir a empresa sozinho?

Mesmo que Li Zhi parecesse invencível agora, Yan Qiu não pôde deixar de se sentir triste por ele.

“O que foi?” Li Zhi percebeu a mudança em sua expressão e perguntou.

“Nada.” Yan Qiu balançou a cabeça. “Só…”

Ele parou, achando suas palavras sentimentais demais, e apenas segurou a mão dele.

“Quero ficar ao seu lado, aconteça o que acontecer.”

Li Zhi ficou surpreso por um momento, depois segurou a mão dele, algo em seus olhos brilhando brevemente.

“Tudo bem, você fica comigo.”

Yan Qiu sorriu e estava prestes a continuar comendo quando ouviu um grande barulho atrás de si. O dono do restaurante gritava: “Saia daqui! Já avisei para não voltar! Saia agora!”

Yan Qiu e Li Zhi se viraram e viram uma senhora de casaco vermelho no chão, segurando uma garrafa de vidro vazia. Perto dela, um homem de casaco cinza tentava ajudá-la a se levantar. Pareciam ser um casal.

“Saímos, mas por que empurrar?” a senhora de vermelho disse.

“Ninguém empurrou! Você caiu sozinha! Não tente me enganar, tenho câmeras aqui.”

“Você!” A senhora levantou-se, tremendo de raiva, olhando ao redor.

Mas os espectadores estavam acostumados a essa cena e ninguém se aproximou para ajudar, todos assistindo a confusão de longe.

“Quem está tentando enganar quem? Quem?” A senhora tentou se defender, mas sua voz falhou.

“Eu?” O dono do restaurante pegou a garrafa vazia da mão dela e jogou fora.

Ele continuou: “Você já esqueceu que criou um menino chamado Yan Qiu?”