Arco 1 –  Oriente sem DESTINATÁRIO

Missão Ágape

Capítulo 16

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Era uma ação bastante ilegal, já que isso desacatava as ordens diretas do rei do submundo.

Mas eles estavam sob o escudo de proteção da rainha, e se algo acontecesse, se fossem pegos no flagra, ela iria intervir por eles.

— Então… você gosta de néctar. — disse Kýrios, caminhando lado a lado do moreno que evitava manter muito contato visual.

Por fora podia transparecer que não estivesse nem aí para o deus e seus inconvenientes discursos sobre sua intimidade e vida sexual, ou seus humores, como tinha acontecido quando o tinha encontrado bebendo com a rainha.

Mas por dentro… James ainda sonhava com as cenas extremamente ardentes da noite anterior, e toda hora sentia um frio na barriga que ia descendo até abaixo de seu umbigo quando olhava para o deus.

E aquelas insinuações da rainha sobre isso não lhe ajudavam em nada…

— Descobri hoje que sim.

— Hm, interessante. Eu tenho uma adega cheia daquelas garrafas. Poderia ter pedido a mim antes, quando ainda estávamos na minha mansão. Eu compartilharia com você sem problemas.

— Fica pra próxima. Guarde-as para uma ocasião realmente importante. Perséfone me disse que só se bebe aquilo quando há um evento importante.

— Então aquele encontro com a rainha era importante?

— Encontro? — James fechou os olhos, passou uma mão no rosto e revirou os olhos — Kýrios, qual é o seu problema? Ela já tem um marido! Um bem bravo por sinal. E… Não me interesso por pessoas comprometidas.

Uma grande contrariedade… Já que o loiro ao seu lado era comprometido, e mesmo assim, havia fantasiado com ele, e pior, se deixado levar até que tivesse seu desejo satisfeito.

— Hm, bom saber disso. Vou anotar em meus relatórios de missão. — disse Kýrios, com uma pitada de ironia e irritabilidade na voz.

— Kýrios, sério, hoje você está insuportável!

— Digo o mesmo de você! — Retrucou o deus, cruzando os braços.

— Rapazes, por favor, preciso pedir silêncio. Estamos quebrando ordens aqui, precisamos de descrição. — lembrou.

Ambos então se viraram para frente, numa espécie de gesto quase infantil de duas crianças birrentas sendo advertidas por um adulto, e seguiram assim sem se falar até que a rainha parasse em frente a uma porta cheia de correntes, eram tantos que parecia que estavam mantendo um prisioneiro de alta perigosidade ali dentro.

Perséfone então ergueu uma mão, e girou seu punho como se estivesse com alguma chave.

— Aconselho irem um pouco para trás. Essas correntes os podem machucar. — Orientou a deusa, que logo fez outro sinal, mas dessa vez com a outra mão, um outro giro de pulso, mas este terminou com uma abertura exagerada de dedos se esticando para pegar algo invisível, pelo menos para os olhos do rapaz e do deus.

As correntes começaram a mudar de forma, de metais para uma coisa orgânica e ameaçadora, era assustador, cinzento e se mexiam constantemente.

— O que é isso? — perguntou James, um pouco receoso de ver aquelas formas se embolando umas nas outras como cobras sem cabeça ou algum fim.

— São pescoço de hidras. Fui em quem deu essa ideia. Porque, veja, se alguém tentar entrar aqui sem a permissão de uma autoridade, ficará preso por entre esses pescoços, e não há como fugir, a não ser por quem tem o conhecimento do encantamento.

— Bem engenhoso. — Elogiou Kýrios dando um passo a frente um tanto interessado — Elas sobrevivem a luz?

— Infelizmente não. Viram areia assim que algo muito luminoso como uma estrela entra em contato com suas peles.

— Ah, que pena. Eu já ia pedir essa tecnologia para por em alguns de meus aposentos de minha mansão. Há coisas muito valiosas que tenho que guardar.

— Talvez um portal noturno possa dá um jeito.

— Deuses que livrem! Já usei um desse, e fiquei uma vez por quase dois dias sem ver a luz do dia, perdido numa imensidão sem lado ou direção. Até hoje não consegui tirar o encantamento de uma das portas de lá.

— Espera, tem uma porta dessas na sua mansão? — perguntou James, e o mesmo fez que sim — E se eu me perdesse e fosse em uma dessas portas?

— Passaria fome e morreria sem ninguém para enviar mensagem de ajuda, já que somente quem está de fora pode ajudar.

James ficou um tanto indignado pela falta de orientação, e agradeceu aos céus por ter tido a sorte de somente ter se perdido em portas que lhe levaram para lugares normais do que era mais aceitável ao seu cérebro.

Perséfone juntou as mãos e as abriu como se estivesse separando cortinas, e logo o mesmo acontecia com os pescoços de hidra, que não paravam de se mexer por um segundo, mas se moviam em todas direções fazendo uma abertura tal qual igual como nos gestos que a rainha fazia.

— Pronto, podem entrar. Mas não se demorem. Vou ficar aqui cuidando da entrada.

Com este aviso, James e Kýrios entraram.

Do lado de fora nem parecia que iriam entrar em um lugar tão imenso. Nem parecia que fazia parte do castelo, era como um dos muitos lugares que existia ali na região do castelo do submundo.

Era uma caverna, disso tinham certeza, e na parede bem ao fundo e com uma iluminação focada em fileiras de tochas, estava um gigante preso em correntes anexadas nas pedras.

— Panoptes… — disse Kýrios, correndo até o amigo, e James foi atrás.

A aproximação foi percebida logo pelo gigante, que estava com o corpo todo costurado em regiões onde haviam seus olhos, estava trajando um trapo todo sujo de seu próprio sangue, e a única parte ilesa eram a região de seus dois olhos, que logo reconheceram quem eram seus visitantes.

— Kýrios… Sr. Payne… — disse, muito fraco, sentado recostado contra a parede.

— Pano, o que lhe fizeram? Lhe torturaram?

— Sim… Mas… foi preciso. Estou liberto agora. Posso agora caminhar com minhas próprias pernas! E olhos…

— Todos esses focos de costura… Eram onde ficavam seus olhos… — perguntou James, e o gigante lhe sorriu.

— Que bom que ainda continua inteligente e perceptivo. E… — O gigante farejou o ar, e sentiu algo vindo do rapaz — Isso é néctar?

— Oh, sim… Eu bebi um pouquinho…

Panoptes arregalou os olhos e olhou para o deus à direita em busca de uma explicação sobre aquilo.

— Não olhe para mim assim, ele é o que tem toda a culpa. Se ele virasse uma poça de carne, não seria minha culpa! Não dessa vez…

— O que?! Espera… Eu poderia morrer bebendo aquilo?!

— Isso não… vem ao caso agora… — disse Panoptes, muito cansado — Vocês estão aqui para me libertar?

Kýrios e James se entreolharam.

— Viemos aqui porque… Hades nos disse que você é um traidor da nossa causa.

— Em parte, é verdade. De início eu não sabia. Mas depois que descobri… eu tentei me ocultar. Vocês estão de prova que para onde eu ia com vocês eu me enfaixava. Mas ainda sim… alguma hora eu tinha que tirá-los para poder respirar melhor! Como eu poderia tomar banho ou me limpar de faixas? Por isso, sempre me mantive o mais distante das coisas o máximo possível. E mesmo assim… não adiantou… — contou.

— Saiba, Panoptes, nós acreditamos em você. — disse James, se aproximando e colocando uma mão sua no peito do gigantesco pé do cocheiro, ou melhor, gigante — Você fez o que podia.

— Obrigado pelo reconhecimento. Mas eu errei, eu devia contar a vocês o que eu estava passando…

— O quanto Hera agora sabe? — perguntou Kýrios.

— Sabe que estamos com o novo Pista de Parca. Sabe de nossa ida em Varanasi. Por isso odeio aquele lugar… Se não fosse todas aquelas canelas ou pimenta, e coceiras… — bufou irritado — E a última coisa ela que sabe é que vamos para…

James compreendeu muito bem o que ele quis dizer. E se colocou no lugar do gigante. É, ele também ficaria irritado se tivesse cem olhos e fosse para um local que tivesse coisas irritando todos seus olhos.

— China. — James completou a fala do gigante, e Kýrios lhe mirou curioso — É, pois é. Consegui decifrar todos aqueles enigmas. A região fica na China. Agora só falta termos o norte exato para chegarmos lá antes desses conspiradores. — disse, se virando para o deus, que logo entendeu o que ele tinha que fazer.

— Oh, certo… — o deus tirou de seu bolso aquele pingente de flecha, e ergueu a outra mão, pedindo para que James pousasse a sua em cima da dele.

— Odeio cortes.

— Farei o possível para que não doa. — disse, e num movimento muito rápido, fez um corte muito preciso bem na linha da vida com aquele pingente de flecha. E como foi da última vez, cumpriu o que prometeu.

O sangue pingou no chão, se misturando à terra, e magicamente começou a se mover formando uma gravura que parecia ser uma cobra.

— Serpente? Isso é uma dica sobre a cidade? Hm, não conheço nenhuma cidade que adore cobras. A não ser no domínio egípcio. — comentou Kýrios, se agachando ao mesmo tempo que James, que se aproximou do desenho para analisar melhor.

— Não. Não é uma serpente…. Eu já vi esse formato em algum lugar… Isso são morros… e a linha de sangue que está em cima delas… Isso me parece… — James fechou os olhos, se esforçando para se lembrar de onde vinha a familiaridade daquelas formas.

Um dia seu pai tinha recebido algo muito valioso para ser restaurado e que vinha de um contrato muito secreto vindo do Oriente.

James naquela época era somente um moleque de apenas dez anos, ainda amava estar com seu pai e por entre aquelas coisas velhas em seu escritório, mas o que o deixava mais maravilhado era ficar sentado na cadeira de seu pai e escuta suas histórias de viagem, ou sobre as várias mitologias que existia naquele mundo.

“Este é um exemplar jarro de jade da Dinastia Ming, e prosperou sob o terceiro e maior imperador que se chamava Yongle, para a nossa tradução se chama…”

— Felicidade Perpétua! — disse James de repente.

— Não entendi. — disse Kýrios, tentando achar sentido na informação que o moreno soltou do nada.

— Felicidade Perpétua. Era o nome do imperador da Dinastia Ming. E esse desenho que se formou no aqui representa a Grande Muralha!

— Por deuses, você é um gênio! — elogiou o loiro, se levantando muito animado — O que estamos esperando? Vamos logo em busca!

— Kýrios. São mais de vinte mil quilômetros de muralha. Achar uma pista nesse lugar é o mesmo que procurar uma agulha pela cidade de Londres. E outra, Panoptes ainda está aqui preso. Não podemos deixá-lo para trás.

— Estou começando a virar seu fã, Sr. Payne. — disse o gigante, cruzando suas pernas para poder relaxar um pouco.

— Deuses… Porque é que tem sempre que haver algum obstáculo? — Kýrios suspirou em cansaço —  Não se preocupe Pano, não é sobre você. Concordo plenamente que temos que te libertar daqui. O problema de que estou me referindo é que agora temos que achar esse local específico de nossa busca… Estava fácil demais para ser verdade… — e toda aquela animação foi pro ralo, e o deus se sentou novamente no chão.

— Temos que pensar. Por exemplo… Você, Kýrios, tem algum contato com alguma divindade de lá? — perguntou James — Pode ser até um espirito, qualquer ajuda é bem-vinda.

Kýrios pensou um pouco, até se lembrar de alguém.

— O domínio de lá é bastante fechado. Tem… uma certa organização bem rígida e disciplinada, então é bem difícil de se interagir com eles. Mas… Vou contar uma pequena história, prometo que não vou me demorar. É só para esclarecer e não ficarem pensando alguma coisa porque eu… Bem…

— Ok, pode começar. — disse James, interrompendo o deus.

— Tudo bem… Bom… Eu e Psiquê uma vez estávamos entediados, e ela me propôs um desafio: que eu ficasse amigo do deus ou de outra deusa que fosse do mesmo ofício que o meu. E eu, claro, fui executar tal desafio!

— E conseguiu?

— Fui chutado de lá pelo Imperador de Jade, o deus criador deles. E foi aí que um milagre aconteceu… Minhas roupas ficaram todas em trapos, uma “mensagem” para eu e ela não por mais os pés lá, mas então, enquanto eu e minha amada estávamos pela estrada, maltrapilhos como se o mundo estivesse nos abandonado, apareceu um casal de jovens muito simpáticos vindos de uma casinha no meio do nada. De princípio fiquei desconfiado. Mas Psiquê, como sempre muito analítica, me disse para confiar neles. E não é que ela estava certa! Esse casal nada mais eram do que Niu Lang e Zhi Nu! Os deuses do amor! É ou não uma grande sorte! Eu apostava que era uma deusa, e Psiquê apostava que era um deus, mas nós dois ganhamos a aposta! E ela, Zhi Nu, nos fez roupas novas, e nos deu parabéns pela nossa história, principalmente por Psiquê, que tinha sido uma brava guerreira por ter enfrentado os deuses e tudo mais para ficar comigo.

— É realmente impressionante… — disse James, tentando apressar o deus — Mas ok, você ainda tem algum contato com esses deuses?

— Não. Infelizmente. Estou banido de lá por tentar, como o Imperador disse em suas palavras “Bagunçar a ordem e o equilíbrio do universo”. Oras, como que vou bagunçar o universo somente com um convite para cear em minha mansão? Se fosse Ares convidando tudo bem, mas eu? Quem acha que criou o símbolo de paz e amor? Eu! E Psiquê, claro. A maior parte foi dela.

James, quanto mais escutava, mais ficava pensativo em como ia executar aquele plano. Ser um deus e entrar no domínio de outros sem interferir é um, mas ser um deus banido do domínio do outro… Aí já era um outro grande problema.

A não ser… por uma coisa.

— Eu tenho uma ideia. Mas não sei se vai aceitar.

— James, estamos em missão, o que tiver que ser feito, será feito.

— Então, meu plano é o seguinte…

James começou a explicar, e tanto o deus como o gigante ficavam com expressões preocupadas a cada segundo em que processavam e digeriam aquele plano.

Era muito arriscado, arriscado num nível divino!

— Por mim tudo bem. Já tiraram tanta coisa de mim mesmo. — disse Panoptes.

— Isso é… Bom… Eu não imaginava que tínhamos que chegar a esse ponto… Hades irá fazer isso com muito gosto. Deuses, estou vendo-o mandar Orpheu escrever uma canção sobre isso! — disse, ficando muito incomodado pela ideia.

— É o único jeito. Ou então, eu posso ir sozinh…

— Não! Não vou deixá-lo ir assim sem nenhuma proteção. Posso virar um mortal, mas tenho algum conhecimento de como me defender sem precisar de magia ou coisa do tipo. — disse, um tanto pensativo com alguns detalhes o plano — Apolo vai com inveja de minha habilidade com arco e flecha sem todos meus poderes! Acho que estou começando a me animar.

— Seja o que De… que os deuses quiserem. — disse James, um pouco inseguro sobre seu plano.

•

Hades ficou muito irritado por saber que Kýrios e James estiveram visitando seu amigo gigante, que tinham desacatado suas ordens, mas sua fúria foi abrandada quando Perséfone interveio pelos dois, explicando tudo do porque estavam ali.

— … por isso que temos que ir logo atrás de nossas pistas! — disse Kyrios, terminando de explicar o restante de sua situação.

Hades ficou pensativo, analisando todo aquele caso, principalmente por saber que a próxima direção que iam tomar era para o Oriente, e ele conhecia como eram as coisas por lá, sabia o quanto o panteão chinês não aceitava estrangeiros em seus negócios. Diferente do domínio de James, ou dos nórdicos mais ao norte.

— Permitir vocês irem até lá seria o mesmo que despertar a fúria deles. Já tenho problemas demais com nossa própria gente.

— Mas e o nosso plano que acabamos de explicar? Tem que admitir que é um bom plano! — insistiu Kýrios.

— De toda forma, é um risco. E não estou disposto a arriscar. — Hades olhou com preocupação para Perséfone e para suas filhas.

James percebeu que apesar de aquele deus sempre exibir uma cara carrancuda e emanar uma aura de terror até quando falava, via em seu olhar obsidiando que havia um temor por quem ele se importava. Estava claro que não estava sendo egoísta, só queria proteger que amava.

— Lorde Hades, sinto muito, mas tenho que ser insistente. Eles já podem estar na nossa frente nessa busca. Quanto mais rápido agirmos, mais chances temos. E, aquele outro assunto tem que ser deixado para depois. — disse o deus do amor.

— Vossa Majestade, sei que é muito difícil ter que concordar com ele, eu entendo — começou James —, mas esse é o único jeito. Além do mais, não essa é uma grande chance para fazê-lo de saco de pancadas? Não tem coisa melhor que isso?

— Ei! — indignou-se o loiro.

Hades inclinou-se para frente, encarando James, e mudando para uma expressão mais interessada.

— O quanto eu quiser?

— Ele é todo seu.

— James!

— Kyrios, é por uma boa causa. — Rebateu, mas usando uma expressão que se o loiro já não o conhecesse mesmo que fosse por bem pouco tempo, cairia em seu ar inocente que parecia estar desentendido da indignação dele.

Kýrios sabia do porquê daquela insistência do rapaz em convencer o rei a maltratá-lo daquela maneira, e por isso, em parte, achava graça e ao mesmo tempo muito charmoso o jeito maquiavélico e elegante que o rapaz agia para somente ter sua vingança pessoal.

— Sim, está bem. Mas creio que vou receber uma recompensa pelos danos extras do planejado, não? — perguntou ao deus do amor, mas aquela pergunta tinha sido mais para o rapaz ao lado.

— Creio que Vossa Majestade não precise recompensar nada. Já que isso é um sacrifico seu, não dele. — respondeu James, antes do rei responder.

Perséfone e suas duas filhas se entreolharam, e deram risinhos cúmplices, entendendo qual era a situação ali entre o rapaz e o deus.

— Lorde Hades, peço que se decidir colaborar com isso, que não envolva ressentimentos pessoais. — disse Kýrios.

— Vou pensar sobre isso. — Declarou o outro deus, encerrando aquela audiência.

•

James e Kýrios foram para um aposento onde ficava guardados algumas armas menores, parecia uma coleção ou espólio dos mortos que iam parar ali, ou talvez fosse de alguns heróis que ainda se arriscavam em se aventurar naquele mundo através de oferendas e sacrifícios para poder chegar ali e ter seus objetivos concretizados.

James ficou surpreso de saber que isso ainda acontecia em pleno século XIX…

O rapaz observava o loiro se preparar, vendo que o mesmo era muito cuidadoso com tudo. Alinhava as flechas e ajeitava a corda de seu arco, colocava seu colete de couro, luvas de mesmo tecido, e depois analisava a envergadura da corda, testando até que ponto o arco ia. Aqueles movimentos eram precisos, e ressaltavam alguns músculos dos braços e costas.

— Cuidado para não escorregar em sua própria baba, James. — disse de repente o deus, fazendo James acordar de sua distração.

Arqueando uma sobrancelha, cruzou os braços e se levantou de uma coluna onde se apoiava recostando seu ombro, indo até o loiro.

— Espero que Hades quebre suas pernas ainda como um deus.

— James… — sorriu de canto, abaixando o arco e se virando para o rapaz — Tudo isso só porque…

— Você e sua mania de pensar que tudo gira em torno de seu pau. — disse James, lhe encarando — Mas já que você não tem muita capacidade mental para pensar em outra coisa, vou lhe conceder uma explicação bem rápida: O motivo de eu querer que Hades lhe mate bem rápido é para que não fique tão danificado. Um mortal não se recupera em segundos.

Kýrios lhe sorriu de canto.

— Hm… Ou seja… Está preocupado comigo.

— Estou preocupado com a missão! Se concentre.

— Porque eu deveria me concentrar? Eu tenho que perder mesmo. Aliás há uma falha nesse plano… Eu não poderia simplesmente falar com Tânatos para me ajudar com isso?

— Eu também pensei nisso. Mas supus que Tânatos não mata ninguém, ele só guia você quando a hora chega. E também tem o fato de que estão de olho nele. Ele ainda não disse, mas creio que esteja sendo vigiado, seus pergaminhos, sua lista… Pense bem, se os deuses conspiradores soubessem de sua morte, não estariam mais atrás de nós. Mas por saberem, talvez pelo Tânatos de que você está vivo pelo relatório que ele possivelmente deve estar sendo obrigado a dar, eles continuam e tentam nos encontrar e impedir nosso avanço. E Hades sabe disso, sinto isso. E a prova está quando ele só concordou porque mostrei a ele que ele pode se envolver sem se prejudicar. O Olimpo com certeza vai chamá-lo para relatar também de seu feito por “matar” o principal fugitivo. Tem que haver um ato bélico para verem que ele está falando a verdade. Vocês todos são cheio de artimanhas mágicas, quem sabe não exijam ver essas cenas em sua mente? E Hades com certeza tem poder suficiente para manipular e deixar que vejam somente o que querem ver, a sua morte pelas mãos dele.

Kýrios lhe mirou fascinado pela sua dedução, não sabia também que aquele rapaz poderia ter uma cabeça assim tão estrategista.

— Deuses… É você mesmo, James?

James sorriu de canto, e voltou a se sentar na beira da coluna, dando de ombros como se aquilo não tivesse sido nada.

— James, eu tenho que te dizer, pode ser que… Você pode ter passado sua vida inteira sem saber o seu talento. Acho que pode estar descobrindo agora.

— Talento? Para quê?

— Você seria um bom detetive, talvez.

James ficou um pouco pensativo, e a sugestão sobre isso lhe despertou uma fagulha de algo que a muito não sentia: vontade de ter um objetivo de vida.

Podia odiar a ideia de estar trancafiado em um escritório restaurando coisas e fazendo relatórios para velhos ricos que não se importavam com seu bem estar a não ser com o lucro. Mas a ideia de estar num escritório resolvendo casos misteriosos… isso lhe entusiasmou um pouco.

— Até você está querendo me botar para trabalhar? E onde está o lance que me disse que iria me bancar enquanto eu o ajudasse?

— Estou cumprindo. Mas… — o deus abaixou os ombros, ficando com um semblante meio triste — Como você me disse lá em Varanasi, uma hora isso tudo vai acabar. E tanto eu como você vamos tomar rumos diferentes. E penso em como você ficaria. E creio que a resposta está vindo aos poucos. E esse pode ser seu destino depois de tudo. Livre, e trabalhando com o que gosta enquanto viaja o mundo. Não é uma ideia legal? Fazer o que ama?

James ficou um pouco surpreso de saber que o outro pensasse em seu futuro. Tudo bem que seus pais também pensavam, e até lhe deram a chance dele mesmo escolher alguma coisa até imporem aquela vida planejada e sem graça. Mas o que diferenciava deles para o que o loiro estava dizendo é que ele estava somente mostrando uma opção baseada em suas observações, mostrando logo algo em que ele fosse bom e que pudesse gostar realmente.

— É uma excelente ideia, eu acho. — disse James, dando de ombros para fingir que não ficou um animado com aquela ideia, mas mesmo assim deixou o deus muito contente.

— E assim poderíamos continuar juntos! Imagina só eu e você resolvendo essas coisas perigosas e…

— Espera, Kýrios, como assim continuarmos juntos? Se esqueceu do que eu falei e do que acabou de falar sobre seguirmos nossos rumos? Lembre-se que no fim de tudo você encontrará sua esposa, e tudo voltará aos trilhos, como deve ser.

Kýrios de repente se deu conta, havia momentaneamente se esquecido…

— Você… tem razão. Eu… Me desculpe. É que estou tão focado nessa coisa toda que eu… Bem…

— Eu te entendo. Mas não vamos pensar nisso. Temos que focar em nosso objetivo. Que é…? — disse, compreensivo, pois viu uma certa instabilidade emocional no outro.

— Que é morrer pelas mãos daquele rabugento.

— Exato. Então, boa sorte.

— Sim, que as sorte me proteja. — disse, fechando os olhos e dando um aceno de cabeça em agradecimento, mas também, para conter e esconder sua vontade de deixar seus olhos marejarem.

•

Nem James e nem Kýrios imaginavam que pudesse existir ali no submundo um local tão grandioso e bem requintado como era aquele coliseu. Não haviam pessoas, mas mesmo assim os gritos e assovios da torcida fantasmagórica e de monstros, que davam “vida” e entusiasmo a aquele evento, preenchia o vazio das ruínas aonde estavam.

Hades já estava na arena, preparado com sua armadura negra e muito assustadora. Havia cristais nas ombreiras, muito afiadas e mortais, os mesmos nos braços, peitoral e nas luvas. Estava todo equipado para matar.

— Ele não vai usar nenhuma arma? — perguntou Kýrios à Perséfone, que lhe guiava até o seu esposo.

— Vamos dizer que ele está bem inspirado hoje. São tantos olhos lhe mirando e torcendo pela vitória de seu senhor. Ele quer lhes dar uma boa apresentação de seu poder sem quaisquer aquisições iniciais, por enquanto.

Kýrios engoliu em seco. Ele estava com seu arco na mão e uma aljava cheia de flechas. Mas não as que usava em seu trabalho, onde acertava os corações desprotegidos e os mergulhava em paixões e amores intensos.

— O jovem Sr. Payne parece preocupado. — comentou Perséfone, olhando lá para a arquibancada, e vendo o moreno sentado, mas estava um pouco inquieto enquanto hora e outra se desculpava com as deusas filhas de Hades.

— Que nada. Ele está é ansioso para me ver sendo chutado no traseiro e pisoteado até morrer. Essas coisas bobas que amigos desejam um ao outro.

A rainha riu breve balançando a cabeça em negativa.

— Ah, Kýrios, você tem tanta sorte.

— Porque diz isso?

— Porque até entre nós, deuses, não temos oportunidade para sermos felizes. E você, mesmo que por anos tendo perdido tudo e até o próprio nome, ainda conseguiu encontrar uma gota de esperança para confortar seu coração. Cuide bem dele. E se der tudo certo, não o deixe. Faça de tudo para cativá-lo pra si.

Kýrios franziu o cenho e olhou muito confuso para a rainha.

— Lady Perséfone… Eu realmente não estou conseguindo entender o que quer dizer. Deve saber o porquê estou fazendo tudo isso, não sabe? Se eu fizer o que está me aconselhando, creio que seja isso, eu não seria diferente de outros deuses?

Perséfone sorriu, mas seu olhar triste deixava tudo ainda mais sem sentido para o loiro.

— Só… Guarde isso que te falei. No momento certo, me entenderá.

— Espero que sim, Vossa Majestade.

Quando Kýrios e Perséfone chegaram ao centro da arena, houve uma comoção da torcida, que ficou ainda mais em polvorosa pelo início do duelo.

— Almas desesperadas! Seres de todo o submundo! Estamos aqui hoje para o maior evento dentro desses cinco séculos depois da Grande Guerra contra os cães troianos! — a plateia aplaudiu, assoviou, e parou quando a rainha novamente levantou sua mão em sinal de que ia continuar a falar — Conseguimos capturar um dos principais criminosos e fugitivos de Afrodite, a traidora, que estava conspirando para o declínio do Olimpo!

Mesmo que fosse uma coisa toda combinada, mesmo assim, para o deus do amor, escutar aquilo lhe doía. A injustiça, toda dor causada por uma acusação infundada com tantos apoiadores… Era como se todos tivessem se reunido para escolherem alguém para sacrificar por algo que ele não sabia o que realmente estava acontecendo por trás de tudo isso.

E só quem tinha descoberto tudo isso, era Psiquê. A quem obviamente a esconderam para não expor seus podres.

— Este deus sem nome, desafiou vosso rei, desafiou sua honra! E isso não pode ficar impune! Seu rei, Hades, lhe concedeu a misericórdia de lutar até a morte! Que o duelo então se inicie! — finalizou Perséfone, sumindo em uma nuvem verde com cheiro de clorofila, aparecendo ao lado de James lá na arquibancada real.

Kýrios tirou uma flecha das costas, e se virou para Hades.

— Então, já posso lhe fazer comer lava?

Hades ergueu uma mão, e em seguida, vários poços de lava apareceram mesmo por toda a arena.

— Agradeço a sugestão, deus sem nome.

Kýrios gostava de coisas quentes, mas queimar-se era o seu ponto fraco. Por isso, não gostava muito do sol, além do ciúme que tinha por conta dos dois deuses que o governava terem uma certa queda pela sua esposa sumida, sempre lhe pregavam peça com o intuito de importuná-lo queimando alguma de suas penas.

Imaginava que fosse morrer com alguma flecha atirada bem no meio de seu coração, ou que fosse ser empalado por uma espada com algum ataque covarde pelas costas, uma coisa toda bem dramática e poética. Mas morrer queimado, não estava em seus planos.

Hades fez emergir das poças bolas de lava, e as arremessou contra o outro deus, que desviou a tempo, fazendo aparecer logo suas asas e conseguindo se distanciar para pegar tempo e preparar seu arco.

O rei do submundo não dava descanso, e lançou outras bolas incandescentes, que as vezes acertava um fantasma ou monstro, os queimando por completo, era uma verdadeira bagunça na arquibancada.

— Perséfone… Isso não estava no plano. — comentou James ali ao seu lado.

— Eu também fui contra, mas Hades se lembrou desse ponto fraco… Não adiantou lhe convencer do contrário.

Uma bola de fogo vinha bem em suas direções, mas uma barreira invisível dispersou toda a lava, fazendo-a vira simples pedregulhos espalhados pelo chão.

Lá no centro da arena, Kýrios mirava e acertava em seu alvo, mas as flechas pareciam não surtir nenhum efeito quando perfuravam a pele pálida daquele rei.

— Sei que é o rei dos mortos, mas isso não faz de você um morto-vivo. Ou faz? — perguntou o deus, vendo o rei tirar as flechas de seu corpo como se tivesse tirando simples farpas.

— Vejo que não mudou nada. Ainda continua um fracote que vivia como um lacaio de sua mãe. — Provocou.

Por mais que colocasse em mente que era tudo fingimento, receber aquelas provocações mexia com seu orgulho, e como consequência, despertava seu lado mais bélico.

Tirando três flechas de sua aljava, e apontou-as ao mesmo tempo para o rei.

— Vou te mostrar quem é o lacaio fracote aqui. — disse, esticando a corda, e lançando as três flechas de uma vez.

James via a tudo muito ansioso, e ver aquelas reações impulsivas do loiro lhe deixava preocupado. Estava sendo tudo muito sério para ser só uma luta de mentira.

As flechas que pareciam tomar um só rumo se separam em três direções, todas pareciam ter vida, mas assim que James olhou para Kýrios, viu o mesmo as controlar somente pelo seu olhar, ao qual tinham ficado dourados.

Hades se defendeu de uma, usando seu braço como escudo, mas mesmo assim foi perfurado, atravessando o outro lado e conseguindo chegar em seu rosto, com a ponta de lâmina penetrando sua bochecha. Já a segunda parou em seu peito, bem do lado esquerdo, e parecia estar se forçando sua entrada para atingir seu coração. Quanto a terceira… Havia ido diretamente no meio da testa do rei dos mortos, e o mesmo também tentava com todas suas forças tirá-la dali.

— Ele realmente está irritado. — comentou Perséfone.

— Como pode estar tão calma? — rebateu James — Isso… Isso não era pra estar acontecendo assim!

— Como nós podemos controlar a fúria de duas forças supremas? Se Kýrios não fosse um deus seria praticamente um primordial, e meu Hades, o rei de tudo isso. Eu e você só podemos assistir e ver como tudo vai se desenrolar. Mas posso dizer uma coisa que pode lhe acalmar… Kýrios não está usando todo seu potencial pelo óbvio, nem Hades. Se fosse o caso, ninguém neste esse coliseu estaria existindo.

James ficava cada vez mais apreensivo, e algo dentro de si ficou se remexendo inquieto ao ouvir aquela palavra “primordial”.

Porque soou tão importante para seus ouvidos?

O deus do amor atacava, suas flechas nunca parando de serem lançadas contra o rei do submundo, e a plateia vaiava a cada passo ou ataque deferido contra o senhor deles.

Isso até Hades de repente desistir de tirar todas aquelas flechas de si e abaixar suas mãos para o chão, para em seguida começar a brotar cristais de obsidiana em tamanhos diferentes, mas muito mortais. Tanto que Kýruos teve que pular e sobrevoar para se manter ileso.

Ah, eram incríveis. James não conseguia resistir em admirar aquelas asas, era como se estivesse vendo um anjo.

— Deuses… Está ficando frio… — disse Perséfone.

— O que isso significa?

— Que o inverno já está chegando para ele. — respondeu a rainha uma metáfora muito sombria, virando seu rosto em direção ao loiro.

James também virou sua atenção para o deus que sobrevoava alto, tentando se proteger dos cristais que toda hora mudavam de lugar, desaparecendo e reaparecendo numa velocidade sobre humana ali na arena e indo em sua direção, que as vezes não conseguia desviar e acabava se cortando ou com alguma parte de suas pernas destroçadas e braços feridos.

Icor misturado ao vermelho de um sangue mortal já começava a aparecer, escorrendo pelos cortes e sujando os cristais, que pareciam se alimentar disso, absorvendo aquelas gotas de sangue divino.

— Lorde Hades! É melhor se render! Ou então serei obrigado a deixar-lhe na inconsciência pelo resto de sua eternidade!

— Ameaças vazias! Sabe muito bem que não saíra vivo daqui. Já te dei uma luta de misericórdia. Chegou a hora de sua punição, deus de nome banido. — disse Hades.

O seu próximo movimento foi fazer aparecer uma lança em sua mão esquerda, e sem hesitar, mirou e lançou bem no meio do peito do outro deus.

Kýrios tentou de verdade desviar, mas como estava fraco em sua divindade a velocidade que quis usar não lhe veio, mesmo que se esforçasse.

Então que acabou sendo atingido em cheio.

— Kýrios!! — gritou James, em choque.

O deus do amor paralisou por alguns segundos ainda ali no ar, e depois de perceber que estava com uma lança que o atravessa do seu peito para suas costas, foi ao chão, em uma queda muito brusca.

— Feito. — disse Perséfone, dando um pequeno sorriso maléfico.

James lhe mirou assustado, e estremeceu, entendendo o que havia acontecido. E ficou desesperado.

— Kýrios!!! — gritou James novamente.

E não conseguindo mais suportar em ficar somente vendo tudo acontecer assim diante de seus olhos, pulou a murada da arquibancada, passou pela barreira, desviou das poças de lavas e pulou pelos poços na velocidade em que conseguia ser possível e capaz.

Não sentia nenhum medo, só queria ir chegar até o loiro, e lhe perguntar logo se aquilo tudo não tinha sido um erro fatal de suas ingenuidades em confiar em quem não devia.

— Kýrios! — lhe chamou, se abaixando e tendo cuidado para não pisar ou machucar suas asas.

— James… — sorriu, mas seu sorriso estava manchado de vermelho e dourado escorrendo pelo canto da boca, assim como também saindo de suas narinas — Deu… Certo?

Só aquela pergunta… Já era resposta para a pior teoria que se passava em sua mente.

Um sentimento muito aterrador lhe preencheu o peito, acompanhado de um nó em sua garganta.

O que ele falaria? Que foram traídos? Completamente enganados? Que tudo na verdade não passava de um teatro muito cruel de Hades e Perséfone?

— É-é claro que sim. Tudo está dando certo. — Mentiu, pagando o deus em seus braços, tentando limpar suas narinas para respirar melhor — Kýrios, você tem algum plano pra isso, não é? — perguntou, na esperança de que pudesse ainda ter algum jeito.

O loiro lhe mirou, e sorriu gentilmente enquanto erguia uma mão, pousando com muito esforço no rosto do rapaz.

— Ah, minha amada… Consegui te encontrar… — sorriu, delirando, tossindo, jorrando mais sangue, sujando as vestes do moreno — Eu falei que eu ia te encontrar… Sempre cumpro minhas promessas…

James não resistiu, e suas lágrimas caíram sem receio algum.

— É claro que… você cumpre tudo que diz. Por isso, agora…. pode descansar.

— Vamos… vamos naquela nossa praia? Tenho tantas coisas pra te contar… Eu conheci alguém Psiquê… Quero… — tossiu, sua respiração ficando cada vez mais difícil — Quero apresentar um amigo… Ele é… humano… Bom rapaz… Sabe… eu quase… Eu… Ele… Me perdoe… Por favor…

James chorava, inconsolável. Culpa era uma palavra insignificante perto do que estava sentindo.

— É-é claro que te perdoou. Ele não tem culpa. Nem você. — disse, repetindo as mesmas palavras que Psiquê havia falado para ele naquela visão em que se encontraram.

— Acredite, eu te amo. E sempre vou te amar… Minha… — os olhos perdiam aquele brilho dourado, e o sorriso vacilava — Meu… — franziu o cenho, confuso — J-James…? Você… não… onde… onde ela está?! — questionou, saindo um pouco de seus delírios.

— Kýrios, saiba que vamos vencer isso tudo. Eu não sei de que jeito, mas vamos dar um jeito nisso… Eu darei um jeito. Eu juro.

— Então… não deu certo?

— É claro que deu! Veja, não estou sorrindo? — disse, forçando um sorriso para o loiro, que riu dolorido e tossiu mais sangue.

— Ah James… Esqueceu que… eu posso sentir o que está sentindo?

James tinha se esquecido, ele era o deu do amor. E seu rosto estava ainda sendo tocado pelo mesmo…

“Sou um completo inútil. Não sirvo pra nada. Nem para mentir.”. Pensou, fechando os olhos e balançando a cabeça em negativa.

— Ei, James, tudo bem. Pelo menos… Me divertir muito junto de você. Saiba que me fez feliz. Me deu esperança. Uma coisa que… eu quase tinha perdido. Obrigado.

— Por favor Kýrios… diga que tem algum plano! Por favor! Diga!

No mesmo instante em que gritou, sentiu seu ombro ser puxado violentamente, e seu corpo ser lançado para longe pelas mãos do rei.

— Nãão!

Hades então tirou a lança, só para depois cravá-la novamente no outro deus, e assim, lhe tirando de vez a vida.

James olhava sem conseguir reagir, não sabia o que fazer, não sabia o que falar, não sabia o que pensar.

— Vamos, James Payne. Precisa descansar. — disse Perséfone, aparecendo ali do seu lado.

James lhe mirou com ódio no olhar, e sem pensar duas vezes, quebrou um daqueles cristais, não se importando que cortasse suas palmas, e com o objeto nas mãos, partiu pra cima da rainha, mirando cravar no mesmo lugar onde Hades tinha ferido seu amigo.

Mas antes disso acontecer, seu corpo foi outra vez lançado pra longe, para uma área da arena que não tinha sido atingida por cristais e nem poços de lava.

Perséfone lhe mirou triste.

— Kýrios… — lhe chamou entre lágrimas, mas sabia que o mesmo não lhe escutaria mais.

O lugar que estava cheio de almas agitadas começou a ficar sombrio, as chamas vermelhas perdiam seu brilho, ficando foscas e cinzentas.

Era ele, estava vindo.

Em uma fumaça cinzenta, surgiu Tânatos. Sua foice brilhando como de costume. E quando olhou ao redor, sua expressão ficou ainda mais séria do que já era.

— Lorde Hades? O que significa… — disse, em um tom que inquiria para saber o que estava acontecendo ali.

— Leve isso. Faça o que bem entender. — disse o rei, arrancando novamente a lança a e dando ao outro deus, e saindo tranquilamente declarando fim daquele evento. Enquanto isso, o outro deus que recebeu a lança ficou encarando-a em choque.

— Como desejar, Vossa Majestade. — disse Tânatos, fazendo uma breve reverência em respeito.

— Tân… Tânatos! — lhe chamou James, e logo o deus foi até ele — Eles… Tudo… tudo acabou… eu… — soluçou — Eu falhei…

Tânatos se abaixou até ele, respirou fundo e lhe deu a lança.

Assim que sua palma encostou na haste fria da arma, James sentiu uma vibração muito forte acompanhado de um calor acolhedor vindo da mesma.

— Tânatos?

— Consegue sentir? — perguntou.

— Está quente…. E… Me deixa com… frio na barriga…, mas… Tânatos, porque está me dando isso? Essa coisa… Eu não posso, eu sou um inútil!

— A morte não é um fim, James Payne. Mas sim, um meio para ir para outros mundos. Você é forte, e inutilidade é a última coisa que Kýrios precisa nesse momento.

— O-o quer dizer?

— Não está sentindo o calor dessa lança?

— Sim, estou.

— Então cuide bem dele. Até que o relatório para o Olimpo fique pronto.

As lágrimas que não paravam de cair não tinham mais medo de desaguarem e mancharem sua dignidade, como assim ensinava seu pai. James começou a chorar copiosamente, mas não mais de uma profunda tristeza, e sim, de um indescritível alívio.

“Como não deduzi isso?!” Pensou James.

— Obrigado. — Foi a única coisa que conseguiu dizer em meio a tantos soluços doloridos.

— Vá para seus aposentos, e fique lá até segunda ordem. — Orientou Tânatos, dando uma menção de que estava sorrindo de canto, mas foi tão rápido que James quase não conseguiu perceber por conta de seus olhos estarem embaçados pelas lágrimas.

— Sim. Irei agora mesmo.

Aos tropeços, se sentindo muito tonto com tudo, James agarrou ainda mais firmemente a lança contra seu peito, abraçando-a como se o mundo fosse toma-la a qualquer momento de si, e correu para fora da arena.

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Capítulo 16
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Missão Ágape

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O Olimpo está em crise, e tudo porque de repente uma profecia disse que um deus iria dizimar o seu sistema e tudo que eles lutaram para conquistar e poderem estar no poder até hoje.

E é...

Chapters

  • Capítulo 47 Proemial
  • Capítulo 46 Alto Mar
  • Capítulo 45 Anelos
  • Capítulo 44 Verdades da Alma
  • Capítulo 43 Premências Difíceis
  • Capítulo 42 Enraizados
  • Capítulo 41 Chaves Sinceras
  • Capítulo 40 Presença
  • Capítulo 39 Luz Misteriosa
  • Capítulo 38 Possibilidades
  • Capítulo 37 Espólios
  • Capítulo 36 Fogo
  • Capítulo 35 Visitas Indesejadas
  • Capítulo 34 Penalidades
  • Capítulo 33 Mais, ou Menos
  • Capítulo 32 Temerário
  • Capítulo 31 Serviços Extras
  • Capítulo 30 Zelus
  • Capítulo 29 Magnetismo
  • Capítulo 28 Despertando
  • Capítulo 27 Sem Céu para Inocentes
  • Capítulo 26 Entre Mortais
  • Capítulo 25 Nuances
  • Capítulo 24 Céu de Luzes
  • Capítulo 23 Sobreposição (parte 2)
  • Capítulo 22 Sobreposição (parte 1)
  • Capítulo 21 Café Quente
  • Capítulo 20 Conselhos
  • Capítulo 19 Muros em Chamas (parte 3)
  • Capítulo 18 Muros em Chamas (parte 2)
  • Capítulo 17 Muros em Chamas (parte 1)
  • Capítulo 16 Cem Olhos
  • Capítulo 15 Nobre Amizade
  • Capítulo 14 Impulsos
  • Capítulo 13 Abaixo da Superfície
  • Capítulo 12 Fim de Festa
  • Capítulo 11 Fagulhas
  • Capítulo 10 Noite de Cores
  • Capítulo 9 Sopa de Ossos
  • Capítulo 8 Saindo do Ninho
  • Capítulo 7 Dádivas
  • Capítulo 6 Reunião Cancelada
  • Capítulo 5 Sonhos?
  • Capítulo 4 Empecilhos
  • Capítulo 3 Efúgio
  • Capítulo 2 Bençãos á Vista
  • Capítulo 1 Sem Opção
  • Capítulo 0 Prólogo dos Contratempos do Amor

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