Arco 1 –  Oriente sem DESTINATÁRIO

Missão Ágape

Capítulo 17

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🟡 Em breve

Nada daquela parte ocorrida estava no plano. Muito menos aquele tipo de morte ao qual o deus do amor foi imerso.

James contava com somente uma atuação, e que essa morte fosse simbólica, já que para um deus perder completamente sua imortalidade, era o mesmo que um mortal se tornar imortal, ou seja, morrendo. Isso pelo menos em seu domínio, quando em todas as missas de domingo ouvia dizer na igreja sobre fé e vida eterna aos que tinha salvação e um lugar nos céus a todos aqueles que cumpriram em vida tudo que era de bom e recebia sua recompensa após a morte.

Mas agora que tudo tinha sido feito, agora só lhe restava ter que esperar pelos resultados.

— Para um riquinho boêmio, até que você está se saindo um belo de um calculista vingativo. Tudo isso só por causa daquele beijo lá em Varanasi? — perguntou Panoptes.

O gigante tinha sido libertado, e agora estava em um divã em seu próprio aposento, recebendo cuidados de servos fantasmas. Havia comido aquele fio de Métis, e se transformado de novo na forma humana, mas os machucados em seu corpo tinham se mantido, e tinham logo que tratados para que pudessem continuar suas buscas.

— Eu já tinha até me esquecido dessa merda. Obrigado por me lembrar, Panoptes. respondeu James com mal humor e ironia, segurando a lança enquanto andava pra lá e pra cá perto da lareira.

— Então vamos ter que ficar aqui e esperar? Não estou gostando disso.

— E eu até agora não estou acreditando que… estou diante de um… gigante.

— E isso muda alguma coisa?

James lhe mirou, respirou fundo, e se sentou na beira da cama, pousando a lança ao seu lado. Abaixou a cabeça e depois esfregou seus olhos.

— Não. É claro que não. É só que… — fungou se sentindo muito cansado — Sabe, é muita coisa para processar. Há um mês atrás eu pensava que você, Kýrios e tudo que estou vendo, que tudo fosse somente uma lenda, histórias que pessoas não estudadas inventavam para poder explicar as forças da natureza. E eu como um humano, assim como todos, acredita.

— Para ser sincero, eu acho que você não é um humano comum.

James levantou a cabeça na hora, e franziu o cenho diante aquela suposição do gigante.

Os olhos dourados e lilás, a pele de oliva avermelhada que parecia estar sempre muito bronzeada, os cachos sedosos, o corte espalhado… Nem parecia ao cocheiro todo enfaixado que ele havia conhecido lá em Londres.

Agora que toda sua pele estava exposta, podia ver bem o quanto o outro também tinha sua beleza. Uma forma física magra, mas com alguns músculos bem definidos, era alto, quer dizer, sua forma humana não tinha a altura padrão que conhecia dos homens londrinos. E agora, por toda sua pele, estavam espalhados focos costurados com hematomas roxos esverdeados, eram onde ficavam todos seus olhos.

— Como está se sentindo sem os…

— Me sinto como se estivesse sem roupas. Mas por um lado, me sinto livre. Não sabia que ter somente dois olhos era algo interessante. Tipo… — o gigante pegou uma vela e pingou bem em cima da ferida onde estava um hematoma costurado, uma órbita vazia onde antes havia um olho. James ficou agoniado em ver, já que aquele pedaço de pele do gigante havia ficado avermelhado pela gota de cera quente, aparentando ficar ainda mais dolorido — Viu? Não preciso mais ter cuidado. Posso fazer isso pelo corpo todo sem me preocupar ter que sentir um cisco ou poeira entrando em meus olhos.

— Mas isso ainda acontece com esses dois olhos na nossa cabeça. — Rebateu, e o outro arqueou uma sobrancelha.

— Tanto faz. O que importa é que me tiraram um peso das costas. Estou livre de Hera. Não sou mais um obrigatório cãozinho espião dela. — disse, seu cenho em desprezo pela sua antiga senhora — Mas vamos falar de você, Sr. Payne. Estou lhe observando a horas, e em nenhum momento desgrudou dessa lança.

— Essa lança, Panoptes, é o seu amigo.

— E?

— E que é meu dever cuidar enquanto ele estiver assim.

— Sim, disso não discordo. O que quero dizer é que…

— Eu fui totalmente incapaz, Panoptes. Eu não tinha percebido que Hades e Perséfone tinham seu próprio plano em cima do meu. Eles não nos disseram. Agora, me diz, e se isso tudo não fosse um “plano do bem”? – James pegou em suas mãos de novo a lança, passando a mão por ela, e fechando os olhos em uma negação muito culpada — Eu falhei. Eu tinha que ter percebido isso!

— Mas já foi. Passou. O que importa é que agora estamos bem. Não fique se culpando. A Lady Perséfone já explicou tudo. Zeus não é bobo, e com certeza não acreditaria nessa encenação toda. Eles tinham que ter provas concretas na cabeça se caso fossem chamados para ser interrogados com magia.

— O que farão com o corpo dele? Eu tentei tirar informações de tudo que é jeito… mas sei que você é bem amigo de Tânatos… Então deve saber de alguma coisa.

— Está vendo coisas. Tânatos é um alguém difícil de se lidar. Não que ele seja um arrogante, nada disso. A questão é a falta de comunicação. Ele não é muito de falar. Somente Kýrios para ser amigo daquele deus. Mas também… enquanto um não diz nada, o outro parece uma biga desgovernada falando. Mas, eu gosto dele assim, pois ele é como uma criança, se está calado demais, é porque tem algo de errado. E depois de muito tempo, é a primeira vez que o vejo animado.

— Hm. Entendo. Mas mesmo assim… Acho que eu e Tânatos nos daríamos melhor então. Porque… tenho que confessar, Kýrios fala demais. E isso me irrita tanto que acabo… — bufou, passando as duas mãos no rosto.

— Hm. Entendo. — Repetiu Panoptes, mas seu tom foi diferente da do rapaz, um tom sugestivo que deixou o outro corado, e por entender a insinuação do gigante, franziu o cenho e desviou o olhar para a lareira, e também não quis alimentar tal sugestão.

Mas o gigante não desistiu, era curioso demais para deixar para lá…

Pigarreando com certa atuação, pegou mais uma taça de vinho que uma fantasma lhe serviu.

James revirou os olhos.

— Pode me dar um descanso? Será que todos vocês não conseguem conversar comigo sem que tenha algum pensamento malicioso por trás?

— Você é humano. E todo mundo sabe que humanos são objetos de desejo por seres superiores ou inferiores. Vocês são tão frágeis, mas também muito fortes. São capazes de tudo. E quando digo tudo, estou me referindo a coisas tanto boas quanto ruins. Vocês causam um fascínio em nós. Por justamente serem previsivelmente imprevisíveis.

— Você pode ter alguma razão.

— No quê? Em você estar caidinho pelo meu amigo?

— Não!! — disse entredentes, jogando a lança na cama e se levantando para se servir de uma taça de néctar, fazendo o gigante arquear uma sobrancelha — Dai-me paciência, Senhor!

O lugar todo tremeu, e do teto caiu alguns pedregulhos e poeira.

James tapou a boca na hora, e Panoptes balançou a cabeça em negativa.

— Ãh, tudo bem… Vamos falar de outra coisa. Sobre… Eu não sabia que humanos bebiam néctar. — disse o gigante, ainda intrigado por aquilo.

— Nem eu. Só fui saber disso hoje. Por isso, tenho minhas desconfianças com a rainha. Ela sabia disso e mesmo assim me serviu. O que ela queria com isso? Me matar? Ah, não, não precisa me dizer, já sei, ela queria me testar. Mas admita, Panoptes, esse teste poderia me fazer uma poça de areia!

— Agora que me disse… É verdade. Isso é estranho. Se foi um teste, porque testá-lo assim de modo tão arriscado? Qual o intuito disso? Esses deuses… Não sei como vocês humanos os adoram e idolatram.

James bebeu um gole de néctar, e o líquido foi descendo pela sua garganta de modo tão macio e quente que quanto mais bebia, mais queria daquela sensação.

O gosto era bastante adocicado, como mel, mas havia um certo amadeirado, como se ele estivesse bebendo chá de canela misturado à leite quente.

— Acho melhor você não ir tão fundo… – aconselhou o gigante.

— Senhor Argos Panoptes, meu caro estimado recente amigo, posso já chamá-lo de amigo não? — o gigante revirou os olhos, e se deitou de lado no divã — Certo, amigo Panoptes, hoje eu tive uma boa sessão de culpa, luto e surpresa. Minha cabeça ainda está doendo, minha garganta dói por ter gritado tanto pensando que eu tinha feito uma grande merda. E mesmo que tudo tenha acabado bem, ainda me sinto a porra de uma merda inútil. Então, acho que mereço encher a cara um pouco. E se quiser também, pode me acompanhar.

— Você tem razão. Vamos encher a cara. Também passei por poucas e boas. Nós dois merecemos uma regalia. — disse o gigante, pegando uma jarra escura de metal ali de uma mesinha perto do divã e se servindo também da bebida — Um brinde às nossas dores físicas e as porcarias que ainda estão por vir.

James ergueu a sua taça assim como o outro, e ambos beberam ao mesmo tempo.

Se passou horas, longas horas. Ali no submundo era difícil ver se era dia ou noite, já que o céu ali agora era negro, uma escuridão infinita. Mas em horas havia nuvens avermelhadas que as vezes se tornavam cinzas por conta da luz que vinha de algum lugar, deixando todo o ambiente numa nuance cinzenta sombria que pareia a uma tarde pós chuva de Londres. Não era sol, isso James sabia, já que o astro não podia iluminar por ali, mas somente para lhe deixar confortável psicologicamente, James contava aquilo como dia.

O gigante e o rapaz, depois dessas horas, haviam chegado ao ponto em que estavam cantando suas favoritas canções de tavernas, claro, cada um em sua língua.

James cantarolava canções animadas de bordéis, em sua mente vinham os acordes acalorados de violino, as lembranças em sua mente daquela bagunça cheia de paixão lhe animava, e sendo estimulada pelo néctar, parecia que todo aquele líquido circulava por todo seu corpo, causando uma felicidade inebriante.

Totalmente embriagados, e por isso muito encorajados também em começar a fazer coisas mais ousadas, como…

— Ha ha! Duvido você abrir um desses pontos e colocar uma bolinha de vidro ou qualquer coisa dentro aí nessa órbita. — Desafiou James, pegando um cristal de ornamento que estava na mesa de frutas.

— Eu já ganhei. — disse o gigante, arranhando sua bochecha e arrebentando os pontos, deixando um pouco de sangue escorrer, colocando em seguida uma pedra verde brilhante no espaço onde antes havia um olho ali — Que tal?

James arregalou os olhos, e ficou impressionado pela estranha beleza que ficou.

— Sabia que há algumas tribos africanas que eles fazem isso, mas eles colocam pedaços de ossos ou dentes de animais nos lábios? Uma vez minha mãe me mostrou um livro com várias gravuras assim… E você está parecendo com uma delas… Esquisito, mas bonito e interessante.

— Sério? Então vou colocar joias em todos esses buracos… vou ficar igual uma coroa! — o gigante riu, virando a taça e bebendo todo o liquido, e se servindo novamente — Agora é minha vez… Eu duvido que o senhor… — Panoptes sorriu de canto, imaginando algo que o faria ganhar aquela brincadeira sem a menor chance de derrota — Ah! Já sei… Eu duvido que faça isso… Sr. Payne, você tem que lamber aquele negócio ali. — Apontou, para algo brilhante e metálico em cima da cama.

— Ah, aquilo? Hm… Uma vassoura?

— Não… Acho que é… — Panoptes focou sua visão no objeto, mas sua embriaguez lhe fez cair de cara no tapete, rindo à toa pelo acidente.

— Seja o que for, já ganhei. — disse James, caminhando, cambaleando, tropeçando até chegar na cama, caindo na mesma, ao lado da tal “vassoura”.

— Porque colocaram essas almofadas aqui? Será que é pra gente arrumar o quarto? – perguntou Panoptes.

— Não sei, só sei que vou ganhar essa… — soluçou por conta da bebida — …essa aposta.

— Não cante vitória antes do tempo, humano… Espere, deixa eu chegar aí… tenho que ver se você não vai trapacear… — disse, sua fala embolada, tentando aos tropeços chegar na beira a cama.

E quando estava perto de se apoiar na mesma, tropeçou numa almofada, seus pés se chocando um com outro, e acabando que batendo com sua cara no colchão, mas, por estar muito embriagado, aquilo foi como uma sacudida muito forte em sua cabeça. Muito tonto, caiu no chão, se esquecendo de seu objetivo, agarrando a almofada pra si e adormecendo em seguida.

— Você vai ver Panoptes, eu sou o rei das apostas! Nunca perdi uma… — disse, pegando a tal “vassoura” dourada na cama.

James aproximou o objeto de seu rosto, se sentando na beira para ficar melhor e mais confortável, pois suspeitava que iria vomitar e continuasse deitado.

— É uma vassoura muito bonita… Tudo aqui é tão luxuoso… As criadas lá em casa iriam brigar para ter sua vez em querer usar isso… — Riu, posicionando o objeto vertical no chão, por entre suas pernas — Vamos ganhar uma aposta… — sorriu, aproximando a haste de seus lábios, logo sentindo o calor vindo do metal.

— Hm? Porque está quente? — seu olhar tonteado desceu para observar o objeto, e percebeu que não era uma vassoura, e sim, que se tratava da lança.

— Tanto faz… trato é trato… Não importa o que for… Desafio é desafio. — disse, aproximando de novo o metal de seus lábios.

Já estava quente, e havia ficando um pouco mais. James então deslizou sua mão pelos detalhes entalhados, encontrando um lugar onde pudesse se apoiar para não cair de vez para frente.

Abrindo sua boca, direcionou sua língua no metal, e em um movimento, lambeu debaixo para cima, lentamente, numa única só vez.

— Pronto! Ganhei…!

Podia ser impressão sua, ou poderia ser delírios da bebida, mas sentiu a lança dar uma leve tremida, e sua cor dourada ficar um pouco rosada.

— Uuu… Então a senhorita lança ficou tímida? Não fique, o que fiz foi com todo respeito… — riu, encostando sua testa na haste — Vou te mostrar que isso não é ruim, afinal, sou cavalheiro… — disse para em seguida novamente fazer o mesmo movimento, sua língua agora passando pelo metal, subindo lentamente até o limite de apoio onde estava apoiada a sua mão ali acima.

E mais uma vez, a haste tremeu.

— Senhor James Payne, o que está fazendo? — perguntou uma voz grave e melancólica vinda de perto da lareira, que agora tinha uma cor cinzenta.

James estava ainda com sua língua na haste quando olhou para o ser que era tão alto que se assustou, caindo no chão junto da lança e bem perto dos pés do deus a sua frente.

— Tânatos…

O deus olhou para todo o quarto, estava uma bagunça. Havia várias jarras de néctar espalhados pelos cantos e almofadas jogadas em todas direções. Viu também o gigante ali no chão agarrado a um travesseiro, roncando, totalmente adormecido, enquanto uma joia esmeralda brilhava na sua bochecha. E por último, James, que tentava se levantar, mas toda sua dignidade caía a cada tropeço ou cambaleio junto da lança.

Tânatos lhe encarou, arqueou uma sobrancelha, olhando de modo curioso para o rapaz.

— Fico feliz que esteja já bem, James Payne.

Por favor… Só James… Não sou senhor também… Tenho só dezoito anos! Dezoito anos e… — Contou nos dedos os dias desde a sua fuga depois da festa de aniversário – doze dias! Se quer chamar alguém de senhor… — James olhou pra lança e riu breve – Velho…

— Isso não quer dizer nada. — começou Tânatos — Você e Kýrios podem ter idades diferentes em grande escala, mas, parecem dois adolescentes de uma década e meia. Foram impulsivos. E ainda colocaram Vossas Majestades em risco. O que vocês estavam pensando quando planejaram aquilo? Mas, que bom que você e Panoptes estejam bem. Agora, temos negócios a tratar. — disse, sempre conciso.

E num estalar de dedos, fez a embriaguez do rapaz sumir.

— Aah! Droga! Minha… cabeça…! — disse pegando em sua têmpora e sentindo a ressaca lhe invadir intensamente como se alguém tivesse lhe jogado uma pedra na cabeça — O que foi isso?!

Panoptes continuou dormindo, Tânatos resolveu deixá-lo assim, sabia que o mesmo ficava com muito mal humor quando era acordado, então deixou-o caído onde estava.

— James, Lorde Hades e Lady Perséfone estão agora nesse momento em julgamento. E como previram, estão lendo suas mentes. Por hora, não descobriram nada. O que significa que conseguimos mais uma aliada.

— Quem?

— Hécate. Disse se simpatizar por você. Pois há muitas adoradoras da bruxaria entre os humanos de seu domínio.

— Mas eu não sou um bruxo.

— Mas há alguém em sua família que seja. — disse Tânatos, e James ficou surpreso.

“Com certeza deve ser minha tia. Aquela bruxa é cruel!” Pensou James, ainda pegando em sua testa pela dor aguda.

— Então… Hades e Perséfone vão voltar logo?

— Não. E é disso que venho tratar. — Tânatos ergueu uma mão, e no meio de uma fumaça cinzenta, abriu o que parecia ser um espelho.

Mas não refletia sua imagem, pelo contrário, a imagem que se mostrava era do corpo de Kýrios, e o mesmo estava posto sobre uma mesa de mármore bem no meio de uma sala cheia e pessoas.

Muitas olhavam espantadas, e outras, com seriedade e um ar de vitória no semblante.

Mas havia uma em especial que estava aos prantos, sua beleza era indefinível, seus cabelos a toda hora balançavam lentamente como se uma brisa muito suave sempre soprasse eles, mudavam a toda hora de cor, parecendo quase a um arco-íris. A única coisa que trajava era um fino tecido que parecia a uma nuvem de tão leve, pois cada movimento que fazia deixava bem evidente suas curvas e outras formas.

E James logo soube quem era por causa da semelhança que o rosto dela apresentava com alguém.

— Afrodite… — murmurou James, ficando com o peito apertado ao vê-la, e também um gosto amargo na boca surgiu fazendo desaparecer o doce sabor do néctar — Mas… E agora?

— O corpo é uma prova concreta. Tinha que ser levado. E é nisso que vamos trabalhar.

— Como assim? Digo, eu não posso continuar nessa busca sozinho. Quer dizer, tem Panoptes, você… Ou é isso que está me sugerindo? Ou… Você virá?

Tânatos fez um semblante de contentamento pela dedução bastante certeira do outro, que arregalou os olhos pela resposta positiva e silenciosa.

— Quando Panoptes foi capturado por nós e descobrimos aquele fato de seus olhos estrarem ainda ligados à Hera, consequentemente, eles também souberam. Mas nós temos agora uma vantagem. Temos tempo. Esse julgamento vai demorar o tempo suficiente para agirmos enquanto eles estão ocupados nisso. Zeus está obcecado para achar qualquer um que esteja contra ele e seus objetivos e apoiadores. E quando um avanço assim acontece, todos são chamados para infinitas investigações e reuniões.

— Mas você está aqui.

— Tenho esse crédito. O ciclo não pode parar. Meu trabalho com as almas tem que ser feito. Mas claro, estou abrindo uma exceção, ao qual eles não sabem que posso tomar em uma situação rara.

No momento em que disse isso, pegou a ampulheta em sua cintura e a lançou no ar, colocando-a dentro de uma bola de névoa que a girava sem parar.

James ficou um pouco preocupado, pois aquilo lhe deu um mal pressentimento.

— Tânatos… Isso não é um pouco demais?

— Eu só tenho essa oportunidade. E vou usar para ajudá-los.

O deus da morte se virou para a mesa onde havia várias frutas, e com um aceno, a limpou completamente, varrendo todos os objetos que havia ali, para depois, pousar sua foice calmamente ali.

Assim que fez isso, toda aquela áurea sombria ao seu redor se dispersou, deixando-o para envolver toda aquela arma, assim como tinha feito com ampulheta.

Quando o deu se virou, sua aparência que era assustadora tinha se tornado comum, não comum em relação a aparência humana, era um comum de deuses. Sua pele ainda continuava pálida, mas seus olhos completamente negros ganharam íris azuis. Suas vestes se tornaram mais modernas, como se tivesse copiado todos os trajes do rapaz. Já seus cabelos, se mantiveram compridos, mas havia uma trança lateral.

James ficou impressionado, não sabia que até aquele deus poderia tomar essa forma.

— Uau.

Ficou inadequado? — perguntou o deus.

— Não, eu não quis dizer isso… Foi mais que… Ficou bem diferente. — respondeu James, ainda admirado que em meio a uma aparência obscura havia um ser belo também.

O deus a sua frente assentiu em agradecimento.

— Podemos?

— Mas e Panoptes?

— Ele vai acordar uma hora.

— E quanto aos seus poderes? Creio que também não pode usá-los em outro domínio assim como Kýrios.

— Sim. Por isso estou nessa sua forma. Não posso ajudá-lo com meus poderes, mas sou capaz assim como todos os deuses. Tenho minhas habilidades de defesa. Além do mais… Se caso eu tiver que usar algum dom, você sabe o que fazer.

Toda vez que ouvia isso, James se sentia inútil. A única coisa que sabia era esgrima, e mesmo assim, péssimo. Então o que sobrava como opção para esses casos era fugir.

— Ok.

“Ok”? Pensei que fosse querer protestar.

— Sei reconhecer quando não tenho vantagem.

O deus lhe mirou desconfiado.

— Não tente nada perigoso, James Payne.

— E eu disse alguma coisa sobre fazer algo?

— Conheço esse olhar. Não se arrisque. — disse como uma certa dor em sua última sentença — Isso é sua responsabilidade. — Apontou de modo sério para a lança — James, essa lança não coleta somente almas, mas também qualquer energia de grande poder. E o melhor é que pode ser usado em qualquer domínio também, já que ela transforma qualquer energia de qualquer origem em simples primordiais essências do universo como um todo. Por isso que… Confesso que fiquei bastante surpreso que Hades tenha usado ela assim tão de repente depois de milênios. Mas agora entendo o porquê. Ele e Perséfone pensaram em tudo. Uma garantia para caso de situações chegarem a ser críticas.

James sentiu seu rosto queimar. Afinal…

Estava com uma arma poderosa nas mãos, e não fazia nem minutos atrás ele estava lambendo-a por conta e um desafio bobo de bêbados.

— Oh, então… — pigarreou, respirando fundo e tentando ignorar a ressaca e dor de cabeça — Então vamos lá aproveitar o tempo que nos resta! — disse, também querendo desfocar-se de seu constrangimento, ou então pediria para o outro cavar logo uma cova e enterrá-lo, pois estava morrendo de vergonha.

Tânatos estalou os dedos e um portal com vinhas avermelhadas e negras que parecia ser veias e artérias apareceu no chão.

— Ãh… Vou pegar minhas coisas, e enquanto isso… Vai arrastando Panoptes pra aí. — disse, não querendo soar como uma ordem, mas mesmo assim, Tânatos não hesitou em acatar suas orientações.

•

Estava tudo muito silencioso por ali naquela parte da muralha, tinham decidido por começar no extremo leste, a alguns quilômetros perto do fim. Ou era o começo? James não sabia.

Mas sabia que aquele terreno lhe dava uma sensação de calma e disciplina, como se tivesse acabado de treinar ou meditar, como aqueles estrangeiros que as vezes vinham visitar seu pai e ficava por uns dias ali em sua mansão e meditando em seu quintal.

— Certo, aqui estamos. E agora? — perguntou Panoptes, um pouco irritado pela dor de cabeça. Havia acordado no chão gelado de pedra, meio confuso e tonto pelo ar estar um pouco agitado, pois sua última lembrança era ter feito um desafio ao rapaz, mas não se lembrava de qual era.

E James, claro, não quis falar sobre isso. Ao em vez disso, disse que Tânatos tinha chegado de repente e ele se esqueceu de executar, admitindo uma “derrota”.

— Hm, eu e Kýrios conversamos sobre isso. Mas tudo foi acontecendo muito rápido… Alguma sugestão? Talvez alguma magia local que vocês, sei lá, conheçam para que possam me ensinar? Estou disposto e de mente aberta para qualquer esquisitice, isso claro, desde que não envolva meu traseiro e arrancar alguma parte de meu corpo. — disse James se apoiando na murada e bebendo um gole de água, fazia algumas horas que estavam caminhando e parando em alguns trechos que possivelmente poderiam ter algo suspeito.

— Talvez uma bússola. — Sugeriu Tânatos — Essa tecnologia não só aponta para o norte. Aponta para onde há interferência magnética. E as coisas que estamos procurando tem uma certa energia densa que pode ser detectada. Pode ser que dê certo.

— Podemos tentar. Alguém de vocês têm uma bússola?

Os dois seres a sua frente negaram com a cabeça. E James fungou derrotado.

— Ok, temos que improvisar então… — disse, tirando a mochila de suas costas, e procurando por algo que fosse de metal e que fosse bem fino.

Mas não achou nada.

Sua mente se pôs a pensar. Olhou para seus companheiros de viagem, que lhe miravam esperando alguma solução.

— Pense James… Pense… — se levantou, andando de lá pra cá.

Até que se esbarrou na lança que estava apoiada onde ele estava antes.

— Sim! Eu já sei que temos que fazer! Tânatos, você sabe se tem alguma cidade por aqui perto? — perguntou, fazendo o outro ficar pensativo tentando entender qual seria o plano daquele rapaz.

A única cidade mais perto era a capital, Pequim, que ficava a mais ou menos setenta quilômetros de onde eles estavam.

E como Tânatos não podia usar nenhum de seus poderes ali para poder transportá-los, tiveram que ir a pé até um certo ponto, depois, tiveram sorte de estar passando uma carroça pela estrada, um comerciante muito simpático, que não hesitou em lhes dar uma carona, isso claro, se comprassem alguma de suas mercadorias.

O que lhes proporcionou uma viagem até os arredores, por que o comerciante disse que seu rumo era até ali, já que iria para uma outra cidade mais distante.

— Foi um bom empreendimento. Vou guardá-lo com muito cuidado. Não é todo dia que se vai a China, não é? — disse James, admirando aquela garrafa de cristal que continha um líquido incolor. O cheiro parecia a de um licor de maçã.

— Eu também gostei do meu. Vai ficar bonito na minha coleção de esculturas em miniaturas que tenho em meu quarto lá na mansão. – disse Panoptes, gostando muito de seu suvenir de dragão.

Já Tanatos… ele não queria nada, mas como era parte do trato para poder ter sua passagem naquela carroça, acabou que tendo que comprar um espelho. E o mesmo olhava de forma pensativa para o pequeno objeto e seu reflexo.

— O que foi Tânatos? Está sentindo alguma coisa?

— Não. Só estou observando o quão talentosos são os humanos. — respondeu, guardando o pequeno espelho em seu bolso.

Sim, agora também tinha seu próprio equipamento de viagem, comprado por James com as joias que tinha pego “emprestado” do quarto onde estava hospedado no submundo. Eram tantos, não ia dar falta.

Caminharam até chegar na cidade. Já estavam acostumados com tanta calmaria da estrada que por horas eram somente árvores e terra, mas ali, para onde se olhava tinham pessoas. Era quase como Varanasi, só que bem mais barulhento e sem lugares para meditar.

Carroças, barracas, pessoas indo e vindo, todas olhavam curiosas para aquele trio, afinal, era raro estrangeiros por ali.

Um grupo de crianças passou correndo com suas pipas, e acabou tropeçando em James, que não deixou uma menina cair no chão.

E como agradecimento, a mesma lhe entregou um papel.

— Hm? O que é isso? — perguntou-se, quando recebeu da mesma um bilhete com um símbolo estranho. A garota lhe encarou com um olhar estranho, como o de alguém perdido em seus próprios pensamentos, e quando James ia abrir a boca para perguntar se a menina estava bem, a mesma saiu correndo, sumindo na multidão junto de outras crianças. — Porque tenho a impressão de que isso não foi uma coisa boa?

— Não sinto nenhuma áurea negativa nisso. — disse o deus da morte, analisando com o olhar o papel — Mas também não sinto nada de positivo. Não há nada. É neutro.

— Alguém de vocês sabem o que está escrito aqui? — perguntou, olhando para os dois a sua frente.

— Não faço a mínima ideia… — disse Panoptes, tentando entender aquilo também.

— É um sinal de boas-vindas. — disse Tânatos, se lembrando de algo — Uma vez Kýrios me contou sobre isso. Parece que comerciantes de mercado clandestino fazem isso com estrangeiros. Atraem eles para lhes vender qualquer coisa por um preço bem abaixo do que realmente é, mas são trapaças, as vezes não prejudicais, mas não vale apena arriscar.

— Parece divertido. — comentou o gigante — Podemos surrá-los por enganarem pessoas inocentes. Estaríamos fazendo um favor às autoridades. E ainda ganharíamos algumas recompensas. Só enxergo vantagens. Vamos aceitar ir até eles.

— Não, melhor não… — disse James, ficando um pouco apreensivo pelos dois, que pareciam estar considerando aquela ideia — Mas… Me fale mais Tânatos, fiquei muito interessado nisso. Meu plano estava em procurar o dia todo por um imã nesse lugar, mas olha que maravilhoso? Nós não fomos até a montanha, ela veio até nós! Você consegue ver aqui nesse bilhete como fazemos para encontrar esses tais comerciantes?

— Eu não entendo sua escrita. Mesmo que eu tente, não conseguirei, isso porque…

— Ah sim, entendi. Não está em seu domínio. — disse James interrompendo o deus, fazendo o deus arquear uma sobrancelha.

Tânatos deu um leve e muito discreto sorriso sem mostrar os dentes, pensando e se lembrando que não fazia muito tempo aquele humano congelava quando lhe via, agora, o tratava como um amigo de eras. Por um momento ficou feliz por isso, pois se lembrou de outra pessoa que também o tratava assim além de Kýrios, sua melhor amiga, Psiquê.

— Certo, já que temos um convite, vamos procurar. Como naquele ditado, “Quem tem boca vai a Roma”, faremos o mesmo.

— Uhg, não quero encontrar romanos. — disse Panoptes com uma cara de reprovação, até o deus estava com um semblante não muito contente com aquela menção.

James respirou fundo, e como um bom perceptivo que era logo supôs que devia ser por causa da história entre gregos e romanos, e em como eles modificaram e adaptaram para si as divindades gregas. E pela reprovação de ambos, com certeza era algo de que não gostavam nenhum pouco.

Caminharam para mais adentro daquela espécie de feira que parecia não ter fim, era muita gente falando alto, gritando e oferecendo seus produtos, mas nada era entendido por James e os outros dois colegas de viagem.

Ninguém deles falava mandarim, então ficava muito difícil entender alguma informação. Mas ainda bem que havia gestos universais como apontar para o papel perguntando em mímica onde era o tal lugar que queriam ir.

A maioria dos transeuntes corria, era como se estivessem fugindo de um monstro ao qual iria lhes amaldiçoar se fossem contar algo sobre ele ou fazer qualquer menção sobre.

Era um tanto cansativo, e como nenhum estava tendo algum sucesso em conseguir informações…

— Kýrios fala mandarim. — comentou Panoptes, comendo macarrão da barraquinha em que pararam — Será que se você beijar alguém desses humanos assim como beijou meu amigo, funcionaria?

James também comia macarrão, mas o seu recipiente vinha com bastante caldo, parecendo uma sopa, e quando ouviu aquilo do gigante se engasgou por aquela informação dita de repente e com tanta naturalidade assim na frente do deus.

— Panoptes!

Tânatos arqueou uma sobrancelha.

— O que foi? Ele também sabe disso! Entre mim, Kýrios e Tânatos não há segredos!

— Mas isso não significa que você possa falar assim tão descaradamente! E outra, eu não o beijei! Foi ele quem me beijou! Que isso fique bem claro aqui!

— Seu rosto está vermelho. — Disse o deus da morte.

James ficou sem ter o que dizer para aquele deus, e voltou a comer sua sopa de macarrão.

— C-cada caso é um caso… E o amigo de vocês, quando sair dessa lança e voltar pro corpo dele vai confirmar que o que estou falando é verdade!

Panoptes ficou prendendo um sorriso, e Tânatos balançou a cabeça em negativa, suspirando entediado, como se quisesse falar “Humanos, gigantes, deuses… todos iguais.”

De repente uma pequena movimentação começou a acontecer ali no meio daquela rua comercial, e James pensou que fosse porque já estavam perto do almoço pelo horário dali em Pequim, mas na verdade era somente um grupo todo de artistas circenses que pediram para as pessoas se afastarem e formarem um círculo.

O senhor, que tinha o rosto todo pintado em branco, falava algo que todos ali gostavam e aplaudiam, e pareciam gostar e se divertir com suas palavras, pois algumas riam ou gargalhavam.

James queria muito entender o que ele estava falando, mas sabia que tinha que se contentar em observar e ver o contexto geral.

Um artista tocando flauta entrou naquele espaço e começou a tocar de modo muito animado. Depois um rapaz de cara pintada em branco, mas este com olhos pintados só que em vermelho também entrou, e começou a dançar como uma bela dama. Alguns riam, outros iam embora xingando, pelo menos é o que James percebia pelas suas expressões aborrecidas. Mas a maioria ficava, por estar gostando da apresentação.

E não foi só isso, também entrou uma moça malabarista em trajes masculinos, que volta ou outra recebia um galanteio de homens que estavam mais perto de onde ela se apresentava.

E foi aí que a confusão começou.

Um homem puxou seu braço, a moça o empurrou, mas o mesmo a puxou pela cintura, e começou tentar beijá-la.

— James?! James! — lhe chamou Panoptes, mas era tarde demais.

O rapaz já tinha deixado de lado seu macarrão e saído dali correndo para aquele grupo de homens para ajudar a moça em apuros.

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Capítulo 17
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Missão Ágape

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O Olimpo está em crise, e tudo porque de repente uma profecia disse que um deus iria dizimar o seu sistema e tudo que eles lutaram para conquistar e poderem estar no poder até hoje.

E é...

Chapters

  • Capítulo 47 Proemial
  • Capítulo 46 Alto Mar
  • Capítulo 45 Anelos
  • Capítulo 44 Verdades da Alma
  • Capítulo 43 Premências Difíceis
  • Capítulo 42 Enraizados
  • Capítulo 41 Chaves Sinceras
  • Capítulo 40 Presença
  • Capítulo 39 Luz Misteriosa
  • Capítulo 38 Possibilidades
  • Capítulo 37 Espólios
  • Capítulo 36 Fogo
  • Capítulo 35 Visitas Indesejadas
  • Capítulo 34 Penalidades
  • Capítulo 33 Mais, ou Menos
  • Capítulo 32 Temerário
  • Capítulo 31 Serviços Extras
  • Capítulo 30 Zelus
  • Capítulo 29 Magnetismo
  • Capítulo 28 Despertando
  • Capítulo 27 Sem Céu para Inocentes
  • Capítulo 26 Entre Mortais
  • Capítulo 25 Nuances
  • Capítulo 24 Céu de Luzes
  • Capítulo 23 Sobreposição (parte 2)
  • Capítulo 22 Sobreposição (parte 1)
  • Capítulo 21 Café Quente
  • Capítulo 20 Conselhos
  • Capítulo 19 Muros em Chamas (parte 3)
  • Capítulo 18 Muros em Chamas (parte 2)
  • Capítulo 17 Muros em Chamas (parte 1)
  • Capítulo 16 Cem Olhos
  • Capítulo 15 Nobre Amizade
  • Capítulo 14 Impulsos
  • Capítulo 13 Abaixo da Superfície
  • Capítulo 12 Fim de Festa
  • Capítulo 11 Fagulhas
  • Capítulo 10 Noite de Cores
  • Capítulo 9 Sopa de Ossos
  • Capítulo 8 Saindo do Ninho
  • Capítulo 7 Dádivas
  • Capítulo 6 Reunião Cancelada
  • Capítulo 5 Sonhos?
  • Capítulo 4 Empecilhos
  • Capítulo 3 Efúgio
  • Capítulo 2 Bençãos á Vista
  • Capítulo 1 Sem Opção
  • Capítulo 0 Prólogo dos Contratempos do Amor

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