Arco 1 –  Oriente sem DESTINATÁRIO

Missão Ágape

Capítulo 18

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🟡 Em breve

Quantas e quantas vezes seus pais iam no departamento de polícia por ele também estar envolvido em brigas das quais as vezes se metia pelo simples fato de estar no momento errado ou no lugar errado…

Mas daquela vez não era alguma falta de sorte, ele mesmo quem tinha comprado essa briga, e agora tinha que arcar com as consequências.

De uma apresentação pacífica de artistas de rua, se tornou um verdadeiro ringue ao ar livre, com direito a plateia, que parecia agora estar mais entusiasmada agora, torcendo para aquilo continuar até que um dos envolvidos caísse inconsciente.

James havia caído pela quinta vez no chão, dessa vez por conta de um soco em sua barriga. Também, o injusto sistema de dois contra um não era seu forte. Muito mal aguentava um oponente sozinho, imagina aguentar dois brutamontes.

Panoptes também estava no meio daquela confusão, e parecia se divertir em socar alguns humanos e as vezes perder, já que nem ele e nem o deus da morte podiam usar seus poderes e dons fora de seu domínio, e para o gigante, isso estava sendo divertido, era um desafio em tanto ter que se segurar para não esmagar a cabeça de alguém com uma simples chute.

Quanto a Tânatos, evitava de tocar em quem ia pra cima de si, sempre desviando ou empurrando os valentões com um pedaço de madeira que jogaram para ele também dar sua amostra de valentia, mas decepcionava ao evitar agressões. Não porque ele queria, mas era porque não queria correr o risco de matar alguém com sua força ainda sendo trabalhada naquela forma e  também por causa de sua aura de morte. Tinha que manter o disfarce, mesmo que seus dois outros colegas de viagem estivessem fazendo o contrário de não chamar atenção.

— Merda! — xingou James, cuspindo sangue depois de levar um soco na boca, machucando seus lábios.

— Cuidado! James, atrás de você! — avisou Panoptes, a tempo de o rapaz quase levar uma cadeirada nas costas, e por conta do desvio para o lado, a cadeira acertou o homem que havia lhe dado o soco.

Era um verdadeiro evento… Se aquelas pessoas estavam entediadas com suas rotinas, aquilo lhes fez dar um novo ar de ânimo, pois até apostas estavam sendo feitas ao redor deles.

A maioria contra o trio de estrangeiros, claro.

Chutes, socos, desvios, muitos tropeços e dentes chineses voando pelos ares. O grupo circense já tinha ido embora a tempos pelo medo de serem pegos ou que tudo sobrasse para eles. James nem havia percebido ainda que já não tinha mais nenhuma moça indefesa para salvar.

— Tāmen kāishile! Shi Tāmen! / Eles que começaram! Foram eles! — gritou uma senhora do meio da multidão, e logo muitos que estavam em um posto guardas longe dali se aproximaram, dispersando a aglomeração e começando a prender os arruaceiros.

A briga ainda continuava, mas agora, havia guardas armados com suas espadas no meio.

— James, Panoptes. — Lhes chamou Tânatos, puxando-os pelo colarinho e os arrastando do meio da confusão.

— Não! Ainda não terminei com aquele filho da puta! — disse James, se debatendo para se soltar, cuspindo sangue, limpando sua boca na manga, e ainda tentando sair do puxão do deus que fazia em sua gola ali na nuca.

— Concordo com ele! Temos que mostrar quem é que manda nessa merda! — apoiou o gigante, ele e o rapaz pareciam duas crianças birrentas tentando se soltar.

— Depois vocês mostram isso quando estivermos seguros. Há coisas se aproximando. Coisas deste domínio. — alertou Tânatos, olhando de modo tenso para todas as direções.

James parou de se debater, e olhou para os lados procurando preocupado a tal coisa.

— Onde?

— Não consigo definir uma direção, parecem estar por todos lados. Temos que nos esconder, agora.

Os três começaram então a correr por entre as ruas e becos estreitos, era um pouco difícil por conta de haver muitas coisas atrapalhando no caminho, como caixas, coisas velhas, panelas ou mesmo varais de roupas e bacias cheias de outras coisas sujas, mas no fim conseguiram se afastar daquela confusão, indo para um local mais calmo…

Que não durou muito, pois logo algo os impediu de continuar.

Um vulto lhes derrubou, e quando tentaram se mover, não conseguiram. Sombras negras ficaram pousadas em cima de seus torsos, menos o de Tânatos. As sombras pareciam saber quem ele era, e só ficavam ao redor, rosnando, meio acuados.

— Não! Me devolva! — gritou James quando uma daquelas coisas cobertas de tecido preto e cinza pegou a lança, e correu em direção de um homem que estava sentado tranquilamente perto dos caixotes de verduras logo mais a frente.

— Faz milênios que não vejo gente de outros domínios por aqui… Isso deve indicar um mal sinal… — disse o homem, olhando com cobiça para aquela lança.

— Que merdas são essas coisas? Elas fedem! Fedem a rato morto! Argh…! — reclamou Panoptes, tentando tirar o ser de cima de si, mas recebendo um rosnar furioso na sua cara.

— Quanta grosseria… Entram sem permissão em nosso território, arrumam confusão, e agora, nos ofendem? Fora o prejuízo que teremos ao anoitecer. Nenhuma de minhas crianças poderão se alimentar por causa de vocês. — disse o homem, se levantando dos caixotes e caminhando lentamente até o trio ali no chão.

— Desculpe então por isso. Mas, não queremos problemas. Só estamos de passagem, coisa bem rápida. — disse James, tapando o nariz e a boca para não vomitar por conta daquele cheiro insuportável de podridão em cima dele.

— Você, é um jiangshi. — disse Tânatos, e a reação que o homem teve foi a do seu rosto, parte dele, cair no chão.

Panoptes arregalou os olhos, e James, ficou confuso quanto ao nome estranho que o deus disse, e seus enjoos aumentaram, quase vomitou em si mesmo por aquela visão horrenda e bizarra.

O homem tinha cabelos brancos, sua pele era pálida, mas não como a do deus da morte, a pele daquele homem era de um pálido adoecido, havia manchas escuras e verdes, estranhas, por toda parte de seus braços e nas partes que ele deixou descoberto. Seus olhos eram normais, tirando o fato de que cada um era de uma cor, um verde e outro âmbar. E apesar dessas características, suas vestes eram limpas e bem elegantes, assim como sua postura.

— E você, um serviçal. Um cata lixos do seu submundo. — Zombou o homem, a quem James não tinha entendido o que era ainda.

— Tânatos, quem é este senhor? Amigo seu? — perguntou James.

O deus lhe mirou, e balançou a cabeça em sinal para ele parar de falar.

— Amigos? Hm, está mais para meio sócios. Temos negócios parecidos. Mas a diferença é que ele não fica com a sujeira, somente com o que resta dos humanos quando deixam de respirar, e deixa pra trás o lixo para vocês humanos limparem. Já eu… Faço o trabalho todo, completo. O que não posso reclamar, é um trabalho recompensador.

— O que você quer em troca? — perguntou Tânatos, sempre com seus olhos fixos na lança. James lhe observou, e soube que o mesmo estava um tanto nervoso, e se ele estava assim, é porque a situação em que eles estavam era séria, muito séria.

— Porque eu iria querer? Já tenho minha compensação pelo prejuízo de vocês aqui na minha mão. — disse, erguendo a lança perto de seu rosto.

Quando o mesmo abriu a boca, uma língua negra saiu, envolvendo a haste.

— Faremos o que você quiser. — disse o deus, nunca levantando a voz, fazendo o outro recolher sua língua e rir.

— Qualquer coisa?

— Tânatos, o que está acontecendo? — perguntou James, apreensivo.

— Sr.  James Payne, por favor, não se envolva. — Aconselhou o deus.

— Verdade, humano. Ouça o que seu deus está falando. Às vezes eles podem ser sábios. E quanto à sua proposta, serviçal do submundo, eu aceito. Me encontrem na clareira ao norte da cidade, onde todos dão o último adeus. — disse o homem de cabelos brancos, pegando de volta do chão a parte do seu rosto que caiu e a colocando de volta no lugar, e logo um muco vermelho escuro começou a grudar de volta a carne junto  ao osso do crânio, e saiu do mesmo jeito que chegou, caminhando a passos lentos onde se havia sombras, e levando consigo, a lança.

Os seres que estavam em cima do torso do rapaz e do gigante saíram, correndo em direção ao seu mestre.

— Tânatos?! A lança…! Porque fez isso?!

— James, aquele ser não é um ser qualquer. E estamos totalmente em desvantagem. Os Jiangshi consomem seres vivos, absorvendo o seu qi, ou como vocês do ocidente chamam de “força vital”. Naquele momento… ele iria consumir Kýrios. E eu, não posso fazer nada aqui neste território. Seria um grande desastre, de todos os lados e sentidos. Esse trato foi o melhor que poderíamos fazer por hora.

James passou as mãos nos cabelos, entendendo toda a situação, mas ainda sim muito nervoso.

— Porra! — xingou, se levantando e chutando um caixote — Ok, mantenha a calma… — disse para si mesmo — É só um contratempo… Somente isso… Vai dar tudo certo… Não vai? — perguntou se virando para o deus.

Tânatos se levantou, se aproximou, e pôs uma mão em seu ombro para poder acalmá-lo.

— Escute, Sr.  James Payne, aconteça o que acontecer, não perca o centro. Tudo tem um porquê, tudo tem uma solução.

— Isso tudo está acontecendo por minha causa, não é? Droga… Se eu não tivesse…

— Ei, James. — Começou Panoptes — Não se culpe. Eu faria a mesma coisa. Você estava defendendo aquela humana. Se meus amigos estivessem naquela mesma situação, faria até pior. Eu os faria engolir suas próprias mãos, e depois, os jogaria para os cães comerem e os cagarem depois, e por último iria mostrar aos seus, mostrar a eles a merda que são.

James arqueou uma das sobrancelhas.

— Ãh… Certo. Obrigado pelo apoio… E pela ideia criativa. Mas…

— Temos que nos recompor agora. — Disse o deus — Não podemos nos deixar novamente levar pelos nossos impulsos. Toda estratégia e cautela agora é válida.

— Sim, você tem razão Tân. — Disse o gigante — Mas, apesar dessa coisa toda estar uma porcaria agora, acho que temos que procurar um lugar para descansar, comer algo, e só então pensar. Tomo mundo concorda?

James fez que sim, seu semblante cansado e derrotado não lhe deixava dizer o contrário, tinha que recuperar forças para poder lutar e se recuperar da surra que estava levando naquela briga. E o principal, pensar logo em algo.

•

Encontraram uma pousada, a única que os aceitou do jeito que estavam: sujos, feridos e cheirando a mortos em decomposição por causa daqueles jiangshis. Mas claro, o dono os orientou a entrar pelos fundos e ficarem na dispensa onde havia várias e várias caixas de legumes e vinhos locais, pois do jeito que estavam iriam espantar sua clientela.

— James. Seja mais rápido, estou com fome. — Lhe chamou Panoptes, chegando ali atrás do biombo e lhe jogando vestes novas e limpas que roubou de um varal alheio.

— Obrigado. E só um instante, em cinco segundos já fico pronto… — Como estava dentro de uma tina, as pegou com cuidado, deixando-as em uma pequena mesinha com sabão em pedra que havia ali do lado, que pelo cheiro, era feito com banha de porco.

— Mentiroso. — disse o gigante, bastante consciente de que aquele banho iria demorar bem mais do que cinco segundos.

James estava pensativo, ansioso, ficava se culpando mesmo que lhe dissessem para não pensar sobre isso, e mentalizava o tempo todo que iria ser mais focado em não arranjar confusão… Mas, ao mesmo tempo, como ele ia conseguir fazer vista grossa quando visse uma injustiça como aquela que estava acontecendo?

Pois é, não conseguia.

— Ei, nós vamos conseguir. Eu e Tânatos já estivemos em situações piores.

— Mas creio que nunca com a alma um amigo de vocês preso em uma lança mágica e que agora está nas mãos de um devorador de vitalidades.

Panoptes cruzou os braços, e respirou fundo.

— Eu não sou bom para consolar ninguém, então, a única coisa que posso dizer é que fique forte. E que não se ache ou se sinta muito merda. Porque, bom, você fez uma baita besteira mesmo. Mas, ainda estamos na arena para enfrentar esses leões. Pelo menos é assim que penso.

— Obrigado. Eu acho…

— Não demore muito. Tânatos e eu estaremos esperando lá fora. — disse, saindo da dispensa, deixando o rapaz sozinho.

James estava cabisbaixo enquanto olhava para a água, as vezes fazia uma bolha com o sabão de banha de porco, mas tudo era meio que automático. Se sentia, como sempre, inútil. Estava praticamente com a vida daquele deus em suas mãos, mas deixou escapar por conta de seu temperamento ou do repentino senso de justiça.

“Eu vou recuperá-lo, Kýrios. E quando você voltar, espero que me recompense com uma semana de folga dessa busca. Droga, o que deu em mim naquela hora?!”

Bateu na água, derramando bastante pelo chão e molhando alguns caixotes.

“Desse jeito vai ter que pagar pelo piso, ou ser expulso daqui”.  Disse uma voz feminina, mansa, em tom que parecia gentil, mas ao mesmo tempo, arteiro.

James tomou um grande susto quando do nada uma moça muito linda apareceu ali dentro de sua tina, estava nua, e a única coisa que escondia sua nudez eram as espumas.

O seu primeiro instinto foi fechar os olhos e se afastar o máximo que podia daquela mulher.

Ou melhor… deusa.

Ele reconheceu na hora quem era.

— Psiquê!

— James.

— Pelos céus, será que não tinha outro lugar para aparecer?! — disse, tentando cobrir suas partes íntimas.

— Hm, de ter tinha mas… apareci bem aqui porque você está se sentindo muito vulnerável. Literalmente sem defesas, e isso me preocupou. — disse, olhando para baixo para o meio das pernas do rapaz, que as fechou, sentindo seu rosto queimar.

— Céus, Psiquê, será que pode… Pare de olhar!

A deusa riu breve e balançou a cabeça em negativa.

— James, para quê tantas formalidades? Já somos amigos. Compartilhamos das mesmas dores, das mesmas esperanças, das mesmas inseguranças… E… do mesmo deus.

James revirou os olhos, passou uma mão no rosto e respirou fundo.

— Olha, senhora deusa, eu não estou com muito humor para brincadeiras ou mais insinuações. Eu não sei qual é seu jogo falando essas coisas, só sei que isso está me enchendo a paciência. Aliás, me desculpe ser indelicado, mas, se eu fosse você parava com essas merdas de ficar jogando aquele idiota pra cima de mim! Será que não consegue ver que eu sou homem? Que tenho uma honra a zelar? Um nome para não sujar?

— Sim, estou vendo que você é homem cheio de virtudes e honras. — Disse, dando uma risada contida, cobrindo a boca e apontando com a cabeça em direção novamente ao meio das pernas do rapaz, que quando seguiu seu olhar de novo, se virou de costas, desejando desaparecer dali.

Seu membro… estava ereto.

“Porque raios meu pau está assim numa hora dessas?!!” Pensou, mas a deusa sorriu de canto e balançou a cabeça em negativa.

— É porque, quanto mais você resistir, mais seu eu lhe desobedece, James. — Disse a deusa, apoiando sua cabeça no ombro do outro, se recostando em suas costas, James arregalou os olhos por entender que seus pensamentos foram ouvidos. — Ah, James, se você soubesse o quão bonito, organizado, mas também bem caótico é a mente em si… Ela guarda tantos mistérios… tantos segredos… Tudo fica guardado, até os mais sórdidos detalhes de toda nossas vidas.

— Porque está me falando isso?

— Não sei. Só sei que achei que devia. Eu te conheço muito mais que você mesmo. Então sei tudo o que sente. Sei o que deseja e o que não deseja fazer. Então sei que…

— Não diga mais nenhuma palavra. Por favor, eu não estou em uma boa hora!

— Eu sei. Por isso que vim.

— Acho que está perdendo seu tempo.

— Como perderei meu tempo? Tempo… hm… Isso é realmente muito relativo… Para você pode ser longo, curto, mas para mim… Por isso que você está desse jeito. Instável. Cheio de desejos a serem saciados. Hormônios a flor da pele…

— Oh céus, de novo não…

— Quando você achá-lo, peça à ele que o leve até uma praia solitária com morros.

— O que tem nessa praia? — perguntou, se virando para a deusa.

Psiquê sorriu, e pousou uma mão em seu rosto.

— A pergunta certa é: o que vai ter nessa praia.

— Tá, e o que vai ter nessa praia?

A deusa respirou fundo, e voltou a se sentar no outro lado da tina.

— Isso só saberemos quando se chegar lá. Vai depender de você.

— Ah não, pode parar com essa falação enigmática. Aliás, você está diferente, a última vez que a vi você estava com uma barriga de gestante. O que aconteceu? E por que está aqui? Se pode aparecer agora, porque me contatar ao em vez de Tânatos ou Panoptes? Psiquê, eu odeio joguinhos, então exijo que me responda tudo agora. Anda, desembucha! — Exigiu, e a loira sorriu de canto meio arteira inclinando a cabeça um pouco pro lado.

— Desembuchar o quê? — perguntou alguém atrás do rapaz.

James deu um pulo dentro da tina, e se virou para a voz.

Era Panoptes novamente.

— E-eu, posso explicar. — Disse, seu rosto parecendo pegar fogo por aquele flagra.

Como ele ia explicar que havia uma deusa, a própria quem eles também buscavam, que estava ali agora com ele dentro e completamente nua, compartilhando daquela tina como se fossem bem íntimos. E pior, havia uma ereção repentina que ele nem sequer estava pensando em algo de alguma natureza libidinosa para aquilo acontecer.

O que ele ia fazer?! Ou melhor, o que estava acontecendo com consigo?

— Sr. Payne, você está ficando louco ou o quê? Tudo bem que está triste e compreendo que fique com cara de uva murcha por todas essas desvantajosas situações, mas começar a falar sozinho? Não está sendo dramático demais?

— Não estou… é porque… Eu posso explicar… — quando olhou para trás, não havia mais ninguém — T-tem razão… estou sendo dramático. É isso. Estou estressado com tudo e não estou reagindo bem.

— Se está reconhecendo isso, então seus juízos estão em perfeito estado. Agora tira logo a bunda daí, Tânatos conseguiu pensar numa boa ideia. — disse, se virando — Se demorar mais, quando eu vir aqui de novo não vou me importar de arrastá-lo nu e cheio de sabão para o meio daquela taverna. Então se apresse. — E saiu outra vez da dispensa, fechando a porta atrás de si.

James respirou fundo e mergulhou até seu queixo e boca ficarem submersos na tina.

Sua mente começou a trabalhar no que tinha sido aquilo, da deusa aparecendo assim tão de repente pra ele.

“O que será que Psiquê quis dizer com todo aquele negócio de praia? E porque ela apareceu assim pra mim? Será que está conseguindo alguma forma de comunicação aonde ela está presa?” Pensou, se focando a terminar logo de vez seu banho, e… acalmar alguns nervos mais abaixo, uma outra questão completamente sem explicação.

•

A noite chegou rápido, James estava muito nervoso, toda hora ficava conferindo seu relógio de bolso, que pelos fusos horários, estava ainda com as horas londrinas.

Depois da longa conversa que teve com Tânatos e Panoptes sobre o que iriam fazer para resgatar a lança onde estava a alma do deus do amor, o trio foi para o local combinado que era bem afastado da cidade, limpo, somente árvores ao redor e algumas pedras em lugares que pareciam ser estratégicos.

Aquilo causava arrepios no rapaz, que sentia o ar dali um pouco denso. Além do mais, esperava que fosse se deparar com um local cheio de lapides ou algo do tipo, como um cemitério, já que pela descrição que o jiangshi tinha dito aquela dedução sobre “na clareira ao norte da cidade, onde todos dão o último adeus” isso se encaixava perfeitamente no perfil de um lugar sagrado para mortos.

— Será que meu relógio está adiantado? Talvez tenha se desconfigurado na queda… Ou então eles estão… — dizia James enquanto olhava seu relógio de bolso até ser interrompido por alguém que chegou ali sem aviso algum.

— Atrasados? Talvez para o jantar. — disse aquele tal jiangshi que tinha lhes interceptado, interrompendo a fala do rapaz, que se afastou rapidamente para trás ao ouvir sua voz tão perto de seu ouvido.

— Trouxe a lança? — perguntou Tânatos, sem rodeios, e o morto-vivo apontou para uma comprida haste em suas costas, estava embrulhada em tecidos envelhecidos, e desfez uma parte para demostrar que era mesmo a arma — Diga, o que quer de nós?

— Pagamento pelos prejuízos. Vejam, minhas crianças estão com fome. Mas há guardas imperiais em meu território todo… Vou ser direto, pois não tenho todo tempo: Quero traga para mim três crianças, três moças e três senhoras de idade.

James arregalou os olhos, não precisou o outro explicar mais.

— Certo. Há algum prazo? — perguntou o deus da morte.

— Tânatos…?! — lhe chamou James, um tanto intrigado pela reação fria do deus à aquele pedido macabro.

— Até o amanhecer. Todas têm que estar aqui antes do primeiro raiar. Melhor, quanto mais cedo, mais chances terão em ter isso aqui de volta. Aproveitem que eu estou de bom humor. Eu não costumo fazer tratos. Mas eu estava entediado, e este evento está me deixando animado.

— Estaremos aqui com todas as nove. Alguma mais condição?

— Ooh, quanta generosidade e assistência… Hm, está bem, tem mais uma: Quero uma das moças, uma que vive arrumando o templo do Dragão Azul. Ela tem uma grande quantidade de vitalidade, é divino… — o jiangshi lambeu os lábios, sedento ao pensar na moça — Ela está repleta de vitalidade, isso por estar sempre em contato cultuando-o, só o cheiro que ela emana me dá água na boca… Eu a quero.

— Algo mais?

O jiangshi arqueou as sobrancelhas, e riu.

— Uma vez ouvi um estrangeiro que veio aqui em Pequim, era de outro domínio, aquele com um só em poder, aquele que o chamam de “Ele”. — a menção do Todo Poderoso fez os ventos ficarem agitados, fazendo as folhagens ao redor rodopiarem por um instante. — Continuando… ele tinha dito algo muito sábio, e gostei do que ele disse, era algo como “quando a esmola é muita…”

— Todo santo desconfia. — Completou James.

— Isso mesmo. Que bom que sabem disso. E então, posso desconfiar de tanta gentileza que estão me oferecendo?

— Nó queremos o que pegou de nós. — Começou Panoptes — Se estamos aqui nessa merda e aceitando seus termos, é porque queremos muito que nos devolva. O motivo, a alma de nosso melhor amigo está aí. E faremos qualquer coisa.

O jiangshi sorriu muito contente com a informação.

— Se é assim, o que estão esperando? Pelas minhas contas, vocês só têm quatro horas. Aqui o sol acorda cedo. Então divirtam-se. Ficarei aqui na espera com minhas crianças. — Assim que disse isso, um monte de mortos-vivos apareceu ali, rodeando o seu mestre.

James, Panoptes e Tânatos então voltaram para a cidade, em silêncio, pensativos.

Haviam formado uma estratégia, e estavam preparados para qualquer imprevisto que fosse acontecer de novo. Até para aquele tipo de pedido mais que previsível do jiangshi.

— Bem como havíamos previsto. — Comentou James, e continuou — Agora, vamos logo roubar logo aqueles porcos que vimos na feira. Você Panoptes, traga o máximo de sacos vazios de batata da dispensa. E Tânatos… Bem, como combinamos, antes ficará com a parte de “machucar” mas não muito aqueles animais, ok? — disse, ainda muito incomodo pela ideia, pois era algo que estavam arriscando, não tinham certeza se daria certo.

— James, não há como. Essa parte… Ainda não me entra muito. — Começou o gigante — Não discordo que porcos tenham uma carne parecida coma de humanos, mas creio que assim que ele abrir as sacolas e sentir o cheiro, vai saber na hora. Acho que teremos que apelar para forças maiores. E arriscar na sorte de não sermos pegos por algum conspirador de Zeus. — disse Panoptes, tirando de seu bolso a chave da mansão de seu pescoço.

— Panoptes, ainda não. — Advertiu Tânatos — Não foi o que combinamos.

— Só temos quatro horas!

—  Panoptes está certo. — disse James, coçando queixo enquanto matinha um semblante pensativo — Aquele morto-vivo pode logo perceber. Quer dizer, vocês sentem quando é algum ser de outro domínio, não é? — questionou James.

— Sim, sentimos. — Respondeu o deus pálido.

— Certo, sei que é perigoso. Mas temos logo que botar isso em pratica de alguma forma. Eu concordo com o Panoptes, mas também com você Tânatos, e por isso, sugiro uma união da ideia de ambos: eu sou um humano, praticamente tenho passo livre em qualquer domínio, então, se usarmos isso em nosso favor e voltarmos ao que eu tinha dito na nossa reunião lá na taverna sobre eu ir a algum templo e pegar seja o que de sagrado para colocar junto desses porcos, o jiangshi, quando for querer analisar as sacolas, verá uma energia daqui do domínio dele, mas contendo em mínima escala a de vocês. Eu sinto muitíssimo por ter que profanar algo, mas é questão de sobrevivência não? — disse James, mais determinado — Ele vai pensar que os porcos/corpos estão assim um pouco diferentes em sua vitalidade por causa da influência de vocês dois em ter tocado no corpo delas quando as “sequestraram”. Pronto. Um risco perfeito.

— Está com mais ânimo. O que aconteceu? — perguntou Tânatos.

— Nada, é só… Eu quero fazer as coisas darem certo. Por mérito, e não por sorte. Quero arriscar, mas tendo uma base bem firme para estarmos preparados para qualquer inconveniente. Então… Panoptes, quantos fios de Métis temos mesmo?  — questionou, cerrando os punhos um pouco nervoso.

— Temos doze. Eu poderia pegar mais lá na mansão… Mas ok, vamos trabalhar então só com isso. — respondeu o gigante.

— Se está decidido que vamos fazer isso mesmo, então vou trazer logo os porcos. Se protejam como puderem até lá. — disse Tânatos, pegando uma flor que crescia em um canto qualquer e absorveu sua vida, sumindo numa nuvem de poeira negra.

Claro, era o mínimo do mínimo que ele podia fazer sem abalar ou chamar atenção de mais alguém daquele domínio. E era a única chance que poderia usar sem que o ambiente ao seu redor percebesse sua divindade. E só. Não podia haver erros, já que não haveria uma segunda vez para poder usar.

James e Panoptes então começaram seu teatro, correndo pelas ruas, fingindo estarem procurando alguém para a contagem do acordo. As ruas estavam completamente vazias de pessoas comuns, só tinham guardas, e por isso, tinham que se esgueirar pelas ruelas e becos para eles não os notar.

— Panoptes, eu tive uma ideia. Um complemento ao nosso plano.

— Diga, é algo relacionado às “moças”?

— Sim, quer dizer… Eu tive um certo pressentimento sobre quando aquele jiangshi falou sobre a tal moça com vitalidade boa. Ele falou que ela emana cheiro de deuses… E se…, mas é só para dar mais embasamento e veracidade.

— Deuses, James… Tânatos nos disse para não nos metermos em problemas… Mas sua ideia é genial! Eu topo.

— Mas ainda não expliquei nada. E nem disse que era uma ideia mesmo, mas sim, um complemento.

— Dá no mesmo. Vamos até lá nesse tal templo! — disse, voltando a se esgueirarem pelos becos.

É, não foi mesmo difícil de se encontrar o tal templo do Dragão Azul. E mesmo que já bem tarde, ainda estava aberta naquele horário. Pois havia alguns adoradores indo para acender incensos.

Cobrindo suas cabeças com mantos que haviam conseguido pelo caminho em um dos quintais, caminharam tranquilamente pelas sombras das casas, passando sem problemas pelos guardas imperiais que faziam rondas por ali.

— Uau. — Murmurou James ao entrar no templo.

Era incrível a riqueza de detalhes, tudo em dourado e vermelho, tudo muito bem cuidado. Havia várias oferendas como frutas e tecidos, e o principal, incensos. O lugar era bastante perfumado. James tinha a sensação de estar mergulhado em uma banheira de colônia cara e cheia de pétalas de flores.

Havia várias moças e senhoras por ali, e ao olhar do rapaz, todas eram iguais, já que trajavam roupas parecidas, todas simples, como camponesas.

— Panoptes, você sabe sentir vitalidades?

— Hm, não, mas sei testar.

— Como?

— Assim.

O gigante então começou a tirar as roupas, ficando somente com sua roupa de baixo. James até que tentou impedi-lo, mas já era tarde demais…

— Ei! Donzelas! Olhem pra mim! — disse, em alto bom som, mesmo que elas não fossem entende-lo.

E todas lhe miraram por terem suas atenções chamadas por aquele louco que estava profanado seu templo.

Muitas gritaram, saíram correndo com seus rostos vermelhos, mas somente uma ficou para trás, uma que estava com um cabo de vassoura na mão em frente ao altar, como se estivesse tentando defender a honra de seu amado lugar e deus.

A mesma gritou várias coisas, mas como nem James e nem Panoptes entendiam, ficaram onde estavam, e claro, o gigante vestiu novamente seus trajes.

— Viu? Só uma pessoa cheia de vitalidade vai fazer esses tipos de loucura. Ficam tão motivados e inspirados que levam tudo muito à sério. Até o medo desaparece.

James fez uma expressão impressionada pela curiosidade, guardando aquela informação para si para ser usada em algum futuro acontecimento do tipo.

— Moça, olha, não estamos querendo machucá-la, veja. — James se sentou no chão, e ergueu as mãos, e deu sinal para o gigante fazer isso também — Só queremos ajuda. Uma sua. Eu. Querer ajuda. — disse, gesticulando uma mímica de mãos e braços sobre sua cabeça, enquanto apontava para a estátua esculpida de dragão — Você. É uma divindade? — perguntou, fazendo outra mímica.

A moça continuava a falar e eles sem entender. Mas o cabo da vassoura apontada pra eles explicava muito bem: que eles tinham que sair dali imediatamente.

— Isso não está dando muito certo… Creio que se demoramos mais, vamos é levar vassouradas. — Comentou James, tentando manter uma expressão simpática para a moça, mas a mesma se mantinha arredia, como uma verdadeira guerreira. Panoptes deu de ombros, pensando no que podia fazer para ajudar seu companheiro naquela situação complicada de comunicação.

— Suas suposições estão quase certas, humano. — Disse alguém atrás da dupla, que logo se virou para a voz grave.

A moça correu até o homem, e se ajoelhou perante ele, encostando sua cabeça no chão em sinal de grande respeito.

— O que criaturas do domínio grego estão fazendo aqui? Vieram nos trazer o caos novamente? — perguntou o homem, seu ar altivo e imponente, e tudo isso era intensificado por uma veste, uma espécie de túnica em tons de azul marinho, havia escamas que brilhavam em furta-cor acompanhando o movimento das chamas das pequenas lanternas.

James e Panoptes olharam entre si, contentes pelo resultado, muito mais do que o esperado.

— Olá, meu nome é James Payne. Não sou grego. Mas ele é. — se apresentou, um pouco nervoso, mas com uma postura elegante como pessoas de sua classe social faziam quando estavam diante de alguém importante.

— Sim, vejo. E mesmo assim, nem ele, e nem você, são bem vindos aqui.

— Mas…

— Sem mais. Estou lhes dando a oportunidade de irem sem quaisquer danos. Isso é ainda um aviso. E não costumo repetir. Vão.

— Senhor! Não podemos! Há um jiangshi que está em poder de algo muito importante para nós! Um artefato que está guardando a alma de nosso amigo, e se não entregarmos nove mulheres, e uma delas tem que ser a moça que cuida desse templo, ele vai devorar a vitalidade dele! Mas nós não vamos entregar, temos um plano que irá… — James não parava um segundo para tomar fôlego, e só parou quando o homem lhe interrompeu.

— Sabia que um dia eu encontraria aquele… — disse, cerrando um punho e colocando o outro às costas de forma rígida — Então é isso, ele quer mesmo sua vingança… — fechando os olhos por um segundo como se tivesse meditando ou pensando em algo se virou de novo para os dois estrangeiros, e deu um aceno de cabeça num inclinar rápido e sutil de corpo — Vou ajudar vocês.

— O quê? Quer dizer, vai mesmo nos ajudar? — perguntou James, ficando muito contente por dentro.

— Sim. Esse jiangshi está a séculos perturbando a paz desta cidade. Mas nunca ninguém consegue pegá-lo, ele sempre muda de forma, sempre mudando de rosto, assim como todas as partes de seu corpo. Me diz, ele ainda tem os olhos um verde e outro amarelo?

— Sim.

— Maldito… — o homem bateu em punho fechado na mesa de oferendas, sua expressão aborrecida indicava seu alto descontentamento — Ele vai me pagar… Onde ele está?

— A última vez que o vimos, estava numa clareira ao norte daqui. — Respondeu Panoptes — Mas com certeza, já deve ter de escondido.

— Qual o plano de vocês?

Mais uma vez o rapaz e o gigante se entreolharam, cada vez mais otimistas.

— O plano é o seguinte…

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Capítulo 18
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Missão Ágape

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O Olimpo está em crise, e tudo porque de repente uma profecia disse que um deus iria dizimar o seu sistema e tudo que eles lutaram para conquistar e poderem estar no poder até hoje.

E é...

Chapters

  • Capítulo 47 Proemial
  • Capítulo 46 Alto Mar
  • Capítulo 45 Anelos
  • Capítulo 44 Verdades da Alma
  • Capítulo 43 Premências Difíceis
  • Capítulo 42 Enraizados
  • Capítulo 41 Chaves Sinceras
  • Capítulo 40 Presença
  • Capítulo 39 Luz Misteriosa
  • Capítulo 38 Possibilidades
  • Capítulo 37 Espólios
  • Capítulo 36 Fogo
  • Capítulo 35 Visitas Indesejadas
  • Capítulo 34 Penalidades
  • Capítulo 33 Mais, ou Menos
  • Capítulo 32 Temerário
  • Capítulo 31 Serviços Extras
  • Capítulo 30 Zelus
  • Capítulo 29 Magnetismo
  • Capítulo 28 Despertando
  • Capítulo 27 Sem Céu para Inocentes
  • Capítulo 26 Entre Mortais
  • Capítulo 25 Nuances
  • Capítulo 24 Céu de Luzes
  • Capítulo 23 Sobreposição (parte 2)
  • Capítulo 22 Sobreposição (parte 1)
  • Capítulo 21 Café Quente
  • Capítulo 20 Conselhos
  • Capítulo 19 Muros em Chamas (parte 3)
  • Capítulo 18 Muros em Chamas (parte 2)
  • Capítulo 17 Muros em Chamas (parte 1)
  • Capítulo 16 Cem Olhos
  • Capítulo 15 Nobre Amizade
  • Capítulo 14 Impulsos
  • Capítulo 13 Abaixo da Superfície
  • Capítulo 12 Fim de Festa
  • Capítulo 11 Fagulhas
  • Capítulo 10 Noite de Cores
  • Capítulo 9 Sopa de Ossos
  • Capítulo 8 Saindo do Ninho
  • Capítulo 7 Dádivas
  • Capítulo 6 Reunião Cancelada
  • Capítulo 5 Sonhos?
  • Capítulo 4 Empecilhos
  • Capítulo 3 Efúgio
  • Capítulo 2 Bençãos á Vista
  • Capítulo 1 Sem Opção
  • Capítulo 0 Prólogo dos Contratempos do Amor

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