Capítulo 27
Uma sensação de vazio. Uma sensação de que o mundo inteiro caiu sobre sua cabeça e não tinha outra opção a não ser ter seu crânio esmagado por toda aquela atroz dor.
James sentiu seus olhos se encherem de lágrimas, mas não sabia o porquê, já que aquele assunto não era algo ligado à ele. Culpou o fato de que possivelmente por estar ligado ao deus naquela “quase possessão” em que metade de seu corpo estava parecendo à ele, de que isso fosse algo que poderia acontecer em momentos mais críticos como aquele.
Kýrios foi o primeiro a reagir, uma grande ânsia lhe tomou conta e não conseguiu se segurar.
Vomitou. E sentiu seu peito se espedaçar.
Tudo porque…
Ali no chão jazia uma criatura pura que um dia poderia ser como ele, um deus, ou uma deusa, ou quem sabe ambígua, como era um dos irmãos daquele deus.
Os cachos bem ondulados e dourados tinham um certo brilho, mas talvez seria por conta do icor, sangue dos deuses. E havia aquela marca, aquela que sua amada tinha na palma da mão, um singelo sinal que parecia uma borboleta.
Era a marca de sua amada deusa.
Kýrio vomitou outra vez, mesmo não tendo nada mais para pôr pra fora. James se sentia tonto pela reação do deus, sentia uma dor profunda tanto em seu peito quanto em seu estômago.
— Zeus cortou o mal pela raiz. Veja, mesmo morta ainda emite uma energia superior a cem desses seres aqui. E ainda me diz que não estava planejando junto com seus amigos traidores usurpar Zeus e toda sua família? Eu poderia até entrar nesse plano, mas ao ver que Lorde Hades se voltaria contra mim e minhas irmãs… É claro que lá no fundo ele queria ter seu lugar no Olimpo, queria ter o poder assim como Zeus e Poseidon. E claro, esse ressentimento foi alimentado ainda mais pela esperança de ter finalmente seu lugar à luz.
James ainda estava ali no chão por causa de Kýrios, que segurava um choro, preso em sua garganta. A dor era angustiante, e mesmo assim, sua cabeça inundada de sentimentos fortes que vinha do outro, mesmo assim uma pequena parte era salva pelo seu raciocínio diante daquilo tudo.
— Vocês… Não tem muita imaginação, não é? — disse James, e quando levantou a cabeça, somente seu olho esquerdo lagrimava, liberando toda sua dor — Parece que a desculpa de “reconhecimento” é a arma de vocês atualmente. Porque isso me é tão familiar?
— James, o que você está dizendo? — perguntou Kýrios, engolindo um nó na garganta.
— Atena e Hefesto prometeram e falaram a mesma coisa para Erictônio. Um lugar, um reconhecimento por todos no Olimpo. Mas aqui agora vejo que Zeus usou a mesma motivação, mas numa versão um pouco diferente.
— James, isso não importa agora! Meu… filho… — a voz do deus saiu embargada, e cada vez que olhava para aquele feto entre os vidros estilhaçados após a queda pelo susto quando viu o que era dentro daquele pote, cada vez mais seu coração doía.
— Acha que isso é alguma farsa? Ha, quem dera se fosse. Eu tinha esperança de que tudo isso fosse mentira… Eu resisti a acreditar que… Mas, tudo era mesmo verdade! Aleteia foi convocada para o julgamento, e confirmou tudo. Vocês são culpados! — vociferou Megera, fechando um punho com raiva e decepção.
— Não. Isso não pode ser verdade! Tem algo que está errado…! — James protestou, mas foi impedido por Kýrios.
— James, nada disso importa neste exato momento. — disse, sua voz saindo muito séria — Zeus matou meu filho. E agora… — soluçou, engolindo aquele nó dolorido em sua garganta — …ele terá de pagar.
— Pagar? — questionou Megera — Como ousa o desafiar? Um criminoso, um traidor do Olimpo, e de tudo que ele estava mantendo por todos esses milênios. Poderia haver muita coisa podre, mas havia paz.
Quanto mais a erínia falava, mais a raiva no deus do amor crescia. James sentia isso, e sentia cada vez mais sufocado por aquilo.
— Kýrios… Por favor, sei que a situação não é boa, mas, não se deixe levar. Porque, eu…
— Você e todos que se juntaram nessa causa de Zeus e sua loucura vão pagar! — esbravejou, com toda sua ira.
Era bem nítido que o deus estava entrando em uma fúria que nunca em toda sua longa vida havia sentido, quer dizer… Essa agora estava sendo mais agoniante, o que era muito curioso para todo mundo, já que isso estava indo contra sua natureza.
— Kýrios, se controle! Você não pode ficar assim! — disse Panoptes, segurando-o pelos braços.
— Estou cansado de tanto levar pancadas e nunca fazer nada! Zeus e todos seus seguidores começaram isso! E eu vou fazê-los terminar! — disse, empurrando o gigante para longe com suas asas, abrindo as mesmas, e no mesmo segundo Tânatos se colocou a sua frente, lhe afastando do feto caído ali no chão.
— Kýrios, você não pode cruzar o limite de sua essência. Isso pode ter consequências! — alertou o deus da morte.
— Zeus cruza limites todos os dias em que respira. Tânatos, saia da minha frente.
— Não posso deixá-lo fazer isso. O nosso plano tem que continuar! Por ela! Lembre-se!
— Mas é por ela, e por nosso filho, que terei que fazer isso. Tânatos, lhe peço, saia da minha frente.
— Kýrios… Por favor… — lhe chamou James — Lembre-se de que está no meu corpo! Você vai me matar se continuar dessa maneira! — disse, sentindo seu peito apertar, como se a qualquer momento ele fosse infartar.
— Ah, sim, meu corpo… Obrigado, James, por me lembrar disso. — disse, a voz saindo seca e com um fundo de ódio — Acho que está na hora de fazer uma visitinha naquele antro de serpentes. — Quando deu um passo para trás, Tânatos colocou a lâmina da foice contra seu pescoço, e nas suas costas, havia a lança, sendo apontada por Panoptes — Até vocês?
— Kýrios, você está ficando cego pelo ódio! Isso vai contra toda a harmonia do universo! — disse Tânatos, seu semblante muito aflito.
— Se eu tiver que bagunçar a “harmonia do universo”, eu farei!
— Não nos obrigue a isso, Kýrios! — avisou Panoptes, apertando um pouco mais a lança contra suas costas.
— Eu digo o mesmo.
De repente James caiu por sobre seus joelhos e começou a gritar, era uma dor muito forte vinda de suas costas. Não era a lança, a dor vinha de dentro para fora.
— Deuses! Ele vai matá-lo! Tânatos! Faça alguma coisa! — pediu o gigante.
Megera, aproveitando toda aquela instabilidade entre o grupo, apontou seu chicote para frente em sinal para todos aqueles monstros começarem a atacar.
E um pandemônio se iniciou.
Tânatos se virou para se defender dos ataques, sua foice conseguia varrer metade dos monstros e transforma-los em meras poeiras escarlate, Panoptes deixou a lança de lado pela mesma começar a queimar em suas mãos, e rapidamente tirou suas duas espadas da cintura, estas que se escondia com magia, assim como sua aparência. Já Li-Hua… O que lhe restou é ter que também se defender como podia somente com seu punhal, e até que estava se saindo muito bem, mesmo que usasse algumas coisas circenses como pular ou dar um mortal para trás para fugir e defender.
Eram empousas, gorgonas morta-vivas, ortros, algumas quimeras de várias outras misturas, e centenas de almas penadas vindas de Asfódelos e Tártaro que com certeza aceitaram trabalhar para Megera em troca de não mais sofrerem as punições de suas irmãs erínias. Todos atacavam aquele grupo pequeno, mas não menos competente.
James se contorcia no chão, tentando aguentar as instabilidades emocionais de Kýrios, que estava ficando mais e mais cego pela dor e raiva.
— Kýrios, por favor…!! Aarrrh! — gritou, sentindo um osso de suas costas se quebrar.
— Do caos tudo veio, e pro caos tudo retornará… — disse o deus, parecia estar entrando num transe bélico.
— Que…?! Kýrios… Que porra está dizendo…?! ARRRH! — mais um osso foi contorcido, e o estalo que fazia era claramente de alguma vertebra sua sendo repuxada para esquerda.
E pior que isso… Algo rasgava a pele perto de sua omoplata…
Algo saía de suas costas…
— Merda! Tânatos! — chamou Panoptes, vendo o que estava acontecendo com o rapaz.
Tânatos ficou com um semblante mais apreensivo, tentou ir até James, mas foi impedido por mais uma enxurrada de almas que lhe vinham sem parar.
— Panoptes! Leve-o daqui! — ordenou, mas não deu tempo para o outro fazer alguma coisa.
E ainda aos gritos, mas agora contidos por causa de Kýrios estar em um estado quase catatônico, James se levantou, havia uma asa torta e toda mal feita do lado direito, faltando penas e muitas partes amostra revelavam ossos e carne viva, que sangrava, como uma ferida muito inflamada. O rosto do rapaz mostrava sofrimento, até uma grande força para resistir ao deus que parecia querer tomar conta de seu simples corpo humano, que evidentemente não iria suportar aquela posse completa.
Ling-Su havia avisado sobre isso… James se lembrou dessa informação, e pensou ali em meio ao tormento que a bruxa pudesse ter visto isso acontecer, por isso o aviso que lhe deu antes de fazer aquele ritual.
Que ele não quis escutar.
Caminhando a passos lentos e esforçados por conta da dor, James e Kýrios iam dolorosamente em direção ao feto. Era surpreendente como nenhum monstro conseguia alcançá-lo, como se houvesse uma barreira que fazia todos que tentassem se aproximar virarem pó de sangue, ou quando não era isso, alguns se tornavam um amontoado de carne, pedaços iguais a que um açougueiro fazia.
Tânatos estava na frente, se defendia de muitos outros monstros que vinham em sua direção e de Li-Hua, que àquela hora estava toda suja em vermelho pelos monstros e almas que ela e Panoptes conseguiam matar. Era uma moça frágil, mas mostrava uma bravura admirável.
— Kýrios. — Tânatos lhe chamou, e quando tentou se aproximar, viu que a ponta de seus dedos se desfez em poeira. Apesar da tamanha perigosidade e densidade daquela barreira, o deus parecia não estar surpreso ao ver tudo aquilo, pelo ao contrário, seu semblante era triste, e por isso, não impediu o avanço do outro deus até seu destino desejado.
James se sentia como um pássaro que foi apedrejado e estava tentando se erguer para voar novamente, mas havia perdido o controle de seu corpo, somente sua consciência estava intacta, e mesmo assim, lutava para não perder até isso.
“Kýrios… Por favor… Pare… Você tem que parar…!”. James implorava, mas não havia nenhuma resposta, somente um som de um vazio ensurdecedor lhe rodeava.
Ele só conseguia assistir… E lutar pelo seu lugar.
Os passos mancos eram dramáticos, e James sentia seu rosto sempre molhado, eram as lágrimas daquele deus que não paravam de cair.
A cria pura ainda estava ali, era como se tudo ao redor não lhe atingisse, provando ser ainda mais que era mesmo seu fruto, o fruto de um amor que destruíram sem piedade.
O deus do amor então se abaixou, cada movimento era feito de forma branda, contrastando com o turbilhão que acontecia ao seu redor.
Suas mãos se estenderam, já que havia tomado conta de ambas. Mesmo que pudesse se cortar por conta dos cacos de vidro, ignorou, e entre o ferir de seus dedos, tirou o diminuto bebê do meio daquela bagunça sangrenta.
Os olhos tão dourados e multicolores quase não apareciam, a pupila completamente dilatada ocultava a beleza de suas íris, era como se só houvesse vazio por trás de seu olhar.
E com muito carinho e cuidado, mesmo que já não precisasse, colocou a sua cria contra o peito, lhe abraçando com muita delicadeza.
E derramou algumas lágrimas sobre aquela criatura inocente.
James via a tudo ali em silêncio, sofria com o sofrimento do deus.
— Tânatos! O que está havendo com ele?! — perguntou alto Panoptes por estar um pouco longe deles.
O deus da morte não quis responder, somente observava as ações do outro deus enquanto que agora sua foice batalhava para si, matando os monstros sozinha, mas sob seu comando de deixa-la ir para onde quisesse.
— Kýrios. — Tânatos lhe chamou, mas não houve resposta.
— Ainda… há um jeito? — perguntou de repente o deus do amor, sua expressão de dor quase cedendo para uma inexpressiva.
Tânatos fungou em cansaço, e balançou a cabeça em negativa.
Kýrios então fechou os olhos e se levantou com o bebê ainda contra seu peito.
— Espero que não fique em meu caminho, meu amigo.
— Não ficarei. Aceitar a perda é o primeiro passo. Vá. — disse Tânatos, parecendo agir como age em seu trabalho quando tinha que buscar as almas de sua lista.
Era a única coisa que podia fazer agora.
O deus da morte ergueu uma mão, abrindo um portal para o amigo, que lhe deu um aceno de cabeça em despedida.
Panoptes via tudo e ficava sem saber o que pensar, mas também não tinha muito o que fazer quando estava lutando pela sua vida e a da moça, que mesmo muito assustada continuava a lutar.
Assim que passou pelo portal, a brisa logo bateu em seu rosto, era noite, sem lua, mas havia algumas tochas acesas ao redor. Olhou para todos os lados e reconheceu estar em um templo, a imagem ao fundo respondeu sua dúvida de quem era.
— Olá, mãe. — disse Kýrios, caminhando até a estátua de Afrodite, e se ajoelhando perante ela — Será que pode cuidar? Por favor mãe, preciso de sua ajuda… Eu imploro… — perguntou, mesmo sabendo que a mesma não ouvia e não estava ali para lhe ajudar.
Abaixou seu olhar para a criança, e vendo uma bandeja prateada, o pousou ali, escondendo-o no meio de algumas pedras de mármore que haviam por ali no altar.
Assim que terminou, se virou, voltando-se para fora, olhando o céu.
James entendeu qual seria o próximo passo, e pela última vez, tentou impedi-lo.
“Kýrios… Não vá… Eles o ferirão! E eu posso não resistir dessa vez… Por favor, me ouça!”.
O deus se manteve em silencio, como se não tivesse escutado nada.
E mesmo tendo somente uma asa saudável, mancou até o fim do terreno, encontrando uma costa rochosa íngreme, e sem pestanejar, se jogou.
James logo lembrou daquela vez lá na mansão que o deus tinha feito a mesma coisa, havia se jogado da murada, assustando-o, mas no fim ele estava bem.
Mas dessa vez era diferente, o salto feito iria lhes levar de encontro as pedras e o chão de terra, e cada centímetro que se aproximava nada de magico acontecia.
“Será que… Kýrios está desistindo de tudo?!”. James pensou.
A velocidade só aumentava, e mais daquela maresia se tornava forte pela aproximação. Seria uma queda feia, e ele não teria chances alguma naquele momento.
Então era assim que acabaria?
Não, ele não podia deixar isso acontecer!
Mas antes que pudesse pensar em alguma coisa, uma fenda brilhando em dourado se abriu diante deles, e a luz que irradiou dali ofuscou toda a sua visão.
Pareceu que foram minutos, o tempo havia parado de modo estranho, as paredes não tinham forma, não tinham profundidade, ou pode ser que até tinham, mas tudo era confuso demais para saber. Até as cores se misturavam constantemente, mas ao mesmo tempo, faziam formar familiares a alguma coisa que parecia estar vindo de sua mente, mas tudo estava disperso demais para se lembrar de qual forma se fazia referência.
Aquela curta viagem pareceu durar uma eternidade, mas no fim, sem que percebesse, estava em pé em um lugar estranho. Percebeu que estava em um lugar muito brilhante e todo dourado.
Era um lugar muito lindo, até muito mais que a mansão, mas, para James, mesmo que tivesse nascido em berço de ouro aquilo era muito exagerado. Preferiria mil vezes o lar do deus, pois se sentia confortável e acolhido ali pela “simplicidade”, em outras palavras, era mais harmonioso, havia um equilíbrio de rusticidade e requinte, os moveis tinha sua beleza suave, mas também demostravam uma certa sensualidade em seus adornos, uma elegância do jeito que ele sonhava em fazer quando um dia pudesse ter sua própria casa.
Kýrios olhou para tudo ao redor, e sua raiva cresceu ainda mais. Mas havia um primeiro objetivo antes de fazer o que queria.
Era estranho que não houvesse ninguém por ali.
Isso até uma voz lhe sussurrar.
“Que isto seja o meu pagamento. E nossas dívidas estarão quitadas”.
Kýrios ficou procurando, querendo saber de onde veio aquela voz, mas não havia nenhum sinal ou energia que pudesse entregar a posição e a identidade do ser.
James havia ouvido também, e tentou se lembrar se já não tinha escutado aquela voz algum dia. Parecia… bem familiar, como o de alguém bem próximo, um alguém de sua casa. Mas sua consciência estava ficando tão anuviada que mal conseguia pensar direito, já que todas suas forças eram para se manter vivo e consciente ali dentro.
Com aquela “facilidade”, o deus do amor não se demorou. Conhecia aquele lugar do início ao fim e cada canto dele. Era um dos poucos que gostava de conhecer tudo que existia ali de cada lugar. Principalmente quando se aventurava pelos jardins e quintais dos deuses acompanhado de sua amada.
Cada canto guardava uma memória inesquecível…
“Estão… todos estão congelados?” Perguntou-se James vendo todos em inércia, como estátuas, mas cada uma fazia algo, algumas ninfas corriam, alguns mensageiros estavam sentados contemplando as flores ou o céu enquanto conversavam entre si, mas todos pareciam manequins realísticos.
O deus do amor não parou para investigar o que estava acontecendo, e muito menos analisava se aquilo tudo era algum tipo de armadilha, estava cego em ira e dor, não lhe importava qualquer consequência.
Seus passos eram determinados e sua postura altiva de um deus sobressaía a aquele doce, relaxado, gentil e às vezes sem noção, que James conhecia até então. Seus movimentos pareciam as de um militar indo em algum desfile ou cerimonia, havia um foco inquebrável, mesmo que mancasse por conta de o frágil corpo humano estar muito dolorido, até movimentar aquela asa mal feita era lancinante.
Quando chegou até a avenida a situação era a mesma, havia alguns deuses menores, estáticos, fazendo coisas fúteis como comer uvas em bancos acolchoados e dourados, e outros ordenando criados limpar algo que havia sido derramado por eles.
E lá ao fundo estava o maior palácio de todo o Olimpo, o palácio de Zeus, a sede principal onde acontecia todos os julgamentos, reuniões e todos os tipos de eventos que se tinha conhecimento naquele domínio.
Para os olhos de James, era tudo só mais exageros. Pensou até em agradecer por Kýrios não ter sido tão pomposo em cumprir ao pé da letra quando ele disse que iria sustentá-lo para sempre se fosse possível e que daria todo tipo de luxo possível.
James então viu que Kýrios parou diante da enorme escada, e como alguém que não queria perder tempo com todos aqueles degraus, usou as asas.
Aquilo parecia uma tortura, cada bater da asa era como uma chicotada em suas costas, era horrível a sensação de seus ossos se remexendo contra sua coluna, parecia que estava esfregando uma pedra na outra para acender fogo, pois também cada movimento lhe fazia ter a sensação de que seu corpo estava queimando.
No salão, vários e vários deuses do panteão principal estavam ali: Hera, Atena, Artemis, Hestia… E todos estavam da mesma forma, paralisados.
E no meio daquele salão dourado e enervado pelas discussões que pareciam ter, lá estava seu corpo, jazendo em cima de uma pedra polida de mármore branco, cercado por uma espécie de campo ou barreira que Hécate conjurava, seu olhar era curioso, como se estudasse ou estivesse prestes a dissecar um animal.
Kýrios então se aproximou, olhou tudo em volta, procurando quem ele queria, mas não estava ali. Ficou irritado, mas primeiro sabia o que tinha que fazer antes de enfrentá-lo.
Sua barreira de caos então novamente se intensificou, e quando se aproximou de Hécate, a mesma acordou de seu estado de inércia, caindo para trás num susto quando viu um rapaz todo debilitado e com uma asa direita que parecia a de um pássaro em frangalhos, só que mais pisoteado e horrível de se ver, lhe dando uma postura feia, uma corcunda, por não suportar aquela asa.
— Quem…? Como que…? — os olhos lilases de Hécate estavam arregalados junto de um franzir de cenho, mas o tal rapaz que ela não reconheceu a interrompeu de falar mais.
— Hécate, quero meu corpo de volta. Este aqui está ficando fraco demais para suportar minha divindade.
— K-Kýrios..?! Mas… O que está havendo?! Como que você…?! Você não pode estar aqui! Tânatos me disse que…
— Faça o ritual. Agora! — gritou, interrompendo, seus olhos ainda em lágrimas.
— Ah — murmurou a deusa, abaixando os ombros que estavam tensos —, então já descobriu sobre…
— Diga uma mais palavra, e eu acabo com as poções de amor que suas adoradoras tanto adoram e vendem usando meu nome. — disse o deus, cada palavra saindo com muita mágoa.
A deusa engoliu em seco, sabia que era muito poderosa, mas também sabia que a ira de um ser, seja ele deus ou humano, é igual, e a intensidade as vezes é até maior que um feitiço ou qualquer encanto.
— Entendo. Então… Deite-se aqui. Só tenho que avisar que isso pode ser um pouco… — Apontou para o chão ao lado da pedra dourada — Isso pode machuca muito o corpo que lhe concedeu espaço.
— Faça. — disse, como se não lembrasse que havia um alguém importante lutando pelo seu próprio espaço.
“Kýrios… Por favor… Eu estou aqui…! Por favor… Me ouça! Sou eu… James!”
De repente Kýrios teve uma sensação ruim no peito, e se sentou.
— Hécate, tenha cuidado… Acho que… — balançando a cabeça para espantar essa sensação, continuou — Faça logo.
A deusa deu um sorriso nervoso de canto, e assentiu.
Com o deus deitado, Hécate começou a fazer movimentos circulares no ar com as mãos, e logo centenas de símbolos antigos apareceram, flutuando sobre o corpo verdadeiro. James admirava o quão bonito eram todos aqueles símbolos lilases e negros misturados ao dourado de sua magia e divindade.
Imaginava sempre que fosse algo muito tenebroso e assustador de ser ver, nunca lhe passava pela cabeça que bruxas tinham essa beleza, e que suas magias não eram aterrorizantes como seus pais ou sua tia e a governanta lhe contavam quando ele era somente um menino. Hécate por exemplo, era linda, tinha cabelos escuros com mechas cinzentas, sua roupa era toda preta, de tecidos leves, deixando algumas partes como os seios, aparentes pela transparência da vestimenta.
— Quando eu disser para ir para o seu corpo, não hesite, apesar da dor que sentirá. — Avisou a deusa, e Kýrios assentiu.
James conseguia entender o que dizia mesmo sendo em grego, mas aquele grego que ela dizia estava fora de seus conhecimentos, havia palavras muito diferentes, e soavam estranhas, parecendo que estava pronunciando todas elas de trás pra frente.
Mas porque então ele entendia?
Um tremor foi sentido no local junto de um estrondo muito forte.
— Não, deuses… Agora não…! — murmurou Hécate, olhando para todos os lados, o céu começou a ficar cinza, as nuvens se formavam, e raios vinham delas, atingindo o teto de cristal daquele salão.
— Deixe que ele venha, continue! — disse Kýrios, sabendo quem estava fazendo aquilo.
A deusa então fechou os olhos e recomeçou o ritual, falando com mais velocidade aquelas palavras estranhas.
Aquilo de alguma forma deu forças para que o rapaz saísse da densa escuridão de inconsciência que lhe envolvia.
— Kýrios! — gritou James, sua voz saindo duplicada quando de repente sentiu um alivio começando a se dispersar pelo seu corpo.
Mas claro, ainda era só o começo.
Hécate continuou em seus dizeres do ritual, mesmo que ao fundo o som dos trovões e o clarão dos raios tentasse atrapalhar sua concentração.
James sentia uma sensação estranha, como se alguém estivesse puxando sua camisa ou tentando tirá-la a força, não era ruim, mas era desconfortável.
— Kýrios, minhas forças estão… — havia icor saindo por uma de suas narinas. Hécate era uma deusa poderosa, mas algo estava interferindo em seus poderes, exaurindo-os propositalmente.
— Continue! Estou quase conseguindo sair…! — disse o deus, ainda no corpo do rapaz.
James era uma bagunça de vários sentimentos… Havia raiva, pena, amor, ódio, tristeza, alegrias… E tudo isso vinha pelas imagens, memórias do deus que se misturavam às suas.
Houve um momento em que viu uma discussão de Psiquê e Kýrios, ela lhe chamava pelo nome verdadeiro, mas sempre que pronunciava havia um apagão, um corte de imagem. Ela parecia infeliz com algo, enquanto o deus estava ajoelhado perante à ela, implorando por algo, chorando.
Ela também estava, mas era mais durona em segurar seu desaguar.
James sentia tudo o que ela sentia, e entendia o sentimento… Ela queria contar algo, mas havia o dever de uma coisa muito importante a se fazer e não podia ceder.
Houve um momento em que ela se abaixou até a altura do loiro, juntou suas testas e acariciou seu rosto, dizendo algo muito estranho em seu ouvido, ao qual deixou o deus atormentado quando a mesma se afastou.
Kyrios tentou alcançá-la, mas Psiquê fechou a porta do cômodo, impedindo-o de entrar. O deus ficou ali recostado na porta, deixando todas suas lágrimas descerem.
Após essa cena, uma lâmina cortou tudo como se aquilo fosse somente uma fotografia, e aquilo lhe assustou muito, pois o espadachim que a fez vestia um manto cinzento foi em sua direção, e com uma espada em curvas em uma das mãos, fincou em seu peito.
“Não adianta nada disso. Você não irá conseguir me impedir. Tudo já está determinado, tudo irá sair como o planejado. Seu sacrifício foi em vão. E assim será sempre.” Disse o ser de capuz cinza, e era o mesmo que havia cortado a cabeça de Psiquê lá naquela visão da muralha.
“Tudo nesse universo é possível! E você vai perder! Essa profecia vai se quebrar!”. Disse a outra voz, essa que James reconheceu ser da deusa da alma, mulher de Kýrios.
James queria perguntar, queria buscar ajuda, mas quando ergueu seus braços para poder alcançar aquela luz que lhe chamava e que ele se rendia de forma irresistível, sentiu um choque muito forte em suas costas lhe atingir, e isso lhe puxou para algum lugar que ele não sabia pra que direção ia. E esta ação foi cortada por um impacto muito forte, como o de alguém lhe empurrando para um abismo.
— Ele voltou! — gritou Kýrios pegando-o em seus braços. — James! Aguente firme!
— Ký… Kýrios… — James tentou chamá-lo, mas sua voz saiu muito fraca.
— Rápido! Leve-o daqui! Eu não vou aguentar por muito mais tempo! — avisou Hécate.
Como aquilo tinha acontecido? Uma hora estava no ritual e na outra… Estava vendo os olhos avermelhados do deus, parecia sofrer por causa de seu estado de saúde.
— Eu posso ajudar! Parte de minhas forças voltaram neste instante! Posso aproveitar enquanto ainda estou em alta! — disse Kýrios — E eu não vou sair daqui enquanto não tiver arrancado algo desse infeliz!
— Kýrios! Aquele que estava lhe ajudando até agora não vai lhe ajudar por muito mais! Eu sinto, essa inércia toda vai acabar! Você não pode contra todos esses deuses! Não com este humano aqui! Se você não for embora agora, ele vai morrer! Esse ambiente vai esmagar sua alma! — alertou Hécate, o icor escorrendo agora pelos seus olhos, havia um claro esforço extremo da deusa em aguentar todo aquele ataque que Zeus fazia para quebrar aquela barreira de estática de tempo que havia ali em tudo.
Até os próprios deuses que estavam ali no salão começaram a se esforçar para se mover, tentando sair daquele véu de paralisia.
Kýrios olhava para o telhado de cristal, sentindo uma raiva muito grande a cada relâmpago que iluminava o salão, mas também olhava para James, que parecia ainda resistir a pressão do local, e além disso, estava sangrando por causa da asa distorcida em suas costas.
O deus olhava a tudo aquilo e sentia ainda mais raiva de tudo. Raiva de si mesmo.
— K-Kýrios… — James sussurrou seu nome, tossindo em seguida, sua respiração escassa por conta do sangue preenchendo seus pulmões. Seu olhar quase se fechando, mas lutando para se manter consciente.
E foi aquele olhar que fez o deus decidir.
— Você vai ficar bem, James. Não vou te deixar te tirarem de mim. — disse, beijando sua testa e depois se virou preocupado pela deusa — Hécate…
— Eu me viro! Vá! Eu vou ficar bem! — a deusa sorriu, mas seu olhar dizia o contrário do que queria passar — Ainda não é hora para enfrentá-lo… Ache todas as provas! Ache sua força! Ache Psiquê! É isso que será nossa vitória!
Kýrios se levantou com James em seus braços, que parecia agonizar, seu olhar querendo se manter no rosto do deus, mas cada vez perdia suas forças a cada gota de sangue que era derramado de suas costas ainda com aquela ferida exposta da asa perfeita que o deus tinha conseguido fazer aparecer e da asa mal formada.
— Obrigado, Hécate.
— Me agradeça depois!!! — gritou, praticamente mandando-o embora, seus lábios ficando mais pálidos a cada segundo gasto em manter Zeus longe daquele salão.
De repente um vulto muito veloz passou pelo deus, que logo abriu suas asas e envolveu a si e o rapaz para proteger.
— Kýrios, é melhor se render. Qualquer esforço será em vão. — disse o outro deus.
— Hermes…
— Muito corajoso de sua parte vir até aqui. Sabia que sua morte era uma fachada. Tânatos está nisso também? Hm, por isso ele anda meio estranho… está respondendo a todas minhas tentativas de socialização.
— Hermes… Será que não vê o que está acontecendo? Eu não sei como, mas Zeus criou tudo isso por algum motivo!
— É claro que há um motivo. E isso já foi provado. Bom, não gosto de perder tempo. E sinto muito, mas você não pode viver, muito menos esse humano. Sou leal a esta casa.
— Eu também sou à minha.
O deus do amor pousou o rapaz no chão com toda delicadeza possível, e então abriu suas asas, e quando ficou visível para o outro deus, atirou uma flecha, que claro, o deus da velocidade a pegou sem um pingo de dificuldade, mas não esperava que o objeto em sua mão fosse se dissolver em uma fumaça avermelhada que foi direto aos seus olhos e narinas.
Era amor ardente, um dos talentos do deus, e como não tinha tempo para pensar em alguma distração, lançou esse véu sobre o outro deus.
Hermes começou a tossir, e começou a vibrar seu corpo para se livrar daquele véu de envolvimento quase subatômico, e por isso, para humanos, era literalmente impossível de se resistir. E nesse mesmo segundo de distração, sem perder a oportunidade, Kýrios se lançou contra o mesmo, que ao ser pego pela gola de sua armadura peitoral, deixou de lado a atenção que tinha sobre o véu e puxou o outro deus, e começou a correr com o mesmo por todo aquele salão para desestabilizá-lo.
Kýrios tentava se soltar, mas a velocidade não lhe deixava conseguir um foco onde pudesse se apoiar com seus pés e bater suas asas com mais estabilidade, ou então, do contrário poderia ter suas duas asas esmagadas pela gravidade da velocidade.
James ali no chão, tinha uma respiração crítica, era terrível o tanto de esforço que fazia, cada força para puxar o ar era agoniante e doloroso para seus pulmões, e estava desconfiado de que algum osso estava perfurando algum deles.
Sua visão era fraca, mas ainda sim conseguia ver alguns vultos dourado e branco que corriam por todo o salão.
— Humano! Ouça a minha voz! — lhe chamou Hécate e ele, com muita dificuldade, virou sua cabeça na direção da deusa — Você é forte, já era para estar morto com esse ambiente… Então… Tome isso! Rápido! — ordenou, lhe jogando um frasco que caiu e foi rolando até parar perto de seu abdômen.
Kýrios, aproveitando da respiração irregular que Hermes começava a ter por causa da flecha de veneno que tinha atirado naquela hora, lhe deu um soco no estômago assim que viu o mesmo fazer a estratégia de ir para trás e voltar para frente na corrida. Aquela física lhe ajudou a pegar impulso e seu punho foi direto aonde queria. Hermes parou por um segundo, tonto, pegando em sua barriga, mas voltou a correr revidando a agressão, e jogando o deus do amor para uma das colunas, que se quebrou com o impacto.
Já James, ainda se esforçava para virar seu corpo até ficar em posição fetal. E quando conseguiu, mesmo com a visão turva e tudo começando a rodar, conseguiu pegar o frasco e levá-lo até a boca, arrancar com os dentes a rolha e beber o conteúdo mesmo que não soubesse o que lhe faria.
Mesmo não sabendo se poderia confiar se aquilo poderia funcionar consigo…
Hermes e Kýrios ainda travavam uma luta um pouco injusta, já que a velocidade do outro deus era uma vantagem da qual o deus do amor não tinha tanto, isso porque sua cabeça estava entre impossibilitar aquele deus para que logo pudesse fugir dali e entre proteger James de alguma investida covarde que aquele deus poderia fazer contra o rapaz.
Ao tentar atirar uma outra flecha, Hermes a pegou no ar e lançou de volta contra o deus do amor, que foi ferido na coxa, e caiu de lado, tropeçando.
— Eu sei que seu fim pode não ser o mais misericordioso, mas posso lhe dar uma rendição calma agora se parar com essa luta vã, posso fazer isso em nome de sua mãe.
— Ah, quanta bondade de sua parte, Hermes. — disse Kýrios, tirando outra flecha de sua aljava e apontando para o outro deus, que arqueou uma sobrancelha em desdenho.
— Porque insiste numa coisa inútil? Estou lhe avisando, “Kýrios Galanis” —disse, seus olhos sempre concentrados nas ações do deus do amor — Se renda, e toda essa dor acaba logo. Eu realmente não quero mais dores, isso tudo já está sendo muito estressante. Sabia que diminui um milésimo de segundo em minha corrida por causa disso? E confesso, estou muito triste pela Afrodite, não acredito que ela possa ser a que criou toda esta situação, mas acredito que você o faça. Tem tendencias muito suspeitas, um caráter duvidoso, fica… se misturando com esses mortais… Então, por favor, se renda.
— Nunca. — disse Kýrios, atirando a flecha, mas o deus desviou com sucesso.
— Errou.
— Não, ele acertou. — disse James, com a flecha fincada em sua mão, e mesmo assim, com muita dor em sua palma, conseguiu ferir o deus em sua coluna, fazendo-o cair na hora no chão.
Como a flecha havia acertado uma vertebra, ficou difícil de tirá-la, então, caiu junto, despencando sem mais forças para suportar tanta dor em seu corpo.
Kýrios arrancou a flecha de sua coxa e correu até o rapaz, se abaixando até o mesmo, e logo quebrando e arrancando a flecha e sua mão também.
— James… Que loucura foi essa? Você não pode e esforçar dessa maneira!
— Eu… — inspirou o ar com dificuldades, tentou erguer uma mão para encontrar o rosto do deus, mas não conseguiu, toda aquela bateria de forças que o conteúdo do frasco lhe deu havia acabado.
— Não fale, por favor. — disse e olhou para Hécate, que já estava com olheiras escuras e uma pele seca por conta de tanta energia sendo usada para manter aquela barreira.
— Vá embora! Vá enquanto a adrenalina está mantendo o coração dele batendo! — ordenou a deusa, seus braços trêmulos, parecendo que iam se quebrar qualquer momento pela aparência frágil deles.
Kýrios abriu suas asas, ergueu o rapaz em seus braços de novo, e deu um aceno de cabeça em despedida e agradecimento à deusa, que lhe sorriu minimamente.
Saindo do palácio de Zeus e voando pelo Olimpo, Kýrios via abaixo alguns seres começando se mover, os raios no céus cinzentos tentavam lhe acertar, mas sempre que chegavam na barreira que havia em uma certa altura, sua velocidade era reduzida, dava para ver suas ramificações se espalharem lentamente indo em sua direção, mas nenhuma lhe acertava por desviar delas com facilidade.
A avenida toda ainda estava paralisada, até a água da fonte ainda estava para cair dentro do lago que havia ao redor, e muitos deuses menores tentavam se mover como os deuses que estavam naquele salão.
Suas asas batiam com toda força que poderiam para lhe dar mais velocidade, mas o caminho ainda era longo até que chegasse na saída.
Kýrios sempre olhava para James em seus braços, seu coração apertava por vê-lo tão debilitado, e se culpava por todos aqueles ferimentos que ele sofreu por causa dele.
Se controlasse mais sua ira… Nada daquilo estaria acontecendo com o rapaz…
Seu vôo foi então interrompido por uma flecha de besta que acertou sua asa, fazendo-o despencar em cima de um telhado, mas para não machucar mais ainda o moreno, fechou as asas ao redor de seu corpo, e ambos foram rolando até quebrar um teto de vidro e cair para dentro de uma residência menor.
Kýrios sentiu o impacto ser abrandado pela água de uma piscina rasa que havia ali dentro, que também lhe molhou todo, deixando-o encharcado.
Quando abriu as asas para tentar se levantar e continuar correndo até a saída e ainda segurando firmemente o rapaz, viu uma besta ser apontada bem no meio de sua testa.
— Sabia que um dia você me daria orgulho, e muito trabalho também.
— Pai. — disse Kýrios, segurando James como se ele fosse um brinquedo que em breve seria arrancado de si.
— Então, mais um humano? Está botando o Olimpo todo na fogueira por causa dessa criatura insignificante? — disse, vendo o quão o rapaz estava ferido, e ainda tinha aquela asa esquerda mal formada piorando tudo.
— Não é o que está pensando…
— Não? Então porque está com esses olhos brilhando e mudando como se fosse um arco-íris? Porque está arriscando toda sua vida por este ser inútil?
— Ele é importante pra minha missão!
Ares, o deus da guerra, seu pai, riu. Mas ainda sem baixar guarda em sua besta.
— É, sua mãe também era importante para minhas missões, e olha o resultado. — olhou para seu filho em referência — Se quer tanto que tudo dê certo, deixe esse humano pra trás. Não deixe esses tipos de emoções interferirem nos seus planos.
— Eu juro, pai, que posso não ser hábil como você, mas vou fazer até o impossível de sair daqui com ele. Custe o que custar.
Ares sorriu, e abaixou a besta, deixando seu filho confuso.
— Seu… avô, está louco. E você, parece que está enlouquecendo também. Mas a diferença está em que você está me deixando muito feliz. Nem eu fiz melhor. Olimpo em uma tremenda crise e guerra civil? Quem diria.
— Então… isso quer dizer que vai me deixar sair daqui?
— Não. — A resposta deixou o loiro apreensivo, já botando sua mente para funcionar em pensar em como ele sairia dali, até o deus da guerra continuar — Não posso deixá-lo sair por ali. Zeus já reuniu todo um exército. Há um atalho. Se levante, e deixe esse humano para trás.
— Não.
— Kýrios. — lhe chamou seu pai em advertência.
— Pai, por favor…
— Não adianta usar esses truques comigo. Apelações emocionais é para sua mãe!
— Não estou apelando para nada! Só estou dizendo que não importa o que me acontecer, não vou deixá-lo! Se for pra enfrentar o exército de Zeus e ele próprio, eu farei! Mesmo que eu morra! Mesmo que eu tenha que destruir esse lugar todo!
— Kýrios… — James de repente lhe chamou.
— James, por favor, não fale, se poupe…
— Escute… ele… — tossiu, e uma grande quantidade de sangue sujou sua própria camisa — Eu vou atrasar… Haverá outros… Só tenha… tenha paciência de esperar para… outro aparecer…
— Não! Você não vai morrer! Já passou por um risco e não morreu! E não será agora! Tânatos não vai deixar! E-e lembre-se, sua vitalidade está ligada à minha! E… não quero e não vou permitir que saia assim de minha vida…
— Me… deixe… Kýrios…
— Você é muito teimoso. Mas eu também sou. — disse o deus, lhe beijando a testa num longo selar, e aproximou sua asa, tirando a flecha envenenada da besta, para logo em seguida se levantar e passar por Ares — Obrigado pela oferta, pai, mas tenho que ir.
— Kýrios, pare. — Ordenou seu pai, num tom mais brando, pensativo — Venha comigo. Rápido. Antes que eu mude de ideia. — disse, abrindo no nada uma escotilha enferrujada que apareceu quando pegou sua lança e cortou o ar em um giro completo, como se tivesse desenhado.
Kýrios não hesitou, e seguiu seu pai, adentrando naquela espécie de atalho.
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Capítulo 27
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Missão Ágape
O Olimpo está em crise, e tudo porque de repente uma profecia disse que um deus iria dizimar o seu sistema e tudo que eles lutaram para conquistar e poderem estar no poder até hoje.
E é...