Capítulo 39
E a hora do amanhecer estava chegando, dando seus primeiros avisos de uma manhã que seria quente, e também agitada para aquele grupo, que já se encontrava a postos numa clareira a cem metros da hospedaria…
James estava se sentindo confuso, num sentimento de curiosidade e também aborrecimento, já que havia chegado a hora do confronto.
— … e então Panoptes tocará as castanholas, tendo a cobertura de Li-Hua e Tânatos, enquanto isso eu estarei com a lança defendendo a linha de frente junto com… — olhando ao redor, deu-se conta de que o deus ainda não havia chegado, aumentando ainda mais seu incomodo — Onde está Kýrios?
— Shifu. — chamou a jovem moça — Vi senhor deus com flechas, e ajeitar asas também.
— Ótimo. — respirou fundo mas em seguida o questionamento veio naquele detalhe citado da jovem — Hm? Ajeitando asas? Por qual razão? Ele se feriu ou algo do tipo? Estamos perto do alvorecer completo. Os pássaros já vão farejar nossos cheiros!
— Ele está vindo. Não se preocupe, James. — disse Tânatos, parecendo envergonhado com algo.
— Aconteceu algo então? — perguntou, não se segurando em sua curiosidade, ainda mais por estar nervoso pelo que viria a enfrentar.
— Ele… Kýrios se encontra…
— Estou aqui! — interrompeu o deus do amor, chegando ali de repente já com arco e flecha em mão e com uma postura e sorriso confiante, mas havia olheiras em seu semblante.
— Bom dia, Kýrios. Está… melhor? — perguntou James, usando da formalidade para esconder as borboletas em sua barriga e mais outra curiosidade por notar aquela parte escurecida abaixo dos olhos que denunciava algum episódio de noite mal dormida ou algum forte desassossego.
Além dessa sensação havia uma grande curiosidade em saber o paradeiro de sua camisa, já que tinha ficado óbvio que o deus a tinha levado consigo. Agora, para quê? E o porquê? Isso era mistério.
— Ah sim! Muito! Porque não estaria? — respondeu, sorrindo aberto, cruzando os braços de forma descontraída.
— Porque… por causa da divindade escassa?
— Quanto a isso não se preocupe, já me recuperei o bastante para entrar em combate com cem centauros!
— Ah é? Então não se importará de ficar no meu lugar dando cobertura. — se intrometeu o gigante, ganhando o olhar inquisitivo do rapaz — O quê?
— Combinamos agora pouco a nossa estratégia sobre este ponto.
— Sim, combinamos, mas acho que não é tão funcional.
— Não? Me prove. — desafiou James.
— Esta moça não tem treinamento suficiente, e ele não pode usar seus poderes porque deu o fragmento da lança a aquele rapaz fantasma. E Kýrios serviria muito mais dando cobertura à você e a todos aqui do que em linha de frente, olha pra ele, não sabe nada de lutar em guerra. Não duraria trinta segundos.
— Ei! Eu posso não saber, mas tenho meus predicados de luta sim! Tenho… à minha maneira. — rebateu o deus.
— Sendo assim… Posso reformular a estratégia: Kýrios fica para tocar as castanholas, enquanto isso, eu, Li-Hua, Tânatos e Panoptes vamos nós quatro lhe dar cobertura. — disse James, tendo a aceitação de todos menos do deus do amor.
— Isso é injusto! Não sou inútil como parecem estar tentando me dizer! — protestou o loiro.
— Kýrios. — chamou James, se virando, lhe fitando — Panoptes deu uma excelente sugestão. E eu vejo que é o melhor assim. Confie… em mim.
O deus também lhe fitou por longos segundos, e depois de pensar um pouco, acabou assentindo.
— Eu confiarei, James. — disse, lhe mirando com um ar de quem torcia para que o rapaz não fizesse algo impulsivo de novo.
— Tem algo voando muito ruim. Barulho de pássaros. — disse Li-Hua de repente, chamando logo a atenção de todos.
Todos logo se puseram em posição, com olhos atentos a tudo ao redor. James observou o céu, e viu que um primeiro raio de sol os iluminava através das folhas das árvores.
— Mas… como…? Não estamos com uma temperatura corporal elevada ainda… — perguntou-se Kýrios.
— Não consigo ouvir nada. — disse o gigante, olhando para todos os lados, e assim como os demais, se pôs a proteger o deus do amor, que ficou rodeado pelos quatro.
— Li-Hua, como é o som que ouviu? — perguntou Tânatos, lhe fitando curioso.
— Ferro batendo forte. Como bolsa de moedas. Muito barulho… está chegando muitos.
— De qual lado? — perguntou dessa vez James.
— Tudo. — respondeu a jovem, se encolhendo um pouco temerosa.
James se pôs a pensar em como que os pássaros já podiam os encontrar daquela maneira se ainda nem tinham entrado em contato direito com a luz solar, e seus corpos ainda se encontravam limpos e frios da fresca madrugada. Havia algo muito errado naquilo. Algum detalhe que poderia estar deixando escapar.
E assim como fez no pântano, sua mente começou a trabalhar em algo para lhes tirar daquela enrascada que parecia começar a se mostrar mais perigosa e complicada do que pensavam.
— Li-Hua, o que mais você ouve? — perguntou James, também achando curioso o fato da moça ter conseguido ouvir tais coisas, e como não tinha tempo para discutir sobre isso, tratou de visar em aproveitar aquela repentina habilidade.
— Chão que faz um boom boom, boom boom, ritmo forte! Como… cavalos correr!
— Cavalos… hm… pelo ritmo… hm, talvez um sátiro? Não, pelo som é algo de grande porte. Um animal de quatro patas então… algo do bestiário grego pelo óbvio. Pensa… pensa… lembre-se das aulas James…
Muitas informações passavam pela sua mente como fotografias ou como imagens muito rápidas de momentos e nomes incomuns que ouviu em sua vida.
Era algo muito comum se lembrar de detalhes, por muitas vezes se lembrava de coisas da sua infância, deixando seus pais impressionados. Sua mãe lhe dizia que tinha uma memória eidética. Só que isso era um tanto condicional, já que só se lembrava perfeitamente do que lhe interessava.
E para a sorte do momento, ou não, tudo era para interessar, tinha que captar tudo que ouvia, pois qualquer coisa desde que entrou naquela missão era considerada de extrema importância, e uma hora poderia valer a pena usar.
“Psiquê, por favor, me ajude…!”.Pediu.
Mas só havia silencio, nem mesmo alguma miragem ou sentimento de sua aparição.
Desistindo de pedir ajuda, recomeçou suas análises mentais…
— Animal, quatro patas, passos ritimados e fortes. Certo, é porte grande… um centauro? Não… um touro? Será Minotauro? Não, ele está morto… talvez seja um grifo? Pode ser que esteja guiando os pássaros, tem uma familiaridade… ou então… será que é possível uma junção? Será uma quimera? Não, isso chamaria atenção demais… — de repente uma pequena informação, um pequeno nome apareceu no meio de suas memórias dos últimos acontecimentos… algo que se encaixava bem e que coincidia com a situação, levando em conta que havia muitos seres das sombras lhes perseguindo e que poderia ser usado para aquele tipo de horário — Certo, certo… já foi um bom descarte de opções… Sombras, seres de quatro patas, sombrio, hm, ok, um ser que rejeita luz… então é do submundo — e foi quando proferiu aquela última palavra, foi quando algo clareou em sua mente, lhe fazendo engolir em seco e torcer para que não fosse isso — Descobri!
— James… — lhe chamou Kýrios, tendo a atenção do rapaz, enquanto olhava fixo numa direção a frente.
— O ser que está vindo para nós… é um ser do submundo! Um ser de quatro patas que só gosta das sombras! É claro! Por isso os pássaros estão vindo direto sem perca de tempo para nos achar! Isso é porque este ser está nos farejando! Guiando-os!Pessoal, é o…
— Cérberus? Não, ele não sai do submundo, ele é irrestritamente fiel a Hades e Persefone. Nem sendo ameaçado ou sob tortura ele sai do Submundo. — disse Panoptes.
— É verdade. Céberus é um servo fiel e irredutível. — confirmou Tânatos.
— Sim. Não é ele. — disse James, sentindo um suor escorrer pelo canto de suas têmporas — O ser que temos que lidar é…
Antes que completasse sua informação, um rugido muito alto ecoou por todo local, espantando os pássaros da região, para em seguida uma densa revoada começar a surgir no horizonte.
— Se preparem! — disse James, se colocando em postura defensiva com a lança, em sequência Panoptes ergueu o martelo de forja flamejante, Tânatos invocou sua foice, e Li-Hua, tirou de sua bainha a adaga de sua mãe, quanto a Kýrios, posicionou seu arco nas costas e ajeitou as castanholas em ambas mãos.
O chão começou a tremer, e aquele som ritmado se tornou mais forte cada vez que se aproximava, e para completar as arvores se agitavam, e mais pássaros locais fugiam em uma revoada desesperada pela sua sobrevivência.
Já que… alguns começavam a cair mortos, faltando pedaços, manchando o solo de vermelho ao entrarem em contato com tanto impacto, transformando-os as vezes em meros poças de carne e sangue.
E mais um rugido foi ouvido… e mais dos sons ritmados ecoavam, se tornando mais intensos a cada vez que se aproximava.
— Por deuses… esse cheiro… — comentou Panoptes e em seguida arregalou os olhos — Não acredito que… por todos os gigantes…!
— Deuses… não quero nem saber o que Zeus fez para conseguir isso… — disse dessa vez Kýrios, com um rosto de reprovação e pena.
— Ah, que bom que vocês conhecem essa besta. — se agitou James, firmando ainda mais a lança em suas mãos.
— Não é uma besta. — defendeu Tânatos, parecendo triste.
— Só porque você viu essa coisa nascer e crescer não significa que esse cão não seja uma besta! — retrucou Panoptes.
— Ortros não é uma besta. — defendeu novamente o deus da morte.
— Me desculpe Tân, mas estou com Pano. Se ele está agora contra nós, de fato agora é uma besta. E sinto muito que tenhamos que fazer algo a respeito. — disse Kýrios, com mãos a postos para tocar as castanholas.
O deus pálido esboçou um semblante triste, e fungou como se estivesse cansado.
— Deixe-me tentar algo primeiro, Kýrios. Peço por pelo menos uma chance, pode me conceder isso?
O deus do amor fez que sim, e abaixou os ombros, e algo no olhar entregou algo triste assim como o outro deus.
Enquanto isso, a jovem moça se mantinha quieta, observando tudo no local, dava para se perceber que suas mãos tremiam, mas sua postura era sempre a de uma guerreira que não abandonaria aquela batalha nem sob tortura.
James iria até a moça, mas o deus da morte ergueu uma mão para ela, fazendo-a se espantar com algo que viu em sua palma.
— Não posso! Todo mundo precisa! Eu tenho meu! — disse baixinho, mas por todo mundo estar em silencio concentrado e atento aos sons de bater de asas e dos estrondos ritmados, todos conseguiram ouvir sua objeção ao que o deus oferecia.
— Você é uma mortal, senhorita Li. Precisa muito mais que eu. E gostaria muito que aceitasse esta gentileza. — disse, lhe mirando com preocupação.
A moça corou, ficou pensativa por alguns segundos e no fim, assentiu.
Quando ergueu sua mão para pegar, sem querer encostou na palma do deus. E por algum motivo ficou muito tímida, recolheu logo a mão, encostando o objeto contra seu peito.
Panoptes que estava mais perto arqueou uma sobrancelha e Kýrios sorriu de canto.
James não sabia bem como agir, mas achou meigo aquela interação do deus com a jovem.
E quando viu o que era, o sentimento contente se tornou tenso. E antes que falasse algo, o deus do amor chegou na frente para advertir.
— Tânatos, seu fragmento… Você ficará…
— Não precisarei.
— Como não?
— Eu vou me cuidar. Vocês precisam muito mais que eu. — disse.
James não entendia o porque daquela ação despreocupada do deus, mas tinha uma desconfiança do que poderia ser: ele era um deus da morte, morrer não estava em seu destino, já que, em suas teorias, o pálido deus poderia controlar e ver sua ida pro além, diferente de todos ali que não possuíam tal visão e estavam a mercê da sorte.
O estrondo ritmado acelerou ainda mais depois disso, parecendo ganhar confiança ao sentir a fraqueza de um do grupo sem o fragmento, e por isso, consequentemente, a revoada também chegou.
— Eles chegaram. — disse Tânatos, olhando somente em uma direção.
O vento e todo aquele barulho de arvores, galhos e folhas se movendo parou bruscamente, o que foi muito estranho, até uma sensação ensurdecedora pairou no ar.
James não conseguia mais sentir dor em suas juntas de tanto que segurava firmemente a lança, em contrapartida, ao seu lado o gigante girava o martelo incandescente, olhando numa direção contrária a sua para poder cobrir uma área de defesa. No meio estava Kýrios, com uma postura defensiva e de asas já bem abertas para poder executar seus movimentos com mais agilidade, e logo atrás de si, cobrindo suas costas estava Tânatos e Li-Hua, agora mais confiante tendo dois fragmentos um em cada mão, usando-os como pulseiras que teve que improvisar usando as fitinhas coloridas de seu coque, deixando-a livre para usar sua adaga com mais firmeza.
— O que aconteceu? Não ouço mais nada! — empertigou-se James olhando para todos os lados em busca de uma primeira ameaça.
De repente Tânatos franziu o cenho, e abandonou seu posto e moveu-se a passos lentos a uma árvore a sua frente.
— Tân? O que você está fazendo? — perguntou o deus do amor.
— Vou conversar com ele.
— Ele? Pelas malditas cobras de Medusa, “ele” quem? — quem perguntou dessa vez foi Panoptes, ficando um pouco aborrecido com o mistério do pálido numa hora tão delicada como aquela.
O deus ignorou sua indagação e continuou a ir onde queria.
— Cuidado. Eu sentir cheiro muito mal. — avisou Li-Hua, preocupada pelo deus, que parou um passo, a olhou por cima do ombro e assentiu em agradecimento pela sua preocupação, e depois seguiu em frente.
— Gente, por favor, mantenham seus lugares! Seja o que ele for fazer, temos que confiar e… nos manter atentos! — disse James, e para sua sorte, os três integrantes acataram sua orientação sem protestar.
Quando Tânatos finalmente parou entre duas arvores, lá das sombras e se materializando na sua frente e fazendo aquele mesmo estrondo, surgiu quem todos temiam que fosse: Ortros.
O ser canino possuía duas cabeças, e assim como seu irmão tinha um olhar flamejante, uma bocarra cheia de dentes iguais as estalactites de uma caverna, só que as do animal eram obsidianos, e muito afiadas, contrastando com sua pelagem marrom.
Assim que o deus da morte ergueu uma mão com a palma levantada pra cima, o cão bicéfalo rosnou, eriçou o pelo de suas costas e se abaixou encarando para atacar.
— Ortros, sou eu, seu amigo. Não lembra de mim? — questionou Tânatos, aproximando somente um passo, e teve como resposta um latido ameaçador — Ortros, sou seu amigo, o amigo das poças de lava, o que lhe trás corpos de guerra, os melhores restos de corpos. — e mais uma vez o cão latiu, mais alto, ameaçando atacar, mas o deus ergueu ambas as mãos da mesma maneira, e fez sumir sua foice — Ortros, não quero machucar você, somos amigos, lembra quando o ajudei a tirar aquele fêmur atravessado em sua língua? — olhou para a primeira cabeça — E lembra quando escondi o fato de você ter comido a coroa de lorde Hades? — disse para a segunda cabeça da direita, que latiu contido — Sim, sou aquele seu amigo.
Os cães pareceram estar processando as informações, tanto que uma hora ambos começaram a entrar em uma discussão de grunhidos caninos entre si, ameaçando morder um ao outro, mas isso parecia fazer parte de seu entendimento.
E após poucos segundos, voltaram a encarar o deus, choramingando como simples filhotes.
— Não pode ser… — sussurrou Tânatos.
— Tân, o que eles estão dizendo? — perguntou Kýrios.
— Que… vão lutar ao nosso lado. — respondeu, sem dar muitos detalhes, mesmo que seu semblante o denunciasse que algo não estava certo.
— Então no fim das contas, eles realmente não são uma besta. — comentou Panoptes.
— Eu disse que não. — retrucou Tânatos, se virando enfim para todo o grupo — Ortros está guiando os pássaros, deu uma pista falsa, forjou o meu cheiro para eles mudarem um pouco de curso e poder ganhar tempo para vir até nós primeiro. Mas agora, ele terá que dar a ele nossos odores. — explicou, dando espaço para o grupo se aproximar do animal.
Ninguém tomou a iniciativa, nem James, mas ao ver o olhar da jovem, que esperava mais um gesto de bravura e ensinamento do seu shifu, não teve escolha a não ser ter que dar o primeiro passo.
“Eu prometi a mãe que cuidaria dela. E mostrar que sou digno, que estou levando ela para um caminho de bem é algo de minha responsabilidade… merda…”. Pensou, engolindo em seco, dandos os primeiros passos até o animal.
E o resultado veio na hora…
Com Tânatos dando um sinal de cabeça dizendo que tudo ficaria bem, James se aproximou, e como não podia hesitar muito teve que ir a passos duros para enfrentar seus medos.
— O que eu tenho que fazer? — perguntou.
— Passe uma mão em sua própria testa, e depois passe a mesma mão sobre o topo da cabeça dele.
— Pensei que fosse algo mais… “ritualesco”.
— Existe. Mas este é o mais rápido por hora. — disse, e olhou para Ortros, dando um sinal de cabeça, e o cão entendeu a deixa do amigo, se deitando para que o rapaz tocasse em suas cabeças.
James sentia suas mãos suarem, havia um tremor em suas pernas e braços que quase o congelavam no lugar. Também, mesmo que tivesse ido até o submundo e visto tantos seres terríveis naquela vez, estar diante de um animal de duas cabeças e dentes obsidianos que pareciam avisar que iria a qualquer momento arrancar seu braço, não era algo fácil de lidar.
E como instruído, acariciou a cabeça do bicéfalo.
Na mesma hora os cães rosnaram, e só não avançaram porque Tânatos lhes deu um olhar intenso, algum outro sinal oculto ou alguma linguagem que devia saber para se comunicar com aquele canino.
— Fiz algo errado?
— Não. Só estão acatando uma ordem de… tortura. Vocês, nós, somos seus alvos. Mas Ortros resiste como pode. — respondeu o deus, ficando com uma expressão visivelmente aborrecida.
O medo ainda sobressaía, mas ao ouvir aquele fato fez com que o sentimento se amenizasse, e criasse pena pelo animal. Nem queria imaginar o que quer que estivesse passando para estar ali obedecendo as ordens de Zeus, já que era fiel a Hades.
Assentindo e se afastando os próximos do grupo se aproximaram em fila para também deixar seu cheiro no animal.
E quando todos terminaram, Ortros se levantou, olhou para Tânatos e fez um cumprimento de cabeça junto de um choramingo, e depois se virou para a floresta na direção de onde veio, se transformando em uma fumaça negra que ia trombando contra as arvores derrubando algumas, e deixando uma pegada no chão que inflamava em cinza, assim como as chamas que Tânatos toda vez que chegava em sua forma divina em algum local.
— Temos um minuto até que os pássaros apareçam. — informou o deus pálido.
Mesmo que todos já estivessem preparados, aquilo causou uma tensão maior do que antes, pois agora era confirmado o eminente confronto, e esperar por isso era pior do que não saber quando viriam.
E como foi previsto, após um grande momento de silencio e expectativa, a revoada começou a se aproximar, a agitação nas copas e o barulho intenso de bater de asas surgia dando a clara sensação e aviso de que não haveria mais conversas e nem negociações.
— Ai! O que foi…? Deuses… — reclamou o deus do amor ao sentir uma ardência em seu ombro, e arregalou os olhos quando viu o que era.
E lá estava uma pena escura, cravada em sua carne, já fazendo seu envenenamento.
As veias começaram a ficar verdes, a pele em volta se voltava para um tom azulado como se estivesse destruindo todas as hemoglobinas e deixando no lugar o veneno, deixando uma sensação de queima.
— Tire isso logo! — disse Panoptes, indo até o deus, tirando a pena, a jogando no chão e em seguida, usando o martelo para inflamar, transformando a pena em um montinho de cinzas.
— Kýrios, dê a nós todos uma flecha com o sangue de hidra! Agora! — ordenou James, tendo o acato quase que instantâneo.
Agora todos, até Tânatos que havia se abdicado de seu fragmento e estava hesitante para aceitar a flecha que agora a segurava na outra mão que não estava a foice.
E um primeiro grupo de pássaros veio…
A nuvem escura fazia granidos que ensurdeciam, alguns ousaram voar em uma rasante, atingindo o grupo, mas que as castanholas faziam ao mesmo tempo em que atordoou as aves, deu tempo para fazer o primeiro contra-ataque.
James foi o primeiro a ter uma perspicácia de sobrevivência, colocou a flecha junto da lança que a absorveu inteira, fazendo o material da arma mudar para um material amadeirado e com uma ponta metálica assim como era a flecha, resultando na possibilidade de usá-la, se aproveitando também do sangue de hidra que envenenava os pássaros e os derrubava quando somente tocavam na lança, estourando seus olhos e todas partes do corpo por causa da grande alergia que tinham.
Panoptes usou a flecha com o sangue de hidra e martelou a haste no chão misturando o poder da ferramenta e o outro objeto, resultando em outros amontoados se tornarem meras cinzas, deixando para trás somente as penas escuras e opacas por não conter mais vida.
Quanto a jovem moça, sua concentração e habilidades que se mostravam ter aprendido em tantas vezes que treinou para orgulhar sua mãe agora estavam valendo, e se apresentando ser muito uteis e decisivos quando via que alguma ave iria machucar seu shifu ou qualquer outro integrante de seu grupo. James ficava impressionado, e um pouco envergonhado em pensar que o que ele poderia ensinar a ela sendo que a única coisa que sabia era o básico de esgrima e brigas de rua? Isso parecia ser indigno diante das técnicas que a jovem, mesmo tendo uma estatura franzina, era muito mais capaz que ele, usando sua adaga junto da flecha envenenada.
Tânatos, como não podia usar seus poderes, só trabalhava em se defender com sua foice dos restantes pássaros que escapavam do som das castanholas, girando a foice no ar, direcionando-as para todas as direções, para dar tempo dos integrantes de seu grupo executarem os que caíam no chão ao seu redor.
— Aai! Merda… — xingou James, pegando em seu ombro.
Não tinha percebido, mas havia uma garra de ave cravada em sua carne, fazendo surgir pequenos pontos escuros e estas logo estouravam em pequenas bolhas como uma queimadura.
— James! — gritou Kýrios, indo socorrê-lo, tirando rapidamente a garra.
Mas de uma forma súbita, o deus cravou no lugar uma de suas flechas.
— Kýrios…
— Isso vai adiar o veneno.
— Isso vai me matar?
— Só se depois dessa luta não cuidarmos. Não se preocupe, há um antidoto, mas é demorado para se fazer assim no meio disso tudo. — tranquilizou, e mais uma vez, em um reflexo, girou o corpo, pulou com o impulso de suas asas e tocou as castanholas, atordoando mais pássaros, que sem hesitação dos outros foram mortos, espalhando mais penas cinzentas pelo local.
A luta parecia estar balanceada, todo o grupo estava conseguindo abater aqueles seres, mesmo que fosse um pouco difícil se manter ileso de arranhões ou alguma bicada.
James até desejou que aquelas aves fossem mesmo gigantes como eram nas lendas de milênios atrás, assim teriam muito mais facilidade de acertar o alvo sem sobrar algum resquício de ataque.
Mas tinham que lidar como podiam com aquilo que parecia um enxame de abelhas, com as nuvens escuras que grasnavam em uníssono avisando que tinha muito mais por vir.
— Por deuses, isso não vai acabar? — reclamou Kýrios, sempre pulando, girando nos calcanhares para desviar de ataques de pequenos amontoados, as vezes até tendo que fazer uma rasante para poder dispersar com suas asas as aves que escapavam das defensivas de Tânatos.
— Porque aquele pulguento não está aqui conosco? — inquiriu Panoptes, queimando mais pássaros.
— Ortros, está nos ajudando, está fazendo o que pode para despistar um bando inteiro de vir em nossa direção. — explicou o deus da morte, girando sua foice, que tilintava contra os bicos e garras.
— Que viessem logo o bando inteiro! Eu não aguento sentir mais cheiro de frango queimado misturado a odor de prego enferrujado! Olhe pra moça, já está ficando verde, a qualquer momento vai começar a jorrar vômito pra todos lados!
E era verdade, a jovem suava frio, suas mãos tremiam, e além disso havia uma palidez de alguém que estava ficando doente. Já se encontrava cheia de bolhas espalhadas pela pele exposta dos braços, rosto e pescoço.
O deus também olhou para os outros, e estavam na mesma condição. James tinha vários arranhões pelos seus braços, mas ainda continuava lutando, Kýrios dava tudo de si fazendo manobras no céu enquanto tocava de minuto a minuto as castanholas, e quando agora fazia isso, bambeava um pouco em seu voo, se sentindo tonto, e talvez já era os efeitos colaterais do grande número de usos daquela arma divina que não era abençoada para sua divindade assim como o arco e as flechas eram.
Tânatos respirou fundo, fechou os olhos por um curto momento e assentiu.
— Estejam preparados. — disse, se virando para a floresta.
O gigante se animou, e foi avisar o restante do grupo.
James estava se levantando quando sentiu um cutucar em seu ombro, mas por estar tão concentrado em executar
Dg pássaros que por um reflexo se virou e golpeou com sua lança.
— Ah meu Deus… o que foi agora? — perguntou, preocupado ao ver uma feição tensa dela. Psiquê.
“James, fique atento, sinto que algo muito importante vai acontecer agora.””
— Algo importante? Tipo o quê? Eu e todo mundo aqui virarmos alpiste?
“James.”
— Ok, ok…! Diga, o que está sentindo?
“Sinto uma benção.””
— Benção?
— Shifu, com quem está falar? — perguntou Li-Hua, o salvando de uma ave que iria cravar suas garras em seus olhos.
— Eu… — quando olhou para a direção em que falava com a deusa, já não estava mais lá — Oh meu Deus… acho que estou começando a delirar. — riu breve e sem graça.
A jovem franziu o cenho, não acreditando muito no seu mestre, mas ousou questionar, pois havia mesmo algo que poderia provar o que o rapaz dizia, o ombro com bolhas escuras e os incontáveis arranhões, assim como havia em seu corpo.
Sem tempo para mais questionamentos, teve que voltar à sua função.
Penas, pó e várias revoadas. Estavam começando a ficar cansados, todos, principalmente o deus do amor, que não mais conseguia voar, e chegou a um certo momento em que vomitou, e ficou assustado, pois não foi o conteúdo de seu estômago, e sim uma boa porção de icor.
Todos viram isso, e ficaram tensos.
— Todos! Agrupar em torno! — orientou James, tendo o acato sem hesitação de seus companheiros de luta.
E foi aí que um rugido soou e ecoou pelo local.
Vindo com as aves, uma nuvem mais escura e espessa começou a surgir no horizonte, e acompanhado disso aqueles sons ritmados de um correr que já sabiam o que era vinha junto. Além disso havia uma terceira coisa intimidadora: uma cortina de fumaça cinza escuro que cobriu os céus.
— Tânatos? — perguntou-se o gigante, olhando o céu depois de conseguir inflamar uma boa porção de aves.
— Não pode ser ele… Tân não pode usar seus poderes aqui… — disse o deus do amor, caindo sobre um joelho.
— Talvez… — murmurou James, mas parou-se.
Afinal, sentia sua pele arrepiar ao olhar aquela nuvem, junto de um frio da espinha, e era a mesma sensação das primeiras vezes em que viu o deus da morte pessoalmente.
“Kýrios tem razão, ele não pode usar seus poderes. Então o que pode ser? Ou melhor, quem pode ser?”. Perguntou-se James internamente.
A nuvem escura ressoou pelos céus, fazendo propositalmente um som muito alto, machucando um pouco os ouvidos de todos.
— James… tape-os… — pediu o deus do amor, fazendo sinal para suas orelhas, sua expressão era cansada, havia icor dourado escorrendo pelo canto de sua boca.
— Merda… — murmurou, ao tocar em seu ouvido e ver que o mesmo sangrava — Kýrios, você também tem que fazer isso!
— Não posso… tenho que continuar tocando as castanholas…
— Sim, você irá continuar. Mas se desmaiar será a nossa derrota! — disse, colocando no chão a lança e indo até o deus rapidamente.
O deus não esperava por isso, não esperava que o rapaz fosse ir ajudá-lo daquela forma tampando seus ouvidos, envolvendo sua cabeça entre suas mãos, e se deixando totalmente de guarda baixa.
— James! Não faça isso!
— Continue tocando! — sussurrou, gesticulando bem os lábios, já que o deus não podia mais ouvir. E para lhe dar confiança, encostou suas testas, fazendo um sinal positivo com a cabeça — Toque! Faça barulho!
O deus franziu o cenho enquanto fitava seus olhos, nunca desviando das profundas orbes esverdeadas do moreno.
E como ordenado, tocou mais uma vez as castanholas.
O tilintar reverberou numa onda forte que se alastrou em um raio de um quilometro, fazendo praticamente todas aves caírem. E foi bem nesse momento que Ortros o segundo cão de Hades, surgiu de novo.
O chão todo tremeu, o barro se espalhava, as arvores se agitaram mesmo que não houvesse pássaros voando entre elas. Tal dúvida foi respondida do que seria ou do que estava acontecendo: o chão estava se abrindo.
— Cuidado com as rachaduras! — avisou o gigante, dando um mortal para trás para poder escapar com agilidade de um fenda que o atacou pelos lados, e para não perder tempo, cravou no chão a flecha, e martelou com a ferramenta, ao mesmo tempo em que a jovem moça também executava as aves com sua velocidade impressionante, era como se algum fantasma tivesse a possuído, pois sua postura e concentração estavam tão aguçadas que até uma pena cortava no ar mas não deixava nada passar pela sua linha de limite que traçou para proteger seu shifu e agora também o deus do amor.
Ortros por sua vez quando chegou a clareira, parando em frente ao grupo, encarando-os, e abaixou a cabeça como se fosse uma saudação, para em seguida começar a cavar uma das rachaduras.
Suas unhas obsidianas assim como seus dentes, mesmo que estivessem em uma secreta aliança com eles, pareciam hostis demais para confiar, mas tinham que confiar.
Ao cavar, a terra começou a tremer de novo.
Um pouco atrás, chegando em uma fumaça cinzenta, Tânatos, que estava mais sério do que de costume. James percebia isso, assim como Panoptes e Li-Hua, somente Kýrios não conseguia por estar muito tonto, seus olhos quase se fechando pela fraqueza.
De repente chamas muito altas vieram da fenda cavada pelo cão bicéfalo, e em uma espiral o fogo se voltou para as aves, sugando-as, devorando suas carnes no meio daquelas labaredas alaranjadas e pretas, que se misturavam de forma estranha, como se lutassem para dominar uma a outra.
E quanto mais o cão cavava, mais o fogo ardia, e mais suas patas perdiam sua forma, pois se queimavam, se tornando cinzas.
E entre aquele tumulto de fogo, aves, penas, terras, outros bandos vindo, castanholas sendo tocadas quase que por automático, um brilho de uma lâmina iluminou perto de Ortros.
E todos do grupo, menos o deus do amor, arregalaram os olhos.
— Que porcarias ele vai fazer?! Porque está usando seus poderes?! — perguntou Panoptes, vendo um possível desastre acontecer.
— Senhor deus sombra tá ajudando… ele deve estar ajudar alguma forma… — disse Li-Hua, seu rosto entristecido, mas claramente torcendo para não ser o que seus olhos estavam vendo que iria acontecer.
— Tânatos… não faz isso com a gente… — sussurrou James para si mesmo, também compartilhando do mesmo sentimento de sua protegida.
Mas lá estava o deus da morte, em uma mão carregava uma ampulheta manchada, pingando sangue no chão. E na outra mão sua foice, o prata brilhava e refletia o sol da manhã, mas por causa de sua aura escura, emanando uma energia de mesmo tom deixava tudo ao redor cinzento.
Seus cabelos ganharam um tom mais pálido, mas não era isso que chamava a atenção… era a forma quase etérea que seu ser se apresentava junto de um par de asas, estas feitas com penas prateadas e olhos obsidianos, tomando um forma mais alta, mais… assustadora.
— Tân… ele está bravo…? Eu o sinto… com raiva… o quê… — sussurrou Kýrios, seus olhos quase se fechando.
— Kýrios, toque mais uma vez as castanholas! Agora! — disse James, se voltando para ele, temendo que se não continuasse naquele momento a lutar, não teriam chances.
— James… porque você está tão… isso é medo? O que está acontecendo…?
— As castanholas Kýrios!
Mesmo não tendo forças, o deus as ergueu com esforço, e tocou.
Mais uma onda de som se dispersou, derrubando ainda mais as aves ao redor, ajudando as fendas a sugarem mais aves para o centro delas.
E quanto isso o deus da morte se preparava para fazer seu ataque, não se mostrava hesitante, muito pelo contrário, reunia toda sua força para aquela execução.
“Por Deus… será que… ele vai matar a todos nós?!”. Pensou James, seu coração ficando desesperado a cada segundo, se culpando por não ter dado ouvidos a sua intuição sobre aquele deus.
— Foda-se! — xingou James, se virando para Panoptes e Li-Hua, mas ainda segurando entre suas mãos e tampando a cabeça do deus do amor — Vocês dois, fujam!
— O quê?! Mas nem morto! Esse imbecil pode tirar meus dois últimos olhos fora, mas não saio daqui sem causar algum dano! — protestou o gigante.
— Eu não ir! Não deixar shifu! Eu ir lutar até fim! — protestou também a moça.
— Porra, se todos nós morrermos não haverá resistência contra Zeus! Se eu e ele morrermos agora, procurem pelos outros filhos de Afrodite que estejam do nosso lado, procurem por um outro Pista de Parca, mas não deixem Zeus nos vencer, e nem o trabalho de Psiquê morrer! — argumentou James.
Mas os dois companheiros de busca não lhe escutaram, e se viraram de costas, se pondo em sua frente para insistir em protegê-lo.
James bufou tenso se vendo sem escolhas, tinha que tentar alguma coisa!
— Kýrios, por favor, fique de olhos grudados em mim! Pode fazer isso?
— Sim… — sorriu engolindo em seco, bambeando pro lado e cuspindo mais icor após tossir, ficando ainda mais tonto, e pelo modo como seus olhos quase se fechavam, ainda mais disperso e inconsciente do que estava acontecendo ao seu redor.
James balançou a cabeça em negativa, se sentindo um pouco culpado de ter que usar aquela artimanha e queda do deus em seus impulsos que ele viu que o loiro estava sentindo por ele, mas era um momento de sobrevivência, e tudo tinha que ser usado.
— Isso, bom rapaz. E se conseguir ficar de olhos abertos, vou te dar um beijo.
— Beijo… beijo…? Eu quero… — sorriu, tentando avançar, mas sem sucesso, quase caindo de cara contra o monte de penas e cinzas se não fosse por James segurá-lo pelos ombros.
— Ótimo, fique sentadinho aqui, e faça o que mandei. Me entende?
— Beijo…?
James revirou os olhos e deu um tapinha em seu ombro, como uma parabenização silenciosa do “foco” do deus.
— Quando eu gritar para tocar essa coisa, você toca, entendido?
— Sim… ha ha… — murmurou, mordendo os lábios enquanto olhava de forma desejosa para o rapaz, mas seus bambeios mesmo que estivesse sentado indicavam o delírio em que se encontrava.
Tendo a certeza que o loiro estaria com sua atenção e forças de vontade em sua pessoa, se afastou.
Se virando para os outros dois, James pegou sua lança do chão e correu em direção a aquele deus.
— Shifu!
— James!
— Protejam o Kýrios! — gritou para os dois enquanto corria.
O medo em seu coração era muito grande, mas aquele sentimento de querer fazer o que era certo era maior, assim como a de… proteger aquelas pessoas, de mostrar que era útil, e de que valia alguma coisa.
E por isso, mesmo que seus pernas estivessem tremendo, seguiu em frente com a lança.
Tânatos percebeu o rapaz, e não fez nada além de erguer a ampulheta para o moreno.
— Porra… — reclamou James, ao sentir uma dor em seu coração — Ah então você quer me impedir… tudo bem, eu também quero. — respirando com dificuldades, se ergueu, e correu — Castanholas! — gritou em aviso.
O deus do amor levantou as castanholas acima de sua cabeça, e de olhos fechados mas ainda sorrindo de canto, tocou o instrumento.
A onda de som foi tão forte aquela vez que fez com que Li-Hua e Panoptes fossem jogados para longe. James sabia que isso poderia acontecer essa vez, e por isso ao em vez de parar para se segurar em algum arbusto, seguiu correndo, e quando a onda lhe atingiu pelas costas se aproveitou do impulso para se jogar aonde queria: na direção de Tânatos.
E o deus, vendo isso, se adiantou logo em executar seu objetivo…
Com um giro da foice, em um corte limpo e rápido, fez as duas cabeças caninas rolarem no chão. E nesse mesmo tempo, James conseguiu cravar sua lança em Tânatos, mas por causa de um pequeno desvio do deus, acabou acertando seu ombro.
— Merda! — reclamou ao cair no chão por não aguentar seu próprio peso pelos seus braços estarem fracos do cansaço da luta com as aves.
— Você, James Payne, não viverá muito agindo dessa maneira. — disse o deus pálido, tirando a lança de seu ombro como se não fosse nada e a jogando pra longe, na direção onde estava o deus do amor.
Tocando em seu próprio ombro, olhou para sua mão contendo icor, mas diferente dos deuses do mundo de cima que eram de tonalidade dourada, o seu tinha um forte tom prateado.
Olhando fixamente para o sangue, deixou-o pingar sobre a terra, e um resultado quase que instantâneo veio.
Todo o solo ficou seco, as arvores ao redor morreram, os passos que estavam abatidos mas ainda tentando voar derreteram, assim como o cão bicéfalo, que queimava, e como se o sangue do deus da morte fosse um combustível inflamável, as chamas da fenda e de seu corpo se alastraram queimando tudo que vinha pela frente.
James não sabia o que fazer, ainda mais por estar paralisado vendo tudo ao seu redor acontecer, percebendo que havia um halo ao seu redor lhe protegendo de ser atingido por aquele fogo cinzento e o sangue de Tânatos que parecia sugar a vida de tudo. E foi então que novamente ela apareceu:
“James! Você tem que salvá-los! Se erga! Puxe-os pra fora desse queimada antes que seja tarde demais!”. Orientou Psiquê.
— Eu falhei… eu não consegui matá-lo! — disse enquanto se levantava — Psiquê, ele nos traiu!
“Eu confio em Tân, e continuarei confiando.”
— Como assim? Porque…
“Vá despressa! Algo mais importante vai acontecer! Não consegue sentir isso James?”
James sentia, era uma pressão vindo de sua cabeça, não doía, mas era bem incomodo.
Ouvindo a deusa, correu de volta um pouco aos tropeços para o deus do amor, desviando um pouco a rota para ajudar Panoptes que carregava a moça em suas costas, por ela estar com uma de suas pernas quebrada e em um angulo anormal por causa do empurrão do impulso.
Os pássaros restantes começaram a queimar e a virar uma sopa de carne e ossos quando se aproximavam da clareira, caindo naquilo que seria uma grande armadilha. Tânatos estava no meio de tudo, parado, olhando tudo virar cinzas, vendo tudo perder seu brilho e sua vivacidade natural, tudo sendo consumido pelo dom de sua divindade.
— Deixa ele comigo, vamos até o limite daquele caminho! — orientou, enquanto fazia a mesmo coisa que o gigante fez, colocando o deus em suas costas, mas por ele ser muito maior e mais forte, não conseguia carregá-lo inteiro, então resolveu arrastá-lo enquanto deixava seus braços envolvidos em seu proprio pescoço e as pernas na terra.
— Não esqueça da lança! — lembrou Panoptes.
— Porra… — olhou pra trás, e lembrou que tinha também uma vida ali para proteger — Pegue a lança pra mim por favor! E vamos dar um fora daqui agora!
Sem ponderações, colocou o matelo entre seus lábios, correu e pulou os montinhos de terra e ossos e carne de pássaro e pegou a arma, seguindo o rapaz sem alguma hesitação.
Como não estavam muito longe da fronteira onde terminava aquela destruíção conseguiram chegar a tempo da terra começar a ser sugada por um buraco que cuspia sombras em seu núcleo, bem onde estava Tânatos, sobrevoando, ainda parado e com as asas abertas, indiferente, como se nada daquilo o impressionasse ou afetassase.
E só esboçou alguma reação, fungando e fechando os olhos em cansaço, quando girou a foice em sentido anti horário, em seguida fincou o cabo no solo.
Uma grande luz surgiu, e parecendo um revide, veio também um impulso, uma onda de impacto que se alastrou no raio todo.
Todos tiveram que se segurar nas arvores, James se esforçou ao máximo para o deus do amor não ser levado par longe, já que agora se encontrava desacordado e pálido. Quanto a Panoptes, usou a lança para se segurar, fincando com tanta força numa arvore que só faltou pouco para atravessá-la, Li-Hua se segurava da mesma forma, mas um braço estava em sua adaga fincada no tronco enquato a outra se agarrava no braço do gigante.
A onda durou um longo tempo antes de parar e deixar um vazio tanto de som quanto de energia do local.
— Hm? — murmurou James ao olhar para sua pele e seu cabelo, e os encontrar diferentes.
— Por todos deuses… o que esse idiota fez conosco?! James! Seus cabelos também estão… — reclamou Panoptes, ao ver que todos eles estavam pálidos e com alguns fios grisalhos.
— Estão todos bem dentro do possível?! — perguntou James, interrompendo por estar nervoso com várias questões, uma delas era a de querer logo saber de que benção a deusa tinha falado.
Enquanto pousava com cuidado o deus perto da arvore onde havia se segurado, se levantou e reuniu forças para se mostrar ainda apto a seguir em frente e não preocupá-los.
Todos assentiram.
— E agora? Shifu vai… matar de vez o senhor Cabelos Brancos? — perguntou a moça, com semblante triste, mas esperançosa de que tudo não fosse terminar assim com aquele deus pálido.
James fungou em tristeza também, observando o seu redor, para depois finalmente direcionar seu olhar lá pro centro de toda aquela confusão.
E perceber algo.
Havia um brilho dourado entre toda aquela nuance sombria, destacando-se tão bem que não teve como não despertar curiosidade no trio ainda acordado atrás das árvores.
— Fiquem aqui. Vou olhar. — disse James, não tendo nenhuma objeção do grupo, afinal… como poderiam defender alguém que os traíu sem a menor piedade?
Com o coração não querendo acreditar no que seus olhos viam, se encaminhou para o centro do caos com a lança em mãos que Panoptes tirou da árvore. Não sabia se iria funcionar, era uma coisa irônica demais… matar a morte? É parece que havia chegado a hora de fazer o que tinha que ser feito.
— Meu Deus… — murmurou James assim que chegou e viu o estado do deus da morte.
Com as asas completamente quebradas, um braço retorcido de um jeito horrível de se ver e um estado físico cadaverico pela magreza excessiva, Tânatos segurava entre suas mãos uma pequena flor dourada.
— Senhor… James… — murmurou o deus, parecendo implorar por ajuda.
— Tânatos… o que fez?
— A flor… ele… dentro dele… Ortros…
— Está me dizendo que… essa flor estava dentro daquele cão?
O deus fez que sim com muito esforço.
— Céus… então você não nos traiu…
— Nunca farei isso Psiquê… eu prometi… juramos pelo Estige, lembra…? Serei leal a você… pela eternidade… — sussurrou, parecendo delirar enquanto olhava para o rapaz, e colocando uma mão no peito, do lado onde ficava seu coração.
James arqueou uma sobrancelha, e um sentimento inquietante começou a fervilhar em sua cabeça e peito.
— Tânatos…
— Pegue logo… antes que eles vejam…
— Eles quem?
Sem mais dizeres, o deud ergueu uma mão e ofereceu a flor.
James a pegou sem hesitar, mas em seguida ficou em conflito do que fazer quando percebeu que o deus sangrava icor bem aonde tinha lhe ferido com a lança.
— Me perdoe Tânatos… eu não sabia que…
— Até mais breve. — disse.
E então de desfez em uma fumaça escura junto de sua foice, desaparecendo no meio da escuridão, deixando para trás a destruição local.
E também, um rapaz se sentindo muito culpado.
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Capítulo 39
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Missão Ágape
O Olimpo está em crise, e tudo porque de repente uma profecia disse que um deus iria dizimar o seu sistema e tudo que eles lutaram para conquistar e poderem estar no poder até hoje.
E é...