Capítulo 2

Faziam dois dias desde que Hayato havia começado a falar com Shin. E deste então, ele sentia-se constantemente observado. As pessoas a sua volta realmente começaram a falar. E a quantidade de ‘oi’s’ que ele recebia quando passava pelo corredor também havia diminuído.

E honestamente, isso não o havia afetado nem um pouco. Na verdade, era até bom. Todas as pessoas com quem conversava tinham apenas assuntos fúteis no repertório.

Se falasse com meninas elas falariam das tendências em moda e música. Se falasse com meninos eles falariam de basquete e peitos. Não eram seus assuntos favoritos, mesmo que já tivesse praticado basquete.

Já com Shin era diferente. Ele tinha assunto e sabia uma infinidade de curiosidades aleatórias. Hayato ficou muito besta ao descobrir que lontras-marinhas dormem de mãos dadas. Ele se derreteu inteiro quando Shin mostrou um vídeo de duas delas deslizando na água.

Eles também trocaram números e Hayato fazia questão de compartilhar tudo sobre si, desde o horário em que acordava até o horário em que dormia. O que comia ou o que assistia. Apenas não havia mandado nada no banheiro ainda para não fazer Shin ter um ataque.

Surpreendo muito Hayato, Shin revelou que tinha dezessete anos. Ele tinha repetido um ano por ter ficado meses afastado da escola. Hayato até brincou dizendo que o chamaria de Shin-senpai. Ele sentia vontade de dar risada sempre que lembrava que quase levou um tapa quando realmente o chamou disso.

Em apenas dois dias ele havia descoberto muitas coisas sobre Shin. Ele era uma pessoa muito honesta, talvez a mais honesta que Hayato já havia conhecido. Ele sempre falava o que pensava, independente da situação.

Mas o que mais fascinou Hayato foi o fato de Shin amar desenhar. Ele havia conseguido espiar um de seus desenhos, já que Shin tinha vergonha, e era simplesmente formidável.

Hayato também descobriu que Shin trabalhava meio período como adestrador e que ele era ótimo em matemática. Hayato havia chamado ele pra estudar junto no horário livre, buscando fazer o que havia prometido fazer a seu professor, e ele levou uma surra.

As sensações que sentia com Shin estavam se tornando mais claras. E ele estava achando tudo fascinante já que nunca havia sentido nada do tipo antes. E assim os dois dias passaram. E a presença que mais observava Hayato estava dando as caras.

Ele devia pensar que era invisível. Apenas o topo da cabeça loira e os olhos cor de caramelo apareciam de seu disfarce. Ele estava os olhando da porta. Encarando Hayato com uma atenção desconcertante.

— Apenas o ignore. — disse Shin, cotovelo apoiado na mesa para que sua cabeça descansasse na própria mão. Seus olhos escuros estavam voltados para a janela.

— É meio difícil fazer isso. Ele é meu senpai. — Hayato estava fazendo o possível para não olhar. Por isso, ficava encarando Shin. O arranhado perto de seus lábios já havia sarado.

— Ele é um idiota. — corrigiu Shin.

A pessoa que os estava encarando era ninguém mais ninguém menos do que Konishi Zen, aluno do terceiro ano do ensino médio e também um dos mais populares de sua escola. Ele era presidente do clube de parkour em sua escola.

Ele havia sido suspenso da escola por uma semana por ter pulado do terceiro andar da escola, enquanto praticava. Aparentemente ele era o amigo de Shin que seu professor havia dito que ele tinha.

— Ele é seu amigo, né? — Hayato precisava confirmar.

— Ele é uma pedra no meu sapato. — respondeu Shin, alto o bastante para que Zen, na porta, escutasse.

— Que maldade, Shin. — respondeu Zen.

— Calado, maldito. — Shin se moveu rápido. Agarrando uma borracha em sua mesa e jogando na direção de Zen. Ele tinha uma excelente mira pois o objeto acertou em cheio a testa de Zen. E com força o bastante para fazer ele dar um passo para trás.

— Shin, está bravo comigo? — perguntou ele entrando na sala.

Konishi Zen realmente era tudo aquilo que as garotas falavam. Alto, musculoso, cabelos loiros e um belo par de olhos caramelo, junto a pele bronzeada que ele tinha, fazia as gatotas suspirarem quando passava.

— Não, imagine, é claro que não estou bravo. — qualquer um no raio de um quilômetro seria capaz de sentir a ironia nas palavras de Shin. — Quem é que ficaria bravo com o melhor amigo de infância que invade o banho de um dos membros de sua família? Ah, com certeza não sou eu.

— Eu já pedi desculpa. — suplicou Zen.

— Ah, claro, como se pedir desculpa apagasse o fato de que você invadiu o banho de Akira! — acusou Shin.

— Akira? — disse Hayato.

— Sim, Shinkai Akira, meu irmão mais velho. — explicou Shin.

— Eu não sabia que você tinha irmãos. — comentou Hayato.

— É, também tenho uma irmã mais nova. — contou Shin.

— Aika-chan é uma gracinha. — suspirou Zen. — Os irmãos dele não se parecem nada com ele.

— Fique quieto, pervertido. — mandou Shin.

— Akira, Shin e Aika…. — refletiu Hayato. — É algum tipo de padrão?

— Na verdade não. Meu nome foi escolhido pela minha mãe e o do Akira e da Aika foram escolhidos pelo meu pai. — explicou Shin.

— Como eles decidiram quem escolheria qual? — questionou Hayato.

— Jokenpô. A tia era péssima e perdeu várias vezes em várias melhores de três. — se intrometeu Zen.

— Não se intrometa na minha conversa. — brigou Shin. — Aliás já não está na hora de voltar pra sua sala? A aula logo vai começar.

— Mas, Shin….

— Mais nada. — os se encararam. Hayato estava achando tudo muito engraçado.

— Vocês tem uma relação engraçada. — disse ele.

— Bem, é claro que eu vou ter uma boa relação com meus irmão mais novo. — Zen sorriu ao dizer isso.

— Primeiro, nós não somos irmãos. Segundo, eu sou o mais velho. — corrigiu Shin.

— Só por alguns meses. E mais, eu sou o mais alto e o mais forte. Fora que é pra mim que você liga quando precisa de ajuda. — acusou Zen.

— Do jeito que você fala parece até que eu preciso da sua ajuda constantemente. — Shin fez bico.

— Você me ligou as três e quarenta da madrugada de hoje porquê não estava conseguindo abrir o pote.

— E você demorou meia hora pra abrir.

Os dois se encaravam com uma seriedade assustadora. Zen voltou a falar.

— Eu estava admirando o desenho do Akira pendurado na sua parede, foi por isso que demorei tanto. E mais, nem estava tão apertado assim. Você mesmo poderia ter aberto.

— Eu não. E se eu tivesse machucado meu pulso?

Isso lembrou Hayato de mais coisas que havia descoberto sobre Shin. Ele tinha muitos medos. Ele tinha medo de se machucar com qualquer coisa que não fosse o trabalho. Ele tinha um cuidado especial com seu pulso e mãos.

Shin também morria de medo de histórias de terror ou qualquer coisa do tipo como filmes e animes. Uma parte de Hayato, a que gostava de proteger, queria ver a forma com que Shin ficava depois de assistir um filme de terror.

Hayato só havia descoberto esse medo quando revelou sua admiração pela Hashimoto Akira-sensei em uma conversa sobre o que ambos gostavam. Shin havia se mostrado bem desconfortável com aquele tema, então Hayato havia encerrado a conversa.

— Abrir uma tampa não machucaria seu pulso. — acusou Zen.

— Você não tem como saber!

— E mais, você vive com os braços arranhados e com mordidas. — Zen puxou o braço de Shin, erguendo a manga do moletom. O braço de Shin estava cheio de arranhados de gatos e com algumas partes enfaixadas ou com band-aind.

— Okay. Acho que já deu não? Zen-senpai é melhor você ir pra sua sala. — interviu Hayato. — Nosso professor já entrou.

Zen saiu correndo ao ouvir isso. Pelo jeito, ele já havia levado bronca por coisas assim. As aulas seguiram normais, com Hayato estudando e com Shin fazendo rabiscos. Pelo jeito, ele não prestava atenção na aula pois já havia aprendido essa matéria no ano passado. Antes de se ausentar. Pensando nisso, por que ele havia sumido por uns meses?

****

— Então, eu vou por aqui. — disse Shin. Ele teria trabalho naquele dia, então Hayato não poderia o acompanhar até em casa. Os dois eram praticamente vizinhos, já que moravam no mesmo bairro. Hayato já havia decorado qual era a casa de Shin.

Naquele dia, eles resolveram se despedir logo no portão de saída da escola. Hayato ficou encarando conforme Shin se afastava e a presença de Zen chegava mais perto.

— Falamos mais cedo mas eu esqueci de me apresentar. — disse ele ao chegar perto. — Eu sou Konishi Zen, pode me chamar apenas pelo nome, não precisa do ‘senpai’. Você é o Mizushima Hayato, não?

— Sou eu mesmo. Pode me chamar apenas de Hayato.

— Okay, então, Hayato…. — a aura gentil de Zen sumiu, dando lugar a uma aura ameaçadora. — Eu vou fazer uma pergunta e se você não responder com a verdade, lamento dizer que você não terá mais a capacidade de falar, pois eu irei arrancar sua língua.

— Qual é a pergunta? — Hayato já tinha uma suspeita.

— Por que se aproximou de Shin?

Sua suspeita estava correta.