Capítulo 84: Paixão

Wei Chi Li não dormiu por muito tempo. Quando acordou, o sol brilhava em seu rosto através da janela. Ela cobriu os olhos com uma das mãos para evitar que a luz a cegasse.

Levantou-se meio atordoada e viu que Liu Luo Yi já havia acordado em algum momento. Ela estava sentada na beira da cama, com sua mão delicada estendida para bloquear o sol para Wei Chi Li, enquanto olhava para frente, perdida em pensamentos.

— Quando você acordou? — Wei Chi Li bocejou. — Por que não dorme mais um pouco depois de viajar a noite inteira?

— Tive um sonho e não consegui mais dormir. — O sorriso de Liu Luo Yi parecia um pouco forçado. — A princesa quer descansar mais um pouco?

Wei Chi Li balançou a cabeça, massageou o ombro para relaxar e então se virou para se aprontar. Depois de se preparar, saiu para encontrar Wei Chi Die e os outros.

Wei Chi Die e An Ge também já haviam terminado seus preparativos. Todos sabiam que não podiam ficar ali por muito tempo. Então, depois de um breve descanso, precisavam continuar viagem.

Wei Chi Li e Xin Ran andaram pela cidade por um tempo, comprando dois cavalos e uma carruagem para que o grupo pudesse viajar com mais conforto. Em poucos momentos, já estavam saindo da cidade, seguindo rapidamente para o norte. Os soldados não haviam os alcançado, mas ainda assim não podiam baixar a guarda e seguiam firmes no caminho.

Após dois dias de viagem, já haviam se distanciado bastante da capital. A estrada principal, antes plana, deu lugar a caminhos de terra, onde a poeira levantava ao menor movimento. O número de pessoas no trajeto diminuiu, assim como as árvores, que ficavam cada vez mais escassas.

Wei Chi Li notou que, mesmo quando passavam por algumas aldeias, todas eram extremamente pobres. Embora fosse outono, não havia sinais de uma boa colheita nos campos. Apenas alguns idosos e mulheres de pele amarelada e aparência frágil trabalhavam na lavoura, enquanto os jovens e adultos em idade produtiva eram raros.

— Irmã, não dizem que o Reino de Yan é forte, próspero e pacífico? Pelo que vejo, não parece nada próspero ou pacífico. — Wei Chi Li ergueu a cortina da carruagem e olhou para fora. Depois de um instante, a poeira atingiu seus olhos, forçando-a a recuar. Então, começou a importunar Liu Luo Yi para retirar os grãos de areia para ela.

Wei Chi Die lançou-lhe um olhar de desprezo e disse:

— Era assim quando cheguei ao Reino de Yan. Talvez tenha sido a seca deste ano. Quanto mais nos aproximamos da fronteira norte, mais árida é a terra.

— Mas isso não deveria significar que não há trabalhadores em lugar nenhum… — murmurou Wei Chi Li, aproveitando a respiração suave de Liu Luo Yi sobre seu rosto.

— Não se mexa. — Liu Luo Yi disse calmamente. Wei Chi Li ficou imóvel, e levou um tempo até que ela conseguisse remover o grão de areia de seu olho.

— Alguns anos atrás, ouvi meu pai dizer que a corte imperial decidiu expandir o exército de repente e, ao mesmo tempo, recrutou os jovens e fortes para trabalharem como operários na fronteira. Como o Reino de Yan fica no centro e há muitos países vizinhos ao seu redor, mesmo que eles não sejam fortes, não podem ser subestimados. O Reino de Yan pode ser grande, mas já existe há cem anos. Muitas coisas permaneceram inalteradas e, aos poucos, começou a entrar em declínio. — Liu Luo Yi disse, entregando o lenço para Wei Chi Li.

Pensativa, Wei Chi Li assentiu. Isso significava que havia um motivo para o imperador temer tanto o território do Norte. Parecia que ele próprio era igual ao seu país: por fora, parecia imponente, mas por dentro estava apodrecendo.

As várias aldeias pelas quais passaram estavam na mesma situação. Só quando o céu começou a escurecer chegaram a uma pequena cidade. Estavam tão cansados que nem se preocuparam em ler o nome do lugar e entraram direto.

Já haviam fugido da capital por dois dias, e o imperador provavelmente já havia enviado ordens para espalhar retratos deles por todo o país. Por isso, Wei Chi Li temia ser reconhecida e entregou um véu para Wei Chi Die e Liu Luo Yi, comprado na cidade anterior, para cobrirem seus rostos.

Apesar de pequena, a cidade era muito melhor do que as aldeias anteriores. Não apenas possuía estalagens de verdade, com quartos bem mobiliados, mas também eram limpos e organizados.

Wei Chi Li estava prestes a falar com Liu Luo Yi quando a viu entrando sozinha no quarto e fechando a porta. O que queria dizer ficou preso em sua garganta e, sem escolha, entrou em seu próprio quarto, sentindo-se abatida.

Assim que se preparava para se deitar, ouviu batidas na porta. Wei Chi Li se levantou para abri-la, mas parou no meio do caminho. Tocou o véu em seu rosto e só então abriu a porta.

— O que foi? — Perguntou friamente.

Do lado de fora estava o estalajadeiro que os havia recebido. Ele sorria gentilmente enquanto segurava um balde de água.

— Preparei água quente para o hóspede. Por favor, aproveite.

Wei Chi Li olhou para o balde e quis fechá-la depois de pegá-lo. Mas, inesperadamente, o estalajadeiro não soltou o balde e, em vez disso, fixou os olhos no rosto coberto de Wei Chi Li.

— O hóspede gostaria de testar a temperatura da água? Se estiver muito quente, posso trocá-la.

Ao dizer isso, ele de repente vacilou, inclinando o balde em direção a Wei Chi Li. Com reflexos rápidos, ela deu um passo para trás, estabilizando o balde com o joelho e segurando-o firmemente sem derramar uma gota de água.

— O estalajadeiro é muito atencioso. A água está ótima. — Wei Chi Li disse com um sorriso, então agarrou o balde e fechou a porta com força.

Do lado de fora, o estalajadeiro hesitou por um momento antes de descer as escadas. Wei Chi Li sabia que ele voltaria, então pegou rapidamente sua bagagem e foi até a porta de Wei Chi Die. Bateu três vezes suavemente e encostou-se à porta, dizendo em voz baixa:

— A situação não está boa. Saiam pela janela imediatamente.

Ela repetiu esse processo na porta de An Ge e Xin Ran, uma por uma, e então empurrou diretamente a porta de Liu Luo Yi e entrou.

Liu Luo Yi, que estava trocando de roupa, levou um susto e quase gritou. Wei Chi Li avançou rapidamente para cobrir sua boca e sussurrou em seu ouvido:

— Alguém suspeitou de nós. Essa hospedaria é incomum, venha comigo.

Ainda tremendo, Liu Luo Yi assentiu. Só então Wei Chi Li a soltou. Seu olhar pousou em seus ombros, então tirou o próprio casaco e o envolveu ao redor dela. Abraçou sua cintura, saltou pela janela e pousou firmemente no chão.

Já era tarde, e a pequena cidade não era tão iluminada quanto a capital, então estava escuro e parecia que todos já haviam adormecido.

— O que aconteceu? — Wei Chi Die, que havia acabado de pular de outra janela, sussurrou.

— O estalajadeiro suspeitou de nós. Ele deve ter recebido alguma informação sobre nós e queria ver minha aparência. Mas, felizmente, falhou. Parece que só nos resta passar a noite no carroção, revezando.

Wei Chi Li balançou a cabeça, segurou a mão de Liu Luo Yi e correu em direção ao carroção. Wei Chi Die lamentou em silêncio e as seguiu.

Assim, o carroção saiu novamente pelo portão da cidade, rangendo na estrada vazia.

— An Ge, faz tempo que você não descansa. Desça agora! — Wei Chi Die se posicionou ao lado de An Ge, que conduzia o carroção, e estendeu a mão para puxar seu cabelo.

An Ge não pareceu sentir dor e continuou dirigindo calmamente enquanto dizia:

— Como esta subordinada pode deixar a princesa conduzir o carroção? Seria inadequado.

Wei Chi Die ficou tão irritada que lhe deu um chute. Cruzando os braços na cintura, disse:

— Outro dia fui eu que cuidei de você. Isso não era inadequado também?

— A princesa foi gentil com esta subordinada. Sou grata. — An Ge respondeu sem emoção.

Wei Chi Die ergueu o punho, quase a golpeando, mas ao ver o ferimento na cabeça de An Ge, que ainda não havia cicatrizado, recuou.

— Ótima subordinada. Acredite ou não, eu te mando para o exército e te exilo na fronteira, sem nunca mais permitir que volte ao palácio!

Ao ouvir isso, os olhos de An Ge escureceram, e ela não disse nada.

— Esta subordinada se preocupa com a princesa. A princesa é tão nobre… conduzir um carroção assim…

— Você ainda sabe que sou uma princesa? — Wei Chi Die arqueou as sobrancelhas, abaixando-se para encará-la, o tom ficando frio. Embora Wei Chi Die fosse ácida ao falar, raramente ficava realmente brava. An Ge sabia que, quando sua voz assumia esse tom, significava que estava furiosa de verdade.

An Ge imediatamente ficou um pouco aflita. Pressionou os lábios e respondeu em voz baixa:

— Esta subordinada reconhece seu erro.

Wei Chi Die estava prestes a falar quando, de repente, algo irrompeu da estrada escura à frente. O cavalo se assustou, perdeu o controle e o carroção começou a sacudir violentamente. Wei Chi Die, que estava agachada e não teve tempo de se firmar, foi arremessada pelo impacto e quase caiu para fora.

Com olhos ágeis e mãos rápidas, An Ge segurou sua cintura com uma mão e manteve as rédeas firmes com a outra. Wei Chi Li, que estava apenas observando, não aguentou mais e correu para assumir a condução.

E, naquele momento, Wei Chi Die estava meio sentada no colo de An Ge, segurando-se nos ombros dela com as duas mãos. A mão de An Ge ainda estava em sua cintura, segurando-a firme em seus braços. Ambas ficaram paralisadas.

Wei Chi Li se esforçou para não rir e evitou olhar para elas, fingindo ser invisível.

Wei Chi Die arregalou os olhos e mordeu os lábios. Rapidamente, empurrou An Ge para longe, levantou-se apoiando-se na porta do carroção e deixou que a brisa fria da noite clareasse sua mente. Discretamente, pousou a mão sobre o peito. Desta vez, teve certeza: era seu coração que estava batendo rápido.

An Ge abaixou as mãos e esfregou as palmas juntas. A temperatura da cintura de Wei Chi Die parecia ter ficado impregnada nelas. Quando aquela cintura esguia, delicada e linda se movia, lembrava uma serpente d’água, encantadora e sedutora.

Fechou os olhos e tentou controlar os pensamentos.

Wei Chi Li pigarreou e disse:

— An Ge, você dirige primeiro. Nós discutiremos estratégias e voltaremos depois para revezar, tudo bem?

An Ge assentiu rapidamente.

Wei Chi Li pulou para o assento do cocheiro e começou a rir, tentando segurar a risada até o rosto ficar vermelho. Liu Luo Yi lançou-lhe um olhar indiferente e não disse nada.

— Pequena Liu’er, será que você pode ser… um pouquinho mais… apaixonada? — Quando Wei Chi Li parou de rir, inclinou-se para frente, com o rosto corado, e se agarrou ao corpo de Liu Luo Yi.

Liu Luo Yi curvou levemente os lábios, baixou os olhos e perguntou:

— O que foi?

Wei Chi Li pensou por um momento, então envolveu os braços ao redor da cintura de Liu Luo Yi, repousou o rosto sobre seu peito e começou a balançar.

Xin Ran, fingindo estar dormindo: …

— O que a princesa está fazendo? — Liu Luo Yi não sabia se ria ou chorava, olhando para Wei Chi Li surpresa.

O rosto de Wei Chi Li ficou ainda mais vermelho. Será que precisava dizer abertamente que queria vê-la sendo manhosa com ela? Isso seria constrangedor demais.

Simplesmente, ela abraçou a cintura de Liu Luo Yi e se recusou a soltá-la. Lembrou-se das atitudes dengosas de outras garotas e imitou:

— Pequena Liu’er, por que você tem sido tão fria esses dias…?

Liu Luo Yi corou. Olhou para Xin Ran e percebeu que ela ainda mantinha os olhos fechados. Além disso, parecia que as duas pessoas lá fora não notariam a situação dentro do carroção por um tempo. Só então relaxou um pouco e estendeu a mão para cutucar Wei Chi Li, dizendo, impotente:

— Princesa, pare de brincadeira.

Nesse momento, o carroção balançou, e a cabeça de Xin Ran bateu contra a lateral. Um “tum” pôde ser ouvido, e seus olhos se contraíram, mas ela permaneceu imóvel.

Wei Chi Li também se assustou e, instintivamente, quis se afastar. Mas ao perceber que Xin Ran não havia acordado, perdeu o receio de passar vergonha e abraçou Liu Luo Yi ainda mais forte.

Os lábios de Xin Ran começaram a tremer. Estava se segurando com muita dificuldade, mas se “acordasse” agora e visse as ações da princesa, talvez fosse silenciada para sempre.

Naquele instante, uma voz veio do lado de fora e o carroção parou abruptamente. Wei Chi Li imediatamente mudou de expressão, sua postura manhosa desaparecendo num instante. Levantou-se de um pulo, colocou Liu Luo Yi atrás de si e gritou:

— Quem está aí?!

— Quem está no carroção? Saiam!

Wei Chi Li espiou discretamente pela janela, franziu ligeiramente as sobrancelhas e sussurrou:

— São alguns soldados.