Capítulo 37: Fantasma

Obviamente Mo Cong não tinha ideia do que estava acontecendo com essa erva daninha de várias pétalas, mas o homem justo no telhado ficou chocado. 

An Jie pensou que Mo Cong estava andando muito devagar e que a atmosfera era um tanto estranha, então ele correu atrás de He Jingming, chegando bem a tempo de testemunhar uma reunião histórica. Mas sua confusão não diminuiu nem um pouco. Foi só quando a cabeça com a tatuagem de flor foi colocada na mesa que ele percebeu por que Zui She havia envolvido tantas pessoas. 

A íris alemã… a flor sagrada das lendas. 

He Jingming estendeu um dedo para tocar a flor, mas rapidamente o retraiu como se temesse algo. Ele disse roucamente: “Ele está vivo?”

O sorriso de Shui Shi não alcançou seus olhos. “Não sei sobre isso, mas esse método de matar… Acho muito familiar.” Naquele momento, alguém entrou e sussurrou algo em seus ouvidos. Zhai Haidong, o Leão Adormecido, assentiu e segurou seu rosário firmemente em sua mão. “Zui She também está aqui, ele acabou de sair do avião. Todos nós, velhos amigos, estamos reunidos aqui agora.”

He Jingming fez uma pausa, seu tom um pouco estranho. “Zui She?”

Zhai Haidong não pareceu notar. “O Iris está mostrando seus poderes para mim… para nós. Nesse ‘nós’, como Zui She poderia escapar?”

“Então…” He Jingming levantou-se de repente. “Ele…”

Zhai Haidong zombou. “Quem?”

He Jingming parecia atordoado, incapaz de falar por um longo tempo, olhando entorpecido para a cabeça nojenta na mesa. Demorou muito para que ele dissesse com uma voz muito seca: “E quanto a Yin Hu?”

“Quem?” Zhai Haidong ergueu as sobrancelhas. Os ossos da sobrancelha se projetaram, as sobrancelhas fracas. Em geral, elas não combinavam com aquele par de olhos desfocados e ligeiramente terríveis. Elas eram uma leve perturbação em suas feições, como os hominídeos de antigamente. Quando a pergunta “Quem?” saiu de sua boca, ele pareceu ter ouvido uma piada das eras e riu roucamente com alegria crescente até que jogou a cabeça para trás histericamente. “Você quer dizer An Yin Hu? Você está perguntando se An Yin Hu virá?”

A expressão de He Jingming esfriou novamente. Ele sentou-se lentamente, olhando melancolicamente para esse louco cego. Zhai Haidong chorou de tanto rir, batendo nas coxas, os sons vindos de sua garganta não mais capazes de serem distinguidos de choro. 

Ele riu tanto que engasgou com a própria saliva, então começou a tossir, seu corpo magro e seco se enrolou, seu rosto vermelho como um camarão cozido. Bai Zhihe gentilmente bateu em suas costas e ele se acalmou depois de um tempo. 

Zhai Haidong balançou a cabeça lentamente. “Eu realmente não esperava isso, Du Lang. Eles disseram que você enlouqueceu, mas eu não acreditei neles antes.”

He Jingming não disse nada, mas os músculos de suas bochechas ficaram tensos. 

An Jie realmente não estava interessado em ouvir as pessoas discutindo sobre ele pelas costas. Especialmente quando os dois debatedores eram um cego e um louco, respectivamente, se juntando como se fossem as paraolimpíadas. 

Como Zui She já estava em Pequim, ele teria alguma maneira de descobrir o que aconteceria depois. 

Seu olhar permaneceu naquela íris encantadora por uma última rodada, antes que ele se movesse silenciosamente, pronto para ir embora. 

De repente, An Jie olhou para trás, uma sensação há muito esquecida de urgência de vida e morte crescendo nele. Ele não teve tempo para hesitar e rapidamente se esquivou para o lado. Ao mesmo tempo, uma bala disparou de um ângulo extremamente astuto, alojando-se na parede em que ele estava encostado naquele momento. Um círculo de poeira flutuou para cima. 

O som de uma bala disparando obviamente assustou as pessoas lá dentro. An Jie xingou e correu na direção de onde a bala veio.

Sua reação foi mais rápida que um raio, mas aquela figura pareceu desaparecer da frente dele num piscar de olhos. An Jie não conseguiu ver nada deles, exceto uma cabeça cheia de cabelos dourados. An Jie estreitou os olhos para verificar a direção de onde vinha, então rapidamente se escondeu em um canto. 

Em pouco tempo, Bai Zhihe correu pessoalmente para fora com seus homens. Quando o último grunhido passou por An Jie, eles foram agarrados à força pelo pescoço e arrastados para o canto. Eles nem tiveram tempo de gritar antes de sentirem uma dor na nuca e irem ver Morpheus com os olhos turvos. An Jie riu. Ele roubou uma arma e um taser do bastardo azarado, então pisou em seu corpo sem um pingo de remorso e silenciosamente escalou uma parede. 

Bai Zhihe já havia chegado ao cruzamento. De um lado estava a movimentada estrada principal, do outro um beco vazio. An Jie viu Bai Zhihe hesitar de sua posição no muro: o mafioso dividiu seus homens em dois grupos, um liderado por ele mesmo em direção à rua principal, o outro em direção ao beco. 

Em um momento como esse, um ladrão assustado escolheria instintivamente o pequeno beco de calhas inundadas e infestações de ratos. Mas para alguém que teve a coragem de atirar do lado de fora da janela de Zhai Haidong e He Jingming… tudo bem, e considerando o alvo de sua bala, An Jie tinha certeza de que essa era uma pessoa extraordinária. 

O julgamento de Bai Zhihe foi muito convencional. Depois de errar o primeiro tiro, a pessoa nunca permaneceria onde estava, e caminhar pela rua principal e se misturar à multidão seria a escolha mais provável; o beco era estreito e reto. Mesmo que estivesse escondido, era difícil escapar dele. A primeira mão de Zhai Haidong fez um plano completo em uma fração de segundo. Para evitar que essa pequena possibilidade acontecesse, ele também enviou alguns homens para olhar no beco. 

An Jie hesitou. Ele de repente se abaixou e pulou da parede, movendo-se rapidamente para a esquina da estrada. Depois de observar cuidadosamente os arredores, seus olhos se fixaram em um lugar – bem ali, o assassino tinha ficado quase completamente imóvel!

As pupilas de An Jie dilataram e ele rolou para longe. De trás daquele muro de pedra desavisado surgiu uma sombra dourada que disparou um segundo tiro nele. 

Desta vez, An Jie viu o inimigo atrás de seu sangue. Na verdade, era um estrangeiro loiro com olhos azuis, inclinado para o lado magro, muito alto, sua aparência um tanto bonita, mas aquela expressão provocativa e zombeteira em seu rosto destruía qualquer senso de beleza que ele tinha. Não retribuir um presente com outro seria o mais indelicado. Como um homem da nação da cortesia, An Jie imediatamente atirou de volta com uma bala no momento em que se esquivou, então os dois se esconderam antes de atrair uma multidão. 

An Jie realmente queria bater nesse bastardo. Ignorando a arma de merda que ele tinha roubado naquele momento, seu oponente obviamente tinha vindo aqui planejado, mas não tinha silenciado sua arma e estava curtindo essa perseguição de gato e rato com todos os presentes tendo posições pouco claras. 

Aquele macaco não evoluído! An Jie cerrou os dentes. Ele decidiu desistir dessa brincadeira mortal de esconde-esconde, virou-se e foi embora.

O som da segunda rodada atraiu a atenção de Mo Cong também. A direção que ele escolheu por acaso era exatamente a mesma de An Jie e, com o canto dos olhos, ele viu a cauda… a cauda de uma jaqueta um tanto familiar. Ele imediatamente parou, franzindo a testa. “An Jie? Por que é ele…”

O dia tinha sido muito agitado – depois de rastejar para casa, An Jie se jogou no sofá, puxando acidentalmente o ferimento em sua mão. Ele pegou um pouco de gaze e remédio debaixo do sofá com os dentes à mostra e, com o coração ausente, começou a cutucar o que restava de seus nervos da dor. 

He Jingming ouviu falar desse “sobrinho” chamado An Jie e veio pessoalmente a Pequim para uma visita. Com os pensamentos e modos desse homem mentalmente danificado, era definitivamente possível. O que era estranho era a hora em que esse velho louco tinha vindo — bem quando algo tinha acontecido com os homens de Zhai Haidong, quando o Velho Leão não podia mais ficar sentado e esperar por ele. 

Além disso, a íris alemã era aquela pessoa – aquela pessoa que caiu nas muitas armadilhas preparadas para ela e foi forçada a morrer, aquela pessoa que uma vez se sentou firmemente no trono das trevas?

Para que ele voltou? Ou melhor… para quem ele voltou?

Por fim, aquele macaco amarelo; por que ele deixou os dois velhos chefes sozinhos e insistiu em atirar nele?

Esta não era mais uma simples briga entre caipiras e algumas gangues da pequena cidade de Pequim. 

An Jie enfaixou a mão e tirou um pedaço de papel de baixo da mesa de chá, esboçando nele um desenho de uma flor de íris. Sua mão tremia um pouco por causa do ferimento, as linhas levemente trêmulas, mas em uma inspeção mais próxima, o desenho parecia ter recebido a quintessência da tatuagem na cabeça humana com uma aura de… estranheza que deixava alguém fisicamente doente. 

Ele subconscientemente escreveu um “R·Li” no canto inferior direito da flor. A letra inglesa florida e o caractere chinês não combinavam; parecia que uma criança que tinha acabado de aprender inglês criou um nome vira-lata, como um cachorro colocando chifres para fingir ser uma ovelha. Mas enquanto An Jie olhava para esses dois caracteres, seu rosto ficou incomumente sério. 

Era ainda mais sombrio—

Vários anos atrás, o nome dessa pessoa representava um respeito inigualável. Esse homem era poderoso, elegante, ninguém sabia o que ele estava pensando; era como se ninguém pudesse escapar de seu controle. No coração dos jovens, ele não poderia ser superado. 

Incluindo An Yin Hu, He Du Lang, Zhai Shui Shi e Zui She daquela época, aqueles que governaram por eras e até foram chamados de extraordinários, todos viam o homem como seu objetivo… até mesmo seu professor. 

Mas isso não significa que eles permitiram seus pecados. 

Pecados. An Jie lembrou-se daquele velho. O velho que os quatro, antes de se voltarem uns contra os outros, trataram como seu pai biológico. Ele era ainda pior que Mo Yannan, nem mesmo deixando uma fotografia para trás 

An Jie pensou que, se não tivesse ficado claramente provado que o velho havia morrido pelas mãos de Li, nunca teria havido um dia em que ele poderia imaginar que chegaria a rivalizar com a autoridade daquele homem.

Mas desde o início dos tempos, a inimizade de um pai assassinado e o ódio de uma esposa roubada não podiam ser esquecidos. 

Mas agora, esse homem que havia desaparecido por décadas, esse homem que deveria estar morto, havia retornado à vida como um fantasma e revelado abertamente sua íris. 

An Jie se inclinou no sofá, amassou o papel sobre a mesa formando uma bola e jogou-o na lixeira mais próxima. 

Esta foi uma declaração de guerra – uma guerra por vingança.

Notas do autor: Damos boas-vindas a um novo capítulo com os gongos e tambores dessa confusão de luta~~~ Flores para mim!

(Flores para o autor! 💐💐💐)