Capítulo 26

A porta é fechada de qualquer jeito, deixando escapar o ar gelado proporcionado pelo ar-condicionado.

Quase 12h30, ao acender a luz, remove a grossa coberta vermelha de cima de seu esposo, que ainda dormia pacificamente.

“Vamos levantar!”

Aumenta o tom da voz, passando alguma credibilidade para alguém semelhante a um cadáver. Denotando impaciência, já é um hábito repetido ao longo dos quase sete anos juntos.

Bem rotineiro, devido a ser bem difícil levantar por conta própria, principalmente quando há um compromisso.

A luminosidade faz com que virasse, remexesse, na tentativa de bloquear para não atingir sua vista de recém-nascido, soltando leves resmungos.

Breno tem ciência da data, o churrasco é um evento emblemático e um ritual anual feito por seus familiares. Anualmente, reúnem-se em uma confraternização de iniciação e falam de assuntos diversos.

Apesar de nenhum deles ser metódico a ponto de ligar para horário, só pelo fato de participar já era válido.

Mesmo assim, para ela não importava, gostava de cumprir com o dever e comparecia sempre no dia marcado, mesmo que voltasse tarde.

“Pô, tá doidete? Ainda é cedo!”

“É quase uma hora, anda, levanta!”

Queria pegar o almoço e comer bastante carne, mesmo com suas restrições na dieta. É o último dia do feriado e, como gostava muito dessas festas, queria aproveitar o máximo antes de encarar o novo ano.

Entretanto, mesmo sob uma forte ameaça, não moveu um grama do peso e continuou como se estivesse em um belo sono pacífico.

Beatriz, sabendo da travessura, começa a fazer barulhos altos propositalmente na tentativa de irritá-lo.

Mas é em vão.

Quanto mais barulhos, mais ouvido de mercador proporcionava.

Isso, de certa forma, a enfurecia e sentia que esse ato horrível era um enorme desrespeito com sua figura, sendo que tinha um compromisso urgente.

E imaginava sua cunhada ligando, perguntando sobre eles.

Portanto, utilizou sua arma suprema: os gritos.

“Anda, Breno! Para de palhaçada, sabe que temos que chegar lá cedo, já vai dar quase uma hora!”

“….”

“Vou logo te avisando, se continuar com essas atitudes, nem peça pra sua família me convidar novamente!”

Nisso, continuou jogando palavras ríspidas para, de alguma forma, atrair a atenção. Sendo que tinha o costume de demorar para escolher uma roupa.

Vendo a não desistência e remexer o corpo de um lado para outro não funcionaram, levanta-se ligeiramente irritado.

O aparelho é desligado, mas ainda é frio, usando uma camisa grossa e meias por não se adaptar ao novo recurso.

Mesmo ouvindo o som alto, a voz irritada da irmã ultrapassa a barreira que seu fone proporciona, escutando algo comum.

A água do arroz estava em processo de ebulição, e por isso, sabe que não demorará para concluir.

Durante, todos os legumes estavam picados em pedaços pequenos graças a um triturador manual comprado no shopping.

Servindo bem duas pessoas, normalmente o vinagrete é feito com azeite, contudo, acabou graças às ceias de final de ano, restando assim o óleo, não sendo nada crítico.

O carvão, comprado no supermercado, esperava fazer seu serviço.

Habituado a despertar cedo, quase não come nada no café, a barriga roncava e queria aprontar logo o almoço.

Dentro, havia vários pedaços rasgados de papelão, apenas jogou um pouco de álcool 70° comprado todo mês para acender a labareda. De primeira, o fogo é tímido e parece que não quer se espalhar, apenas ficando ali no meio.

Mesmo não sendo o método indicado, já lidava com o velho truque há anos e conhecia os meios certos para se espalhar uniformemente.

Enquanto isso, o casal já tinha se decidido.

Beatriz estava confiante e contente com os resultados durante quase quatro meses de dieta e exercícios em casa, emagreceu bastante, chegando à faixa dos oitenta e poucos quilos.

Contudo, queria mais, uma academia seria boa, mas está receosa porque está desempregada e seu marido não pode arcar com tantas despesas.

Além das contas para pagar, ainda tem três filhos menores com a primeira companheira de um longo e conturbado casamento de dez anos.

E, por causa disso, uma boa parte de seu salário vai para a pensão alimentícia desses menores.

Apesar de não ser estipulado pela justiça, somente um contrato de boca que dura quase sete anos deseja tornar-se legal devido a vários problemas ocorridos durante esse período, causados pela ex-companheira.

Até a família dele incentiva, para adquirir de volta seus direitos paternos, impedidos de fazer pela mãe das crianças que, agora, mantém uma união estável com seu atual noivo.

É uma briga iniciada com a separação, e pelo fato de retornar a ter uma vida compromissada com outra pessoa, faz o inferno.

No entanto, de alguma forma, ninguém consegue convencê-lo e simplesmente continua neste impasse, onde os prejudicados são os menos que não podem ter contato com o próprio pai e parentes.

E, que, ano após ano, sua companheira insiste em ir por essa opção para que os lados saiam das amarras dessa teia criada pela ex.

Decidiu não molhar o cabelo, embora esteja armado. Seus pequenos cachos de um crespo 4B pintados totalmente de chocolate seriam presos para formar um coque bonito usado constantemente em cabelos assim.

Passando pelo famoso big chop, para remover toda a química de vários produtos de relaxamento, finalmente pode saber como é a real madeixa.

Agora, com mais de três anos de crescimento, é tão cheio e natural, com os cachos feitos em Z bem apertados, dando uma estrutura mista.

Longe da realidade, por utilizar a química, mas com consciência de respeitar o tempo, fazendo em um local de confiança sem ser levada por maré de opiniões, o que gerou sua ruína capilar.

A TV do quarto estava ligada, e o homem deitado vendo vídeos curtos de outra plataforma sem se preocupar com nada, apenas esperando sua esposa sair para entrar.

Em sua concepção, era cedo para ir à festa, só não podia lutar contra, já tinha escolhido tudo e ela tomava banho.

E assim que sair, deve entrar.

Assim, Bruna ficava à mercê de ouvir as falas de algum filme de que não tem ciência do que se trata.

Enquanto o interior gritava, sentindo falta de ler um livro.

Ama novels, desde que foi apresentada, e lia sempre que podia através das traduções ilegais.

Isso é pela falta de interesse de empresas internacionais, que se limitavam ao inglês ou coreano, migrando para quem fornecia gratuitamente.

Contudo, a mudança veio em 2022, quando a Neenshli Comics resolveu olhar para o público latino, criando uma plataforma onde as obras tivessem a tradução daquele continente.

Isso foi pelo crescente consumo de mídias coreanas, como o famoso k-pop e os doramas. E, visto como uma oportunidade, a plataforma resolveu dedicar-se a traduzir obras do seu catálogo para o público latino.

Com isso, o que era coreano e inglês passou a adicionar o espanhol. Fazendo com que algumas scans fechassem as portas para impulsionar a venda legal no site.

Porém, havia um problema.

Brazil.

Apesar de expandir para esse nicho, apenas disponibilizou o idioma espanhol predominante na América Central e Sul, esquecendo um.

Por falta de ignorância e descaso, muitos que não fazem parte da América Central e Sul desconhecem o idioma nativo da população brasileira, atribuindo ao espanhol falado por outros colonizados por espanhóis.

Dessa xenofobia, não viu viabilidade financeiramente em criar uma plataforma à parte, não fazendo questão nenhuma de vender no país tupiniquim.

Gerando o efeito reverso, em que as autoras redirecionaram o ódio e repulsa pelo público latino-americano para somente os brasileiros que continuaram pirateando.

Em que a culpa não era inteiramente de seu povo.

“Filhos da puta, mama minha rola.”

Mas, apesar dessa facilidade, para os hermanos, ainda há grande parte que vive da pirataria, em razão de que os capítulos são cobrados em dólar.

O que encarece muito o valor, visto que a moeda ainda é desvalorizada, sendo classificados como subdesenvolvidos.

Fora a falta de consideração, algumas dessas traduções têm erros grotescos, fazendo esse público continuar consumindo o conteúdo das scans.