Capítulo 52

Assim, é transportada a uma época longe de seu futuro, onde, nesse, não tinha mais seu namorado.

 

Apesar de ser 2010, a visão só filtrava em preto e branco, como um filme antigo.

 

Ao abrir bem, vê que está em um local totalmente diferente de sua casa, na verdade, não é sua casa.

 

E sim, um muito maior, em um espaço diferente que somente pessoas com boa condição financeira podem ter.

 

Ao olhar para as mãos pequenas, muito menores que as da mãe, não entende por que só enxerga nessa paleta, sabendo que antes conseguia ver todas as cores.

 

O barulho dos trovões era nítido como uma tempestade forte, com a chuva intensa que caía do céu.

 

E para provar a veracidade, sua cabeça virou para o lado e viu a precipitação cair sem parar através das enormes janelas de vidro temperado, dando uma bela visão da cidade.

 

Com os pés descalços, se movem em direção à única luz no fim do túnel.

 

Quando grudou no vidro, conseguiu ver a paisagem de cima, difusa, com uma visibilidade meio embaçada pela pouca névoa que cobria o chão.

 

É a primeira vez que vê esse fenômeno tão perto, já que só observava de longe quando cobria os picos onde mora.

 

Mas, mesmo com essa falta de visibilidade, encara as luzes em vermelho e amarelo passando, no que julga ser uma estrada.

 

O barulho exterior é bloqueado, tornando-o silencioso.

 

Sabendo da presença dos carros e da vida agitada de um centro urbano, compreendeu que não é sua cidade ou seu país.

 

Como se a atmosfera fosse totalmente oposta.

 

Com isso, um medo tomou completamente.

 

Vagando igual a um fantasma, correndo até a porta principal, feita em madeira, tentou girar a maçaneta — sem uma chave — não faria a função completa.

 

Causando pânico.

 

TUM, TUM, TUM!

 

“Socorro! Alguém, ajuda, por favor!”

 

Batendo com o punho, o objeto suga o impacto, formando um barulho baixo.

 

Seu coração entrou em desespero e, igual a um ataque de pânico, cobriu com as mãos, tentando assimilar uma ideia.

 

E, com respiração profunda, retomou o controle, prevendo uma liberdade difícil de engolir nesse castelo bem ornamentado.

 

Portanto, observou o espaço.

 

A casa se destaca pela sua amplitude, apresentando um layout singular, sem andares que a dividam, o que a transforma em um espaço plano e arejado.

 

De perto, é possível sentir a harmonia dos ambientes, todos meticulosamente planejados para oferecer conforto e funcionalidade.

 

À direita, posicionada estrategicamente perto da imponente janela, encontra-se uma magnífica mesa de jantar.

 

À frente, a sala de estar se apresenta como um refúgio acolhedor.

 

Um sofá grande convida ao relaxamento e às boas conversas.

 

O ambiente é embelezado por um elegante rack, que abriga uma imponente TV LED.

 

Esta tela não é apenas um deleite visual, mas também evoca lembranças das noites de cinema na casa do seu irmão.

 

Contudo, não era o mesmo design da atualidade, todavia, superior ao que tinha aos 18 anos.

 

E tocando levemente, o nome da empresa entalhado na TV reflete mesmo com a falta de luz.

 

“Ignitus… Quê?”

 

Sem pista para identificar quem é o dono, a decoração mínima é um mostruário de uma loja de decorações.

 

E, a dada distância, à qual não está acostumada, o sofá claro é macio, não sendo classificado como os populares pela base da pirâmide.

 

E sim, suave ao toque, dando a chance de deitar e até dormir com tranquilidade.

 

O comprimento vertical, que compõe o assento, é grande como a morada de um gigante.

 

Ao fazer o teste, encostando sua coluna no encosto do objeto, viu que somente o tornozelo e os pés ficaram para fora, engolido quase inteiro.

 

Logo, o pavor foi substituído pela curiosidade, e uma leve euforia invadiu.

 

O enorme sofá retrátil, feito com os melhores produtos e forrado num veludo de 100% algodão, fez afundar levemente no assento e no encosto que forneciam as sensações nunca experimentadas.

 

Nem o sofá do seu irmão, do mesmo design, só que menor, chegava aos pés desta maravilha.

 

Imaginou o quanto seu pai amaria essa maravilha envolta num cobertor e vendo seus programas nessa bela TV luxuosa.

 

Essa euforia se desenvolveu para um sintoma diferente e queria testar a resistência, caminhando com os pés nus.

 

E foi o que fez.

 

Como uma criança que ama cometer travessuras, sobe no objeto e fica sob o assento, os pés, que encontraram a maciez da superfície, geraram um certo desequilíbrio, como costuma acontecer ao ficar sobre o colchão.

 

Mas, diferente do colchão box, esse parece nuvens.

 

Andando com todo cuidado, a capacidade de dar uma volta é pelo formato em L.

 

Se houvesse uma festa, além de comportar muita gente, dava para suportar facilmente umas dez confortavelmente.

 

Os passos que iniciaram com cautela mudaram para fervorosos, circulando sem perder o equilíbrio.

 

Em certas partes, pulava para sentir a maciez ou o toque duro da madeira que compõe o esqueleto do objeto.

 

Todavia, nada, dando o veredito da boa qualidade.

 

Quando os pés tocam novamente o chão marmorizado, oferece um certo estranhamento, como se nunca tivessem pisado em terra firme.

 

Logo se ajeitando, para ir a outras partes.

 

A cozinha é americana.

 

“Óbvio.”

 

Notando a complexidade e organização, iguais aos filmes de ‘Sessão da Tarde’.

 

A questão aborda mais o uso profissional, como programas de TV, do que uma residência de fato.

 

Mas não havia utensílios.

 

Estavam vazios, limpos e novos, como se acabasse de adquirir.

 

As duas geladeiras estavam ligadas e, ao abrir, encanou um arsenal de bebidas alcoólicas, como cerveja, vinhos, espumante e uísque.

 

Anotando que o usuário fosse um carro e vivesse somente dessa substância.

 

Sem quaisquer alimentos ou sobras.

 

Na outra, a mesma história, vazia, muito bem organizada e limpa, igual às de fábricas.

 

Ao fechar, a pulga continuava a morder. Para sanar, abriu os armários.

 

“Quem em sã consciência não teria uma dispensa básica? Nem um miojo faz parte dessa decoração.”

 

A princípio, imaginou a idade, uma pessoa que vivesse ao lado do alcoolismo, como melhores amigos.

 

Ligando os pontos, o meliante fazia suas refeições em outros estabelecimentos ou até fast food.

 

“O corpo deve ser mais estragado que o meu, imagina só, fast food e cachaça?”

 

Saindo do cômodo e indo a outro, julgando ser um banheiro.

 

A porta estava aberta, é um lavabo.

 

Na realidade, um baita lavabo.

 

O motivo pelo reconhecimento foi que sua irmã apresentou esse conceito achando que pertencia à modernidade, mas parecia existir há bem mais tempo.

 

A enorme área é equipada com uma pia fabulosa e um vaso sanitário sem uma lixeira.

 

Ainda que não seja um banheiro completo, toma uma boa parte de sua casa.

 

Dava para desfilar tranquilamente e comportar uns quatro indivíduos.

 

A arquitetura, diferente do que está acostumada, com os pisos dominando boa parte.

 

Esse lembra um shopping.

 

À esquerda não é ladrilhada ou emassada com massa corrida, e sim, feita de pedra escura, os detalhes únicos lembravam muito as paredes de uma caverna.

 

A jovem não acreditou a ponto de iniciar um processo que causou a evolução da humanidade, em sentir a estranheza com o tato natural.

 

Duro, firme e irregular como qualquer parede de pedra.

 

A sensação fria e única, que somente um objeto feito desse material oferece, queria fotografar para enviar à sua irmã, que é a louca da decoração.

 

Apesar da irregularidade, não é granuloso, mas liso, deslizando os dedos por uma parte sem obstáculo. E, para o teste final, gritou para formar um eco.

 

“Uhhh!”

 

Logo, tentou usar as mãos para o efeito desejado.

 

A batida com o punho fechado causou uma leve dor. Por causa disso, não produziu o costumeiro em paredes que levam o molde ‘brasileiro’.

 

Provando, assim, sua veracidade e originalidade.

 

A parte do vaso foi bem rápida, é algo que muitos usam, mas poucos gostam de relatar, por se tratar de um tabu das reações naturais.

 

Contudo, o que captou foi cheiro, sem odor ruim ou bom ou produtos cheirosos.

 

Mas de limpeza.

 

Na verdade, extrema limpeza.

 

Semelhante ao leito de hospital, sentiu-se desconfortável por não pertencer ao cotidiano, que se assemelhava a alguém bem nojento.

 

Por estar descalça, fez a culpa emergir por contaminar o espaço imaculado, como se estivesse em solo sagrado.

 

“Caramba…”

 

Quando virou e se encarou, a imagem nesse espelho majestoso causou choque.

 

O corpo é o mesmo, mas num contexto errado, de um jeito que nunca mais se viu.

 

Na realidade, desde a adolescência, quando namorava Márcio.

 

A ponto de quase chorar.

 

“Por quê?”

 

A época dessa jovialidade refletia pensamentos pesados, numa identidade oposta à atual.

 

Algo que nunca encarou como belo.

 

Seu rosto arredondado, típico traço herdado de seu progenitor, provava que não é fruto de seu pai.

 

Porém, a sua papada é extremamente suave, um relevo quase imperceptível, e não é só isso.

 

Transmitia inocência, bem mais do que hoje, como se nunca tivesse tido contato com a maldade.

 

Delicado, idêntico a uma boneca.

 

Ainda assim, essa boneca que era vista como patinha feia machucou diversas vidas para ser vista ou minimamente notada.

 

Os lábios grossos, o nariz herdado pela etnia negra também continuavam ali.

 

Em seus olhos redondos, revelam que a matéria escura morava ali. A sua pele, apesar de lisa, tem a mesma mancha de espinhas.

 

E esse tipo de visão, somente aos 16 anos, soube encarnar com vivacidade.

 

Seu cabelo, extenso e escuro, dava para distinguir cada cachinho formado, como a mistura harmônica do 3C com reflexos do 4A.

 

O volume controlado iniciava baixo na raiz e depois se expandia pelo comprimento até as pontas, são bonitos e brilhantes, do jeito que sempre gostou.

 

Abaixo do pescoço, a surpresa foi maior, o seu corpo tinha a mesma forma quando pesava 69 kg.

 

O pescoço mantém a grossura e o pigmento escuro da acantose nigricans, gerado pela diabetes, surgindo aos 10 anos.

 

Todavia, em seu colo, descendo até onde está o busto, seus seios estavam levantados e sustentados pelo vestido em sua pele.

 

A roupa possuía apenas duas divisões: uma na parte do busto, que sustentava os seios, e a de baixo, lisa, que moldava suas curvas de forma leve e confortável, sem ser muito justa.

 

Era perfeita para girar ou ser levantada, como na famosa foto de Marilyn Monroe.

 

Contudo, ao contrário da diva, a peça é um modelo simples que dava um ar ingênuo e sensual, cujo comprimento é um pouco acima das coxas.

 

Fechando com um ‘laço’ regulador no busto.

 

Moldados confortavelmente, dando dimensão e detalhes do tamanho real.

 

Exibindo a imensidão da fartura e naturalidade, porém, sem deixar vulgar, tornando sutis.

 

A alça que envolve os ombros é composta por duas tiras da mesma espessura fina do busto.

 

Na cabeça, havia duas presilhas, semelhantes ao modelo dos anos 90, quando sua mãe fazia penteados loucos em sua juba natural e rebelde.

 

As duas estavam de cada lado da testa, isso fez com que o ar ficasse em evidência.

 

Pela primeira vez, amou a aparência física, claro, não é uma beldade, mas não é tão feia assim, fazendo-a sorrir espontaneamente.

 

Depois de um tempo admirando, resolveu conhecer os outros cômodos da enorme casa.