Capítulo 82

“Mohammad, com quantos anos perdeu a virgindade?”

 

Essa pergunta veio no momento em que estavam saboreando um delicioso hambúrguer de cheddar.

 

Fizeram uma parada após passar por algumas lojas, e como só ele estava com fome e por querer saber o sabor da nostalgia que tanto prega, não pediu um Big Mac.

 

E, de um jeito encantador, fez voltar no tempo, quando viajava no jato particular de seu pai para ir a Londres, e gastou toda sua inocência e o líquido seminal contido numa aeromoça mais velha.

 

Foram muitas horas de sexo e muitas camisinhas usadas e descartadas.

 

Foi um momento bom, e até interessante.

 

Descobrir o sabor do sexo não foi um ato vergonhoso, como costumava acontecer na vida dos jovens do sexo masculino, e sim, algo que nasceu para fazer, e muito bem.

 

“17 anos.”

 

“Hum… É até uma idade normal para se considerar. Foi bom ou gozou rápido?”

 

Riu novamente, para quem olha como algo divertido e nem é levado para o campo sexual.

 

Sentiu vontade de falar abertamente sobre o que de fato sentiu em relação a todas que passaram por suas mãos, não era amor, e sim o puro instinto de saciar sua vontade bestial em obter prazer e gozar infinitamente.

 

Sem o intuito de criar laços ou ter a dor de cabeça de pagar inúmeras clínicas de abortos.

 

“Não, na primeira vez demorei meia hora para gozar, e com o passar das atividades foi alongando o tempo de ejaculação.”

 

“Por que não se limita a ter uma aparência e a grana de um seme? Por que tinha que ter essas aptidões sexuais?”

 

Essas siglas do universo yaoi são um tanto novas.

 

Quando ouviu pela primeira vez, fez questão de pesquisar e, mesmo doendo os olhos e quase bloqueando o instinto de quebrar o celular no meio de tanta pornografia gay, interligou os fatos.

 

E foi um tanto engraçado ser enquadrado nesse campo, o que significa que é o tipo ideal de qualquer fujoshi.

 

Principalmente da que ama, que consome esse tipo de gênero a ponto de fazer uma crítica muito bem construída de algo que naturalmente nasceu para oferecer sexo.

 

“E não gosta disso?”

 

“Nas obras é legal, e até divertido, mas na realidade dá um certo tipo de medo.”

 

“Então, o que posso fazer para não causar essa reação?”

 

“Ser mais humano, e não um pedaço da costela de uma divindade.”

 

“Vou tentar o impossível para ser assim.”

 

“Pera… foi mal, não quero cagar regra. Não mude o que é para agradar alguém, só desejo que me respeite e seja legal com quem amo.”

 

“Se isso que deseja, então realizarei.”

 

Após comer e sair do meio onde havia muito sangue jovial ao redor, a mulher percebeu que era hora de retornar para casa.

 

Diferente da vinda, toda sua energia e extroversão foram esgotadas e agora queria recarregar essa bateria social, andando de carro e ouvindo uma boa música.

 

E, durante o trajeto, Mohammad soltou algo que queria comentar e pegou de surpresa.

 

“Não sei por que, mas quando vem em minha mente, noto que combina muito com essências cítricas como maracujá, bergamota e laranja, e também exala rosas.”

 

“Uau.”

 

“E… mesmo que usasse todas as linhas, continuaria sendo igual, como se de fato nascesse para ser assim.”

 

Bruna riu, pois estava comentando sobre suas marcas favoritas e os tipos que mais usava.

 

Não sabia que combinava tanto com os ideais cítricos, por sorte, os cheiros que comprou são gostosos e frescos.

 

“E como tirou essa conclusão?”

 

“Quando te vi pela primeira vez.”

 

“Essa semana?”

 

Só lembra que conheceu na segunda, então presumiu que fosse assim, mas estava totalmente errada, foi bem antes, antes mesmo de perceber que já tinha um interesse forte com apenas um único olhar.

 

“Não, foi bem antes de perceber que existia.”

 

“Como assim?”

 

Tenta recordar se já viu antes, mas nada vem à sua mente.

 

“Três de janeiro, você passou em frente ao antigo apartamento dos meus avós maternos. Foi nesse dia que a vi.”

 

“Que? No dia em que iniciei minha terapia? Impossível ignorar uma estrela tão brilhante.”

 

Na verdade, estava enganada em retratar como uma estrela, a sua verdadeira essência é um buraco negro, na realidade, um quasar.

 

Que lentamente migrava para o ‘repouso’.

 

Sendo mais brilhantes que as luzes emitidas por uma galáxia, pois toda matéria disponível era engolida, intensificando os átomos de luz que se aglomeram antes de serem devorados.

 

Emitindo bem mais que a própria matéria que esteja sucumbindo.

 

E é isso que o define, a gravidade era tão esmagadora, que acabava intensificando os átomos que emitiam luz, ficando mais brilhantes.

 

No final, para essa estrela atingir o ápice, era preciso ceder tudo que conhece como pessoa e sua identidade para esse ser impiedoso.

 

Tinha uma fome gigantesca que não era saciada por nada.

 

Por isso, a jovem achava que o Mohammad era um ser de luz que não passava despercebido.

 

No entanto, esse ‘planeta’, agora orbita nesse buraco negro, não afetando sua estrutura, se tornando imune à força gravitacional desse glorificado como devorador de sóis.

 

Além do que, não quer destruir, e sim ter por perto até que um ou outro não resista.

 

“Dessa vez, acabei passando despercebido por alguém que não vê minha aparência como algo primário.”

 

“Caramba, não imaginei que conseguiria ter essa atitude, mas é bom, isso ensina que não é 100% desejável o tempo todo. Foi bom não ser notado, agora podemos conversar de boa.”

 

“Apesar de ser estranho e fora da curva, gostei do fato de não se atrair pelo meu físico. Assim podemos nos ver como somos, completamente, sem precisar desse fator.”

 

“Sim. Me responda, como tirou essa conclusão sobre relacionar meu jeito à essência cítrica e floral?”

 

“O seu perfume, de maracujá. Para ser exato.”

 

“Ah! Deve ser o que compramos recentemente, meu pai não gosta porque fala que é de prostituta.”

 

“Caramba, para mim não, combinou com você. E pensando bem, foi daí que veio um cheiro que se adéqua ao seu interior e exterior, como a bergamota, contudo, com um pé no floral.”

 

“Nunca imaginei ter uma identidade única, achava que fosse igual ao camaleão, que se mistura ao ambiente atual para se proteger de predadores e não morrer banalmente.”

 

“Compreendo.”

 

“E fico feliz por receber esse diagnóstico, talvez ter algo que nos lembre como somos seja bom.”

 

Apesar da confirmação, lhe presenteou ao ouvir o que só ficava em seu imaginário como um ato de vitória, tem convicção de que não permanecerá lá, e sim, concluído em vida.

 

No final, esqueceu de verificar a antiga colônia.

 

Ainda queria saber como é.

 

Atualmente, a vida estava nos trilhos, e agradecia imensamente a esse amigo mais que especial em seu último emprego.

 

“Espero que todos os seus sonhos sejam realizados. O tempo que nossa amizade durou me ajudou a ser mais alegre. Dedico toda sorte, amor e votos de felicidades a quem esteja.”

 

Mohammad continuava guiando, por não alertar que faria esse passeio acompanhada, e como seu pai chegava entre 16h45 e 20h, decidiu voltar às 15h.

 

Claro, ficará surpresa em ver tantas coisas, e mais uma vez insistirá em dar uma chance.

 

Verdadeiramente, Mohammad foi um dos mais gentis que passou por sua vida, porém, não agirá impulsivamente, e se for o que diz, deseja desviar qualquer atenção e permanecer em seu canto.

 

“Sei que é impossível.”

 

A música de Seu Jorge toca através do celular dele, a preferida, ‘Seu olhar’, é a segunda depois de ‘Quem não quer sou eu’, também de mesma autoria que fez parte da trilha sonora da novela ‘Fina Estampa’.

 

“[…]Tem muito tempo na estrada. Muito tem. E como quem não quer nada. Você vem. Depois da onda pesada. A onda zen. É namorar na almofada. E dormir bem. Foi o seu olhar. O que me encantou. Quero um pouco mais. Desse seu amor. Foi o seu olhar. O que me encantou. Quero um pouco mais. Desse seu amor…[…]”

 

Dessa vez, não cantou silenciosamente, mostrando sua bela desafinação numa canção que retrata a situação atual.

 

Como se transmitisse inconscientemente os sentimentos do peito que não tem coragem de admitir.

 

De volta para a Zona Norte, seguia o trajeto para Jacarepaguá, um desejo forte dela, em ir pela estrada que liga Grajaú.

 

Admitindo a repudia, ou qualquer coisa romântica, dessa vez teve que se render, porque, ao mesmo tempo que a retrata, também fala um pouco de si.

 

Talvez hoje, antes de dormir, ouça novamente e misture o timbre do cantor com o dela, formando uma única coisa, algo que retrata seus sentimentos.

 

Em todo momento, reinou o silêncio, mas o clima foi de total entendimento, como se pudessem se comunicar sem ao menos trocar palavras, apenas sentindo e curtindo a presença.

 

Relembra o tempo que levava milhares, e o clima era quente e com vários toques das mãos delgadas com cores diversificadas passando por sua calça, no seu órgão sexual.

 

Que ficava em alerta, porém não duro o suficiente a ponto de incomodar.

 

Recorda das vezes que fizeram sexo oral enquanto conduzia pela rua londrina que sempre chovia.

 

Na época, achou que era a melhor sensação do mundo.

 

O prazer antecipado, antes de chegar ao ato.

 

Só que depois, num espaço onde reina o silêncio enquanto reverberava essa canção, explicitando os sentimentos, descartou o passado cheio de luxúria.

 

Adotando isso, mediante a brasilidade, transmitida por uma latina, sendo o amor de sua vida.

 

Quer mais, nem que rode todo o estado para ter mais desse prazer, dessa coisa que se transformou no número um entre ‘n’ coisas favoritas.

 

Quando saíram da estrada e finalmente chegaram ao bairro, outra canção é rodada, e por causa disso, por chegar até aqui se atenuando sobre a despedida, não será fácil.

 

Imploraria para dormir com ele, mesmo não rolando nada.

 

Mas… já basta.

 

Todavia, ficava para uma próxima vez…

 

Essa parece que não chega, como se estivesse muito longe, o deixando aflito.

 

“Meu Deus, nem acredito que chegamos, a volta foi mais rápida que a ida.”

 

“Concordo, deveria ser o contrário.”

 

“Também acho que esse dia foi o melhor do mundo, me despedi e me diverti muito.”

 

“Que bom, espero que façamos isso outras vezes.”

 

“Seria muito bom, gosto disso, andar de carro e apreciar o silêncio, a música e a paisagem externa quando o veículo passa rápido sem trânsito.”

 

“Segunda podemos fazer isso de novo, como planejamos. Não esqueça de usar um casaco e trazer um guarda-chuva.”

 

“Tá bom, tá bom.”

 

Se espreguiça, para destravar o que ficou um bom tanto sentado num banco confortável.

 

E quando subia a ladeira do Alfredo Pujol, recordou-se dos itens comprados e também não queria sua presença, para não causar burburinhos e fofocas.

 

Quer manter esse segredo por enquanto, até se sentir à vontade e relatar naturalmente dessa nova amizade.

 

Não foi muito além do portão da moradia da tia de seu cunhado, subiria um tanto com o que pudesse carregar.

 

“E as outras coisas? Não pensamos nisso antes.”

 

“Está tudo bem, só leve os que não são tão espalhafatosos. Quando chegar em casa, em cinco minutos, abra a porta e todas as suas coisas serão entregues.”

 

“Tá de pachorra comigo, né?”

 

“Fique tranquila.”

 

Um carro incomum estar por essa redondeza dava na cara que nem era Uber.

 

E ficou ali, até desaparecer de seu radar natural.

 

Bruna chegou muito rápido, não poupou a fadiga e foi de uma vez, para ser o mais rápido possível, por serem 16h, e muitas outras coisas surgirão.