Capítulo 166

Um antigo amigo de seu pai veio visitar sua mansão. Esse era o único a ter relação fraternal, conseguindo tolerar e até brincar com o comportamento difícil e horrível.

 

Nesse dia, trouxe boas novas, indo ao retiro particular que era uma sala tradicional onde bebia uísque e fumava narguilé, em que o exterior era totalmente de ouro 24k com pedrarias preciosas como o diamante, deixando tudo mais bonito.

 

Diferente de Mohammad, que nasceu para os negócios e comandar um império, seu pai, formado em medicina, era um péssimo administrador, um dos piores da linhagem Haroon.

 

Nunca se comprometeu verdadeiramente com os negócios, deixando nas mãos de terceiros, que eram o CEO da empresa.

 

Enquanto vivia das regalias com os resultados gerados, por ser poderosa e bilionária, toda riqueza não seria gasta por uma vida toda, nem que seu filho atingisse a maioridade, ainda assim continuariam bilionários.

 

O que faz desse pai, um verdadeiro de sua classe.

 

Só que, assim que tomou conhecimento de si próprio, analisava as atitudes falhas de seu progenitor e queria dar um basta.

 

O intuito era criar algo que o paralisasse, assim perdendo suas funções como patriarca, e tudo ficaria sob sua responsabilidade.

 

Mas tudo mudou com a visita daquele amigo, trazendo um artefato muito valioso, que mudou totalmente o rumo da história e a decisão de não tornar inválido e sim, remover para sempre.

 

Samir bin Zayn Al Abadi era um doutor especializado em cirurgia cardíaca e trabalhava como chefe do setor cardiológico.

 

Era um ótimo profissional e muito amigo do dono. Os dois frequentaram a mesma universidade Health na Suíça e fizeram residência no hospital.

 

Mas, diferente do Dr. Abadi, Ali era especialista em genética humana, o que o fez estudar ao longo da existência na criação do ser ‘perfeito’ que futuramente seria Mohammad, seu único filho e herdeiro.

 

Samir era casado com sua primeira esposa, que lhe deu apenas uma única semente, uma filha. Devido a complicações no parto, para poupar sua saúde e não morrer durante a gestação, foi indicado a não gerar novamente.

 

Na época, sua filha tinha dois anos, e sua esposa, que era prudente, pois precisava dar um herdeiro para a continuidade da Abadi, indicou casar outra vez para tentar um filho.

 

Diferente de seu amigo querido, Samir amava sua esposa e não queria outro matrimônio, e deixou esse plano queimar numa fogueira ardente e virar cinza, portanto, manteve os cuidados e a educação de Samira.

 

Aos quinze anos, se apaixonou por um brasileiro que veio trabalhar por um tempo na construtora Haroon. O amor de ambos foi uma fagulha em meio à palha seca, tocou, acendeu e incendiou completamente.

 

Apesar disso, e de apresentar boa condição financeira pela profissão, seu namoro não foi aprovado pelo simples fato do genro ser estrangeiro e católico.

 

Isso é um problema, já que a muçulmana não deve casar com religião diferente, ocorrendo o oposto quando se trata do sexo masculino.

 

Pois, o Alcorão prega que o homem é o cabeça da família, tendo a autoridade de acordo com o que é pregado. Logo, o esposo de Samira devia abandonar o catolicismo para se tornar muçulmano e assim, ter a mão dela.

 

Porém, com o crescimento da luta feminista, enfatizando a liberdade do sistema patriarcal que só visa como objeto, fez com que armasse um plano e fugisse do país.

 

O que aconteceu, e por amor, enfureceu-se com o ato desonesto de seu genro que literalmente ‘roubou’ sua única preciosidade, que era apenas uma adolescente, levando-a para outro país.

 

E, pela amargura, o orgulho falou mais alto e Samir cortou laços com sua amada filha e proibiu sua esposa de ter contato também, em que, durante um longo período, ‘deixou’ de ser uma Abadi.

 

O reconhecimento veio naquele ano, em 98, doze anos sem se falar e cinco anos após o nascimento do neto.

 

Quando soube da gravidez em 1992, a felicidade transbordou, mas a ferida doía e permaneceu igual.

 

Quando Fatir nasceu, arranjou um jeito e conseguiu enviar uma correspondência com as primeiras fotos de seu filho com apenas uma semana de vida.

 

Quem recebeu foi a mãe, encantada com a beleza e, só de vislumbrar, soube que era danado.

 

Mas só lhe mostrou quando foram jantar, deixando para que ele tivesse coragem e força o suficiente para ver.

 

Assim que abriu, olhando cada uma, seu peito acelerou e um misto de tristeza e arrependimento atingiu profundamente. Seu neto tem todos os seus traços, como se fossem dele e não de sua filha.

 

E o nome dado era de seu pai, Fatir bin Mahir Al Abadi, que faleceu aos trinta anos.

 

Sofrendo, só teve coragem de se comunicar esse ano, que enviou várias outras relacionadas a família e ao seu neto, que completou cinco anos em 29 de julho.

 

E dentro de tantas havia uma diferente, que categoricamente é uma ‘intrusa’ que só está ali ao atrair a atenção, por ser muito bondosa, gentil e demasiadamente inocente.

 

Quando o mordomo da família guiou Samir até a sala privativa, segurava o envelope pardo com todas as fotos que recebeu recentemente.

 

Queria mostrar, já que Ali era o único que escutava suas histórias e dores sobre a partida de Samira.

 

Ao mirar, sentado em sua poltrona fumando narguilé, acompanhado de seu uísque, o cumprimentou e foi diretamente ao mini bar, servindo-se com uma dose de conhaque.

 

Cedo, estava feliz e queria acompanhar antes de lhe trazer as boas novas. Diferente desse geneticista, Samir abominava qualquer fumo, seja o cigarro ou narguilé.

 

E, pela profissão, entende que o tabaco faz mal e danifica lentamente o pulmão do usuário ao longo do tempo que sustenta o hábito.

 

“O que lhe traz aqui, velho amigo?”

 

Perguntou Ali, de expressão cansada, como se o mundo fosse entediante.

 

“É sobre minha filha, voltamos a nos falar e vim lhe mostrar as fotos que me enviou, ali está meu neto que completou cinco anos.”

 

“O tempo voa tão depressa, parece que foi ontem que veio aqui e mostrou o recém-nascido, já tem cinco anos…. Cinco anos….”

 

Entrando num monólogo, em que o tempo passa rápido e não aproveitou muito, futuramente, Mohammad será o que lhe dará um neto.

 

“Samira deixou de ser uma criança, e agora é uma mulher adulta de 27 anos, formou sua família e tem um filho homem. Olhar para Fatir faz lembrar dos meus erros do passado de ter cortado o laço com ela, deveria ter feito o oposto.”

 

“Sua filha não mora no Rio de Janeiro?”

 

“Sim, no bairro Grajaú, se chama Sá Viana. Ainda que seja quase de frente para a favela, relata que raramente acontece confronto e traz bastante segurança para as famílias presentes.”

 

“Não importa se é tranquilo, de luxo ou pobre. Continua sendo uma ratoeira suja. Um lugar imundo, como todos os países latinos.”

 

Samir sabe dessa xenofobia, principalmente contra brasileiros, que no final acarretou escolher uma barriga de aluguel dessa nacionalidade, devido ao QI e beleza de Victoria Bourbon.

 

Que se adequou perfeitamente à sua pesquisa, e a cobaia para criar o ser ‘perfeito’. E tendo um filho desse sangue, rejeita e apenas trata como árabe.

 

Mohammad tem a mesma linha de pensamento.

 

“Fico surpreso que tenha negócios nesse lugar ‘odioso’, ainda mantém o plano de fazer outra unidade da Health no Recreio?”

 

Ali tinha em mente construir uma nova unidade no Recreio dos Bandeirantes.

 

O vasto terreno de 150 mil m² foi comprado, mas de fato nunca foi concluído, estando ‘abandonado’ durante seis anos.

 

Ainda assim, compradores e até o governo queriam o espaço, oferecendo uma quantia exorbitante para construir mais condomínios de luxo.

 

O que foi rejeitado e, sem usar, continua sendo dono e não tomou iniciativa de começar a construção.

 

“Não estou a fim de fazer mais nada lá, a construtora já arrecada milhões, não preciso manchar a reputação da Health.”

 

“Bem… Faça o que lhe bem entender, antes de lhe mostrar as fotos, fiquei sabendo que seu filho ficou em primeiro lugar novamente.”

 

“Esse é o mínimo esperado, foi treinado para isso, mesmo que não precise.”

 

“Sim…”

 

“Fora que, estar numa turma avançada, acredito que vá terminar o colegial aos 16 anos, mas disse que quer entrar na universidade no ano seguinte. Faça o que bem entender, o importante é conseguir o diploma.”

 

“Parece que foi ontem quando o vi com poucos dias de nascido, não acredito que já tem dez anos. Como o tempo voa de verdade, já resolveu todos os trâmites para a viagem à Ásia para participar do torneio mundial de matemática?”

 

“Não preciso cuidar de nada, aquele garoto se vira em tudo desde os 6 anos, nunca precisei mover um dedo. Além do que, tem o cachorro que ajuda. Só exijo que traga o troféu como todos os anos.”

 

“Hum….”

 

Falava de Ahmad, que foi comprado aos seis anos e deixado aos cuidados de seu primogênito, que tinha apenas cinco.

 

O intuito era que Mohammad tivesse um criado ou um animal de estimação, já que todos que lhe davam morriam em tempo recorde.

 

E só sobrou esse pobre garoto, responsável por cuidar de toda a agenda. E isso é positivo, não imaginava que pudesse ser tão útil assim.

 

Samir nunca concordou com esse ideal, não lhe desceu transformar uma criança em escravo, mas não pôde impedir de tal ato acontecer, que veio suprir algo sem necessidade.

 

Por vezes, resolve muitas coisas, semelhante a um adulto.

 

“Deixe ver as fotografias, quero realmente saber se seu neto continua com essa sua aparência horrível.”

 

Disse sério, mas que na realidade era uma piada ácida à qual já estava acostumado, e entregou o envelope.

 

Nisso, Mohammad retorna para casa, era para chegar à noite, por vários compromissos ao longo do dia.

 

Entretanto, resolveu voltar para curtir a solidão. Ele e Ahmad estão numa turma avançada, ao seu saber ou acha que sabe, não condiz com a realidade.

 

Na verdade, terminará o colegial bem antes do estipulado, aos 14 anos.

 

Pelo avanço intelectual, no middle school, com a presença de alunos de 13 anos. Mas sua estrutura precoce faz compará-lo a um pré-adolescente, sendo o mais alto com seus 1,80 m de altura.

 

Sendo alvo de vários amores platônicos e interesses ‘aprofundados’ que somente essa idade oferece.

 

E por estar chegando cedo em casa, deve notificar o pai.

 

Mesmo possuindo força o suficiente para encarar vários alunos de idade avançada, ainda é fraco em comparação a ele, que apesar da profissão tem o porte de boxeador veterano.

 

Quando era ‘disciplinado’, não sentia dor, nada o afligia, foi treinado para suportar inúmeros métodos de tortura para o capacitar caso um dia fosse sequestrado.

 

Desde pequeno, recebeu inúmeros treinamentos rígidos e pesados para conseguir se virar sozinho caso algo aconteça e sair facilmente. Mohammad não tinha medo dele, apenas não era o momento certo para revidar.

 

Logo, permitia-se ser penalizado, e entende que daqui a pouco, não muito longe, ficará tão imponente quanto esse velho, que só de vê-lo não atacará o que ocorreu cinco anos depois.

 

Quando a SUV entrou no domínio da mansão, apenas observou o lado de fora arbóreo que não condiz com o clima do país, pela predominância desértica, e esse clima tropical deveria ficar onde está, porém, sobrevivem em um local extremamente quente e seco.

 

Para concluir o plano governamental, arboriza o máximo no intuito de ‘amenizar’ o calor de Dubai. Estando próximo ao Golfo Pérsico, com extensão marítima, ainda a precipitação anual é baixíssima, chovendo raramente.

 

Quando o veículo para, a porta é aberta pelo segurança, e como nada, sai com a mochila nas costas e vestindo o habitual uniforme escolar, que parecia mais uma farda militar da marinha.

 

Quando entrou, o antigo mordomo o atendeu, curvando-se ligeiramente, perguntando se queria algo.

 

“Onde está meu pai?”

 

“Está em sua sala privativa, jovem mestre.”

 

Sem agradecer, foi em direção certeira onde Ali costuma ficar, e seguiu reto atravessando várias áreas que não usava por séculos, e de frente à enorme porta dupla de madeira, deve notificar com batidas suaves.

 

“Entre.”

 

Adentrou e encontrou não somente o pai, mas também Samir.

 

Que tinha um bolinho pequeno de fotografias.

 

“Jovem mestre, que surpresa vê-lo. Pensei que estaria no colégio agora.”

 

“O diretor encerrou todas as atividades da tarde para fazer uma reunião emergencial com o grupo docente.”

 

“Ah.. Vem cá, quero mostrar as fotos que minha filha enviou do meu neto.”

 

“…”

 

Diferente do pai que, pelo menos, tem um único amigo verdadeiro, Mohammad não deseja nenhum tipo de laço.

 

Seu objetivo é ganhar mais grana e poder enquanto usa as pessoas para conquistar. Seu pai é um desses. Ao ficar inválido, poderá usar como meio e o descartará como qualquer coisa que já perdeu a utilidade.

 

Não havia interesse na história de Samir, na realidade, pouco importa que ambos reatem os laços e o neto, que é brasileiro, piorando tudo.

 

Tudo oriundo desse país miserável — que saiu recentemente da inflação — é sem importância.

 

O natural é recusar, mas havia algo clamando para olhar cinco fotografias naquelas vinte, berrando e alertando sobre o arrependimento caso deixasse para depois, ou nunca mais.

 

E pela intuição sobrenatural, deu passos e pegou o pequeno bolinho sem álbum.

 

Explicando que recebeu recentemente.

 

O sorriso alegre e orgulhoso revela como sua filha e o neto estão felizes, enquanto Mohammad passava monotonamente, como se realmente fosse chato, uma obrigação não desejada.

 

Apenas quer voltar para o quarto e tomar banho, ignorando as faces felizes e travessas do menino, mas quando passou para a penúltima, rapidamente seus dedos elegantes interromperam.

 

Era uma imagem comum, que passaria despercebida igual ao restante.

 

Mas não esse.

 

Quando mirou a menina, sem vínculo sanguíneo com a família, que estava ao lado de Samira, sorrindo abertamente, com seus dentes deformados pela mordida aberta, fez paralisar e seu coração pulsar.

 

Pintada com tinta marrom e fundo amarelado igual a ouro, olhos castanhos escuros e cabelo crespo numa maria-chiquinha trançada com xuxinhas de coloração rosa neon.

 

Sua roupa era o mais simples possível, mas bonita para uma criança de sua idade, imaginou ter 4 anos, e logo revela ao lado de Fatir que é mais alto, e de alguma forma não agradou.

 

“Ah, chegou aí tão rápido?”

 

“O que é isso?”

 

Perguntou, mostrando a menina para Samir.