Capítulo 98
“Hey, Joe!”
Alex, que o viu equilibrando-se entre algumas caixas e bolsas, captou que era uma outra ordem do presidente.
“Yep.”
“Isso não vai parar? Daqui a pouco, aquele closet não suportará tanta coisa que compra.”
“Sim, o bom é que não é a minha grana.”
“Esqueci desse detalhe, mas o que tem aí?”
Por cima, soube que era ligado ao universo da papelaria.
No relatório, constam as transações dela em itens pelo universo do ‘studygram’, sabendo sua fascinação por esse meio.
“São as encomendas da China e do Japão.”
“Uau, é coisa pra caralho.”
“Sim, meu dever é não perder essas belezinhas, sabe como é? Iguais joias.”
Alex não é nenhum pé rapado, tem uma graduação renomada, o que ajuda a compreender as interações humanas e era perfeito para seu serviço.
E essa fascinação mascara um diagnóstico escondido.
“Será?”
Só era um psicólogo, e para tirar conclusões há uma necessidade de aprofundamento.
Contudo, aposta que o presidente sacou.
“Ok.”
***
Apesar da feição serena, seus olhos denotam cólera demoníaca.
Não era para penalizar, na verdade, arrancar o dedo que estava erguendo a peça íntima.
O secretário, que analisava os fatos presentes, não percebeu a besta à espreita pronta para atingi-lo, mas, como qualquer herbívoro que sobrevive nessa selva caótica, sentiu o mal ao redor.
No entanto, era tarde demais e não dava para escapar, não havia tempo de despertar a dama, e caso fosse, seria punido da pior forma, talvez perderia um olho como Takano…
“Porra…!”
Assim que virou, já estava perto e a mão pesada vinha em sua direção e, como já esperava, sua bochecha esquerda foi atingida.
A força é tremenda, ocasionando uma dormência no pescoço, sabendo que ficará com o torcicolo por um tempo.
Sua pele, branca como giz, rapidamente avermelhou com a forte batida que cobriu quase metade do rosto.
O som alto formou ondas sonoras, expelindo um fraco eco.
A calcinha caiu no chão com a força do vento provocado pela batida.
Nesse curto período, em que ainda não raciocinou para sentir a dor da pancada, ficou estático e, como algo errado, um grunhido veio da cama, anunciando a percepção da ação.
Mas estava cansada o suficiente para abrir os olhos, e mesmo assim, o som alto da melodia impedia de assimilar o que de fato ocorreu.
Mohammad possui a expressão tenebrosa, se abaixando e pegando a peça do chão, observando se não tinha nada, e até cheirou para analisar se estava contaminado.
Passando com cuidado para a poltrona que manteve o odor característico.
“O que falei para fazer? Disse para não tocar em nada do que fosse permitido. Por que me desobedeceu?”
“Eu… eu…”
E, quando menos esperou, outro foi desferido na outra face.
“Quero a resposta.”
Nos ensinamentos cristãos, fala-se do versículo de Mateus 5:39, em dar a face caso a outra fosse atingida.
Era isso que Ahmad bin Awad tentou resgatar quando seu pai lhe disse uma última vez antes de ser morto pelo grupo extremista.
Gravado em sua mente nesse exato momento, todavia, diferente do deus bondoso e seu pai, não queria dar a outra face, foi obrigado, ao cometer um erro idiota ao fazer algo que foi treinado a não fazer.
“Por que não fiquei sentado no meu lugar, como um bom cachorro doutrinado, e esperando pacientemente pela volta do dono? Por que dei corda à minha curiosidade?”
“Responda, por que me desobedeceu?”
“Me perdoe, fui indisciplinado, não escutei a sua orientação e acabei atiçado pela curiosidade. Perdoe-me, presidente.”
De cabeça baixa, não conseguia olhar para cima. Caso faça, não será só isso, e sim um soco, sendo mil vezes pior.
“Lave as mãos, em que não possa sentir o cheiro dela em seus dedos, não importa que esteja em carne viva, se voltar ainda manchado, quebrarei novamente seus dedos para aprender a não tocar no que não é seu.”
“Sim, presidente.”
“Tem dez minutos, e quando sentar nessa cadeira, não quero imaginar que possa ter algo nela em você.”
“Sim, presidente.”
“Agora saia.”
“Com licença, presidente.”
Ao sair contido, querendo, na verdade, correr, foi em direção à porta, indo para o seu aposento, e fazer a lavagem processual em situações emergenciais.
Um ato que há tantos anos não repetia.
E agora é necessário, para não vê-los tortos novamente, e no final, receber uma punição pior por estar inválido pelos machucados.
Só não podia chorar, como um bicho, não deve mostrar tristeza, alegria, raiva ou nada que não fosse autorizado pelo seu dono.
Todas as suas emoções foram roubadas por esse sádico, e por causa disso tinha que aparentar todas as funções de um robô, tornando-se um ser tão inatural quanto a divindade que serve.
Na realidade, essa dor é mais psicológica que física, porque foi submetido há longos anos a não sentir dor.
“De novo.”
“Ahhhhhh!”
Olhava o pequeno anjo de seis anos, que segurava um chicote rígido feito da crina de cavalo.
Esse artefato era seu pão diário, que Mohammad fazia passar para modificar gradualmente seus sensores, fazendo assim, com o passar dos dias, semanas e anos, um ser perfeito.
***
Mohammad segurava o item de maior preciosidade, e que nesse instante foi tocado por outro, logo o animal que ajudou a cuidar, dando-lhe comida, moradia e uma instrução digna de um magnata.
Que, no final, acabou traído, e isso é quase natural.
É normal às vezes os bichos morderem a sua mão no processo de treinamento, no momento em que persistem na rebeldia, e que precisam de certo esforço e doutrina para disciplinar.
Todavia, seu empregado já foi ensinado, desde que foi para sua casa, para lhe servir como um cachorro substituto para tantos que faleceram em suas mãos.
Diferente dos outros, esse não tinha como matar, tem que manter ao seu lado e cuidar como qualquer bichinho de estimação.
E foi isso que fez, alimentou quando tinha que alimentar, doutrinou e ensinou a lei básica de um servo para seu dono.
E para obter o resultado que tem, foram muitos anos de treino, tortura e um tanto de manipulação.
Acreditando que estava apto para ser usado e servir como digno de sua espécie.
É o dono, precisava para auxiliar em muitas coisas, foi para isso que aquele verme lhe deu de presente.
Para ser usado nas tarefas que, de certa forma, não precisava colocar as mãos, coisas simples que uma da hierarquia dele tem que fazer.
“Mohammad, trouxe-lhe um novo bichinho.”
“…”
Mirou de cima a baixo para o garoto um ano mais velho que estava péssimo de aparência, era nítido a guerra em seus olhos e a dor de perder um ente mais que querido.
“Mantenha-o vivo, precisa dos filhotes para servir à descendência Haroon.”
“É um inútil.”
“Faça ficar um pouco útil. Acredito que saiba treinar um animal. Apesar de não durar com um…”
Riu, como se os outros presenteados não fossem nada, tão nada quanto esse escravo.
Entretanto, assim como no passado, onde permitiu um ato que foi instruído para não fazer, dessa vez será nocivo, o que deixou furioso e talvez se arrependa de não ter quebrado o dedo que pegou na calcinha…
Sim, vai se arrepender.
Contudo, não pode substituir algo que custou e demandou tempo para fabricar, e que precisava para fazer suas funções.
Não perdoará uma próxima vez, se não, não serão os dedos, e sim o coração que será perfurado pelo seu machado.
Nesse estresse, precisava relaxar, e nada melhor que deitar ao lado da pessoa que ama.
Fazendo, se rastejou até o móvel e deitou ao lado dela, que estava com a cabeça coberta.
Aproximando seu rosto perto do cabelo, sentiu o leve cheiro do finalizador e imaginou como era o processo.
E queria muito estar presente, assim, recordou de sua morada que não será um lar enquanto não estiver.
“[…]Eu não estou destinado a viver sozinho. Transforme esta casa em um lar. Quando eu subir as escadas e virar a chave… Oh, por favor, esteja lá ainda apaixonada por mim.[…]”
A última estrofe de ‘A House Is Not A Home’, cantada por Dionne Warwick, em conjunto com a canção ‘One Less Bell To Answer’, feita pelo mesmo compositor Burt Bacharach, soa quase como uma súplica doce.
Na voz bonita de um homem que construiu a casa dos sonhos, mas não será um verdadeiro lar, e sim apenas mais um amontoado construído por capricho de seus prazeres.
Só se tornará, quando finalmente passar por aquela porta, construída no intuito de chegar alguém que verdadeiramente fará parte dessa nova história, e que dará todo significado de pertencimento à sua solidão.
Enquanto se delicia, para diminuir o azedume do acontecimento anterior, um empregado esfregava suas mãos continuamente com sabonete líquido antibactericida.
Suas mãos estão vermelhas, por tamanho esforço em eliminar qualquer cheiro daquela mulher que será sua nova dona, a verdadeira que assentará ao lado dele.
O tapa desferido causaria um certo desconforto e até inchar, deixando com aspecto desfigurado e mostrando a todos que cometeu um erro, um estúpido demais.
Já faz 18 anos, recorda com detalhe de como procedeu.
E tudo por um brinquedo em fúria, pois na época, era apenas um universitário do segundo semestre de administração.
Nisso, Mohammad não queria atender a diva, devido a estar ocupado demais, tendo relações com outra de departamento diferente.
Foi bem claro ao relatar que não queria ninguém em seu apartamento, e nesse tempo, não tinha os cachorros para auxiliar nessa missão complicada.
E tudo ficava por sua conta, tinha que estudar para não ser punido, limpar e organizar suas coisas e até servir de guarda.
Uma formosura de olhos verdes conseguiu, de certa maneira, furar o bloqueio e, como a porta não estava trancada — para outra beleza poder sair no cronograma expedido — invadiu.
E quando Mohammad estava quase chegando lá, foi atrapalhado com gritos de raiva e desespero da outra invasora, o que fez a parceira que estava no clímax, recebendo várias estocadas, tomar um susto e perder o fio da meada.
E toda cena foi estragada por duas pessoas, só de…
Mohammad fez o trabalho sujo de esbofetear e expulsar do apartamento, enquanto outra esperava para assim restaurar o clima perdido.
E, como recompensa, por permitir esse show gratuito, destruído o momento especial da besta de alcançar o prazer, ganhou um belo de um tapa, tão forte quanto esse que tem em suas duas faces.
Fora que, depois, não permitiu que ninguém fizesse o mesmo e aguentou até Dmitri chegar.
Aliviando em 30%, tornando o que é hoje.
Porém, não entendeu essa atitude, pois tocar em peças íntimas e trocar lençóis manchados com orgasmo feminino era sua função.
Quantas vezes teve que jogar calcinhas de incontáveis modelos, pelo limite estipulado?
Até havia algumas que deixavam propositalmente para servir de ‘recordação’ para o homem que fez gemer loucamente durante as horas intensas de prazer.
Só que todas tinham um único propósito, serem jogadas fora, como todas as camisinhas usadas diluídas num ácido para desintegrar qualquer complicação com alguma obsessiva.
“Poderia ter ficado rico vendendo aquele esperma.”
Mais ou menos, sabendo bem que a tortura por tentar prejudicar esse senhor não seria paga pela dor e lesão severa proferida da boca de um juiz de bolso.
Nisso, algo de sua função foi penalizado.
Como há muitos anos sem fazer.
E entendeu que esse pequeno traje, de péssima qualidade e não sexy o suficiente para atiçar o desejo, não era igual a outros que tinham a função de agradar ao carnal.
Aquilo era especial, e não devia ser nem nomeado por suas mãos imundas, e no final acabou poluindo algo sagrado para esse cara.
Concluindo, pinica depois de várias lavagens, secou numa toalha de rosto e finalizou com uma boa quantidade de álcool 70, que queimou ao contato de sua pele sensível, e tudo em oito minutos.
“Isso só serve de lembrança para não ser tão curioso, minha função nunca foi de ser isso e sim, obedecer como um bom animal.”
Ao sair e chegar à tal porta que fez experimentar o inferno, foi o mesmo e abriu com o semblante de quem sentia uma intensa raiva.
E, naturalmente, como se nada, cumprimentou e pediu licença para adentrar nesse mar de tortura que chama de aposento.
Como se retornasse ao passado no teste mortal, o presidente não falou e saiu na frente, entrando pela mesma porta que foi seu pesadelo.
Sentia vontade de chorar, queria, como qualquer ser humano normal agraciado por Deus a ter tais sentimentos.
Mas não ele.
Estava proibido de sentir essas coisas consideradas desnecessárias e não benéficas ao seu proprietário.
E aparentar-se impecável, com o rosto sublime de submissão diante de seu senhor.
Não sabe o que era pior, a descendência negra que teve seus antepassados escravizados e suas vidas roubadas, e que hoje tem que ver essa parcela sofrer pelas mãos da geração nascida dos mesmos senhores de engenho.
Ou a sua, que possui todo o conforto do mundo, contudo, é igualada a um animal de serviço e usada por toda a eternidade.
“Não importa, ambos terão o mesmo fim. Deus, só não deixe que enlouqueça, só…”
“Senta, temos muitas coisas a resolver antes que acorde. Logo, retornaremos após as 17h.”
“Sim, presidente.”
Não havia nada a relatar, como a ordem foi feita, seus dedos foram poupados de não sofrer algo pior.
Como tal, apenas seguiu o que deveria ser feito e provavelmente ficariam acordados por um longo período até concluir o cronograma.
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Capítulo 98
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