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Doce Inanição

Capítulo 14

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A luz da manhã filtrava-se pelas frestas das cortinas, desenhando linhas suaves sobre o corpo adormecido de Cael. Ele não se mexia, mas não dormia. Seus olhos estavam abertos, fixos no tecido amarelado do travesseiro, como se buscassem decifrar algum segredo ali costurado — algo que lhe dissesse como continuar existindo naquele lugar sem se romper.

A cama ainda guardava o calor residual do corpo de Nathan. Ele havia se levantado cedo, silencioso como sempre, mas antes de sair, seus dedos haviam roçado os cabelos de Cael com a mesma hesitação que se tem ao tocar uma ferida prestes a cicatrizar. Não houve beijo. Nem palavras. Apenas o gesto — tímido, mas presente — como quem dizia: estou aqui, mesmo quando não sei o que dizer.

Cael rolou sobre o colchão e enterrou o rosto no lençol. A textura era limpa, acolhedora. Cheirava a Nathan. Não a perfume ou sabão, mas à essência leve e morna de alguém que vive com calma. Aquilo o acalmava e o deixava tenso ao mesmo tempo.

Levantou-se devagar, o corpo ainda se adaptando à ausência do selo. Havia uma leveza nova em seus movimentos, mas também uma estranheza — como andar descalço após anos em sapatos apertados: liberdade que feria. Olhou-se no espelho do armário e tocou o pescoço, onde antes ardia a marca de sua servidão. Agora havia apenas pele. Macia, quase pálida.

Pela primeira vez em muito tempo, seu reflexo não lhe causava desprezo — apenas confusão.

Desceu para a cozinha ainda de meias, vestindo uma camisa larga que não era sua. O ar carregava o aroma rico e inebriante de café recém-passado, misturado ao calor adormecido dos móveis de madeira, criando uma atmosfera quase íntima, de lar.

Nathan estava na cozinha, ainda com o cabelo desalinhado pelo sono e a camiseta larga pendendo dos ombros. De costas para a entrada, concentrava-se na xícara fumegante que segurava entre as mãos, os olhos meio fechados enquanto tomava o primeiro gole, saboreando o amargor reconfortante que parecia enraizá-lo no presente.

Foi então que sentiu uma presença suave atrás de si.

Cael surgiu como uma sombra tranquila, atraído pelo cheiro do café como uma mariposa à luz. Usava apenas uma calça de moletom frouxa e uma camiseta fina que deixava transparecer a curva elegante de sua cintura. Carregava a própria xícara com ambas as mãos, soprando levemente o líquido quente antes de dar um gole, as sobrancelhas franzidas num gesto adoravelmente distraído.

Nathan se virou de leve, recostando-se contra a bancada, observando-o com um pequeno sorriso nos lábios — um sorriso que Cael percebeu mesmo sem levantar o olhar.

Terminando de beber, Cael apoiou a xícara sobre a mesa próxima, como quem descarta as últimas formalidades. Caminhou até Nathan com passos lentos, quase felinos, até que não havia mais do que um palmo de distância entre seus corpos.

Os olhos dourados encontraram os de Nathan, uma súplica silenciosa, desarmada e terna.

— Posso te beijar? — perguntou ele, a voz baixa e um tanto rouca, como se temesse perturbar a delicadeza daquela manhã.

Nathan não hesitou. O sorriso cresceu, aquecendo ainda mais o pequeno espaço entre eles.

— Pode — respondeu, a palavra soando mais como uma promessa do que uma permissão.

Antes mesmo de terminar de falar, Cael se aproximou, as mãos subindo devagar para tocar o rosto de Nathan com uma reverência quase cerimonial. O beijo que se seguiu foi diferente de qualquer outro que já haviam trocado: não havia urgência, não havia o peso de antigos medos ou desejos desesperados. Era terno, amoroso, um toque que falava de confiança recém-construída, de um querer silencioso que não exigia nada além de presença.

Nathan deslizou os braços ao redor da cintura de Cael, puxando-o mais para perto, sentindo o calor vivo de seu corpo contra o seu. Cael sorriu contra sua boca — um daqueles sorrisos pequenos e secretos que apenas Nathan parecia ter o privilégio de ver.

O beijo se aprofundou com uma lentidão preguiçosa, exploratória, como se ambos estivessem redescobrindo a sensação de pertencer um ao outro sem as amarras antigas da culpa ou da fome.

Quando por fim se afastaram, ofegantes, os olhos de Cael brilhavam com uma ternura tão aberta que fez o peito de Nathan apertar.

— Você faz o café ficar ainda mais gostoso — murmurou Cael, roçando a ponta do nariz no dele com um gesto quase infantil.

Nathan riu, uma risada baixa e suave, ainda mantendo Cael firmemente contra si, como se soltá-lo fosse um risco que não valia a pena correr.

— Você tem um jeito… peculiar de elogiar — brincou, o sorriso persistindo enquanto acariciava de leve a linha da mandíbula de Cael com o polegar.

Por um momento, não disseram nada. Apenas permaneceram ali, no calor abafado da cozinha, o cheiro de café e pão fresco envolvendo-os como uma promessa tácita de que, apesar de tudo, estavam recomeçando — com pequenos gestos, pequenos toques, que tinham mais significado do que qualquer grandiosa declaração.

— Quer me acompanhar até a faculdade? — perguntou, a voz casual, mas com um calor que não disfarçava o quanto apreciaria a companhia.

Cael piscou, surpreso, o olhar se suavizando. Depois de um instante, assentiu — e a decisão foi tão natural quanto respirar.

—–

Pouco depois, caminhavam lado a lado pelas ruas que levavam à universidade. O frio matinal fazia com que a respiração de ambos surgisse em nuvens breves no ar. Nathan, como de costume, usava uma jaqueta leve; Cael trajava algo discreto, mas que, mesmo assim, realçava sua presença de forma inegável — como se o mundo ao redor naturalmente se moldasse à sua silhueta.

Assim que cruzaram os portões da faculdade, Cael sentiu novamente aquele curioso fenômeno: olhares sutis deslizando sobre ele, sussurros abafados que se perdiam no vento. Como da última vez, era impossível passar despercebido.

Nathan percebeu também — e riu, baixo.

— Você definitivamente chama atenção — comentou, com um certo tom divertido.

Cael suspirou, fingindo um tédio exagerado, mas não pôde evitar o sorriso que lhe curvou os lábios. Então, sentiu algo: a mão de Nathan, estendida em sua direção, um convite silencioso.

O íncubo hesitou, lançando-lhe um olhar curioso.

— Se dermos as mãos, não vai dar a impressão errada para as pessoas? — perguntou, a voz carregada de um leve deboche. Mas havia também algo mais ali, uma sombra de receio que não conseguia esconder totalmente.

Nathan arqueou uma sobrancelha, confuso.

— Impressão errada? — repetiu. — De que somos um casal?

Cael assentiu com a cabeça, os olhos dourados semicerrados.

Nathan sorriu — o tipo de sorriso que era todo ternura e certeza.

— Mas nós somos um casal — disse, simplesmente. — Não somos?

A resposta caiu entre eles como uma pedra num lago sereno, criando ondas suaves de silêncio e significado.

— Somos, claro — Cael riu, sem graça, desviando o olhar por um breve momento. — Eu só pensei… alguns humanos não gostam de assumir relacionamentos em público, especialmente em lugares como faculdade ou trabalho — murmurou.

Nathan inclinou-se levemente para a frente, conspiratório.

— Você não lembra da última vez que esteve aqui? — perguntou, divertido. — Nós nos beijamos.

Cael piscou, pego de surpresa pela lembrança. Claro que lembrava. Como poderia esquecer?

Nathan continuou, agora mais sério:

— A verdade é que… já aconteceu. Desde aquele dia, eu ouvi alguns comentários. Nada direto. Só… fofocas, entre conhecidos.

Cael sentiu uma pontada incômoda de culpa.

— Me desculpe — disse, genuíno.

Nathan balançou a cabeça, desdenhando a preocupação.

— Não há do que se desculpar. Nada disso é um problema pra mim — seus olhos, tão claros e firmes, encontraram os de Cael. — Eu não me importo que as pessoas saibam que eu tenho um namorado tão lindo.

A palavra — namorado — atravessou Cael com uma força inesperada.

Namorado.

Não era apenas um rótulo. Era uma âncora. Uma afirmação silenciosa de pertencimento, de escolha. Algo que Cael, em toda a sua existência feita de vazios e artifícios, raramente havia experimentado de forma tão simples, tão irrevogável.

Ele desviou o olhar, respirando fundo, como se precisasse de um momento para absorver aquela nova realidade. Sentiu o calor da mão de Nathan entrelaçar-se à sua, sem hesitação.

E, pela primeira vez em muito tempo, Cael não sentiu a necessidade de esconder quem era, ou quem estava ao seu lado.

Permaneceram assim por alguns instantes, apenas sentindo o pulsar discreto da vida ao redor, enquanto o mundo parecia se tornar um pouco menos vasto e desconhecido.

Quando o horário da aula se aproximou, Nathan sorriu para ele — o gesto cheio de uma ternura quase dolorosa.

— Vou indo — disse, soltando devagar a mão de Cael, os dedos deslizando com relutância.

Cael observou-o se afastar pelo corredor, cada passo carregando a promessa silenciosa de que voltaria.

E ali, parado entre o fluxo de estudantes e o som abafado das conversas, Cael permitiu-se um sorriso tranquilo — discreto, mas verdadeiro.

Era estranho… e, ao mesmo tempo, maravilhosamente inevitável.

Eles eram namorados agora.

De verdade.

—–

“Oi.”

“Já comeu alguma coisa?”

“Eu fiz chá. Quer que eu te espere pra jantar?”

As respostas vinham com pontualidade gentil, sem empolgação nem frieza:

“Sim, acabei de sair da aula.”

“Pode me esperar, chego por volta das 8.”

“Boa ideia. Obrigado.”

Quando Nathan chegou, o apartamento estava aquecido. Lá fora, o ar era cortante. Mas, ao abrir a porta, foi envolvido pelo calor suave do apartamento. Cael o esperava no sofá, encolhido sob um cobertor, os joelhos puxados contra o peito. Não disse nada de imediato; apenas levantou os olhos quando Nathan entrou.

O humano parou na porta, observando-o como quem verifica um sonho: medindo se ele ainda estava ali, sólido e real, e não uma miragem evaporada junto da magia que o libertara.

— Fiz sopa — disse Cael, a voz baixa, quase reticente. — Não sei se você gosta… mas achei que seria… reconfortante.

Nathan tirou o casaco com calma, pendurando-o no cabide com uma precisão quase cerimonial, e respondeu apenas com um aceno:

— Gosto, sim.

Sentaram-se à mesa. Comiam em silêncio, o ambiente preenchido apenas pelo tilintar ocasional das colheres e o murmúrio abafado da cidade do lado de fora.

Na primeira colherada, Nathan conteve uma leve careta, tentando disfarçar. A sopa era morna, salgada demais, com uma textura incerta — um esforço genuíno, porém desastrado. Cael, atento a cada microexpressão, percebeu. E riu, um som pequeno e rouco, como se não soubesse direito se podia achar graça.

— Acho que cozinhar não é meu talento natural — murmurou, apertando o cobertor contra o peito numa tentativa de esconder o rosto.

Nathan sorriu também, um sorriso quente, sem zombaria. Continuou comendo sem reclamar, o gesto mais eloquente do que qualquer palavra.

Depois, ele se jogou no sofá, exalando um cansaço tranquilo, enquanto Cael hesitava por um instante antes de se juntar a ele, sentando-se perto, os joelhos quase se tocando.
Por um tempo, ficaram apenas assim, respirando juntos.

Nathan, meio distraído, pensou que Cael devia estar com fome — mas, orgulhoso como era, jamais diria isso em voz alta. Algo em sua postura, no modo como se mantinha perfeitamente imóvel, denunciava uma contenção dolorosa.

Quebrando o silêncio com uma leveza quase ensaiada, Nathan se inclinou e, em vez de falar, roçou os lábios nos dele — um beijo lento, sem pressa, carregado de uma ternura que parecia deslocada naquele corpo treinado para outras respostas.

O íncubo estremeceu. O instinto o fez tensionar, rígido por um instante… mas então algo dentro dele cedeu, dissolvendo-se devagar. Sua cauda, inquieta, enroscou-se frouxamente em torno da própria perna, como um pedido silencioso de permissão para ficar.

Quando se afastaram, Cael piscou, ainda um pouco atordoado, antes de murmurar, com uma pequena curva divertida nos lábios:

— Acho que a sopa estava mesmo ruim… até o beijo tinha gosto de sal.

Nathan soltou uma risada abafada, puxando Cael para mais perto, como quem encontra consolo na imperfeição.

— Podemos ficar assim? — sussurrou Cael, tão baixo que parecia temer quebrar o instante frágil entre eles.

Nathan não respondeu com palavras. Apenas entrelaçou seus dedos aos dele, a pressão firme, sem exigir, sem forçar.

Ficaram assim — não como amantes apressados, nem como prisioneiros de uma urgência antiga — mas como dois seres, tão distintos e feridos, tentando, com a paciência dos que carregam cicatrizes, reconstruir o significado do toque.

Depois de um tempo, Nathan puxou Cael suavemente, acomodando-o à sua frente no sofá, o silêncio entre eles confortável, familiar. Então Nathan inclinou a cabeça, seus lábios roçando a têmpora de Cael. Foi um beijo suave, quase casto, mas que o fez estremecer. Nathan o beijou novamente, desta vez na bochecha, depois no canto da boca.

Cael virou a cabeça e, com um gesto calmo, Nathan começou a beijá-lo — um beijo lento, amoroso, desprovido de pressa ou luxúria óbvia. Cael correspondeu, os olhos semicerrados, até que se afastou com um pequeno suspiro.

Mas Cael se afastou primeiro, franzindo a testa.

— Meu pescoço… dói nessa posição — murmurou, a voz soando quase como um pedido de desculpas.

Nathan soltou uma risada breve, sem qualquer irritação, e ajeitou-se para encará-lo melhor.

— Então senta no meu colo. De frente pra mim.

Cael hesitou, depois assentiu, movendo-se para montar nas coxas de Nathan. Acomodou-se no colo dele, o corpo leve, como se temesse ser um peso. As mãos de Nathan repousavam em sua cintura, os polegares traçando pequenos círculos no tecido da camisa. Voltaram a se beijar, agora mais encaixados, mais próximos, a respiração de ambos aquecendo o ar entre eles.

As mãos de Nathan deslizaram lentamente por baixo das roupas de Cael — subindo pelo dorso, acariciando as curvas suaves de sua cauda com uma ternura desconcertante.

A respiração de Cael engasgou, seu corpo ficou tenso enquanto os dedos de Nathan traçavam o apêndice sensível.

— Nathan… — ele murmurou, com a voz tensa. — Não…

Sussurrou com os olhos abaixados, como se o próprio gesto o envergonhasse.

Nathan arqueou uma sobrancelha, a expressão um misto de irritação e carinho.

— Idiota — resmungou, a voz baixa, mas sem verdadeira dureza. — Já não é óbvio o suficiente?

Cael piscou, sentindo o coração errar o compasso por um instante. Ergueu os olhos, sem afastar-se, como se temesse que qualquer movimento pudesse desfazer o momento.

— Por quê…? — murmurou, como se a pergunta lhe escapasse sem controle. — Por que você quer isso?

Nathan soltou um suspiro paciente, ajeitando Cael melhor no colo, como se não pretendesse deixá-lo fugir.

— Porque você tá com fome, Cael. Por mais que tente esconder.

Cael balançou a cabeça, quase em pânico, as palavras saindo atropeladas.

— Eu estou bem. Não estou… faminto. Eu posso aguentar.

Nathan o olhou por um instante longo, como quem pesa o que dizer — depois sorriu de um jeito exasperado e gentil.

— Eu quero fazer sexo com você, Cael. — Disse com simplicidade brutal, sem floreios. — Você sabe que eu gosto de você e não sou feito de pedra, sabia?… E isso vai te ajudar a se alimentar também. Só não entendo por que você está se segurando.

Cael abriu a boca, depois a fechou, as palavras se embolando na garganta.

Ele não queria forçar nada entre eles, não queria apressar Nathan só por fome, não queria que tudo fosse reduzido a isso — desejo e necessidade, nada mais.

Mas, antes que pudesse se perder na própria culpa, Nathan acariciou sua nuca e murmurou, com uma paciência feita de ternura:

— Você não está forçando nada. Não está me pressionando. Eu estou te pedindo, Cael… Acha que eu também não sinto isso? Essa vontade… Eu quero te sentir, cuidar de você. Então pare de lutar contra isso.

Cael não respondeu de imediato. O peito doía com algo que não era exatamente fome — era a urgência de ser compreendido, e ali, naquele instante, ele se sentia mais nu do que jamais estivera.

— Eu… eu só queria que fosse diferente. Que não fosse só um impulso. Que não me visse como… aquilo que eu fui feito pra ser. — Disse, enfim, a voz presa em algo que se assemelhava à comoção.

Nathan levou a mão livre até o rosto de Cael, afastando uma mecha de cabelo que caíra sobre seus olhos. O gesto foi de uma ternura quase desconcertante.

— Eu nunca vou te impedir de se alimentar — afirmou. — Nunca. Se você precisar, é só dizer. Você não tem que sofrer. Não comigo.

Cael sentiu os olhos arderem. Não de dor, mas de alívio. Um tipo raro e precioso de alívio, que não vinha da libertação do selo, mas da confiança que Nathan parecia lhe oferecer sem exigir garantias.

— Eu não sei se consigo explicar como isso… como isso é importante pra mim — confessou. — A liberdade de escolher. Até mesmo isso. O corpo… o desejo… sempre foram armas nas mãos de outra pessoa. Até quando eu achava que estava no controle. E agora…

— Agora não são — completou Nathan, com firmeza. — Não comigo.

Cael assentiu, os olhos fixos na linha do maxilar de Nathan, que agora parecia quase demasiadamente humano, vulnerável em sua clareza.

Por um instante, tudo se aquietou. A respiração de ambos entrou em sintonia, e o calor entre eles não era de desejo urgente, mas de um laço que começava a se consolidar — feito de respeito e escolhas compartilhadas.

Cael soltou um suspiro baixo e apoiou a testa no ombro de Nathan, como quem se rende — não por fraqueza, mas por confiança.

— Eu não preciso me alimentar agora — disse, depois de um tempo. — Mas… talvez… talvez eu queira. Com você. Quando for a hora certa. Quando você quiser também.

Nathan assentiu lentamente, e não havia expectativa em seu olhar. Só paciência.

— Tudo bem, mas não espere até ficar faminto para se alimentar — murmurou.

E o silêncio que se seguiu não exigia mais nada.

Ainda com a testa apoiada no ombro de Nathan, Cael murmurou, quase como se estivesse confidenciando um segredo:

— Aliás, sua irmã me disse que seu aniversário está próximo. — Cael ergueu os olhos dourados, suaves. — Foi por isso que você disse que estaria livre no fim de semana?

Nathan assentiu, brincando com uma mecha dos cabelos de Cael entre os dedos.

— Sim. Tirei o dia pra mim. Quer dizer, pra mim e pra quem eu quiser passar esse tempo. — Sorriu de lado, como quem oferecia uma escolha silenciosa. — Mas… também vou encontrar minha família e alguns amigos.

Cael hesitou por um momento, os dedos desenhando linhas invisíveis no tecido da camisa de Nathan.

— Você já tem planos, então… — murmurou, a voz mais baixa do que pretendia. — Não precisa se preocupar comigo. Pode ir e se divertir. Eu não vou atrapalhar.

Nathan inclinou o corpo para trás, apenas o suficiente para conseguir olhar nos olhos dele.

— Eu ia chamar você para ir — disse, sincero. — Não é como se eu não quisesse você lá.

Cael sorriu, um sorriso pequeno e quase tímido, e balançou a cabeça.

— Não… — disse, passando as pontas dos dedos levemente pela gola da camisa de Nathan, como se precisasse de algo para se concentrar. — Eu prefiro deixar você aproveitar seu dia. Quero que tenha tempo para sua família, para seus amigos.

Nathan ergueu uma sobrancelha, um brilho malicioso acendendo-se em seus olhos.

— Então por que trouxe o assunto à tona? — Provocou, a voz arrastada, cheia de diversão. — Hm? Não estaria tramando alguma coisinha, estaria?

Cael corou, uma leve sombra rosada subindo pelas maçãs de seu rosto, e desviou o olhar como quem fora apanhado em flagrante.

— Eu… — começou, tentando formular uma defesa plausível, mas acabou suspirando, derrotado. — Talvez tenha pensado em fazer alguma coisa, sim. Mas não imaginei que você ia… — fez um gesto vago com a mão, apontando para si mesmo e para Nathan de forma generalizada — ficar com tesão e tentar fazer sexo comigo antes disso.

Nathan riu, um som rouco e divertido que reverberou contra o corpo de Cael.

— Você é péssimo em guardar surpresas — comentou, com aquele tom brincalhão que sempre deixava Cael desarmado. — E, pra deixar claro… é óbvio que eu quero. Quero agora, quero depois, quero quando você quiser.

Cael abaixou o rosto, escondendo o sorriso bobo que ameaçava escapar.

— Eu não faria isso sem perguntar se você queria de verdade — disse, com a voz sincera, quase solene.

Nathan afagou sua nuca com carinho, puxando-o para mais perto.

Por um instante, permaneceram assim: dois corpos encaixados de maneira quase inconsciente, respirando juntos, existindo juntos.

Depois de um tempo, Cael murmurou contra o peito de Nathan:

— Você pode passar o dia com sua família e amigos… e à noite, podemos sair. Um encontro. Só nós dois. E… se você ainda quiser, podemos passar a noite juntos.

Nathan afastou-se o bastante para ver o rosto dele, o sorriso tranquilo voltando aos seus lábios.

— Vai ser perfeito — respondeu, os olhos brilhando com uma ternura que fazia o coração de Cael doer de uma forma boa.

Nathan, então, perguntou, a voz tingida de preocupação sincera:

— Você consegue ficar sem se alimentar até lá?

Cael assentiu com determinação.

— Consigo — respondeu. — Por você… eu consigo.

Nathan sorriu, puxando-o mais uma vez para um abraço, sem pressa, como se o tempo pudesse ser esticado apenas pela força de sua vontade.

Ali, entre promessas silenciosas e desejos contidos, uma nova fase entre eles começava a se desenhar — feita não de necessidade, mas de escolha, de entrega mútua, lenta e genuína.

E Cael, pela primeira vez, sentiu que poderia esperar.

Porque agora, ele sabia: Nathan também o escolheria.

Sempre.

—–

O entardecer tingia o céu de dourado e lilás quando Nathan encontrou Cael esperando por ele diante do hotel.
A luz morna refletia na fachada envidraçada, banhando a figura de Cael com um brilho quase etéreo. Ele estava de pé, junto à entrada imponente, vestindo roupas elegantes de cortes discretos — calças de alfaiataria que delineavam suas pernas longas, uma camisa escura que realçava o tom de sua pele clara e o brilho estranho e hipnotizante de seus olhos dourados.
Havia uma beleza atípica nele, algo que não era apenas físico — era a maneira como seus ombros, embora firmes, pareciam guardar uma tensão quase tímida, como se aquele gesto, aquela espera, fosse para ele um desafio silencioso.
Nathan sentiu o calor invadir-lhe o peito ao ver o cuidado escondido nos detalhes: o cabelo penteado com mais esmero, a escolha da roupa que dizia, sem palavras, “Eu queria estar à sua altura.”
Aproximou-se, o cansaço do dia derretendo sob a simples presença dele.

— Você se arrumou… — disse, a voz carregada de uma admiração sincera, quase surpreendida.

Cael deu de ombros, tentando parecer indiferente, mas o pequeno sorriso que curvou seus lábios o traía.

— Era uma ocasião especial, não era? — respondeu, em um tom leve que escondia a ansiedade sob a superfície.

Nathan sorriu, sentindo o próprio coração tropeçar desajeitadamente.
Sem hesitar, estendeu a mão — e, desta vez, Cael a aceitou sem hesitação, seus dedos se entrelaçando como se, por fim, admitissem algo que ambos já sabiam.

O concierge os recebeu com uma polidez silenciosa, conduzindo-os através de corredores de mármore polido e tapeçarias discretas. O restaurante interno do hotel era um santuário de sofisticação contida: iluminação tênue, mesas estrategicamente afastadas para garantir privacidade e o som de música instrumental envolvendo o ambiente como um murmúrio confortável.
Acomodaram-se em uma mesa junto a uma janela ampla que revelava a cidade começando a cintilar sob o véu da noite. Nathan soltou um suspiro leve, os ombros relaxando pela primeira vez em horas.

— Foi um dia cheio — disse, sorrindo enquanto examinava o cardápio de couro fino. — Minha mãe fez questão de mostrar fotos embaraçosas da minha infância pra todo mundo. — Completou, revirando os olhos em uma expressão que arrancou uma risada suave de Cael.

— Alguma história que eu precise saber? — perguntou Cael, apoiando o queixo na mão, seus olhos dourados brilhando de interesse genuíno.

Nathan fingiu um pesar teatral.

— Acho que é melhor manter algum mistério… senão você vai querer fugir. — respondeu, a boca curvando-se num meio sorriso que carregava mais ternura do que humor.

Cael inclinou-se um pouco sobre a mesa, o olhar malicioso cintilando sob a luz suave.

— Se eu sobrevivi à primeira vez que te vi usando aquele pijama de patinhos, acho que posso sobreviver a qualquer coisa.

Nathan soltou uma risada verdadeira, um som que reverberou entre eles como um acorde perfeito.
Era nesses momentos, tão pequenos e aparentemente triviais, que Cael sentia o mundo que conhecia desmoronar, tijolo por tijolo, sendo substituído por algo mais vulnerável e assustadoramente real.

A conversa fluiu com uma naturalidade que ambos quase temiam quebrar.
Nathan falou dos reencontros com amigos de infância, das piadas velhas que sua família repetia a cada ano e, em um momento de hesitação breve, confessou:

— Eu… contei pra eles que estou em um relacionamento. — As palavras saíram com uma leveza estudada, mas havia tensão em seus olhos, como se esperasse algum julgamento.

Cael piscou, surpreso, e depois, suavemente, sorriu — um sorriso pequeno, mas que iluminou seus traços de maneira quase dolorosa.

— E… como eles reagiram? — perguntou, a voz cuidadosamente neutra, como quem caminha na borda de um precipício.

Nathan apoiou os cotovelos na mesa, aproximando-se imperceptivelmente.

— Eles fizeram perguntas, claro. Queriam saber quem era você… por que você não estava lá. — Nathan riu baixo, balançando a cabeça. — Eu disse que… que numa próxima vez, você poderia conhecê-los.

Cael baixou o olhar por um instante, absorvendo aquela promessa silenciosa.
Parte de si queria recuar — as cicatrizes de sua vida antiga ainda pulsavam sob a pele —, mas a maior parte… queria acreditar. Queria ser merecedor desse futuro que Nathan oferecia sem pedir nada em troca.

Depois do jantar, guiado por um impulso que misturava nervosismo e desejo de agradar, Cael o levou até a suíte que havia reservado.
O elevador subiu devagar, e cada andar parecia puxá-los mais para dentro de uma bolha onde o mundo exterior se tornava uma memória cada vez mais distante.

A suíte era ampla, com janelas de vidro que se abriam para a vastidão da cidade, onde as luzes tremeluziam como estrelas distantes.
A cama, imensa e impecavelmente arrumada, convidava sem vulgaridade. Havia uma garrafa de vinho descansando em um balde de gelo ao lado de duas taças já preparadas. A iluminação, indireta e quente, espalhava sombras suaves pelos móveis minimalistas.

Nathan girou sobre os calcanhares, olhando tudo com uma expressão que misturava surpresa e comoção.

— Você pensou em tudo isso… pra mim? — murmurou, a voz rouca pela emoção.

Cael encolheu os ombros, desconfortável sob o peso daquele olhar.

— Eu queria fazer algo especial — disse, desviando o olhar para as próprias mãos. — Porque… você merece. Não só pelo aniversário. — Sua voz vacilou, e ele mordeu o lábio inferior, lutando para encontrar palavras que sempre lhe escapavam. — Por tudo.

Nathan atravessou a distância que os separava em poucos passos.
Com infinita delicadeza, tocou o rosto de Cael, o polegar roçando sua pele com uma reverência silenciosa.

— É mais do que eu poderia pedir. — disse, e naquele instante, não havia espaço para dúvidas entre eles.

O beijo que se seguiu foi leve, quase hesitante, como o primeiro toque da luz sobre a água ao amanhecer.
Cael correspondeu com uma doçura tímida, como quem ainda aprendia a aceitar gestos que não exigiam nada em troca.

E a noite se desenrolou lentamente:
Beijos preguiçosos, risadas abafadas entre carícias tímidas, palavras murmuradas contra a pele como promessas pequenas e frágeis. Não havia fome urgente, nem a pressa desesperada que tantas vezes marcara os encontros de Cael antes de Nathan.

Era outra coisa — algo que se construía no ritmo da respiração, no deslizar das mãos que mapeavam o corpo do outro como se redesenhassem fronteiras secretas.
O mundo lá fora desapareceu, e na penumbra daquela suíte luxuosa, Nathan e Cael começaram a construir algo raro e precioso: um espaço onde desejo e ternura coexistiam, onde o amor podia, enfim, florescer — não como uma explosão violenta, mas como o lento desabrochar de algo que sabia que o tempo era seu maior aliado.

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Capítulo 14
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Doce Inanição

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Nathan jamais esperou encontrar o amor na forma de um íncubo. Muito menos descobrir que ele tinha um lado doce, um senso de humor duvidoso e uma tendência incorrigível a usar lingerie como forma...

Chapters

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        Capítulo 14 Sim, Eu Sou o Namorado Dele
      • Capa
        Capítulo 13 Você Sobreviveu. Agora Vai Viver
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        Capítulo 12 O Amor Dito Pela Primeira Vez
      • Capa
        Capítulo 11 Eu Quis Te Esquecer, Mas Só Soube Te Procurar
      • Capa
        Capítulo 10 A Primeira Vez Que Você Foi Amado
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        Capítulo 9 Manual Paranormal de Como Reagir a um Incubus
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        Capítulo 8 Memórias que Não Dormem
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